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Meta-análise

Exacerbações de DPOC e sintomas de refluxo gastroesofágico: revisão sistemática e meta-análise

Exacerbations of COPD and symptoms of gastroesophageal reflux: a systematic review and meta-analysis

Thiago Mamôru Sakae, Márcia Margaret Menezes Pizzichini, Paulo José Zimermann Teixeira, Rosemeri Maurici da Silva, Daisson José Trevisol, Emilio Pizzichini

ABSTRACT

Objective: To examine the relationship between gastroesophageal reflux (GER) and COPD exacerbations. Methods: We conducted a systematic search of various electronic databases for articles published up through December of 2012. Studies considered eligible for inclusion were those dealing with COPD, COPD exacerbations, and GER; comparing at least two groups (COPD vs. controls or GER vs. controls); and describing relative risks (RRs) and prevalence ratios-or ORs and their respective 95% CIs (or presenting enough data to allow further calculations) for the association between GER and COPD-as well as exacerbation rates. Using a standardized form, we extracted data related to the study design; criteria for GER diagnosis; age, gender, and number of participants; randomization method; severity scores; methods of evaluating GER symptoms; criteria for defining exacerbations; exacerbation rates (hospitalizations, ER visits, unscheduled clinic visits, prednisone use, and antibiotic use); GER symptoms in COPD group vs. controls; mean number of COPD exacerbations (with symptoms vs. without symptoms); annual frequency of exacerbations; GER treatment; and severity of airflow obstruction. Results: Overall, GER was clearly identified as a risk factor for COPD exacerbations (RR = 7.57; 95% CI: 3.84-14.94), with an increased mean number of exacerbations per year (mean difference: 0.79; 95% CI: 0.22-1.36). The prevalence of GER was significantly higher in patients with COPD than in those without (RR = 13.06; 95% CI: 3.64-46.87; p < 0.001). Conclusions: GER is a risk factor for COPD exacerbations. The role of GER in COPD management should be studied in greater detail.

Keywords: Pulmonary disease, chronic obstructive; Gastroesophageal reflux; Meta-analysis; Risk factors; Evidence-based medicine.

RESUMO

Objetivo: Examinar a relação entre refluxo gastroesofágico (RGE) e exacerbações da DPOC. Métodos: Foi realizada uma revisão sistemática de artigos publicados até dezembro de 2012 utilizando várias bases de dados. Os critérios de elegibilidade incluíram estudos sobre DPOC, exacerbações da DPOC e RGE que comparavam ao menos dois grupos (DPOC vs. controle ou RGE vs. controle) e descrevendo riscos relativos (RRs), razões de prevalência ou ORs e respectivos IC95% (ou com dados que permitissem o seu cálculo) para a associação entre RGE e DPOC, assim como taxas de exacerbações. Os dados foram coletados com um formulário padronizado que incluía o tipo de estudo; critérios para diagnóstico de RGE; idade e gênero dos participantes; número de participantes; método de randomização; escores de gravidade; métodos de avaliação dos sintomas de RGE; critérios de definição de exacerbação; taxa de exacerbações (hospitalizações, visitas à emergência, consultas não programadas, uso de prednisona e uso de antibióticos); sintomas de RGE no grupo DPOC vs. controles; média de exacerbações da DPOC (com sintomas vs. sem sintomas); frequência anual de exacerbações; tratamento para RGE; e gravidade da obstrução. Resultados: O RGE foi claramente identificado como um fator de risco para exacerbações da DPOC (RR = 7,57; IC95%: 3,84-14,94), com um aumento na média de exacerbações por ano (diferença média: 0,79; IC95%: 0,22-1,36). Houve uma prevalência significativamente maior de RGE em pacientes com DPOC do que naqueles sem DPOC (RR = 13,06; IC95%: 3,64-46,87; p < 0,001). Conclusões: O RGE é um fator de risco para exacerbações da DPOC. O papel do RGE no manejo da DPOC deve ser mais profundamente investigado.

Palavras-chave: Doença pulmonar obstrutiva crônica; Refluxo gastroesofágico; Metanálise; Fatores de risco; Medicina baseada em evidências.

