Continuous and bimonthly publication
ISSN (on-line): 1806-3756

Licença Creative Commons
7425
Views
Back to summary
Open Access Peer-Reviewed
Artigo Original

Aspectos clínico-patológicos do carcinoma bronquioloalveolar e sobrevida em pacientes no estágio clínico I

Clinicopathological aspects of and survival in patients with clinical stage I bronchioloalveolar carcinoma

Daniel Sammartino Brandão, Rui Haddad, Giovanni Antonio Marsico, Carlos Henrique Ribeiro Boasquevisque

ABSTRACT

Objective: To analyze the clinicopathological aspects of bronchioloalveolar carcinoma (BAC) and the survival in a sample of patients at clinical stage I. Methods: A retrospective study involving 26 patients diagnosed with clinical stage I BAC and undergoing surgery at the Thoracic Diseases Institute of the Federal University of Rio de Janeiro, in the city of Rio de Janeiro, Brazil, between 1987 and 2007. We analyzed clinicopathological and radiological aspects, as well as mortality and survival. The data, which were collected from the medical charts of the patients, were statistically analyzed. Results: Females predominated (n = 16). The mean age at diagnosis was 68.5 years. Most patients were active smokers (69.2%). The most common forms of presentation of BAC were the asymptomatic form (84.6%) and the nodular form (88.5%). Involvement of the upper lobes predominated (57.7%). Stage IB was the most common pathological stage, followed by stages IA and IIB (46.2%, 38.4% and 15.4%, respectively). There was no in-hospital mortality. Four patients died during the postoperative follow-up, with a mean disease-free survival time of 21.3 months. The overall five-year survival rate was 83%. The probability of survival for the patients diagnosed after 1999 showed a trend toward an increase when compared with that for those diagnosed up through 1999 (three-year survival rate: 92% vs. 68%; p = 0.07). Conclusions: The clinicopathological aspects of this study sample were similar to those of patients with BAC evaluated in previous studies.

Keywords: Adenocarcinoma, bronchiolo-alveolar; Carcinoma, non-small-cell lung; Lung; Smoking.

RESUMO

Objetivo: Analisar os aspectos clínico-patológicos do carcinoma bronquioloalveolar (CBA) e a sobrevida em uma amostra de pacientes com estadiamento clínico I. Métodos: Foram estudados retrospectivamente 26 pacientes com diagnóstico de CBA e estágio clínico I, , segundo a classificação tumor-node-metastasis (TNM, ­tumor-­linfonodo‑metástase),(15)operados no Instituto de Doenças do Tórax da Universidade Federal do Rio de Janeiro, na cidade do Rio de Janeiro, RJ, entre 1987 e 2007, quanto a variáveis clínico-patológicas e radiológicas, mortalidade e sobrevida. Os dados foram colhidos dos prontuários médicos dos pacientes e analisados estatisticamente. Resultados: Houve predomínio de mulheres (n = 16). A idade média ao diagnóstico foi de 68,5 anos. Houve predomínio de tabagistas (69,2%). As formas de apresentação assintomática (84,6%) e nodular (88,5%) foram as mais comuns. Houve predileção pelos lobos superiores (57,7%). O estágio patológico IB foi o mais comum, seguido pelos estágios IA e IIB (46,2%, 38,4% e 15,4%, respectivamente). Não houve óbitos hospitalares. Quatro pacientes faleceram durante o seguimento pós-operatório, com tempo livre de doença médio de 21,3 meses. A taxa de sobrevida global em cinco anos foi 83%. A probabilidade de sobrevida para os pacientes diagnosticados depois de 1999 tendeu a ser maior do que para aqueles diagnosticados até 1999 (taxa de sobrevida em três anos: 92% vs. 68%; p = 0,07). Conclusões: Os aspectos clínico-patológicos da amostra estudada foram semelhantes àqueles de estudos anteriores em pacientes com CBA.

Palavras-chave: Adenocarcinoma bronquíolo-alveolar; Carcinoma pulmonar de células não pequenas; Pulmão; Tabagismo.

