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Artigo Original

Broncoscopia no diagnóstico de tuberculose pulmonar em pacientes com baciloscopia de escarro negativa

Bronchoscopy for the diagnosis of pulmonary tuberculosis in patients with negative sputum smear microscopy results

Márcia Jacomelli, Priscila Regina Alves Araújo Silva, Ascedio Jose Rodrigues, Sergio Eduardo Demarzo, Márcia Seicento, Viviane Rossi Figueiredo

ABSTRACT

Objective: To evaluate the diagnostic accuracy of bronchoscopy in patients with clinical or radiological suspicion of tuberculosis who were unable to produce sputum or with negative sputum smear microscopy results. Methods: A prospective cross-sectional study involving 286 patients under clinical or radiological suspicion of having pulmonary tuberculosis and submitted to bronchoscopy-BAL and transbronchial biopsy (TBB). The BAL specimens were submitted to direct testing and culture for AFB and fungi, whereas the TBB specimens were submitted to histopathological examination. Results: Of the 286 patients studied, 225 (79%) were diagnosed on the basis of bronchoscopic findings, as follows: pulmonary tuberculosis, in 127 (44%); nonspecific chronic inflammation, in 51 (18%); pneumocystis, fungal infections, or nocardiosis, in 20 (7%); bronchiolitis obliterans organizing pneumonia, alveolites, or pneumoconiosis, in 14 (5%); lung or metastatic neoplasms, in 7 (2%); and nontuberculous mycobacterium infections, in 6 (2%). For the diagnosis of tuberculosis, BAL showed a sensitivity and a specificity of 60% and 100%, respectively. Adding the TBB findings significantly increased this sensitivity (to 84%), as did adding the post-bronchoscopy sputum smear microscopy results (total sensitivity, 94%). Minor post-procedure complications occurred in 5.6% of the cases. Conclusions: Bronchoscopy is a reliable method for the diagnosis of pulmonary tuberculosis, with low complication rates. The combination of TBB and BAL increases the sensitivity of the method and facilitates the differential diagnosis with other diseases.

Keywords: Bronchoscopy; Tuberculosis, pulmonary; Sputum; Bronchoalveolar lavage; Biopsy.

RESUMO

Objetivo: Avaliar a acurácia diagnóstica da broncoscopia em pacientes com suspeita clínica ou radiológica de tuberculose, com baciloscopia negativa ou incapazes de produzir escarro. Métodos: Estudo transversal prospectivo de 286 pacientes com suspeita clínica/radiológica de tuberculose pulmonar e submetidos à broncoscopia - LBA e biópsia transbrônquica (BTB). As amostras de LBA foram testadas por pesquisas diretas e culturas de BAAR e de fungos, e as de BTB por exame histopatológico. Resultados: Dos 286 pacientes estudados, a broncoscopia contribuiu para o diagnóstico em 225 (79%): tuberculose pulmonar em 127 (44%); inflamações crônicas inespecíficas em 51 (18%); pneumocistose, infecções fúngicas ou nocardiose em 20 (7%); bronquiolite obliterante com pneumonia em organização, alveolites ou pneumoconioses em 14 (5%); neoplasias pulmonares ou metastáticas em 7 (2%); e micobacterioses não tuberculosas em 6 (2%). Para o diagnóstico de tuberculose, o LBA mostrou sensibilidade e especificidade de 60% e 100% respectivamente, havendo um aumento importante da sensibilidade quando associado à biópsia (84%) e à baciloscopia após a broncoscopia (94%). Complicações controláveis decorrentes do procedimento ocorreram em 5,6% dos casos. Conclusões: A broncoscopia representa um método diagnóstico confiável para pacientes com tuberculose pulmonar, apresentando baixos índices de complicações. A associação de biópsia transbrônquica ao lavado broncoalveolar elevou a sensibilidade diagnóstica do método e permitiu o diagnóstico diferencial com outras doenças.

Palavras-chave: Broncoscopia; Tuberculose pulmonar; Escarro; Lavagem broncoalveolar; Biópsia.

