Continuous and bimonthly publication
ISSN (on-line): 1806-3756

Licença Creative Commons
8294
Views
Back to summary
Open Access Peer-Reviewed
Artigo Original

Efeito da teofilina associada ao β2-agonista inalatório de curta ou longa duração, em pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica estável: revisão sistemática

Effect of theophylline associated with short-acting or long-acting inhaled β2-agonists in patients with stable chronic obstructive pulmonary disease: a systematic review

Eliane Cristina Zacarias, Aldemar Araújo Castro, Sônia Cendon

ABSTRACT

Objectives: To determine whether, in stable patients with chronic obstructive pulmonary disease, administration of theophylline in combination with short-acting or long-acting inhaled β2-agonists is more efficacious than is a placebo or each of these drugs used in isolation. Methods: A systematic review and meta-analysis were carried out. All randomized and double-blind clinical trials found in the literature were selected. Results: A total of eight studies were included. In comparing the effect of theophylline combined with β2-agonists to that of a placebo, we found a statistically significant improvement in mean FEV1 (0.27 L; 95%CI: 0.11 to 0.43) and mean dyspnea (-0.78; 95%CI: -1.26 to -0.29). None of the meta-analyses performed detected any difference between the results obtained using theophylline combined with β2-agonists and those obtained using β2-agonists alone. When the administration of theophylline combined with β2-agonists was compared to that of theophylline alone, there was a statistically significant improvement in mean dyspnea (-0.19; 95%CI: -0.34 to 0.04). Conclusion: In patients with stable chronic obstructive pulmonary disease, theophylline combined with β2 agonists is more efficacious than is a placebo in terms of improving FEV1 and dyspnea. In addition, theophylline combined with β2 agonists is more efficacious than is theophylline in improving dyspnea. Furthermore, administration of theophylline combined with β2 agonists is no more efficacious, for any of the variables studied, than is the use of β2-agonists in isolation.

Keywords: Lung diseases, Obstructive; Bronchodilator agents; Xanthines; Pulmonary disease, Chronic obstructive.

RESUMO

Objetivos: Avaliar se o tratamento com teofilina associada ao β2-agonista inalatório de curta ou longa duração é mais eficaz que o placebo e que o uso isolado de cada um dos fármacos, para os pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica estável. Métodos: Realizou-se uma revisão sistemática com metanálise, sendo selecionados todos os ensaios clínicos aleatórios e duplo-cegos encontrados na literatura. Resultados: Foram incluídos oito estudos. Teofilina associada ao β2-agonista vs. placebo: houve melhora estatisticamente significante para o VEF1 (L), com média 0,27 (IC95% 0,11 a 0,43); e para a dispnéia, com média -0,78 (IC95% -1,26 a -0,29). Teofilina associada ao β2 agonista vs. β2-agonista isolado: nenhuma das metanálises realizadas detectou diferença entre os grupos. Teofilina associada ao β2-agonista vs. teofilina isolada: houve melhora estatisticamente significante para a dispnéia, com média -0,19 (IC95% -0,34 a -0,04). Conclusões: Em pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica estável: 1) teofilina associada ao β2-agonista é mais eficaz que o placebo, em relação ao VEF1 e dispnéia; 2a) teofilina associada ao β2-agonista é mais eficaz que a teofilina isolada, em relação à dispnéia; e 2b) teofilina associada ao β2-agonista não é mais eficaz que o β2-agonista isolado, para quaisquer das variáveis estudadas.

Palavras-chave: Pneumopatias obstrutivas; Broncodilatadores; Xantinas; Doença pulmonar obstrutiva crônica.

