ABSTRACT
Objective: To evaluate submaximal exercise tolerance and respiratory muscle strength in relation to forward head posture (FHP) and respiratory mode in children, comparing mouth-breathing (MB) children with nasal-breathing (NB) children. Methods: This was a controlled, analytical cross-sectional study involving children in the 8-12 year age bracket with a clinical otorhinolaryngology diagnosis of MB, recruited between October of 2010 and January of 2011 from the Mouth Breather Clinic at the State University of Campinas Hospital de Clínicas, located in the city of Campinas, Brazil. The exclusion criteria were obesity, asthma, chronic respiratory diseases, heart disease, and neurological or orthopedic disorders. All of the participants underwent postural assessment and the six-minute walk test (6MWT), together with determination of MIP and MEP. Results: Of the 92 children in the study, 30 presented with MB and 62 presented with NB. In the MB group, the differences between those with moderate or severe FHP and those with normal head posture, in terms of the mean MIP, MEP and six-minute walk distance (6MWD), were not significant (p = 0.079, p = 0.622, and p = 0.957, respectively). In the NB group, the mean values of MIP and MEP were higher in the children with moderate FHP than in those with normal head posture (p = 0.003 and p = 0.004, respectively). The mean MIP, MEP, and 6MWD were lower in the MB group than in the NB group. Values of MIP and MEP were highest in the children with moderate FHP. Conclusions: Respiratory biomechanics and exercise capacity were negatively affected by MB. The presence of moderate FHP acted as a compensatory mechanism in order to improve respiratory muscle function.
Keywords:
Mouth breathing; Posture; Exercise tolerance; Respiratory mechanics.
RESUMO
Objetivo: Avaliar a tolerância ao exercício submáximo e a força muscular respiratória em relação à anteriorização da cabeça (AC) e ao tipo respiratório em crianças com respiração bucal (RB) ou nasal (RN). Métodos: Estudo analítico transversal com um grupo controle no qual foram incluídas crianças de 8 a 12 anos com diagnóstico clínico otorrinolaringológico de RB, recrutadas do Ambulatório do Respirador Bucal do Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas, Campinas (SP), entre outubro de 2010 e janeiro de 2011. Os critérios de exclusão foram obesidade, asma, doenças respiratórias crônicas, cardiopatias e distúrbios neurológicos ou ortopédicos. Todos os participantes foram submetidos a avaliação postural, teste de caminhada de seis minutos (TC6) e determinação de PImáx e PEmáx. Resultados: Das 92 crianças do estudo, 30 tinham RB e 62 tinham RN. No grupo RB, não houve diferenças nas médias de PImáx, PEmáx e distância percorrida pelo TC6 (DTC6) entre o grupo com AC classificada como grave ou moderada e aquele com AC normal (p = 0,622; p = 0,957; e p = 0,079, respectivamente). No grupo RN, as médias de PImáx e PEmáx foram maiores no grupo com AC moderada do que naquele com AC normal (p = 0,003 e p = 0,004, respectivamente). Os valores de PImáx, PEmáx e DTC6 foram menores no grupo RB do que no grupo RN. A presença de AC moderada determinou maiores valores de PImáx e PEmáx. Conclusões: A RB afetou negativamente a biomecânica respiratória e a capacidade de exercício. A presença de AC moderada atuou como um mecanismo de compensação para uma melhor função da musculatura respiratória.
Palavras-chave:
Respiração bucal; Postura; Tolerância ao exercício; Mecânica respiratória.