Introdução

A tuberculose é uma das principais causas de mortalidade por doença infecciosa, sendo a tuberculose pulmonar a forma mais frequente. Segundo a Organização Mundial de Saúde, a incidência mundial estimada era de 9,4 milhões de casos novos (137 casos/100.000 habitantes) em 2009, com maior concentração na Ásia (55%) e África (30%) e, em menor proporção, no Mediterrâneo (7%), Europa (4%) e Américas (3%).(1) No Brasil, a tuberculose é a terceira causa de morte por doenças infecciosas, responsável por 4.800 mortes/ano. Em 2010, foram notificados 70 mil novos casos. As formas pulmonares representam 85% dos casos, sendo 53% com baciloscopia direta positiva e 32% sem confirmação bacteriológica.(2)

A busca de casos e o tratamento efetivo constituem o binômio fundamental para o controle da doença. A estratégia para a busca de casos consiste na realização de baciloscopia de escarro (duas ou três amostras) dos indivíduos com tosse e expectoração por mais de 2 semanas, sendo a baciloscopia o principal método diagnóstico devido a seu baixo custo, fácil coleta e rapidez no resultado.(2,3) Apesar do elevado valor preditivo positivo (VPP) em nosso meio (95%), a baciloscopia de escarro tem sensibilidade média em 40-60%. Além disso, o exame é positivo em apenas 20% dos pacientes com lesão pulmonar mínima, e aproximadamente 30% dos pacientes não conseguem expectorar espontaneamente, principalmente nas formas iniciais da doença.(3) Outros fatores interferem no rendimento diagnóstico da baciloscopia: técnica de coleta e de análise, volume de secreção e condições de armazenamento. A cultura de escarro pode elevar o rendimento diagnóstico em 20-40%, apesar de ter como fator limitante o tempo para o resultado final - 2-8 semanas quando se utiliza meios sólidos, ou 10-40 dias com métodos automatizados não radiométricos.(3) A radiografia de tórax também é um método importante no diagnóstico da tuberculose, porém apresenta limitações: em até 15% dos casos, essa pode não mostrar sinais da doença, apresenta dificuldade para determinar a atividade da doença ou sequelas e apresenta semelhanças das alterações com outras doenças, como neoplasias, micoses pulmonares e sarcoidose.

Define-se como tuberculose com baciloscopia negativa aquela na qual o paciente tem pelo menos duas amostras de escarro negativas, radiografia sugestiva e/ou ausência de resposta clínica ao tratamento com antimicrobianos, exceto fluoroquinolonas. Nos casos em que não é possível coletar o escarro espontaneamente ou naqueles com baciloscopia negativa, o escarro induzido ou a broncoscopia com coleta de amostra de LBA e/ou biópsia transbrônquica (BTB) podem ser utilizados.(4)

O presente estudo teve por objetivo avaliar o rendimento diagnóstico dos métodos broncoscópicos, ou seja, LBA, BTB e a combinação desses, em pacientes com suspeita clínica/radiológica de tuberculose pulmonar com baciloscopia negativa no escarro ou quando incapazes de produzir escarro. Avaliamos também o impacto da BTB e da baciloscopia após broncoscopia no rendimento diagnóstico final do procedimento.

Métodos

Entre janeiro de 2006 e dezembro de 2008, foi realizado um estudo prospectivo e transversal com pacientes maiores de 18 anos de idade encaminhados para a realização de broncoscopia que apresentassem suspeita de tuberculose como principal hipótese diagnóstica. Esses pacientes foram encaminhados do Ambulatório de Pneumologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HC-FMUSP), onde já haviam realizado exames iniciais, entre os quais, exames de escarro com resultado negativo (ou apresentavam incapacidade para produzi-lo). As alterações radiológicas não foram descritas de maneira uniforme nas folhas de coleta de dados para todos os pacientes, o que inviabilizou uma análise detalhada e uma correlação entre os dados radiológicos e os achados broncoscópicos.

O estudo foi aprovado pela comissão de ética e pesquisa da instituição, e o termo de consentimento livre e esclarecido foi obtido de todos os pacientes ou de seus familiares responsáveis.

Os exames de broncoscopia com coleta de amostras de LBA e BTB foram realizados no Serviço de Endoscopia Respiratória do HC-FMUSP. Foram excluídos pacientes com contraindicação para o exame, como, por exemplo, distúrbios de coagulação, plaquetopenia, uremia, pulmão único e hipertensão pulmonar grave. Utilizamos fibrobroncoscópios de 4,9/5,0 mm com canal de trabalho de 2,2 mm (Pentax® FB-15V; Asahi Optical Co., Tóquio, Japão, ou Olympus® P20D; Olympus Corp., Tóquio, Japão). Todos os pacientes foram submetidos ao procedimento em decúbito dorsal horizontal, ventilação espontânea e sob sedação endovenosa com midazolam e citrato de fentanila. Foi utilizada lidocaína tópica 1% sem vasoconstritor (até 7 mg/kg) para a anestesia tópica das vias aéreas durante o exame. Todos os pacientes receberam suplementação de oxigênio através de cateter nasal e foram monitorados com oximetria de pulso, cardioscopia e medição da pressão arterial não invasiva.