Introdução

A doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) é considerada um dos maiores problemas de saúde pública do mundo.(1) Recentemente, foi redefinida como uma doença caracterizada pela limitação ao fluxo aéreo, não totalmente reversível,(2,3) geralmente progressiva, e associada a uma resposta inflamatória anormal dos pulmões, a partículas ou gases nocivos.(4)

Um tratamento eficaz seria aquele que conseguisse impedir a progressão da doença, diminuir os sintomas, aumentar a tolerância ao exercício, prevenir e tratar as complicações, diminuir a mortalidade e melhorar a qualidade de vida,(4) mas, até o momento, nenhuma das medicações existentes para a DPOC modifica o declínio a longo prazo na função pulmonar, ou interfere na mortalidade. Abordaremos, dentro da terapia broncodilatadora, o tratamento com teofilina e β2-agonista inalatório de curta ou longa duração.

Os β2-agonistas são broncodilatadores potentes e seguros, podendo ser de curta ou longa duração. Seu efeito principal consiste em dilatar os brônquios por uma ação direta sobre os β2-agonistas adrenorreceptores existentes no músculo liso. A estimulação destes receptores gera o relaxamento da musculatura lisa, por um mecanismo que envolve o aumento da concentração intracelular de adenosina monofosfato cíclico (AMPc).

A teofilina é o broncodilatador oral mais freqüentemente prescrito.(5) É um fármaco usado há aproximadamente sessenta anos, por reduzir a hiperinsuflação pulmonar e, conseqüentemente, a dispnéia.(6)

O efeito relaxante sobre o músculo liso é atribuído à inibição da fosfodiesterase, com um aumento resultante no AMPc. Este aumento no AMPc também tem seu papel importante na inibição do processo inflamatório.(7) Adicionalmente, atua na clearance mucociliar, estimulando os batimentos ciliares e o transporte de secreção no epitélio das vias aéreas.(6)

A ação antiinflamatória da teofilina é objeto de estudos atualmente. Além de proporcionar a inibição não seletiva da fosfodiesterase, tem-se demonstrado a supressão do processo inflamatório pela ativação da deacetilase histônica, enzima esta diminuída pelo estresse oxidativo presente em pacientes com DPOC. Esse mecanismo também melhora a resposta ao tratamento com corticóides, e possui a vantagem de ocorrer com baixas concentrações da teofilina (5-10 µg/mL), com diminuição dos efeitos colaterais.(6)

Como os broncodilatadores agem em diferentes locais, há linhas de pesquisa que acreditam que, quando se usa broncodilatadores combinados, ocorre melhora significante em relação à monoterapia,(8,9) por se tratarem de drogas com diferentes mecanismos de ação, locais de atuação, início e duração dos efeitos, podendo aumentar o grau de broncodilatação com equivalentes ou menores efeitos colaterais.(4)

Existem muitas controvérsias quanto ao uso de broncodilatadores no tratamento da DPOC, devido à diferença nos métodos de estudo, critérios de seleção, tamanho da amostra, doses e métodos de administração das drogas, e critérios de avaliação da resposta.(10)

Comparando os três principais consensos da literatura, European Respiratory Society - 1995, American Thoracic Society - 1995 e British Thoracic Society - 1997, para o tratamento da DPOC, um autor(11) concluiu que muitas recomendações são empíricas, por falta de evidência científica. Contudo, os três recomendam o uso de broncodilatadores como primeira linha de tratamento, questionam a associação de drogas e concordam serem necessários estudos para compreender e tratar melhor esses pacientes.

Em virtude da importância deste tópico, e com a finalidade de se obter a melhor evidência científica existente atualmente na literatura, em relação ao efeito terapêutico da teofilina associada ao β2 agonista, realizamos esta revisão sistemática de ensaios clínicos aleatórios.

Esta revisão teve como objetivo avaliar se o tratamento com teofilina associada ao β2-agonista é mais eficaz que o placebo ou que o uso isolado de cada um dos fármacos, para os pacientes com DPOC estável.