Introdução

O câncer de pulmão é a principal causa de morte por neoplasia maligna nos países desenvolvidos, inclusive entre as mulheres.(1) Observa-se tendência semelhante nos países em desenvolvimento, sendo que, no Brasil, a neoplasia maligna do pulmão, crescente desde 1979, é a primeira causa de óbito por câncer em homens e a segunda mais comum entre as mulheres.(2)

O carcinoma bronquioloalveolar (CBA), responsável por aproximadamente 3% dos casos de câncer de pulmão, vem recebendo atenção crescente na literatura médica nos últimos anos.(3,4) Isso acontece pois se trata de um dos poucos tipos histológicos presentes em pacientes com menor incidência de tabagismo, especialmente entre as mulheres.(4,5) Ainda, a forma lepídica de disseminação do CBA, recobrindo o epitélio respiratório e causando lesões pneumônicas ou multinodulares, é única.(5) Além disso, sua incidência vem aumentando quando comparada aos outros tipos histológicos, o que tem sido atribuído ao uso da TCAR como método diagnóstico ou de screening, já que essa pode mostrar pequenas lesões pulmonares em vidro fosco antes imperceptíveis à radiologia convencional.(6)

A Organização Mundial da Saúde (OMS) redefiniu, em 1999, os critérios histopatológicos necessários para o diagnóstico de CBA, ­restringindo esse diagnóstico aos tumores não invasivos.(7) Essa redefinição se associou a uma melhora do prognóstico clínico de CBA em comparação às formas de adenocarcinoma antes consideradas como "adenocarcinoma bronquioloalveolar".(8) Ela foi estimulada por estudos cujos achados de sobrevida em 5 anos foram de 100% para determinados tipos de adenocarcinomas.(9,10)

Em duas publicações simultâneas,(11,12) afirmou-se que o CBA e sua resposta à quimioterapia estão mais frequentemente associados à mutação do receptor do fator de crescimento epidérmico (RFCE). Desde então, quimioterápicos com alvo nesta via celular foram desenvolvidos, o que poderia mudar o prognóstico de muitos pacientes com CBA, mesmo nos estágios mais avançados.(13)

Recentemente, tem sido questionada a forma mais apropriada de tratamento cirúrgico para o CBA cujo diagnóstico ocorra em estágios precoces, abaixo de 2 cm, uma vez que estudos mostraram sobrevivência em 5 anos próximas de 100% em ressecções sublobares de nódulos de até 1-2 cm.(6,10,14)

Portanto, buscamos analisar as características clínico-patológicas do CBA em uma população específica de pacientes com estadiamento clínico I, submetidos a tratamento cirúrgico em um mesmo serviço de cirurgia torácica, incluindo sua forma de apresentação clínica e radiológica, associação com o tabagismo, histopatologia, tratamento, morbidade, mortalidade e sobrevivência, sendo que essa última foi subdividida temporalmente nos períodos anterior e posterior a 1999, ocasião da nova definição da OMS.

Métodos

Foram estudados retrospectivamente 26 pacientes com diagnóstico de CBA no estágio clínico I, segundo a classificação tumor-nódulo-metástase (TNM),(15) através da análise dos dados contidos em seus prontuários médicos na ocasião do diagnóstico. Todos os pacientes foram submetidos à TC de tórax e à broncoscopia e operados pela equipe do serviço de cirurgia torácica do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho (HUCFF) entre 1987 e 2007.

Para sua inclusão no estudo, os pacientes deveriam ter o diagnóstico de CBA segundo os critérios da OMS estabelecidos em 1999 e revistos em 2004, sem qualquer grau de invasão estromal, linfática ou pleural.
Foram excluídos os pacientes cujos diagnósticos fossem provenientes de exames citopatológicos e aqueles cujo seguimento pós-operatório não tivesse sido completo, ou seja, quando não fosse possível identificar qual o desfecho clínico do caso (livre de doença, recidiva ou óbito).

