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Artigo Original

Desfecho do tratamento da tuberculose em indivíduos com doença renal crônica no Brasil: uma análise multinomial

The outcome of tuberculosis treatment in subjects with chronic kidney disease in Brazil: a multinomial analysis

Barbara Reis-Santos, Teresa Gomes, Bernardo Lessa Horta, Ethel Leonor Noia Maciel

ABSTRACT

Objective: To analyze the association between clinical/epidemiological characteristics and outcomes of tuberculosis treatment in patients with concomitant tuberculosis and chronic kidney disease (CKD) in Brazil. Methods: We used the Brazilian Ministry of Health National Case Registry Database to identify patients with tuberculosis and CKD, treated between 2007 and 2011. The tuberculosis treatment outcomes were compared with epidemiological and clinical characteristics of the subjects using a hierarchical multinomial logistic regression model, in which cure was the reference outcome. Results: The prevalence of CKD among patients with tuberculosis was 0.4% (95% CI: 0.37-0.42%). The sample comprised 1,077 subjects. The outcomes were cure, in 58%; treatment abandonment, in 7%; death from tuberculosis, in 13%; and death from other causes, in 22%. The characteristics that differentiated the ORs for treatment abandonment or death were age; alcoholism; AIDS; previous noncompliance with treatment; transfer to another facility; suspected tuberculosis on chest X-ray; positive results in the first smear microscopy; and indications for/use of directly observed treatment, short-course strategy. Conclusions: Our data indicate the importance of sociodemographic characteristics for the diagnosis of tuberculosis in patients with CKD and underscore the need for tuberculosis control strategies targeting patients with chronic noncommunicable diseases, such as CKD.

Keywords: Tuberculosis/epidemiology; Renal insufficiency, chronic/epidemiology; Risk factors; Logistic models.

RESUMO

Objetivo: Analisar a associação de características clínicas e epidemiológicas de indivíduos com tuberculose e doença renal crônica (DRC) com os desfechos do tratamento da tuberculose no Brasil. Métodos: Entre 2007 e 2011, foram selecionados indivíduos com DRC e tuberculose utilizando o Sistema de Informação de Agravos de Notificação do Ministério da Saúde do Brasil. Foram comparados os desfechos do tratamento da tuberculose com características clínicas e epidemiológicas dos pacientes por um modelo hierárquico de regressão logística multinomial, no qual cura foi o desfecho de referência. Resultados: A prevalência de DRC entre os casos de tuberculose foi de 0,4% (IC95%: 0,37-0,42%). A amostra incluiu 1.077 indivíduos, cujos desfechos do tratamento da tuberculose foram os seguintes: cura, em 58%; abandono do tratamento, em 7%; óbito por tuberculose, em 13%; e óbito por outras causas, em 22%. As características que diferenciam as OR de abandono do tratamento e de óbito foram idade; alcoolismo; AIDS; abandono prévio; transferência para outra unidade de tratamento; suspeita de tuberculose em radiografia de tórax; baciloscopia inicial positiva; e indicação ou realização de tratamento diretamente observado. Conclusões: Os dados apontam para a importância das características sociodemográficas na determinação da tuberculose em indivíduos com DRC e reforçam a necessidade de estratégias de controle da tuberculose direcionadas a pacientes com doenças crônicas não transmissíveis, como a DRC.

Palavras-chave: Tuberculose/epidemiologia; Insuficiência renal crônica/epidemiologia; Fatores de risco; Modelos logísticos.

Introdução

A doença renal crônica (DRC) já é considerada uma pandemia.(1) Com as radicais mudanças nos hábitos e no estilo de vida, assim como com o envelhecimento da população, que ocorreram principalmente nas ultimas décadas do século XX e no início do século XXI, a DRC apresentou um expressivo crescimento de suas taxas de morbidade e mortalidade, e a expectativa é de que continue a crescer nos próximos anos.(1,2)



Indivíduos portadores de DRC possuem um sistema imunológico debilitado em consequência tanto do estado inflamatório crônico decorrente das terapias de substituição renal quanto da DRC e de outras comorbidades.(3) Assim, indivíduos com DRC, independentemente de estarem sob terapia de substituição renal, estão mais suscetíveis a doenças infecciosas(4) e, entre essas, a tuberculose.