Introdução

As exacerbações da DPOC são eventos críticos na história natural e no manejo da doença, pois estão relacionadas a piora da qualidade de vida,(1,2) declínio acelerado da função pulmonar,(1,2) hospitalizações,(2-5) aumento do risco de morte(1,3,5) e uso intenso de recursos de saúde.(1,3,4) Embora as exacerbações tenham um impacto negativo no curso natural da doença, pouco se sabe sobre suas causas.(2,5)

Estudos recentes têm sugerido que os principais fatores determinantes de exacerbações da DPOC são história de exacerbações,(2,4) baixo nível de atividade física,(4) gravidade da doença(2,4,5) e presença de comorbidades, tais como refluxo gastroesofágico (RGE), insuficiência cardíaca congestiva, doença arterial coronariana e insuficiência renal/hepática crônica.(4,6-8) No entanto, o papel do RGE nesse cenário ainda não está claro.

Aproximadamente metade da população adulta dos países industrializados tem experiência pessoal de sintomas de RGE, e 20-30% sofrem de doença do RGE (DRGE).(9) Presumivelmente, a DRGE é a doença mais comum do trato digestivo.(9,10) A DRGE piora o controle da asma, devido ao reflexo esôfago-brônquico,(11,12) e aumenta a reatividade brônquica.(11,13,14) Além disso, a DRGE é um fator determinante de microaspiração.(14,15) Há também relatos de que o RGE é acompanhado de inflamação neutrofílica das vias aéreas,(16) e a DPOC tem o mesmo tipo de inflamação,(17) que por sua vez pode ser aumentada por essa associação. Além disso, a microaspiração do conteúdo gástrico e o broncoespasmo induzido pelo nervo vago devido à irritação do esôfago causada pelo ácido gástrico podem contribuir para a associação entre RGE e doença pulmonar/sintomas pulmonares.(4,15,18)

A associação entre RGE e exacerbação da DPOC ainda não está clara.(15,19) Uma explicação é que o RGE contribui para as exacerbações da DPOC, pois aumenta a inflamação das vias aéreas. Portanto, o objetivo desta meta-análise foi avaliar o impacto do RGE nas exacerbações da DPOC.

Métodos

Fizemos uma busca sistemática nos seguintes bancos de dados: Medline (PubMed, de 1966 a dezembro de 2012); EMBASE (de 1974 a dezembro de 2012); Cochrane Controlled Trials Register (1960-2007) e LILACS (de 1982 a dezembro de 2012). Criamos três grupos de descritores, usando as conjunções "OR" e "AND" dentro de cada grupo e entre os grupos, respectivamente. Usamos os seguintes descritores no primeiro grupo: "COPD", "chronic bronchitis" e "emphysema". Para a variável explicativa, o segundo grupo compreendeu os termos "GERD", "GORD", "GOR", "gastroesophageal reflux", "gastro esophageal reflux", "gastroesophageal reflux disease", "gastro esophageal reflux disease", "gastrooesophageal reflux", "gastro oesophageal reflux", "gastrooesophageal reflux disease", "gastro oesophageal reflux disease", "laryngopharyngeal reflux" e "swallowing". O terceiro grupo de descritores foi usado para restringir o delineamento dos estudos: "cohort", "prospective", "retrospective", "clinical trial", "cross sectional" ou "case-control". As referências bibliográficas de todos os artigos selecionados também foram pesquisadas, mesmo que não tivessem sido identificadas pela busca nos bancos de dados.

Critérios de elegibilidade

Os critérios de elegibilidade para a seleção de artigos foram os seguintes: artigos publicados em inglês, espanhol ou português; artigos sobre pacientes com DPOC (definida de acordo com os critérios da Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease),(1) enfisema ou bronquite crônica; artigos que relatassem a taxa de exacerbações da DPOC, definidas pelo número de hospitalizações, atendimentos de emergência e consultas não programadas, bem como pela necessidade de uso de prednisona/antibióticos ou pelos critérios descritos por Anthonisen et al.(20); artigos que comparassem pelo menos dois grupos (DPOC vs. controle ou RGE vs. controle); artigos que descrevessem o risco relativo, a razão de prevalência, ou a OR da associação entre RGE e DPOC com os respectivos IC95% ou com dados suficientes para que fizéssemos os cálculos necessários e artigos que relatassem taxas de exacerbações e respectivos IC95% ou dados suficientes para que fizéssemos os cálculos necessários. Não estabelecemos nenhum limite de idade nem impusemos restrições à definição de RGE.