Devido à pequena incidência deste tipo histológico, e também ao interesse em comparar possíveis diferenças entre a sobrevivência antes e após 1999, foi necessária uma pesquisa retrospectiva e longa. Por isso, iniciamos a pesquisa localizando, nos registros do serviço de anatomia patológica, os pacientes com diagnóstico de adenocarcinoma primário do pulmão. Após a revisão dos laudos histopatológicos e citopatológicos e dos prontuários e, utilizando os critérios da OMS de 1999, encontramos 26 pacientes que preenchiam os critérios para inclusão no estudo.

A coleta de dados desses pacientes foi feita através da análise de seus prontuários médicos e dos laudos histopatológicos, com o preenchimento de uma ficha de coleta de dados individual. Nos casos cuja última consulta ou informação registrada no prontuário tivesse mais de seis meses, os pacientes ou seus familiares foram contatados por via telefônica.

Os dados constantes nas fichas foram compilados em uma planilha e analisados com o uso dos programas MS Excel® 2007 e STATISTICA, versão 7 (StatSoft Inc., Tulsa, OK, EUA). A normalidade de distribuição das variáveis contínuas foi avaliada pelo teste de Kolmogorov-Smirnov. A comparação dos dados entre gêneros, estágios TNM e carga tabágica foi realizada com o teste t de Student, sendo considerado como significante o valor de p < 0,05. A proporção de ocorrência das diferentes variáveis categóricas foi analisada pelo teste do qui-quadrado. A análise descritiva dos dados é apresentada como média ± dp e proporções (%). O tempo livre de doença foi medido desde a data da cirurgia até a sua recorrência ou óbito. A probabilidade de sobrevida foi feita pelo método de Kaplan-Meier, com o tempo medido desde a data da cirurgia até a data do óbito ou da consulta mais recente, sendo esses últimos censurados. A diferença de sobrevida entre subgrupos foi analisada pelo teste log-rank.
O presente estudo teve seu protocolo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do HUCFF.

Resultados

A amostra de 26 pacientes com diagnóstico de CBA teve predomínio de mulheres. A ocorrência da doença foi principalmente na sexta e sétima décadas de vida. Os pacientes eram, em sua maioria, brancos. Não houve diferença significativa (p = 0,65) entre a idade de apresentação do CBA entre homens e mulheres (69,7 ± 10,1 anos vs. 67,7 ± 11,5 anos). A Tabela 1 mostra as características desses pacientes.



Houve predominância de pacientes tabagistas. Não houve diferença estatística (p = 0,91) entre a idade média de diagnóstico para fumantes e não fumantes (68,3 ± 10,4 anos vs. 68,9 ± 12,4 anos), tampouco na carga tabágica entre os gêneros (p = 0,11).

Observou-se que a carga tabágica média dos pacientes N1 (90,75 ± 31,55 anos-maço) foi maior do que a dos pacientes N0 (41,85 ± 5,57 anos-maço), mas sem significância estatística (p = 0,14; Figura 1).
A forma de apresentação clínica mais comum foi a forma assintomática. Dos pacientes que apresentaram sintomas na avaliação inicial, tosse e hemoptise foram os sintomas identificados. Todos os pacientes foram submetidos à broncoscopia, tendo, em sua maioria, resultados normais.





As anormalidades encontradas foram a presença de lesão endobrônquica vegetante e hiperemia difusa da mucosa.

A forma de apresentação tomográfica mais comum foi o nódulo ou massa pulmonar periférica, e apenas 3 pacientes apresentavam a forma pneumônica.

A localização mais frequente foi o lobo superior do pulmão esquerdo, seguido, por ordem de frequência, pelo lobo superior do pulmão direito, o lobo inferior esquerdo, o lobo inferior direito e 1 paciente com lesão localizada no lobo médio.

Todos os pacientes tinham estadiamento clínico pré-operatório TNM(15) no estágio I, sem adenomegalia mediastinal pela TC. Além disso, apenas 1 paciente teve diagnóstico pré-operatório de neoplasia, ou seja, para os 25 restantes, o diagnóstico foi perioperatório. Assim, não foi realizada mediastinoscopia pré-operatória de rotina.