Métodos

Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina (Processo nº 251/00). Foram incluídos ensaios clínicos aleatórios, nos quais foi utilizada teofilina associada ao β2-agonista, em pacientes com DPOC estável. Os critérios de exclusão foram estudos com sigilo da alocação, descritos de forma inapropriada, população mista (asmáticos com DPOC) e intervenções que não eram as estudadas. Dois revisores avaliaram independentemente os títulos, os resumos e a sessão dos métodos de todos os relatos de ensaios clínicos identificados. Os estudos que indicassem preencher os critérios para sua inclusão foram selecionados. A partir desta ação, foi criada uma coleção de estudos para serem avaliados pelos revisores. As fontes de estudos foram: Excerpta Medica, Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde, Medline, a base de dados de ensaios clínicos controlados da Colaboração Cochrane, o registro de ensaios controlados aleatórios do grupo de vias aéreas da Colaboração Cochrane, e a lista de referências dos ensaios clínicos aleatórios encontrados.

As variáveis estudadas foram contínuas e avali-adas através de média e desvio padrão para cada um dos grupos. As selecionadas foram: 1) capacidade de exercício; 2) volume expiratório forçado no primeiro segundo (VEF1); 3) pico de fluxo expiratório; 4) pressão inspiratória máxima (PI max.); 5) qualidade de vida; 6) sintomas e 7) efeitos colaterais.

A análise estatística foi realizada utilizando-se o módulo Metaview do programa de computador Review Manager, produzido pela Colaboração Cochrane.

Resultados

O número dos estudos identificados em cada fonte está descrito na Figura 1, a data da última busca nas bases eletrônicas de dados foi janeiro de 2005, e há um artigo do ano de 2001 encontrado em busca manual.






Dos 848 artigos, 822 foram excluídos por não possuírem o grupo ou a intervenção do nosso interesse. Selecionamos 26 estudos, aos quais foram aplicados os critérios de inclusão e exclusão previamente definidos, restando 8 artigos. As principais características dos artigos incluídos encontram-se na Tabela 1.






Qualidade dos estudos incluídos

Na seqüência de alocação, os oito estudos não mencionaram como foi feito o cálculo do tamanho de suas respectivas amostras, nem se houve preocupação em fazê-lo; foram realizados em duplo-cego e descritos adequadamente. Quanto ao sigilo de alocação, todos mencionaram no texto que o estudo foi aleatório, porém não o descreveram. Apenas um estudo(9) foi um ensaio clínico aleatório, com grupos paralelos. Os outros sete foram ensaios clínicos aleatórios, com grupos cruzados.

Em dois dos oito estudos não houve perdas.(12,13) Nos demais, encontramos uma variação entre 10,7 e 29,6%. A escala de qualidade(14) avalia os estudos, levando em consideração três fatores: aleatorização, mascaramento e perdas ou retiradas do estudo. Os oito estudos foram aleatórios, porém não descreveram a forma como se realizaram; duplo-cego, descritos adequadamente, e explicadas as perdas quando presentes. Todos obtiveram pontuação três. Esta escala não é utilizada para incluir ou excluir estudos da revisão sistemática; no entanto, com ela é possível agrupar estudos homogêneos para a metanálise, na análise de sensibilidade.

Resultados dos desfechos estudados
Teofilina associada ao β2-agonista vs. placebo


Dos 156 pacientes incluídos em sete ensaios clínicos cruzados, com variáveis contínuas,156 receberam teofilina associada ao β2-agonista e 156 receberam placebo . Os indivíduos alocados no grupo da teofilina associada ao β2-agonista, comparados àqueles alocados para o grupo do placebo, mostraram:

VEF1, L: diferença de média ponderada (modelo de efeito randômico) 0,27; intervalo de confiança 95%. (0,11 a 0,43); p = 0,0007; e teste de heterogeneidade p = 0,96. Este resultado é estatisticamente significante e baseia-se em três estudos, com 48 indivíduos por grupo(15-17) (Tabela 2).