IntroduçãoA síndrome do respirador bucal (SRB) é caracterizada pela substituição do padrão de respiração exclusivamente nasal por um padrão de suplência bucal ou misto. Comprometimentos de ordem funcional, estrutural, postural, biomecânica, de oclusão e de comportamento estão envolvidos nessa síndrome.(1)
A respiração bucal causa inibição dos nervos aferentes nasais, do nervo autonômico e do simpático trigeminal, que atuam na regulação da profundidade da respiração e no calibre das vias aéreas. O bloqueio nasal resulta em aumento da resistência e diminuição da complacência pulmonar, afetando a expansão torácica, com ventilação alveolar inadequada.(2)
Também tem sido demonstrado que o padrão respiratório imposto pela SRB implica em necessidades posturais adaptativas. Para facilitar a passagem do fluxo aéreo pela cavidade bucal, o indivíduo projeta a cabeça e estende o pescoço. Dessa forma, ele aumenta a passagem de ar pela faringe, reduzindo a resistência das vias aéreas.(3)
Vários trabalhos avaliaram a postura corporal de indivíduos com respiração bucal, sendo consenso que a anteriorização da cabeça é a principal alteração.(4-7)
Essa anteriorização da cabeça desencadeará uma desorganização das cadeias musculares (anterior, posterior e cruzadas), prejudicando a mobilidade e, consequentemente, a função do músculo diafragma. Essa alteração postural também levará ao recrutamento da musculatura acessória da respiração, com o aumento da atividade do músculo esternocleidomastoideo, levando à elevação da caixa torácica, diminuindo a mobilidade toracoabdominal e comprometendo a eficácia ventilatória promovida pelo diafragma. Essa desvantagem mecânica intensifica o esforço inspiratório e aumenta o trabalho respiratório.(3,8,9)
A ineficiência dos músculos da respiração vai gerar diminuição de força muscular respiratória, resultando em menor expansibilidade torácica, o que prejudica a ventilação pulmonar durante a atividade física.(9)
Dessa forma, tanto o padrão bucal, quanto a anteriorização da cabeça, também presente em crianças respiradoras nasais, podem comprometer a organização das cadeias musculares e resultar em diminuição da atividade do diafragma e em hipoatividade da musculatura abdominal, dificultando o sinergismo entre esses dois músculos.(8) Essas adaptações provocam prejuízo na ventilação pulmonar, com consequente reflexo na capacidade ao exercício (Figura 1).(9) Portanto, como a respiração bucal e as alterações da postura da cabeça podem influenciar a biomecânica respiratória e a capacidade de exercício, julgou-se necessário avaliar as relações entre essas variáveis, assunto não estudado em populações de crianças, até o presente momento, na literatura médica.
O objetivo do presente estudo foi avaliar a tolerância ao exercício submáximo e a força muscular respiratória em relação ao padrão postural da cabeça e o tipo respiratório em crianças com respiração bucal e naquelas com respiração nasal.
MétodosRealizou-se um estudo de corte transversal, descritivo e analítico, com um grupo controle. A amostra foi composta por crianças com idades entre 8 e 12 anos, de ambos os sexos, com diagnóstico de respiração bucal confirmado por história, exame clínico e nasofibroscopia confirmando o grau de obstrução das vias aéreas, assim como a presença de alterações mecânicas e anatômicas. As crianças foram recrutadas no Ambulatório do Respirador Bucal do Departamento de Otorrinolaringologia do Hospital de Clínicas, Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (FCM-Unicamp), Campinas (SP).
Para o grupo controle, foram selecionadas crianças saudáveis da Escola Municipal de Ensino Fundamental D. Ana José Bodini Januário em Hortolândia (SP), triadas através de um questionário enviado aos pais e exame clínico otorrinolaringológico, de acordo com os critérios sugeridos por Yi et al.(5) O questionário continha perguntas sobre presença de comorbidades, medicamentos em uso, cirurgias e tratamentos já realizados ou em andamento, sinais e sintomas característicos de respiração bucal (ronco e baba noturnos, dormir com a boca aberta, queixa frequente de obstrução nasal e sono agitado) e presença de rinite alérgica.
O exame clínico foi realizado por propedêutica otorrinolaringológica e consistiu de avaliações por rinoscopia, oroscopia e otoscopia, para analisar a presença de fatores obstrutivos de cavidades nasal e/ou oral, conforme descrito por Yi et al.(5) Crianças que não preenchessem os critérios de exclusão para os controles (presença de mais de um sinal ou sintoma de respiração bucal ou obstrução mecânica oral/nasal) foram convidadas a participar do estudo.
Todas as crianças com diagnóstico de SRB, atendidas no Ambulatório do Respirador Bucal, no período entre outubro de 2010 e janeiro de 2011, foram convidadas a participar do estudo.
Consideraram-se como critérios de exclusão ter índice de massa corporal maior que o percentil 95; ter asma, doenças respiratórias crônicas, distúrbios neurológicos, distúrbios ortopédicos e/ou cardiopatias; e ter sido submetido a adenotonsilectomia. Os critérios de exclusão foram investigados através da análise dos prontuários médicos e entrevistas com os pais, no grupo de estudo, e pelo questionário respondido pelos pais, no grupo controle.