De forma independente, dois revisores avaliaram os títulos e resumos das citações identificadas e obtiveram o texto integral de todos os artigos que julgaram elegíveis. Também de forma independente, os revisores aplicaram os critérios de elegibilidade à seção Métodos de ensaios elegíveis. Discordâncias foram resolvidas por meio de discussões com um terceiro revisor.

Abstração de dados

A abstração de dados foi realizada de forma independente por dois revisores, que usaram um protocolo adaptado do estudo de Vandenbroucke et al.(21)

Coleta e análise de dados

Os dados foram analisados com o freeware MIX, versão 1.7.(22) Agrupamos os estudos incluídos para obter a razão de risco (RR) ou a OR para as exacerbações da DPOC e a média de exacerbações por ano com seus respectivos IC95% ou ep.

Seleção de revisões

Extração e gerenciamento de dados

Os dados foram extraídos por meio de um formulário padronizado e incluíram o tipo de estudo, os critérios para o diagnóstico de RGE (pHmetria ou questionários), a idade e o sexo dos participantes, o número de participantes, o método de randomização, escores de gravidade (ou seja, a classificação da DPOC), métodos de avaliação dos sintomas de RGE, critérios para a definição de exacerbação, taxa de exacerbações (hospitalizações, atendimentos de emergência, consultas não programadas, uso de prednisona e uso de antibióticos), sintomas de RGE em grupo de pacientes com DPOC vs. controles, a média de exacerbações da DPOC (com sintomas vs. sem sintomas), a frequência anual de exacerbações, o tratamento do RGE e a gravidade da obstrução ao fluxo aéreo.

Avaliação da qualidade metodológica das revisões incluídas

Síntese dos dados

Apresentamos todas as estimativas pontuais como RR ou média  ep. Usamos gráficos de floresta (forest plots) para exibir os resultados. Os ensaios selecionados foram combinados por meio do freeware MIX.(22) Para as variáveis dicotômicas, calculamos a RR de efeito fixo e os respectivos IC95% para estudos individuais.

Calculamos a diferença média com IC95% para as variáveis contínuas. Quando os dp foram relatados, nós os usamos para calcular o ep, por meio da seguinte fórmula:
dp = ep × RQ (N) (1)
onde RQ (N) é a raiz quadrada de N.

Caso os dp não estivessem disponíveis para as variáveis contínuas, transformamos os IC95% em ep por meio da seguinte fórmula:
ep = (limite superior do IC95% − limite inferior do IC95%) ÷ (1,96 × 2) (2)

Além disso, a OR foi adaptada ao risco relativo por meio da seguinte fórmula(23):
Risco relativo = _______OR_______ (3)
(1 − Po) + (Po × OR)
onde Po é a prevalência observada.
Quantificamos as inconsistências entre as estimativas combinadas por meio da seguinte fórmula:
I2 = [(Q − gl)/Q] × 100% (4)
na qual Q é o qui-quadrado e gl representa seus graus de liberdade.

Isso ilustra a porcentagem de variabilidade, que efetivamente revela estimativas resultantes da heterogeneidade, e não de um erro amostral.(24) Se havia heterogeneidade, um modelo de efeitos aleatórios era usado. Realizamos análises de sensibilidade por meio da comparação entre o modelo de efeitos aleatórios e o modelo de efeito fixo. O potencial de viés de publicação foi avaliado por meio do teste de Egger e de gráficos de funil (funnel plots).

Resultados

As buscas nos bancos de dados eletrônicos identificaram um total de 543 artigos. A revisão dos títulos e resumos resultou na exclusão de 507 artigos. A revisão dos títulos rendeu 36 artigos, os quais foram examinados. Dos 36 artigos remanescentes, alguns foram ainda excluídos pelos seguintes motivos: informações ausentes a respeito de DPOC, RGE, ou exacerbações(25-32); artigos de revisão(6,12,15,33-37); falta de dados adequados para a meta-análise(18,28,38-42); e critérios de inclusão/exclusão que fizeram com que o estudo não fosse representativo da população.(43) Em seguida, uma revisão dos resumos e dos textos integrais rendeu 11 artigos, que pareciam preencher os critérios de inclusão. Dos 11 artigos, 7 preencheram os critérios de inclusão e foram incluídos na análise (Figura 1).(4,19,44-48) As características dos estudos incluídos na meta-análise são apresentadas na Tabela 1. Não foram incluídos estudos não publicados ou em andamento.