Dispnéia: diferença de média padronizada (modelo de efeito randômico) -0,78; intervalo de confiança 95% (-1,26 a -0,29); p = 0,002; e teste de heterogeneidade p = 0,58. Este resultado é estatisticamente significante e baseia-se em dois estudos com 36 indivíduos por grupo(16,17) (Tabela 3).





Teofilina associada ao β2-agonista vs. β2-agonista isolado

Dos 719 pacientes incluídos em oito ensaios clínicos, 361 receberam teofilina associada ao β2 agonista, e 358 receberam β2-agonista isolado. Não houve diferença estaticamente significante nas variáveis estudadas.

Teofilina associada ao β2-agonista vs. teofilina isolada

Dos 926 pacientes incluídos em oito ensaios clínicos, 462 receberam β2-agonista associado à teofilina, e 464 receberam teofilina isolada. Os indivíduos alocados no grupo da teofilina associada ao β2-agonista, comparados àqueles alocados para o grupo da teofilina isolada, mostraram:

Dispnéia: diferença de média padronizada (modelo de efeito randômico) -0,19; intervalo de confiança 95% (-0,34 a -0,04); p = 0,01; e teste de heterogeneidade p = 0,79. Este resultado é estatisticamente significante e baseia-se em três estudos, com 336 indivíduos no grupo da teofilina associada ao β2-agonista, e 344 no grupo da teofilina isolada(9,16,17) (Tabela 4).





Discussão

Os resultados desta revisão sistemática evidenciaram melhora significante do VEF1 e da dispnéia com o uso da teofilina associada ao β2-agonista, em relação ao grupo placebo, e melhora da dispnéia no grupo de pacientes que foram tratados com teofilina associada ao β2-agonista, quando comparado ao grupo que usou isoladamente a teofilina.

Analisando a função pulmonar, devemos lembrar que as provas funcionais, apesar de serem realizadas com o paciente em repouso e possivelmente não reproduzirem as alterações que ocorrem durante o exercício,(18) ainda são o padrão-ouro para o diagnóstico e avaliação da DPOC, por serem a forma mais reprodutível, padronizada e objetiva de se medir a limitação do fluxo aéreo.(4)

Evidenciamos significância estatística no VEF1 em litros, quando comparamos a teofilina associada ao β2 com o grupo placebo através dos estudos de alguns autores.(15-17)

Outros(15) estudaram o efeito da teofilina e do salbutamol com o uso das drogas isoladas e associadas, em 25 pacientes com DPOC e reversibilidade do VEF1 ≤ 10%. O estudo foi realizado em 4 fases:1) teofilina + salbutamol; 2) teofilina; 3) salbutamol e 4) placebo, com duração de três semanas cada uma, quando foram avaliados: a) testes de função pulmonar (espirometria: antes e depois de cada intervenção; e pico de fluxo expiratório, diariamente); e b) diário de sintomas. Os autores observaram melhora significante, com p < 0,001 nos valores espirométricos, com o uso das drogas associadas.

Outros estudos(16) incluíram 24 pacientes com DPOC estável e reversibilidade do VEF1 ≤ 35%, analisando a ação da teofilina e do salbutamol na função pulmonar e dispnéia, durante as atividades de vida diária. Em quatro períodos, com duração de duas semanas cada um, os pacientes foram submetidos aos seguintes tratamentos: 1) salbutamol; 2) teofilina; 3) teofilina associada ao salbutamol; e 4) placebo. Verificou-se aumento significante do VEF1 (p < 0,001), com o uso da teofilina associada ao salbutamol, quando comparado ao grupo placebo.

O último estudo incluído,(17) que colaborou para a melhora significante do VEF1 nesta metanálise, analisou 12 pacientes com DPOC estável (VEF1 = 1,09 ± 0,35 L), com reversibilidade do VEF1 ao broncodilatador ≤ 15%. A duração do estudo foi de 56 dias, divididos em 4 fases de 14 dias cada uma. As seguintes intervenções foram realizadas: 1) teofilina; 2) salbutamol; 3) teofilina + salbutamol; e 4) placebo. A espirometria foi feita ao final de cada fase. Os grupos tratados com as drogas obtiveram melhora do VEF1 em 13,5% com a teofilina; em 16,2% com o salbutamol; e em 31,3% com as drogas associadas. Portanto, significante melhora com a associação da teofilina e salbutamol.

