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Carlos Alberto de Assis Viegas

Estimado Editor

Em resposta ao interesse e às críticas feitas por Alexandre Amaral Rodrigues, referentes ao nosso artigo "Formas não habituais de uso do tabaco", tenho a dizer que, quanto ao questionamento sobre o volume de fumaça inalado em uma sessão de narguilé, saliento que a referência utilizada foi a de Shihadeh et al.(1) Os objetivos do uso dessa referência foram prover dados que pudessem ser usados como guia em estudos topográficos do tabagismo e conseguir a primeira aproximação dos parâmetros médios relacionados ao uso do narguilé, tais como volume, duração e frequência das baforadas (puffs). Os autores concluíram que "results showed that the average water-pipe café smoking session consists of one hundred seventy-one 530 mL puffs of 2.6 s duration at a frequency of 2.8 puffs/min". Eles salientam ainda que os volumes das baforadas, quando do uso de narguilé, são muito maiores que aqueles dos cigarros, e que até mesmo um simples puff de narguilé tem o volume comparável ao volume cumulativo de 335-1.235 mL para um cigarro inteiro.

Outro estudo,(2) analisando a fumaça do narguilé, mostrou que nessa fumaça estão presentes várias substâncias químicas em abundância, as quais se acredita que sejam fatores causais da elevada incidência de câncer, de doença cardiovascular e de dependência encontrada nos fumantes de cigarro. Também foi encontrada, na pasta de tabaco para narguilé, a presença de elementos radioativos semelhantes aos encontrados em cigarros e nas folhas de tabaco.(3) Além da inalação direta, as concentrações de CO (importante causador de doenças cardiovasculares), medidas em alguns locais da moda para fumar narguilé e bares, são particularmente altas. Ainda mais, os aditivos presentes no carvão, largamente utilizado para queima do tabaco no narguilé, e sua toxicidade continuam desconhecidos.(4)

Quanto à conclusão que o referido crítico tira, em tese, de que os usuários de narguilé deveriam inalar menos fumaça porque ela contém mais nicotina, comparada à fumaça do cigarro, mostra seu total desconhecimento sobre dependência química, o que é o esperado para um economista, mesmo com mestrado em filosofia na Universidade de São Paulo. Insisto também que nenhum dado foi alterado ou manipulado, conforme aquele senhor afirma, mas foram sim selecionados sob um outro olhar. Certamente queremos convencer as pessoas de que a conduta de consumir produtos do tabaco é nociva para sua saúde, e não há nenhuma questão de moralidade nisso, e sim uma questão de saúde pública, uma vez que no Brasil morrem, por ano, cerca de 200 mil pessoas por enfermidades relacionadas ao tabaco. Outro tema que foi levantado por ele é a afirmação de que não se trata de artigo científico, mas sim de um texto para leigos com embalagem científica. Aqui, sugiro que ele faça o questionamento diretamente ao Senhor Editor e ao Corpo Editorial do JBP, responsáveis pelas publicações. Ele também sugere que estamos ludibriando o público. Segundo o dicionário de português "Aurélio", ludibriar significa "zombar, escarnecer ou troçar de". Considero tão absurda a afirmação que me dou o direito de não fazer qualquer comentário a respeito.

Por outro lado, também somos preocupados com a exatidão das informações transmitidas e entendo que uma importante função dos profissionais de saúde, bem como dos de comunicação, é informar à comunidade a existência de hábitos nocivos para a saúde. Sobre a questão da exatidão, seria importante refletir sobre o fato de que "el hombre más apasionado por la verdad, o al menos por la exactitud, es por lo común el más capaz de darse cuenta, como Pilatos, de que la verdad no es pura. De ahí que las afirmaciones más directas vayan mezcladas con dudas, repliegues, rodeos que un espíritu más convencional no tendría." (Memorias de Adriano - Marguerite Yourcenar). Ou seja, me parece que o suposto crítico perdeu o foco a respeito do objetivo do nosso trabalho. Finalmente, sobre a questão tabagismo e ética, como profissional de saúde, entendo que não tratar e não controlar o uso de derivados do tabaco é que é antiético. Concordo apenas que nunca nesse país se necessitou tanto de promover grandes debates sobre ética.

De todas as formas, no caso específico, acredito que a informação mais adequada a ser divulgada é a de que não existe nenhuma forma de consumo de tabaco que tenha se mostrado segura e que o mundo precisa ser um ambiente mais saudável, sem os produtos derivados do tabaco.(5) Caso contrário, continuarão morrendo cerca de 10 milhões de pessoas por ano, em todo o mundo, por enfermidades relacionadas ao consumo desses produtos.

Carlos Alberto de Assis Viegas
Professor Associado da Faculdade de Medicina, Universidade de Brasília,
Brasília (DF) Brasil


Referências

1. Shihadeh A, Azar S, Antonios C, Haddad A. Towards a topographical model of narghile water-pipe café smoking: a pilot study in a high socioeconomic status neighborhood of Beirut, Lebanon. Pharmacol Biochem Behav. 2004;79(1):75-82.

2. Shihadeh A, Saleh R. Polycyclic aromatic hydrocarbons, carbon monoxide, "tar", and nicotine in the mainstream smoke aerosol of the narghile water pipe. Food Chem Toxicol. 2005;43(5):655-61.

3. Khater AE, Abd El-Aziz NS, Al-Sewaidan HA, Chaouachi K. Radiological hazards of Narghile (hookah, shisha, goza) smoking: activity concentrations and dose assessment. J Environ Radioact. 2008;99(12):1808-14.

4. Chaouachi K. The medical consequences of narghile (hookah, shisha) use in the world. Rev Epidemiol Sante Publique. 2007;55(3):165-70.

5. Boyle P, Ariyaratne MA, Barrington R, Bartelink H, Bartsch G, Berns A, et al. Tobacco: deadly in any form or disguise. Lancet. 2006;367(9524):1710-2.

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