O exame clínico foi realizado por propedêutica otorrinolaringológica, avaliando-se fossas nasais, seios paranasais, faringe, laringe e orelhas. Determinou-se a presença de fatores obstrutivos nas cavidades nasais por rinoscopia. A otoscopia consistiu no exame do meato acústico externo e na avaliação de presença de retração da membrana timpânica. Avaliaram-se alterações da cavidade oral e hiperplasia de tonsilas palatinas por oroscopia.
A nasofibroscopia foi realizada para a avaliação das cavidades nasais, desvios septais, hipertrofia de cornetos e da rinofaringe, determinando-se o grau de hiperplasia das tonsilas faríngeas em relação ao espaço das coanas do lado direito e esquerdo.
Utilizou-se um endoscópio flexível (Machida, Tóquio, Japão) com diâmetro de 2,7 mm. O endoscópio foi introduzido na cavidade nasal até a região da rinofaringe, onde foi avaliada a presença das tonsilas faríngeas (adenoides). O endoscópio foi removido da parte posterior para a anterior, sendo avaliados o tamanho e o aspecto das conchas nasais na parede lateral da cavidade nasal. A classificação do tamanho das adenoides foi realizada conforme o estudo de Modrzynski e Zawisza.(10) As adenoides foram definidas como hiperplásicas quando ocupavam uma área igual ou superior a 70% da rinofaringe na avaliação endoscópica. O tamanho das tonsilas palatinas foi definido por oroscopia de acordo com os parâmetros recomendados por Brodsky.(11) Na avaliação das tonsilas palatinas, considerou-se como grau I as obstruções de até 25% da orofaringe; grau II, aquelas entre 25% e 50%; grau III, aquelas entre 51% e 75%; e grau IV, aquelas > 75% da luz da orofaringe. Diagnosticaram-se como hiperplásicas aquelas classificadas como grau III ou IV.
O diagnóstico de respiração bucal foi definido pela equipe de otorrinolaringologia mediante a análise conjunta da anamnese, dos sinais e sintomas e das características físicas relacionadas à síndrome, e a obstrução mecânica foi confirmada por nasofibroscopia segundo os critérios previamente determinados por Yi et al.(5) Os critérios clínicos e físicos para a identificação das crianças com respiração bucal foram determinados segundo o estudo de Abreu et al.(12)
As crianças foram submetidas à avaliação postural pelo teste de Nova York,(13) um método objetivo de avaliação postural que contempla treze segmentos corporais.(13) Apresenta um sistema de pontuação que permite uma análise quantitativa com poder de classificação do distúrbio postural avaliado. A postura é classificada como grave, moderada ou normal.(14) A classificação da postura da cabeça foi analisada especificamente.
A avaliação da força muscular respiratória foi realizada pela determinação de PImáx e PEmáx. Em seguida, realizou-se o teste de caminhada de seis minutos (TC6). Essas avaliações foram realizadas por fisioterapeutas previamente treinadas, sendo cada teste realizado pela mesma profissional, que atuava de forma cega em relação aos resultados dos outros testes.
As medidas de PImáx e PEmáx foram obtidas com um manovacuômetro (MV-120; Ger-Ar-SP Com. Equip. Ltda., São Paulo, Brasil) acoplado a um conector traqueia com um orifício de 1 mm de diâmetro na extremidade proximal para o escape de ar e a um bocal de plástico de 2 cm de diâmetro interno.(15) Foram realizadas três avaliações, considerando-se o maior valor como o resultado final.
Após um repouso de 15 min, realizou-se o TC6, seguindo-se as recomendações da American Thoracic Society.(16)
As crianças foram instruídas através de uma demonstração prévia dos testes realizados. Pela voz de comando da avaliadora, essas foram incentivadas a realizar seus esforços máximos.
Os dados foram processados com o programa Statistical Package for the Social Sciences, versão 16.0 (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA). Foram determinadas médias, desvios-padrão, medianas e valores extremos das variáveis quantitativas. Para avaliar a associação entre as variáveis qualitativas, empregou-se o teste do qui-quadrado e, para as variáveis quantitativas, o teste de Kruskal-Wallis. Para a análise multivariada das variáveis PImáx, PEmáx e distância percorrida no TC6 (DTC6), empregamos a regressão linear múltipla do tipo stepwise, considerando as variáveis tipo de respiração, alteração postural cervical, idade e gênero, sendo que as variáveis de PImáx e PEmáx foram ajustadas pela transformação de Blom. Adotou-se o nível de significância de 5%.
O projeto foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da FCM-Unicamp (n° 849/2008). Antes do início do estudo, todas as crianças tiveram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido assinado pelos pais ou responsáveis.