O VEF1 foi a variável mais encontrada nos ensaios clínicos, porém foi representada em alguns trabalhos em litros,(12,13,15-17,19) e em outros em porcentagem do previsto.(9,15) Portanto, dos 8 artigos incluídos, 7 estudaram o VEF1, mas, devido à apresentação inadequada dos dados(12,19) e à diferente metodologia encontrada no trabalho de alguns autores,(13) que dividiram o grupo em pacientes com VEF1 ≤ 0,5 L e ≥ 0,5 L, esses estudos não puderam fazer parte da análise estatística.

Analisando os grupos: 1) teofilina associada ao β2-agonista x teofilina isolada e 2) teofilina associada ao β2-agonista x β2-agonista isolado, observamos uma resposta favorável ao uso das drogas em associação apenas quando comparada à resposta obtida pelo grupo que usou teofilina isoladamente.

Vale a pena salientarmos que os trabalhos que não evidenciaram melhora significante na função pulmonar constataram benefícios na qualidade de vida(20) e melhora dos sintomas.(21,22,24-26)

Em relação à dispnéia, devemos lembrar ser esta uma das principais queixas dos pacientes com DPOC. Trata-se de um relato subjetivo, relacionado a vários fatores, desde os fisiológicos até os sócios-culturais. Considera-se este o sintoma mais valorizado na literatura.(27)

Acredita-se que os broncodilatadores proporcionam uma dilatação das pequenas vias aéreas, com conseqüente diminuição do aprisionamento de ar, ocorrendo um aumento da força muscular, redução da dispnéia e da limitação ao exercício nos pacientes com DPOC.(27)

Obtivemos significância estatística nos grupos: 1) teofilina associada ao β2, quando comparado ao placebo, através dos trabalhos de alguns autores;(16,17) 2) teofilina associada ao β2, quando comparado ao grupo teofilina isolada.(9,16,17) Esses achados são de grande importância clínica para os pacientes com DPOC, pois a diminuição da dispnéia está diretamente relacionada à melhora na qualidade de vida destes pacientes.

Em um estudo,(16) o objetivo principal foi avaliar a dispnéia durante as atividades de vida diária em pacientes com DPOC, em uso de teofilina e salbutamol, associados ou não. Utilizaram, para a avaliação desta, uma parte do questionário de qualidade de vida Chronic Respiratory Questionnaire (CRQ), com 5 questões em uma escala de 7 pontos, onde 1 significava intensa dispnéia e 7 representava não ter dispnéia (variando de 5 a 35 pontos). Fizeram correlações negativas entre dispnéia e VEF1 e entre dispnéia e PImax, ambas significantes (p < 0,001), concluindo que ocorre diminuição da dispnéia nas atividades de vida diária com o uso da teofilina associada ao salbutamol, devido à melhora da força muscular e ao aumento do calibre das vias aéreas.

Houve a descrição dos sintomas: dispnéia, tosse, secreção e broncoespasmo por alguns autores,(17) através de um diário com 5 pontos (0 = nenhum e 4 = intolerável). Encontraram significante diminuição da dispnéia com teofilina + salbutamol. Com relação ao broncoespasmo, observaram melhora significante com o uso das drogas associadas. Sobre a tosse e produção de secreção, não foram encontradas diferenças entre os grupos.