As cirurgias foram realizadas em todos os 26 pacientes, sendo o tempo médio de internação de 11 ± 9 dias, variando entre 5 e 40 dias. As cirurgias realizadas foram, em sua maioria, ressecções anatômicas do tipo lobectomia com linfadenectomia mediastinal, sendo que 2 pacientes foram submetidos à bilobectomia superior e média, e outros 2 pacientes à pneumectomia, uma do lado direito e outra do lado esquerdo. Apenas um paciente foi tratado por segmentectomia do segmento anterior do lobo inferior esquerdo devido à limitação funcional detectada por espirometria.

O CBA não mucinoso foi o subtipo histológico mais comum. O estadiamento patológico se mostrou diferente do estadiamento clínico em 4 pacientes (15,4%), devido à detecção de linfonodos positivos na peça operatória, a partir do nível 10, configurando o que a classificação TNM denomina como N1.

Assim, segundo a avaliação da peça e dos linfonodos mediastinais ressecados, os estadiamentos patológicos foram: IA, em 10 pacientes (38,4%); IB, em 12 pacientes (46,2%); IIB, em 4 pacientes (15,4%), sendo todos esses T2N1 (Figura 2). Não houve casos no estágio IIA (T1N1).




Não houve óbitos associados ao tratamento cirúrgico. Ocorreram complicações cirúrgicas em 8 pacientes, em sua maioria menores, como borbulhamento de ar pelo dreno torácico superior a 5 dias, espaço residual não complicado e deiscência de ferida operatória. As complicações maiores foram hemotórax pós-operatório, em 2 pacientes, que necessitaram de reoperação como tratamento definitivo, e pneumonia associada à insuficiência respiratória.

Todos os pacientes tiveram seguimento pós-operatório completo, sendo que, nesse período, 4 pacientes faleceram, especificamente, nos meses 10, 12, 24 e 36 de seguimento. A mortalidade em 3 anos foi de 15,4%.

A sobrevida média foi de 57 meses, variando entre 10 e 244 meses (IC95%: 38 ± 75 meses). O tempo médio de seguimento dos pacientes foi de 5,3 anos (Figura 3). A probabilidade de sobrevivência foi comparada entre os pacientes com diagnóstico anterior e posterior a 1999, tendo sido identificada uma tendência a maior sobrevida nos casos diagnosticados após 1999, mas que não alcançou significado estatístico (p = 0,07; Figura 4).







Houve recidiva da doença em 6 pacientes (23%), sendo 4 delas intratorácicas (66,7%). O tempo livre de doença para esses pacientes variou entre 10 e 36 meses (média de 21,3 ± 9,8 meses). Os sítios de recidiva foram coluna vertebral (n = 2; 7,7%), pulmão contralateral (n = 2; 7,7%), derrame pleural ipsilateral (n = 1; 3,8%) e recidiva local pulmonar (n = 1; 3,8%).

Os 2 pacientes com recidiva no pulmão contralateral foram submetidos à segmentectomia e permaneciam vivos, com 38 e 61 meses de sobrevida. Nos pacientes com recidiva à distância, foi utilizada quimioterapia com cisplatina (n = 1; 3,8%) e radioterapia convencional (n = 3) devido a metástases para a coluna vertebral (n = 2; 7,7%) e recidiva no coto brônquico (n = 1; 3,8%).

Discussão

O CBA é um subtipo de adenocarcinoma que vem recebendo atenção crescente nas últimas décadas. Isso ocorre porque estudos identificaram que as suas características clínicas, radiológicas, epidemiológicas e biológicas são algo diferentes dos demais carcinomas de pulmão não pequenas células (CPNPC), mesmo quando comparado aos adenocarcinomas em geral.(1,8,9,16-19)

No presente estudo, a idade média foi semelhante àquela encontrada nos maiores estudos envolvendo pacientes com CBA,(8,20) e muito próxima da idade média de ocorrência dos CPNPC em geral, que oscila entre 60 e 69 anos.(21) A idade acima de 67 anos é um fator para pior sobrevida, demonstrado na literatura para CPNPC no estágio IA.(22)

Entretanto, a mortalidade aqui relatada (15,4% em 3 anos) não confirmou esse achado.