ResultadosForam incluídas no estudo 92 crianças, sendo 30 (32,6%) com respiração bucal (grupo RB) e 62 (67,4%) com respiração nasal (grupo RN), com média de idade de 9,8 ± 0,9 anos e 9,6 ± 0,9 anos, respectivamente (p = 0,365). No grupo RB, 23 (76,7%) eram do sexo masculino e 7 (23,3%) do feminino e, no grupo RN, 23 (37,1%) e 39 (62,9%), respectivamente (p < 0,001). Não houve diferenças entre os dois grupos quanto a etnia (p = 0,336), peso (p = 0,133) ou altura (p = 0,337).
A inclinação anterior da cabeça, determinada pelo teste de Nova York, foi detectada em 29 crianças (96,7%) do grupo RB, considerada grave em 12 (40,0%) e moderada em 17 (56,7%). No grupo RN, inclinação moderada foi detectada em 30 crianças (48,4%), e não houve inclinação grave (p < 0,001).
A comparação das variáveis PImáx, PEmáx e DTC6 entre os grupos RB e RN, mostrou que todas as variáveis foram menores no grupo RB - PImáx: 20,0 ± 7,1 cmH2O vs. 62,5 ± 21,9 cmH2O (p < 0,001); PEmáx: 25,3 ± 11,7 cmH2O vs. 58,8± 22,3 cmH2O (p < 0,001); e DTC6: 568,1 ± 47,4 m vs. 629,8 ± 47,6 m (p < 0,001).
As Tabelas 1 e 2 mostram que, no grupo RB, não houve diferenças entre as médias de PImáx e PEmáx nos subgrupos com alteração (grave e moderada) e sem alteração. No entanto, no grupo RN, as médias de PImáx e PEmáx foram maiores no subgrupo com alteração postural (70,8 ± 19,1 cmH2O vs. 54,7 ± 21,7 cmH2O; p = 0,003; e 67,7 ± 22,1 cmH2O vs. 50,5 ± 19,5 cmH2O; p = 0,004, respectivamente). Em relação à DTC6, não houve diferenças entre as médias nesses subgrupos nos grupos RB e RN (p = 0,079 e p = 0,181, respectivamente; Tabela 3).
Após a análise multivariada por regressão linear múltipla da PImáx e PEmáx em relação ao sexo, idade, tipo de respiração e alteração da postura cervical, o melhor modelo ajustado para PImáx (R2 ajustado= 60,4%) incluiu somente as variáveis tipo de respiração e alteração da postura da cabeça. A respiração bucal determinou menores valores de PImáx, enquanto a alteração postural, maiores valores. O mesmo se observou no caso da PEmáx (R2 ajustado = 44,2%; Tabela 4).
O mesmo ajuste foi realizado para a DTC6. Nesse caso, permaneceu no modelo somente a variável tipo de respiração, sendo que o grupo RB apresentou menores valores de desvio-padrão (R2 ajustado= 26,6%; Tabela 4).
DiscussãoNo presente estudo, avaliamos a influência do tipo respiratório e da anteriorização da cabeça na capacidade de exercício e na força muscular respiratória em crianças com SRB. Não foram encontrados na literatura, até o presente momento, estudos que relacionassem todas essas variáveis.
Nossa pesquisa mostrou um predomínio de respiração bucal no sexo masculino, sendo esse fato também observado por outros autores.(1,17) Meninos apresentam menor calibre das vias aéreas, maior prevalência de rinite alérgica e de síndrome da apneia obstrutiva do sono, principais entidades associadas à SRB.(18)
A cabeça em projeção anterior foi observada em 96,7% das crianças do grupo RB. Foi relatado que essa alteração, combinada à flexão da coluna cervical baixa e extensão da coluna cervical alta, com diminuição da lordose cervical, é a primeira compensação postural adotada pelo indivíduo com respiração bucal como forma de diminuir a resistência à passagem do ar.(5,6,19)
Cuccia et al.(6) avaliaram a postura cervical de 35 crianças com respiração bucal comparadas com um grupo controle, através de medidas cefalométricas, e encontraram um aumento da extensão da coluna cervical alta (articulação atlanto-occipital) com diminuição da lordose cervical, sendo esse o principal achado. Utilizando o mesmo método, evidenciou-se aumento de extensão cervical em 56 crianças com asma e respiração bucal comparados com não asmáticos e com respiração nasal.(4) Yi et al.(5) também observaram extensão da posição da cabeça e lordose cervical diminuída em 30 crianças com respiração bucal. Esses estudos corroboram os resultados da nossa pesquisa.