Após a inspeção da árvore brônquica e a descrição dos achados endoscópicos, coletaram-se amostras de LBA e BTB nos segmentos pulmonares escolhidos previamente pela radiografia ou TC de tórax. Para a coleta de amostra a partir de LBA, foi utilizado um volume de soro fisiológico 0,9% que variou entre 100 e 150 mL, em temperatura ambiente. O volume recuperado foi submetido a pesquisas diretas (gram, pesquisa de BAAR e de fungos) e respectivas culturas. A BTB foi realizada com uma pinça flexível (Radial Jaw 3; Boston Scientific®, San Jose, EUA), com retirada de três a seis fragmentos de parênquima pulmonar para o exame anatomopatológico. Alguns pacientes apresentaram sangramento durante o procedimento de biópsia, sangramento esse em moderada quantidade e que foi controlado com medidas locais, como impactação do aparelho no segmento com manutenção de aspiração contínua, instilação de solução salina gelada ou instilação de solução com epinefrina.

Após o término do exame, os pacientes foram mantidos na sala de recuperação, monitorados e com suplementação de oxigênio até a recuperação completa da consciência, sendo posteriormente encaminhados ao ambulatório de origem. Foi realizada radiografia simples de tórax uma hora após o término do exame nos pacientes que apresentaram suspeita clínica de pneumotórax,(5) como presença de dor torácica do tipo pleurítica ipsilateral à BTB, assim como dispneia ou tosse seca significativas.

Para o diagnóstico da tuberculose, utilizamos os seguintes critérios: cultura positiva para Mycobacterium tuberculosis a partir de amostra de LBA e/ou presença de processo inflamatório crônico granulomatoso, a despeito de haver necrose de caseificação ou presença de BAAR na BTB.

Após a broncoscopia, todos os pacientes foram orientados a coletar uma amostra de escarro, que foi enviada para pesquisa direta e cultura para micobactérias.

A análise descritiva compreendeu o cálculo das frequências das variáveis estudadas. A variável contínua idade foi descrita como média e desvio-padrão. A sensibilidade foi calculada com base na razão entre os resultados verdadeiro-positivos pelo total de resultados positivos. A especificidade foi calculada através da razão entre os resultados verdadeiro-negativos pelo total de resultados negativos. Os cálculos de sensibilidade e especificidade foram realizados para cada método diagnóstico (pesquisa direta no LBA, cultura do LBA, exame anatomopatológico da BTB e para a broncoscopia em geral).

Resultados

Um total de 286 pacientes (154 homens e 132 mulheres), com média de idade de 46,7 ± 16,0 anos, foi submetido à broncoscopia por suspeita clínica e radiológica de tuberculose, sendo a doença confirmada em 135 pacientes (47%).

Em 225 pacientes (79%), os métodos broncoscópicos contribuíram para diferentes diagnósticos, incluindo tuberculose pulmonar, em 114 (40%); inflamações crônicas inespecíficas, em 51 (18%); pneumocistose, infecções fúngicas e nocardiose, em 20 (7%); bronquiolite obliterante com pneumonia em organização, alveolites e pneumoconioses, em 14 (5%); neoplasias pulmonares ou metastáticas, em 7 (2%); e micobacterioses não tuberculosas, em 6 (2%).

A inspeção da laringe e da árvore brônquica revelou alterações endoscópicas em 126 pacientes (44%): enantema, estenose brônquica, brônquio em fenda, processo inflamatório granulomatoso, malácia, fístula e alterações inflamatórias na mucosa da laringe em 43%, 21%, 17%, 10%, 5%, 3% e 3%, respectivamente.

A baciloscopia em amostras de LBA foi positiva em 31 casos (10,8%). Nesses casos, houve a identificação de M. tuberculosis e de micobactérias não tuberculosas em 26 (84%) e em 5 (16%), respectivamente A sensibilidade, especificidade, VPP e valor preditivo negativo (VPN) das pesquisas de BAAR a partir de LBA para o diagnóstico de tuberculose foram de 19%, 96%, 84% e 54%, respectivamente (Tabela 1).