O predomínio de mulheres é compatível com séries maiores publicadas anteriormente sobre pacientes com CBA.(16,17) Entretanto, outras séries apresentaram uma maior participação de homens.(8,18,23) Especula-se que a presença da mutação do RFCE seja um dos fatores determinantes para que o desenvolvimento de CBA ocorra preferencialmente em mulheres.(23)

A incidência de tabagismo foi semelhante à descrita na literatura para o CBA, que, como os adenocarcinomas em geral, tem sido caracterizado como o tipo histológico de CPNPC menos relacionado ao tabagismo.(24)

Porém, a incidência de CBA se relaciona diretamente com o tempo de exposição e com a carga tabágica, e o risco relativo cai proporcionalmente ao tempo de abandono do tabagismo. Não foi possível, neste estudo, confirmar estatisticamente que a carga tabágica se associa à maior gravidade do CBA, mas a carga tabágica média dos pacientes N1 foi consideravelmente maior do que a dos pacientes N0.

A forma de apresentação clínica mais comum foi a forma assintomática. A tosse foi o sintoma mais comum, e todos os pacientes com sintomas apresentavam alterações detectáveis à broncoscopia. Portanto, a broncoscopia é um exame indispensável no estadiamento pré-operatório, especialmente nos pacientes sintomáticos.

O CBA é descrito como o tipo histológico mais provável em pacientes que apresentem broncorreia,(25) mas, tendo em vista a amostra apresentar um nítido predomínio de CBA na forma não mucinosa/nodular, e também por consistir de estágios mais precoces, a ocorrência desse sintoma não foi observada. Três pacientes apresentavam a forma radiológica pneumônica, mas em apenas 2 deles foi confirmado o diagnóstico de CBA do tipo mucinoso.

O CBA tem um espectro de apresentações que varia desde o nódulo pulmonar solitário periférico até lesões pulmonares múltiplas, bilaterais e com derrame pleural associado. O achado predominante de apresentação nodular se explica não só pela forma de seleção da amostra, composta por pacientes em estágios iniciais de CBA, mas também pelo fato de ser essa a forma mais frequente de apresentação radiológica.(16) As formas pneumônicas costumam se relacionar ao subtipo mucinoso e apresentam comportamento mais agressivo e pior sobrevida.(26) Houve apenas 3 casos dessa forma no presente estudo.

Considerando que os critérios de inclusão visaram identificar pacientes nos estágios iniciais, todos os pacientes estudados estavam no estágio clínico I. Entretanto, o estadiamento patológico revelou que 4 pacientes (15,39%) tinham metástases linfonodais N1, configurando estágio IIB devido a T2N1M0.

A discrepância entre o estadiamento clínico e o patológico é conhecida, e se justifica pela presença de metástases em linfonodos cujo diâmetro não exceda 1 cm ou, no caso de linfonodos maiores que 1 cm, quando a mediastinoscopia tem resultado falso-negativo, seja por amostragem inadequada, seja por limitação anatômica do método. Deve-se destacar que os linfonodos acometidos nesta série se localizavam na região hilar ou intrapulmonar, ou seja, a partir do nível 7, e inacessíveis através da mediastinoscopia cervical.(27) Dessa forma, a mediastinoscopia pré-operatória não teria alterado o estadiamento em nenhum dos pacientes estudados, e o uso indiscriminado desse procedimento em pacientes com nódulo pulmonar indeterminado não se justifica fora de protocolos de pesquisa.