A anteriorização da cabeça aumenta a atividade do músculo esternocleidomastoideo e leva à elevação da caixa torácica, diminuindo a mobilidade toracoabdominal e comprometendo a eficácia ventilatória promovida pelo diafragma.(3) Essa desvantagem mecânica intensifica o esforço inspiratório e gera um círculo vicioso de tensão muscular, alteração postural e aumento do trabalho respiratório.(3,20) Dessa forma, a desorganização das cadeias musculares, que resulta na contração ineficaz do diafragma e, consequentemente, dos músculos abdominais, altera toda a dinâmica respiratória, resultando na diminuição da força muscular respiratória. Outro fator que pode influenciar a biomecânica respiratória seria pelo menor esforço respiratório exigido pela respiração bucal, assim como a inibição de nervos aferentes nasais, responsáveis pela regulação da capacidade e dos volumes pulmonares, refletindo no uso insatisfatório da musculatura respiratória e no progressivo enfraquecimento muscular.(8,21,22)
Encontramos diminuição de força muscular respiratória no grupo RB. Em um estudo avaliando o perímetro torácico de crianças com respiração bucal, foram encontrados menores valores em relação ao grupo controle.(23) Esse achado é explicado pela expansibilidade diminuída, com fraqueza da musculatura respiratória, levando a um perímetro torácico menor.(23) A diminuição da excursão diafragmática encontrado no estudo de Yi et al.(5) também é um achado que reforça a alteração de mecânica ventilatória na SRB.
Diante das alterações da mecânica respiratória na SRB, aventou-se a hipótese de investigar sua repercussão na capacidade ao exercício, utilizando-se o TC6, assunto não estudado nesse tipo de população até o presente momento, na literatura médica.
A diminuição da força muscular respiratória pode ser desencadeada pela desorganização do padrão postural ou pelo bloqueio de reflexos nasais. Esses fatores vão determinar volumes e capacidades pulmonares menores, afetando a expansão torácica e a ventilação alveolar, com diminuição da PaO2, refletindo na tolerância ao exercício.(21,22) Em casos mais graves, isso pode estar associado a síndrome da apneia obstrutiva do sono e cor pulmonale.(18)
Outra hipótese é a vigência da teoria da via aérea única, de forma que a SRB pode estender seus efeitos para a região pulmonar e interferir na resposta fisiológica ao exercício. A SRB leva a alterações dos sistemas muscular, circulatório e respiratório, que podem repercutir nessa resposta.(24)
Alguns estudos avaliaram a função cardiorrespiratória de indivíduos em condições que induziam a respiração bucal.(25-28) Ribeiro Soares(25) observaram valores de alguns índices espirométricos abaixo do predito (FEF25-75% e ventilação voluntária máxima), caracterizando um distúrbio ventilatório do tipo obstrutivo em respiração bucal, em sua maioria de leve a moderado. Esse fato remete ao comprometimento estendido para a árvore brônquica, sendo que o aumento da resistência nasal modifica a pressão intratorácica com diminuição do volume pulmonar.
Asmáticos submetidos à respiração bucal, através do bloqueio por clipe nasal durante o exercício, tiveram VEF1 diminuído em 20%, comparado com uma queda de 5% quando respirando espontaneamente, predominantemente pelo nariz.(26) Asmáticos necessitam de uma resistência nasal menor para iniciarem uma respiração bucal, e, quando a respiração bucal ocorre, observa-se uma queda da função pulmonar e maior predisposição a quadros bronco-obstrutivos.(27) No estudo de Melissant et al.,(28) induziu-se uma obstrução de vias aéreas superiores durante o exercício, sendo observada uma diminuição na ventilação-minuto e na eliminação de gás carbônico. Os indivíduos tiveram como resposta hipoventilação, hipóxia e hipercapnia. Dados semelhantes aos dos estudos citados anteriormente corroboram a diminuição da capacidade cardiorrespiratória encontrada em nosso estudo.