A cultura para micobactérias foi positiva em 75 pacientes, sendo M. tuberculosis em 68 e outras micobactérias não tuberculosas (M. kansasii, M. gordonae e M. avium) em 7. A sensibilidade, especificidade, VPP e VPN da cultura do LBA para o diagnóstico de tuberculose foram de 50%, 100%, 100% e 63%, respectivamente. A associação entre pesquisa direta e cultura mostrou um aumento da sensibilidade e do VPN para 60% e 70%, respectivamente (Tabela 1).

A BTB foi realizada em 232 pacientes (81%), sendo contraindicada em 54 (19%). A BTB forneceu diagnóstico em 167 casos (72%), incluindo doenças granulomatosas tuberculosas e não tuberculosas, neoplasias de pulmão ou metastáticas, linfomas, doenças fúngicas, pneumoconioses e quadros inflamatórios inespecíficos, como descrito anteriormente. A BTB foi positiva para tuberculose em 57 desses pacientes (25%). Para o diagnóstico de tuberculose, a BTB, isoladamente, mostrou sensibilidade, especificidade, VPP e VPN de 42%, 92%, 88% e 53%, respectivamente (Tabela 1).

A pesquisa direta e a cultura a partir de LBA associados à BTB elevaram a sensibilidade e o VPN da broncoscopia para 84% e 82%, respectivamente. A especificidade e o VPP obtidos pela associação dos três métodos de análise (pesquisa direta, cultura a partir de LBA e exame anatomopatológico) foram de 97% e 95%, respectivamente (Tabela 1).

Amostras de escarro após a broncoscopia foram coletadas de 169 pacientes (59%). Nesses, a cultura foi positiva para M. tuberculosis em 57 (34%). Outras micobactérias foram diagnosticadas em 3 (2%) desses pacientes. Ressalta-se que em 13 pacientes (10%), o diagnóstico de tuberculose foi decorrente exclusivamente dos resultados dos exames de escarro após a broncoscopia.

Em 61 pacientes (21%), não foi possível estabelecer o diagnóstico final pela broncoscopia. Desses, 14 (23%) foram submetidos a procedimentos cirúrgicos invasivos (exérese de linfonodos, mediastinoscopia, videotoracoscopia ou cirurgia pulmonar aberta), sendo possível o diagnóstico anatomopatológico de tuberculose em 8 (57%) e diagnóstico de doença fúngica e neoplasia em 6 (43%).

Considerando todos os procedimentos diagnósticos realizados nos 286 pacientes com suspeita clínica/radiológica de tuberculose, o diagnóstico da doença foi confirmado em 135 pacientes (47%), enquanto 104 (36%) tiveram outros diagnósticos estabelecidos. Consequentemente, o diagnóstico diferencial de pacientes com tuberculose e baciloscopia negativa, utilizando métodos broncoscópicos e/ou cirúrgicos, foi conclusivo em 239 pacientes (84%).

As complicações relacionadas à broncoscopia foram observadas em 17 pacientes (6%), dentre elas: síncope, em 1 (0,3%); laringoespasmo, em 1 (0,3%); broncoespasmo, em 1 (0,3%); pneumotórax após BTB, em 8 (3%); e sangramento moderado após BTB, em 6 (2%). O sangramento foi controlado com medidas locais, sem necessidade de bloqueio brônquico ou intervenção cirúrgica.

Discussão

O presente estudo mostrou que a broncoscopia, além de ser um método diagnóstico com baixa morbidade para pacientes com suspeita de tuberculose cujo diagnóstico não foi possível pelo exame de escarro, permite a coleta de uma maior quantidade de material para análise, aumentando as chances de diagnóstico da doença (Tabela 2). Do total de pacientes com suspeita clínica/radiológica de tuberculose, a doença foi confirmada em 40% (114/286) dos casos pelos métodos broncoscópicos. Observamos também que, isoladamente, cada um desses métodos diagnósticos (pesquisa direta do bacilo a partir de LBA, cultura a partir de LBA e exame anatomopatológico) possui baixa sensibilidade diagnóstica (19%, 50% e 42%, respectivamente); porém, quando analisados em conjunto, a sensibilidade diagnóstica aumenta sobremaneira (para 84,4%).