A lobectomia é considerada como a cirurgia que oferece um resultado oncológico adequado e com perda funcional aceitável para a maior parte dos pacientes com CPNPC. As vias de drenagem linfática e os linfonodos são removidos em bloco com o tumor, garantindo frequentemente margens livres de doença e menor probabilidade de recidiva local.(16,18)

Assim, apenas 1 paciente foi tratado cirurgicamente através de segmentectomia, uma vez que o risco de uma lobectomia era elevado diante de sua pequena reserva funcional, enquanto todos os demais foram submetidos a lobectomias, bilobectomias e pneumectomias.

A mortalidade operatória relacionada às ressecções pulmonares por câncer varia entre 2,4% e 4% e, considerando apenas as pneumectomias, pode alcançar 9%.(16) No presente estudo, não houve óbito operatório. As complicações pós-operatórias foram compatíveis com as relatadas em séries maiores,(16) sendo que as mais graves foram hemotórax e insuficiência respiratória relacionada à pneumonia, que provocaram apenas um maior tempo de internação.

Os 6 pacientes (23,1%) com recidiva da doença a apresentaram nos primeiros 24 meses. Desses, 2 tiveram recidiva no pulmão contralateral e, após terem sido submetidos à segmentectomia das novas lesões, permaneciam sem sinais de recidiva com 31 e 68 meses de sobrevida.

Portanto, diante de um paciente com recidiva localizada pulmonar, a ressecção da lesão deve ser considerada(16,28). As recidivas foram intratorácicas em 66,7% dos casos estudados aqui, corroborando o menor potencial de disseminação linfática e hematogênica do CBA.(29)

A probabilidade de sobrevivência em 5 anos esteve acima de 80%, mesmo considerando que alguns dos pacientes estudados estavam no estágio IIB, no qual a sobrevivência em 5 anos esperada para os CPNPC é de cerca de 40%.(15) A sobrevivência média esperada para pacientes nos estágios I e II do CBA é de 92% e 63%, respectivamente, sendo que em alguns estudos que avaliaram pacientes com lesões menores que 2 cm, observaram-se sobrevivências de 100% em 3 anos.(30)

As curvas de sobrevivência entre os pacientes operados antes e depois de 1999 mostram uma tendência à maior sobrevida para aqueles operados depois de 1999, mas essa diferença provavelmente não alcançou significância estatística devido ao tamanho reduzido da amostra, com apenas 26 pacientes e 4 óbitos no período estudado.

Mesmo considerando que, pelos critérios de seleção, os pacientes foram classificados pelos mesmos critérios histopatológicos e que, teoricamente, não haveria discrepância entre os diagnósticos, acreditamos que essa tendência se deva ao fato dos exames histopatológicos após 1999 terem sido mais minuciosos quanto à procura de pequenos sinais de invasão estromal em toda a lesão ressecada, o que seria suficiente para considerá-la um adenocarcinoma invasivo. Um grupo de autores,(8) analisando 626 casos de CBA em todos os estágios, observou tal tendência, atribuindo-a ao fato de que, após 1999, com a nova definição da OMS, apenas tumores in situ foram considerados como CBA, excluindo-se assim os adenocarcinomas invasivos e, sabidamente, de pior prognóstico.

Dessa forma, concluímos que a maior parte dos pacientes com CBA foram mulheres, tabagistas e com apresentação clínica assintomática. A forma nodular, acometendo os lobos superiores, foi a apresentação radiológica mais comum do CBA, o que é compatível com o predomínio do subtipo histológico não mucinoso na amostra.

O estadiamento clínico TNM foi discordante do estadiamento patológico em 4 pacientes, todos devido a metástases linfonodais N1. As ressecções anatômicas foram o tratamento cirúrgico mais utilizado, sendo a lobectomia a operação mais comum. A incidência de complicações operatórias maiores foi pequena, e não houve óbito operatório. A mortalidade em 3 anos foi de 15,4%.


Referências


1. Thomas L, Doyle LA, Edelman MJ. Lung cancer in women: emerging differences in epidemiology, biology, and therapy. Chest. 2005;128(1):370-81.