Aumento do risco de exacerbações da DPOC em pacientes com RGE

Encontramos um elevado risco de exacerbações da DPOC em pacientes com RGE por meio do cálculo da RR de exacerbações da DPOC entre pacientes com RGE e aqueles sem. Os pacientes com RGE apresentaram risco de exacerbação sete vezes maior do que aqueles sem RGE (RR = 7,57; IC95%: 3,84-14,94; z = 5,83; t2 = 0,0; p < 0,0001). Usamos um modelo de efeito fixo, cujo uso se justifica pela baixa heterogeneidade (Q = 1,07; I2 = 0,0; p = 0,89) dos estudos (Figura 2). A análise incluiu 341 pacientes de todos os estudos.

Examinamos ainda o aumento do número de exacerbações da DPOC em pacientes com RGE. Nessa análise, usamos um modelo de efeitos aleatórios em vez de um modelo de efeito fixo, em virtude da grande heterogeneidade (Q = 9,95; p < 0,04; I2 = 59,8%). Os pacientes com RGE apresentaram mais exacerbações por ano (diferença média = 0,79; IC95%: 0,22-1,36; z = 2,69; t2 = 0,23; p < 0,007) do que aqueles sem RGE (Figura 3). A análise incluiu 2.418 pacientes de todos os estudos.



Associação entre RGE e DPOC

A fim de determinar a associação entre RGE e DPOC, usamos um modelo de efeito fixo (Q = 0,39; p = 0,94). A análise combinada revelou uma prevalência significativamente maior de RGE em pacientes com DPOC do que naqueles sem DPOC (RR = 13,06; IC95%: 3,64-46,87; z = 3,94; t2 = 0,0; p < 0,001; Figura 4). A análise incluiu 476 pacientes de todos os estudos.



Discussão

A presente revisão sistemática com meta-análise mostrou que o RGE é um fator de risco para exacerbações da DPOC com base no maior risco de exacerbações e no aumento do número de exacerbações por ano nesses pacientes. Além disso, nossa análise mostrou uma associação significativa entre sintomas de RGE e diagnóstico de DPOC. Essa associação é corroborada pelo aumento da frequência de exacerbações por ano em pacientes com RGE.

Esta é a primeira meta-análise a investigar o papel do RGE como fator de risco de exacerbações da DPOC. As principais questões sobre o efeito do RGE nas exacerbações da DPOC são como as exacerbações são determinadas ou definidas e se tais determinações são realizadas de forma prospectiva ou retrospectiva. Estudos retrospectivos recentes(47,48) sugeriram que os sintomas de RGE se associaram a exacerbações; no entanto, nesses estudos, solicitou-se aos participantes que relatassem o número de exacerbações ocorridas no ano anterior, uma abordagem que poderia resultar em um viés de memória. Para resolver esse tipo de problema, outros estudos(19,45) usaram um sistema de coleta de dados baseado em questionário, que nos permitiu identificar as exacerbações de acordo com uma definição mais confiável de exacerbação de DPOC, como os critérios modificados por Anthonisen et al.(20) As análises prospectivas de Terada et al.(19) e Hurst et al.(4) apresentaram as informações mais confiáveis sobre exacerbações e foram os estudos mais influentes nos gráficos de floresta (forest plots) sobre o risco de exacerbações da DPOC associadas a RGE (Figura 5).