Estudos anteriores mostraram os benefícios da broncoscopia no diagnóstico de tuberculose em diferentes grupos de pacientes. Miro et al.,(6) em uma avaliação retrospectiva de amostras de secreção respiratória coletadas por broncoscopia para a detecção de M. tuberculosis em pacientes HIV positivos, observaram um aumento no rendimento diagnóstico de 96% para 100% quando se acrescentou a BTB. Resultado semelhante foi observado em pacientes HIV negativos. Chawla et al.(7) estudaram prospectivamente um grupo de 50 pacientes com suspeita de tuberculose pulmonar submetidos à broncoscopia. As culturas a partir de LBA foram positivas para M. tuberculosis em 90% dos casos. Um diagnóstico rápido foi possível em 72% dos pacientes por meio da pesquisa direta no escarro após a broncoscopia, no lavado brônquico e em biópsias brônquicas. Um diagnóstico exclusivo por biópsia brônquica foi obtido em 20%; por baciloscopia de escarro após a broncoscopia, em 6%; e por lavado brônquico, em 6%. Dos 30 pacientes submetidos à BTB naquele estudo, 9 tiveram diagnóstico histopatológico positivo, sendo que em 3 o diagnóstico foi exclusivo por biópsia.(7) Outros estudos mostraram a importância na rapidez diagnóstica fornecida por biópsia broncoscópica (endobrônquica ou transbrônquica) para identificar BAAR e/ou processos inflamatórios granulomatosos, com ou sem necrose caseosa, nos pacientes com suspeita clínica e radiológica de tuberculose pulmonar.(4,8-10)

Caymmi et al.,(11) em um estudo retrospectivo avaliando 52 pacientes, mostraram que a associação entre amostras de LBA (pesquisa direta e cultura) e a BTB aumentou a sensibilidade diagnóstica do procedimento (de aproximadamente 50%, quando se utilizou cada método isoladamente, para 80%, quando se analisou em conjunto todos os métodos de coleta). Naquele grupo de pacientes, foi possível o diagnóstico diferencial com outras doenças pulmonares, como tumores, infecções fúngicas e infecções inespecíficas, além de processos inflamatórios e cicatriciais. Nosso estudo mostrou resultados semelhantes, com um número maior de casos.

Esses dados reforçam a importância dos resultados de amostras de LBA (pesquisa direta e cultura) e da BTB (pesquisa direta do bacilo e padrão histológico) para o diagnóstico de tuberculose pulmonar. Sempre que a condição clínica permitir, a BTB deve ser coletada, fornecendo maior quantidade de material para a análise e permitindo rapidez na identificação do bacilo no tecido e/ou na avaliação do padrão de inflamação tecidual. O padrão histológico da biópsia pode sugerir o diagnóstico da doença quando associado ao quadro clínico, radiológico e epidemiológico, permitindo o início do tratamento até que o resultado da cultura seja finalizado, o que pode variar entre 4 e 6 semanas (em meios sólidos - Löwenstein-Jensen ou Ogawa-Kudoh) ou entre 10 e 40 dias (em meios líquidos).(3) Além disso, em nosso estudo, mostramos que a BTB aumentou a sensibilidade diagnóstica da broncoscopia e permitiu o diagnóstico final de outras doenças. Observamos ainda que, em 34% dos casos, o diagnóstico obtido pela broncoscopia foi divergente da suspeita clínica/radiológica, o que se torna importante principalmente quando consideramos doenças fúngicas, micobacterioses não tuberculosas, infecções inespecíficas e neoplasias. Esses dados sugerem que o tratamento empírico para tuberculose, mesmo em pacientes com suspeita clínica/radiológica, pode ser suscetível a erros em um considerável número de casos.

Os principais riscos da BTB são sangramento (2-5%) e pneumotórax (em aproximadamente 3% dos casos), e as contraindicações são distúrbios de coagulação, uso de certos medicamentos para doenças de base e presença de uremia, de pulmão único e de hipertensão pulmonar moderada a acentuada.(12) Em pacientes com enfisema pulmonar importante ou com a presença de múltiplas bolhas, a BTB pode ser feita sob fluoroscopia, devendo ser avaliada individualmente.

No presente estudo, mostramos também os resultados do exame de escarro após a broncoscopia que, apesar de não ter sido coletado em todos os pacientes, contribuiu com 5% do total de casos confirmados de tuberculose. Em nosso estudo, a coleta de escarro adequado foi possível em 169 pacientes (59%). Em 9,6% dos pacientes, o diagnóstico final de tuberculose pulmonar foi obtido somente pela cultura de escarro após a broncoscopia. Mostramos ainda que a associação do exame do escarro após a broncoscopia aos métodos broncoscópicos (LBA e BTB) elevou a sensibilidade diagnóstica final para 94%. Sarkar et al.,(13) em um estudo anterior com 30 pacientes com suspeita de tuberculose e baciloscopia de escarro negativa, mostraram que houve 86,6% de positividade através de métodos broncoscópicos e 73,3% de positividade em análise do escarro após a broncoscopia.