Um estudo duplo-cego, randomizado e paralelo,(9) com 962 pacientes com DPOC estável, avaliou a eficácia da teofilina e do salmeterol na função pulmonar, sintomas e exacerbações. A duração do estudo foi de 12 semanas e os pacientes foram divididos em 3 grupos: 1) salmeterol, 2) teofilina e 3) teofilina + salmeterol, com orientação de preencherem um diário que continha o pico de fluxo expiratório e escore de sintomas. Questionários de qualidade de vida e dispnéia foram realizados pelos profissionais, nos retornos à clínica, na 4ª, 8ª e 12ª semanas. A dispnéia foi avaliada através de dois índices: Baseline Dyspnea Index (BDI) e Transitional Dyspnea Index (TDI). Houve melhora significante com o uso da teofilina associada ao salmeterol para os sintomas (p = 0,023), sendo que, para a dispnéia, a maior diferença foi encontrada em relação ao grupo que usou teofilina isoladamente (p < 0,048).

Os três estudos apresentaram diminuição significante da dispnéia, utilizando-se teofilina associada aos β2-agonistas, em comparação com as outras intervenções. Encontramos enorme dificuldade para a análise desta variável, devido à variabilidade dos métodos empregados, mas sua avaliação foi possível através de uma padronização estatística, levando-se em conta o significado dos resultados encontrados em cada trabalho.

Segundo um estudo,(28) a dispnéia pode ser mensurada durante as atividades diárias e durante testes específicos (por exemplo, após o teste de caminhada). As formas aceitas pela American Association of Cardiovascular and Pulmonary Rehabilitation são: a) para as atividades diárias, BDI e TDI e a parte correspondente à dispnéia do CRQ; e b) para os testes específicos, escala de 0 a 10 de Borg ou a visual analog scale.

Encontramos, nos estudos já descritos, o uso do CRQ e dos índices de dispnéia (TDI e BDI), porém alguns(17) utilizaram-se de uma outra escala para a avaliação desta variável. Outros dois estudos(12,30) avaliaram a dispnéia, mas não puderam ser utilizados na análise estatística, por não terem descrito adequadamente os resultados. Podemos comparar o resultado de um estudo(12) com os resultados desta revisão sistemática, pois não encontramos diferença estatisticamente significante quando foram comparados o grupo tratado com teofilina + β2 com o grupo tratado apenas com o β2.

Percebe-se, pelo grande número de escalas e índices, que há grande interesse em se estudar a dispnéia em pacientes com DPOC. Porém, como vimos, cada autor a estuda de uma maneira, dificultando a análise comparativa e a obtenção de uma conclusão sobre o assunto.

Para o pico de fluxo expiratório e para PImax, não há evidências convincentes de que o uso da teofilina associada ao β2 proporcione melhora nesses parâmetros, devido ao pequeno número de estudos encontrados.

Outras duas variáveis importantes para pacientes com DPOC seriam: capacidade de exercício e qualidade de vida. A capacidade de exercício foi estudada através do teste da caminhada de seis minutos,(19,30) teste da caminhada de doze minutos, e teste incremental em cicloergômetro,(12) e a qualidade de vida através do CRQ, por um grupo de autores.(19,30) Todas essas variáveis são aceitas na literatura, mas infelizmente não pudemos utilizá-las em nossa análise estatística, por não terem sido descritas adequadamente, pois foram publicadas sem os desvios padrão.

Os efeitos colaterais do uso das drogas foram apenas apresentados como relato nos estudos, sem significância clínica ou estatística. O mais citado enfatizou a ação deletéria da teofilina sobre o sistema gastrointestinal, sendo a náusea a principal queixa.(9) Em todos os estudos houve o comentário que, usando-se as drogas associadas, tem-se como benefício a diminuição dos efeitos colaterais.

Esta revisão sistemática permite concluir que: 1) o tratamento com teofilina associada ao β2-agonista é mais eficaz que o placebo para pacientes com DPOC estável, em relação ao VEF1 e dispnéia; 2a) o tratamento com teofilina associada ao β2 agonista é mais eficaz que a teofilina para pacientes com DPOC estável, em relação à dispnéia; e 2b) o tratamento com teofilina associada ao β2-agonista não é mais eficaz que β2-agonista isoladamente, para quaisquer das variáveis estudadas, nos pacientes com DPOC estável.