Não houve associação entre PImáx e PEmáx em relação à postura da cabeça nas crianças do grupo RB em nosso estudo. Já no grupo RN, observou-se que quanto pior a anteriorização da cabeça, maiores foram os valores de PImáx e PEmáx. Esse dado sugere que as crianças com respiração nasal utilizam essa alteração como forma de compensação, atingindo valores maiores de PImáx e PEmáx do que aqueles com postura cervical normal. Já as crianças com respiração bucal parecem ter um maior comprometimento postural, não tendo disponível maiores recursos compensatórios para a realização das manobras. Como não encontramos pesquisas que avaliaram essas associações, mais estudos são necessários para reforçar, comprovar e explicar as alterações da força muscular respiratória em relação ao tipo respiratório e à anteriorização da cabeça.
Apesar de não termos evidenciado uma relação entre alteração músculo-esquelética e disfunção ventilatória em indivíduos com respiração bucal, Silveira et al.(29) observaram que a projeção anterior da cabeça em respiração bucal correlacionou-se negativamente com variáveis espirométricas.
O TC6 foi sensível e reprodutível em crianças com respiração bucal no presente estudo. Apesar de não haver outros estudos sobre o uso do TC6 em crianças com SRB, esse teste tem sido considerado um bom instrumento de avaliação da capacidade funcional por ser simples, barato e de fácil aplicabilidade, propiciando uma análise global dos sistemas cardíaco, respiratório e metabólico.(30)
Neste estudo, a respiração bucal parece ser o fator de maior impacto na alteração das variáveis estudadas. Sugere-se, portanto, que a alteração cervical seja mais uma alteração desencadeada pela respiração bucal, com menor efeito na força muscular respiratória e na capacidade de exercício. Outra consideração é que a alteração postural moderada pode atuar como um mecanismo compensatório satisfatório, favorecendo uma melhor funcionalidade da musculatura respiratória, independentemente do tipo respiratório.
Embora não haja evidências de que a alteração da postura da cabeça possa ter um impacto na biomecânica respiratória e na capacidade de exercício, a respiração bucal, acompanhada ou não de alteração cervical, leva a comprometimentos nos sistemas músculo-esquelético e cardiorrespiratório. Dessa forma, é fundamental uma intervenção global, evitando mecanismos compensatórios patológicos.
Uma limitação do presente estudo foi o fato de que não foi possível recrutar toda a população pretendida, embora todas as crianças provenientes do ambulatório especializado tenham sido convidadas. Sugerimos, dessa forma, a realização de estudos com um maior tamanho amostral, assim como a realização de estudos longitudinais com amostras envolvendo faixas etárias maiores, além da utilização de um instrumento de avaliação postural de maior acurácia, mensuração de variáveis de função pulmonar e realização de teste cardiopulmonar máximo. Esses estudos futuros poderão elucidar essas relações, ainda pouco exploradas na literatura.
No presente estudo, a respiração bucal afetou negativamente a biomecânica respiratória e a capacidade de exercício. A postura da cabeça, alterada de forma moderada, atua como um mecanismo de compensação para uma melhor função da musculatura respiratória.
AgradecimentosAgradecemos a Ester Piacentini Côrrea o auxílio na coleta dos dados.
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Trabalho realizado na Universidade Estadual de Campinas - Unicamp - Campinas (SP) Brasil.
Endereço para correspondência: Renata Tiemi Okuro. Rua Francisco de Barros Filho, 52, casa 6, Barão Geraldo, CEP 13084-215, Campinas, SP, Brasil.
Tel. 55 19 3521-8983. E-mail: re_okuro@yahoo.com.br ou dirceu@fcm.unicamp.br
Apoio financeiro: Este estudo recebeu apoio financeiro da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
Recebido para publicação em 21/3/2011. Aprovado, após revisão, em 9/6/2011.
Sobre os autoresRenata Tiemi Okuro
Mestranda. Programa de Pós-Graduação em Saúde da Criança e do Adolescente, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas - FCM-Unicamp - Campinas (SP) Brasil.
André Moreno Morcillo
Professor Associado Livre-Docente. Departamento de Pediatria, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas - FCM-Unicamp - Campinas (SP) Brasil.
Maria Ângela Gonçalves Oliveira Ribeiro
Fisioterapeuta, Departamento de Pediatria, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas - FCM-Unicamp - Campinas (SP) Brasil.
Eulália Sakano
Professora Assistente. Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas - FCM-Unicamp - Campinas (SP) Brasil.
Patrícia Blau Margosian Conti
Fisioterapeuta. Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas - FCM-Unicamp - Campinas (SP) Brasil.
José Dirceu Ribeiro
Professor Associado Livre-Docente. Departamento de Pediatria, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas - FCM-Unicamp - Campinas (SP) Brasil.