Em relação às alterações da mucosa respiratória em nosso grupo de pacientes, observamos sinais de inflamação aguda em 44% dos casos, incluindo enantema de mucosa, presença de granulomas com fibrina e secreção aderida, inclusive na laringe. Em um estudo anterior ao nosso, foram citadas as seguintes alterações da mucosa brônquica na tuberculose: inflamação com material caseoso, estenose fibrótica, lesões tumorais, granulomas, lesões ulcerativas, edema e hiperemia.(14) Em nosso estudo, observamos a presença de estenose brônquica em 21% (26/126) dos pacientes. A importância desses achados sugere a necessidade de se avaliar e monitorar a evolução do processo inflamatório da mucosa brônquica, principalmente naqueles com processo inflamatório com material caseoso e lesões tumorais, devido à possibilidade de evolução para estenoses. Na avaliação da doença endobrônquica, as principais indicações da broncoscopia são presença de redução volumétrica pulmonar, tosse crônica inexplicável, hemoptise e sibilos localizados.(15) Além disso, esses dados têm importância no planejamento terapêutico de lesões sequelares de brônquios, por meio de dilatação mecânica e/ou colocação de stents.

As principais complicações da broncoscopia (pneumotórax e sangramento) ocorreram em um pequeno número de pacientes, e não houve a necessidade de internação posterior ao exame em nenhum caso, mostrando a segurança do procedimento diagnóstico.(12)

Em nosso estudo, não comparamos os resultados da broncoscopia aos de escarro induzido com salina hipertônica. Estudos anteriores mostraram a validade da utilização de escarro induzido devido a seu menor custo, bom rendimento diagnóstico e menor risco de complicações; porém, outros estudos mostraram que os resultados do escarro induzido são semelhantes aos da broncoscopia no diagnóstico final da doença.(16-20) Em nosso estudo, consideramos somente a análise do escarro coletado imediatamente após a broncoscopia, no qual a manipulação e a hidratação da mucosa brônquica durante a coleta de amostras de LBA estimulam a tosse e a expectoração, facilitando a coleta de secreção respiratória. Mostramos que houve um aumento significativo da sensibilidade diagnóstica.

Concluímos que, na amostra estudada, a broncoscopia mostrou-se um método seguro e eficaz para o diagnóstico de tuberculose pulmonar em pacientes sem possibilidade de diagnóstico pelo exame de escarro. A associação da BTB à LBA aumentou a sensibilidade diagnóstica da broncoscopia e permitiu o diagnóstico diferencial com outras doenças. A coleta de escarro após a broncoscopia aumentou a sensibilidade diagnóstica global. Sugerimos também que o tratamento empírico da tuberculose deve ser evitado, sempre que possível, mesmo em pacientes com suspeita clínica/radiológica.

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* Trabalho realizado no Serviço de Endoscopia Respiratória, Divisão de Pneumologia, Instituto do Coração - InCor - Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.
Endereço para correspondência: Márcia Jacomelli. InCor, Setor de Endoscopia Respiratória, Rua Eneas Carvalho de Aguiar, 44, 7º andar, Cerqueira Cesar, CEP 05403-900, São Paulo, SP, Brasil.
Tel. 55 11 2661-5612. E-mail: jacomelli.marcia@yahoo.com.br
Apoio financeiro: Nenhum.
Recebido para publicação em 23/8/2011. Aprovado, após revisão, em 1/1/2012.


Sobre os autores

Márcia Jacomelli
Médico Assistente. Serviço de Endoscopia Respiratória, Divisão de Pneumologia, Instituto do Coração - InCor - Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.

Priscila Regina Alves Araújo Silva
Médico Estagiário. Serviço de Endoscopia Respiratória, Divisão de Pneumologia, Instituto do Coração - InCor - Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.

Ascedio Jose Rodrigues
Médico Assistente. Serviço de Endoscopia Respiratória, Divisão de Pneumologia, Instituto do Coração - InCor - Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.

Sergio Eduardo Demarzo
Médico Colaborador. Serviço de Endoscopia Respiratória, Divisão de Pneumologia, Instituto do Coração - InCor - Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.

Márcia Seicento
Médico Assistente. Divisão de Pneumologia, Instituto do Coração - InCor - Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.

Viviane Rossi Figueiredo
Médico Diretor Técnico. Serviço de Endoscopia Respiratória, Divisão de Pneumologia, Instituto do Coração - InCor - Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.

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