No entanto, para a tomada de decisão clínica, os dados da literatura são apenas um dos aspectos que, somados à experiência clínica, às condições e às respostas individuais de cada paciente, acabam por definir a conduta final.

Referências

1. Hurd S. The impact of COPD on lung health worldwide: epidemiology and incidence. Chest 2000;117(Supl 2):S1-S4.

2. American Thoracic Society. Standards for the diagnosis and care of patients with COPD. Am J Respir Crit Care Med 1995; 152(5 Pt 2):77-121.

3. British Thoracic Society. Goals of the COPD guidelines. Thorax. 1997;52(Supl 5):1-26.

4. Pauwels RA, Buist AS, Calverley PM, Jenkins CR, Hurd SS; GOLD Scientific Committee. Global strategy for the diagnosis, management, and prevention of chronic obstructive pulmonary disease. NHLBI/WHO Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease (GOLD) Workshop summary. Am J Respir Crit Care Med. 2001;163(5):1256-76.

5. Janson C, Chinn S, Jarvis D, Burney P. Physician-diagnosed asthma and drug utilization in the European Community Respiratory Health Survey. Eur Respir J. 1997;10(8):1795-802.

6. Barnes PJ. Theophylline - New perspectives for an old drug. Am J Respir Crit Care Med. 2003;167(6):813-8.

7. Rang HP, Ritter JM, Dale MM. Sistema respiratório. In: Rang HP, Ritter JM, Dale MM, editors. Farmacologia. 3ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan;1997.p.287-8.

8. Filuk RB, Easton PA, Anthonisen NR. Responses of large doses of salbutamol and theophylline in patients with COPD. Am Rev Respir Dis. 1985;132(4):871-4.

9. ZuWallack RL, Mahler DA, Reilly D, Church N, Emmett A, Rickard K, et al. Salmeterol plus theophylline combination therapy in the treatment of COPD. Chest. 2001;119(6):1661-70.

10. Nishimura K, Koyama H, Ikeda A, Sugiura N, Kawakatsu K, Izumi T. The additive effect of theophylline on a high-dose combination of inhaled salbutamol and ipratropium bromide in stable COPD. Chest. 1995;107(3):718-23.

11. Ferguson GT. Recommendations for the management of COPD. Chest. 2000;117(Supl 2):23-8.

12. Dullinger D, Kronenberg R, Niewoehner DE. Efficacy of inhaled metaproterenol and orally-administered theophylline in patients with chronic airflow obstruction. Chest. 1986;89(2):171-3.

13. Karpel JP, Kotch A, Zinny M, Pesin J, Alleyne W. A comparison of inhaled ipratropium, oral theophylline plus inhaled β-agonist, and the combination of all three in patients with COPD. Chest. 1994;105(4):1089-94.

14. Jadad AR, Moore A, Carroll D, Jenkinson C, Reynolds DJ, Gavaghan DJ, et al. Assessing the quality of reports of randomized clinical trials: is blinding necessary? Control Clin Trials. 1996;17(1):1-12.

15. Taylor DR, Buick B, Kinney C, Lowry RC, McDevitt DG. The efficacy of oral administered theophylline, inhaled salbutamol, and a combination of the two as chronic therapy in the management of chronic bronchitis with reversible air-flow obstruction. Am Rev Respir Dis. 1985;131(5):747-51.

16. Jaeschke R, Guyatt GH, Singer J, Keller J, Newhouse MT. Mechanism of bronchodilator effects in chronic airflow limitation. CMAJ. 1991;144(1):35-9.

17. Thomas P, Pugsley JA, Stewart JH. Theophylline and salbutamol improve pulmonary function in patients with irreversible chronic obstructive pulmonary disease. Chest. 1992;101(1):160-5.