2. Guimarães CA. Lung cancer mortality. J Bras Pneumol. 2007;33(5):xxix-xxx.

3. Read WL, Page NC, Tierney RM, Piccirillo JF, Govindan R. The epidemiology of bronchioloalveolar carcinoma over the past two decades: analysis of the SEER database. Lung Cancer. 2004;45(2):137-42.

4. Arenberg D; American College of Chest Physicians. Bronchioloalveolar lung cancer: ACCP evidence-based clinical practice guidelines (2nd edition). Chest. 2007;132(3 Suppl):306S-13S.

5. Jamni KS, Santoro IL, Borges EL, Silva WV, Uehara C. Características clínicas, diagnósticas e laboratoriais de portadores de carcinoma bronquioloalveolar. Rev Bras Cancerol. 2008;54(1):11-6.

6. Kishi K, Homma S, Kurosaki A, Motoi N, Kohno T, Nakata K, et al. Small lung tumors with the size of 1cm or less in diameter: clinical, radiological, and histopathological characteristics. Lung Cancer. 2004;44(1):43-51.

7. Travis WD, Colby TV, Corrin B, Shimosato Y, Brambilla E, Sobin LH. Histological typing of lung and pleural tumors. In: WHO. World Health Organization. International Histological Classification of Tumours. Berlin: Springer; 1999.

8. Zell JA, Ou SH, Ziogas A, Anton-Culver H. Epidemiology of bronchioloalveolar carcinoma: improvement in survival after release of the 1999 WHO classification of lung tumors. J Clin Oncol. 2005;23(33):8396-405.

9. Noguchi M, Morikawa A, Kawasaki M, Matsuno Y, Yamada T, Hirohashi S, et al. Small adenocarcinoma of the lung. Histologic characteristics and prognosis. Cancer. 1995;75(12):2844-52.

10. Suzuki K, Kusumoto M, Watanabe S, Tsuchiya R, Asamura H. Radiologic classification of small adenocarcinoma of the lung: radiologic-pathologic correlation and its prognostic impact. Ann Thorac Surg. 2006;81(2):413-9.

11. Lynch TJ, Bell DW, Sordella R, Gurubhagavatula S, Okimoto RA, Brannigan BW, et al. Activating mutations in the epidermal growth factor receptor underlying responsiveness of non-small-cell lung cancer to gefitinib. N Engl J Med. 2004;350(21):2129-39.

12. Paez JG, Jänne PA, Lee JC, Tracy S, Greulich H, Gabriel S, et al. EGFR mutations in lung cancer: correlation with clinical response to gefitinib therapy. Science. 2004;304(5676):1497-500.

13. Sequist LV, Lynch TJ. EGFR tyrosine kinase inhibitors in lung cancer: an evolving story. Annu Rev Med. 2008;59:429-42.

14. Asamura H. Minimally invasive approach to early, peripheral adenocarcinoma with ground-glass opacity appearance. Ann Thorac Surg. 2008;85(2):S701-4.

15. Mountain CF. Revisions in the International System for Staging Lung Cancer. Chest. 1997;111(6):1710-7.

16. Okubo K, Mark EJ, Flieder D, Wain JC, Wright CD, Moncure AC, et al. Bronchoalveolar carcinoma: clinical, radiologic, and pathologic factors and survival. J Thorac Cardiovasc Surg. 1999;118(4):702-9.

17. Breathnach OS, Kwiatkowski DJ, Finkelstein DM, Godleski J, Sugarbaker DJ, Johnson BE, et al. Bronchioloalveolar carcinoma of the lung: recurrences and survival in patients with stage I disease. J Thorac Cardiovasc Surg. 2001;121(1):42-7.

18. Furák J, Troján I, Szoke T, Tiszlavicz L, Morvay Z, Eller J, et al. Bronchioloalveolar lung cancer: occurrence, surgical treatment and survival. Eur J Cardiothorac Surg. 2003;23(5):818-23.