Quando foram usados critérios menos rígidos para a definição de exacerbação, encontramos um aumento da frequência de exacerbações em pacientes com RGE. Foi realizada uma análise preliminar de estudos com critérios menos rígidos,(40,41,48) a qual demonstrou uma tendência semelhante do risco de exacerbações (RR = 7,68), um aumento semelhante da frequência de exacerbações (aumento médio = 1,02 por ano) em pacientes com RGE e um aumento semelhante do risco de RGE associado a DPOC (RR = 2,82) em comparação com os resultados obtidos em nossa análise final (dados não apresentados). Embora apenas um estudo(44) tenha usado a pHmetria como padrão ouro para o diagnóstico de RGE, o risco de exacerbações e RGE em pacientes com DPOC apresentou boa homogeneidade nos estudos.

As exacerbações da DPOC são um desfecho importante na história natural da doença,(29,49-52) não só porque representam um fardo econômico considerável,(53) mas, mais importante, porque repetidas exacerbações da DPOC podem deteriorar a qualidade de vida relacionada à saúde, acelerar a progressão da doença(50-52) e levar a morte prematura.(3,50,52)

Com o tempo, as exacerbações da DPOC tornam-se mais frequentes e mais graves, e isso está associado a um comprometimento funcional cada vez maior.(52) Os fatores de risco de exacerbações repetidas incluem VEF1 baixo antes do tratamento,(4,49,51) aumento do uso de broncodilatadores ou corticosteroides,(4,48) exacerbações prévias (mais de duas nos últimos dois anos),(4,49) uso prévio de antibióticos(4,51) e presença de comorbidades.(4,29)

Estudos têm relatado taxas de mortalidade hospitalar de 11-24%(17) e de 35,6%(50) após dois anos. Pacientes com exacerbações frequentes apresentaram as maiores taxas de mortalidade (p < 0,001), com um risco de morte 4,3 vezes maior do que o dos pacientes que não necessitaram de tratamento hospitalar.(51) Assim, a exacerbação em si pode ser um fator significativo associado ao aumento da mortalidade em pacientes com DPOC; no entanto, a gravidade da doença de base pode influenciar o desfecho nos pacientes. Alguns estudos(4,19,45,47,48) demonstraram um aumento do número de exacerbações por ano relacionado ao RGE, porém sua associação independente com o RGE ainda precisa ser testada por meio de análise multivariada controlada adequadamente.(25)

Outra questão é a falta de um padrão ouro ou de medidas objetivas para diagnosticar RGE nos diferentes estudos, o que torna difícil selecionar estudos e homogeneizar os dados sobre o diagnóstico de RGE. A falta de um padrão ouro pode superestimar ou subestimar o RGE em algumas populações ou amostras. Pacientes com doenças respiratórias frequentemente experimentam um desconforto no peito que pode ser confundido com sintomas de refluxo, principalmente pirose, levando a uma superestimação dos sintomas de refluxo. De acordo com Sweet et al.,(6) os sintomas típicos de refluxo (pirose, regurgitação e disfagia), têm correlação limitada com o refluxo medido objetivamente, atingindo uma sensibilidade de 89,5% e uma especificidade de apenas 47,1%. Esses dados tornam os estudos baseados em questionários de sintomas imprecisos quando comparados com aqueles baseados em testes mais específicos, como a pHmetria de 24 h e a cintilografia do esôfago.(30) Em nossa meta-análise, 6 dos 7 estudos incluídos basearam-se em questionários, e, portanto, todas as conclusões devem ser inferidas a partir de sintomas de RGE como um fator de risco, já que não houve confirmação diagnóstica de RGE. No entanto, o impacto dos estudos baseados em questionários pode subestimar essa associação. O único estudo(44) incluído na presente meta-análise que tinha critérios objetivos demonstrou a mais forte associação entre sintomas de RGE e exacerbações da DPOC. Estudos prospectivos devem ser delineados de forma a identificar RGE objetivamente e demonstrar o impacto do tratamento do RGE nas exacerbações da DPOC.