18. Rodrigues SL, Viegas CAA. Estudo de correlação entre provas funcionais respiratórias e o teste de caminhada de seis minutos em pacientes portadores de DPOC. J Pneumol. 2002;28(6):324-8.

19. Guyatt GH, Townsend M, Nogradi S, Pugsley SO, Keller JL, Newhouse MT. Acute response to bronchodilator. An imperfect guide for bronchodilator therapy in chronic airflow limitation. Arch Intern Med. 1988;148(9):1949-52.

20. Jones PW, Bosh TK. Quality of life changes in COPD patients treated with salmeterol. Am J Respir Crit Care Med. 1997;155(4):1283-9.

21. Celli BR. Standards for the optimal management of COPD: A summary. Chest. 1998;113(Supl 4):283-7

22. Canadian Thoracic Society. Guidelines for the assessment and management of chronic obstructive pulmonary disease. CMAJ 1992;147(4):420-8.

23. Ikeda A, Nishimura K, Koyama H, Izumi T. Bronchodilating effects of combined therapy with clinical dosages of ipratropium bromide and salbutamol for stable COPD: comparison with ipratropium bromide alone. Chest. 1995;107(2):401-5.

24. Grove A, Lipworth BJ, Reid P, Smith RP, Ramage L, Ingram CG, et al. Effects of regular salmeterol on lung function and exercise capacity in patients with chronic obstructive airways disease. Thorax. 1996;51(7):689-93.

25. Giessel G, Zuwallack R, Cook C, Anderson W, Reilly D, Emmett, Rickard A. A comparison of serevent and theophylline on pulmonary function in COPD patients [abstract]. Am Respir Crit Care Med. 1999;159:A523.

26. Ram FSF, Cendon S. Theophylline benefits stable "irreversible" chronic obstructive pulmonary disease: review and meta-analysis. Eur Respir J. 2002;20(Supl 38):S374.

27. Pulmonary Rehabilitation: joint ACCP/AACVPR evidence-based guidelines. ACCP/AACVPR Pulmonary Rehabilitation Guidelines Panel. American College of Chest Physicians. American Association of Cardiovascular and Pulmonary Rehabilitation. Chest. 1997;112 (5):1363-96.

28. Mahler DA, Matthay RA, Snyder PE, Wells CK, Loke J. Sustained-release theophylline reduces dyspnea in nonreversible obstructive airway disease. Am Rev Respir Dis. 1985;131(1):22-5.

29. Cazzola M, Donner CF. Long-acting β2 agonists in the management of stable chronic obstructive pulmonary disease. Drugs. 2000;60(2):307-20.

30. Guyatt GH, Townsend M, Pugsley SO, Keller JL, Short HD, Taylor DW, et al. Bronchodilators in chronic air-flow limitation. Effects on airway function, exercise capacity, and quality of life. Am Rev Respir Dis. 1987;135(5):1069-74.
________________________________________________________________________________________

* Trabalho realizado na Escola Paulista de Medicina/Universidade Federal de São Paulo - EPM/UNIFESP - e Centro Cochrane do Brasil, São Paulo (SP) Brasil.
1. Doutora em Ciências Pneumológicas pela Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP - São Paulo (SP) Brasil.
2. Doutor em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP - São Paulo (SP) Brasil.
3. Doutora em Medicina pela Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP - São Paulo (SP) Brasil.
Endereço para correspondência: Eliane Cristina Zacarias. Rua Almirante Marques de Leão, 638, apto. 21b, Bela Vista, CEP 13030-010, São Paulo, SP, Brasil.
Tel 55 11 3253-7633/55 19 9601-1356. E-mail: liage@uol.com.br
Recebido para publicação em 4/3/2006. Aprovado, após revisão, em 18/7/2006.


Indexes

Development by:

© All rights reserved 2024 - Jornal Brasileiro de Pneumologia