19. Shigematsu H, Lin L, Takahashi T, Nomura M, Suzuki M, Wistuba II, et al. Clinical and biological features associated with epidermal growth factor receptor gene mutations in lung cancers. J Natl Cancer Inst. 2005;97(5):339-46.

20. Raz DJ, Jablons DM. Bronchioloalveolar carcinoma is not associated with younger age at diagnosis: an analysis of the SEER database. J Thorac Oncol. 2006;1(4):339-43.

21. Yang P, Allen MS, Aubry MC, Wampfler JA, Marks RS, Edell ES, et al. Clinical features of 5,628 primary lung cancer patients: experience at Mayo Clinic from 1997 to 2003. Chest. 2005;128(1):452-62.

22. Chang MY, Mentzer SJ, Colson YL, Linden PA, Jaklitsch MT, Lipsitz SR, et al. Factors predicting poor survival after resection of stage IA non-small cell lung cancer. J Thorac Cardiovasc Surg. 2007;134(4):850-6.

23. Marchetti A, Martella C, Felicioni L, Barassi F, Salvatore S, Chella A, et al. EGFR mutations in non-small-cell lung cancer: analysis of a large series of cases and development of a rapid and sensitive method for diagnostic screening with potential implications on pharmacologic treatment. J Clin Oncol. 2005;23(4):857-65.

24. Toh CK, Gao F, Lim WT, Leong SS, Fong KW, Yap SP, et al. Never-smokers with lung cancer: epidemiologic evidence of a distinct disease entity. J Clin Oncol. 2006;24(15):2245-51.

25. Hidaka N, Nagao K. Bronchioloalveolar carcinoma accompanied by severe bronchorrhea. Chest. 1996;110(1):281-2.

26. Manning JT Jr, Spjut HJ, Tschen JA. Bronchioloalveolar carcinoma: The significance of two histopathologic types. Cancer. 1984;54(3):525-34.

27. Detterbeck FC, Jantz MA, Wallace M, Vansteenkiste J, Silvestri GA; American College of Chest Physicians. Invasive mediastinal staging of lung cancer: ACCP evidence-based clinical practice guidelines (2nd edition). Chest. 2007;132(3 Suppl):202S-220S.

28. Mun M, Kohno T. Efficacy of thoracoscopic resection for multifocal bronchioloalveolar carcinoma showing pure ground-glass opacities of 20 mm or less in diameter. J Thorac Cardiovasc Surg. 2007;134(4):877-82.

29. Rena O, Papalia E, Ruffini E, Casadio C, Filosso PL, Oliaro A, et al. Stage I pure bronchioloalveolar carcinoma: recurrences, survival and comparison with adenocarcinoma of the lung. Eur J Cardiothorac Surg. 2003;23(3):409-14.

30. Yamada S, Kohno T. Video-assisted thoracic surgery for pure ground-glass opacities 2 cm or less in diameter. Ann Thorac Surg. 2004;77(6):1911-5.



Trabalho realizado no Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, Instituto de Doenças do Tórax - HUCFF-IDT - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro (RJ) Brasil.
Endereço para correspondência: Daniel Sammartino Brandão. SAOS 01, bloco D, ap 309, CEP 70660-014 , Brasília, DF, Brasil.
Tel 55 21 8148-7034. E-mail: sammartinodb@terra.com.br
Apoio Financeiro: Nenhum.
Recebido para publicação em 8/4/2009. Aprovado, após revisão, em 14/12/2009.




Sobre os autores

Daniel Sammartino Brandão
Mestre em cirurgia Torácica. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro (RJ) Brasil.

Rui Haddad
Professor Adjunto de Cirurgia Torácica. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro (RJ) Brasil.

Giovanni Antonio Marsico
Chefe do Serviço de Cirurgia Torácica. Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, Instituto de Doenças do Tórax - HUCFF-IDT - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro (RJ) Brasil.

Carlos Henrique Ribeiro Boasquevisque
Professor Adjunto de Cirurgia Torácica. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro (RJ) Brasil.

Indexes

Development by:

© All rights reserved 2024 - Jornal Brasileiro de Pneumologia