Uma subanálise de pacientes com DPOC que receberam terapia antirrefluxo(47) mostrou que o número de exacerbações da DPOC por ano tendia a diminuir nos pacientes que tinham RGE controlado ou não sintomático. Em um ensaio controlado randomizado, Sasaki et al.(25) mostraram que o tratamento com lansoprazol (15 mg/dia) em pacientes com DPOC sem RGE foi capaz de evitar exacerbações da DPOC em 77% dos pacientes (OR = 0,23). Esses resultados devem ser vistos com precaução. Alguns autores(9,10) são céticos a respeito de tais dados, uma vez que a associação entre asma e RGE é aparentemente mais forte(14,16) que a associação entre DPOC e RGE. Além disso, em pacientes com asma, uma população na qual a probabilidade de refluxo ácido é maior, a supressão ácida intensa com esomeprazol (40 mg duas vezes ao dia) não reduziu o número de exacerbações.(11,13) Clinicamente, o refluxo ácido silencioso não é um preditor confiável do sucesso do tratamento antirrefluxo em pacientes com asma.(10)

O motivo de tal associação não é claro. A explicação mais comum é que a aspiração de refluxo, ácido ou não, aumenta a inflamação das vias aéreas e leva a um aumento do risco de exacerbações. No entanto, a ocorrência de bronquite crônica aumenta clinicamente o risco de exacerbações da DPOC. Uma análise comparativa de pacientes com DPOC com e sem bronquite crônica, corrigida para tabagismo, índice de massa corporal, uso de medicamentos, e função pulmonar, seria um argumento muito mais forte a favor da presença ou ausência de um papel desempenhado pelo RGE em exacerbações da DPOC do que a presente análise. No entanto, a diferenciação entre bronquite crônica e enfisema não foi realizada nos estudos incluídos aqui.(2) Podemos especular que há um risco maior de exacerbações da DPOC ou de RGE em pacientes com DPOC e história de bronquite crônica.

Alternativamente, vários investigadores(26,28,34,47,54,55) têm sugerido que a associação entre o RGE e uma vasta gama de doenças respiratórias é mais bem explicada pelas doenças que causam RGE ou contribuem para tal. Existem várias hipóteses plausíveis que apoiam essa explicação. Em primeiro lugar, a alta prevalência de hérnia de hiato se deve a tosse crônica associada a diferentes doenças pulmonares.(26,39) Embora não haja uma correlação perfeita entre hérnia de hiato e refluxo, é mais provável que ocorra refluxo na presença de uma hérnia de hiato maior.(10) O diafragma contribui para reduzir a função do esôfago, e qualquer alteração entre os dois afetará sua função. Em segundo lugar, os broncodilatadores também relaxam a musculatura lisa gastrointestinal e podem facilitar o refluxo, e algumas drogas, como a teofilina, aumentam a produção de ácido gástrico e, consequentemente, podem causar refluxo ácido.(18,27,38,48)

Em suma, os pacientes com DPOC e sintomas de RGE revelaram-se mais suscetíveis a exacerbações do que aqueles sem sintomas de RGE. Uma avaliação objetiva da presença de RGE em tais pacientes pode determinar estratégias futuras para reduzir ou controlar o RGE e, posteriormente, diminuir o número de exacerbações da DPOC.

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Trabalho realizado no Programa de Pós-Graduação em Ciências Médicas, Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC - Florianópolis (SC) Brasil.
Endereço para correspondência: Emilio Pizzichini. Universidade Federal de Santa Catarina, Hospital Universitário Campus Universitário, Trindade, CEP 88040-970, Florianópolis, SC, Brasil.
Tel./Fax: 55 48 3234-7711. Email: pizzichi@matrix.com.br
Apoio financeiro: Nenhum.
Recebido para publicação em 10/1/2013. Aprovado, após revisão, em 1/2/2013.

Sobre os autores

Thiago Mamôru Sakae
Professor de Epidemiologia. Programa de Pós-Graduação em Ciências Médicas, Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC - Florianópolis (SC) Brasil.

Márcia Margaret Menezes Pizzichini
Professora Adjunta. Programa de Pós-Graduação em Ciências Médicas, Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC - Florianópolis (SC) Brasil.

Paulo José Zimermann Teixeira
Professor Adjunto. Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre; e Médico. Pavilhão Pereira Filho, Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, Porto Alegre (RS) Brasil.

Rosemeri Maurici da Silva
Professora, Universidade do Sul de Santa Catarina, Florianópolis (SC)
Brasil.

Daisson José Trevisol
Professor. Universidade do Sul de Santa Catarina, Florianópolis (SC) Brasil.

Emilio Pizzichini
Professor Adjunto. Programa de Pós-Graduação em Ciências Médicas, Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC - Florianópolis (SC) Brasil.

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