A tuberculose também é reconhecidamente um problema global de saúde pública, cujo controle tem sido um desafio para diversas organizações governamentais e não governamentais em todo o mundo.(5,6) Nos últimos anos, o Brasil apresentou uma diminuição do número de casos, da taxa de incidência e da mortalidade por tuberculose. O país também alcançou avanços na detecção da doença e no manejo dos casos de coinfecção com o HIV e resistência às drogas. No entanto, ainda existem grandes obstáculos para que o Brasil consiga eliminar a tuberculose, tais como as dificuldades na investigação dos contatos e no diagnóstico na atenção primária, assim como a baixa taxa de cura entre os indivíduos tratados.(7,8)

Indivíduos portadores de DRC possuem um risco reconhecidamente aumentado para a tuberculose e, por conta de seu estado de imunossupressão, também possuem um pior desfecho durante o tratamento.(5) O Brasil possui uma grande e ascendente população de indivíduos com doenças crônicas não transmissíveis, entre elas, a DRC, e ainda apresenta uma alta prevalência de tuberculose na população geral e em grupos de risco.(9,10)

Dessa forma, com a convergência dessas duas pandemias e os indícios da ocorrência de um pior desfecho nessa população, consideramos que as investigações sobre o tema ainda não foram esgotadas e que são necessários estudos que identifiquem as características relacionadas com os desfechos desfavoráveis, levando em consideração as diferenças existentes entre os possíveis desfechos, já que esses implicam medidas de controle com graus de complexidade diferentes.

O objetivo do presente estudo foi analisar a associação de características clínicas e epidemiológicas de indivíduos acometidos por tuberculose e DRC com os desfechos do tratamento da tuberculose por meio de análise multivariável de regressão logística multinomial.

Métodos

O Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) é um dos sistemas de vigilância em saúde do Brasil, desenvolvido na década de 1990 com o objetivo de coletar e difundir informações que, no caso da tuberculose, contemplam dados sociodemográficos, história de saúde e características da doença e seu tratamento.(11) Análises de completude e qualidade das informações geradas foram realizadas ao longo dos anos, considerando essa base de dados uma importante e confiável fonte de informações.(12)

Entre os anos de 2007 e 2011, foram registrados no SINAN 432.958 casos de tuberculose no Brasil, entre os quais foram identificados 1.716 indivíduos relatados como também portadores de DRC (TB-DRC). Assim, foram comparados os desfechos do tratamento da tuberculose (cura, abandono, óbito por tuberculose e óbito por outras causas) de indivíduos TB-DRC com características clínicas e epidemiológicas. Os indivíduos TB-DRC que possuíam o status de encerramento do tratamento da tuberculose não conclusivo (ignorado, transferência ou mudança de diagnóstico) ou evolução para tuberculose resistente a múltiplas drogas foram excluídos do presente estudo.


Foram classificados como indivíduos TB-DRC todos aqueles que, no campo da base de dados do SINAN denominado "outras comorbidades", apresentavam a descrição de DRC, independentemente de seu estágio. Dessa forma, as seguintes descrições foram encontradas e incluídas: doença renal crônica, insuficiência renal crônica, nefropatia crônica, glomerulonefrite crônica, renal crônico, hemodiálise, transplante renal, transplante de rim, insuficiência renal dialítica e nefropata em diálise.

As variáveis relacionadas aos aspectos sociodemográficos foram as seguintes: gênero (feminino/masculino); idade (< 20 anos/20-39 anos/40-59 anos/ 60 anos); cor da pele (branca/preta/parda/outras); anos de estudo (analfabeto/1-4 anos/5-8 anos/9-12 anos/> 12 anos/não se aplica); área de residência (urbana ou periurbana/rural); e institucionalização (não/presídio/asilo/orfanato/hospital psiquiátrico/outros).

Quanto ao histórico de saúde, foram analisadas a presença/ausência de alcoolismo, diabetes mellitus, doença mental, AIDS e transplante renal. Também foram analisadas as seguintes variáveis relacionadas às características da tuberculose e de seu tratamento: tipo de tratamento (caso novo/recidiva/reingresso após abandono/transferência); prova tuberculínica (não reator/reator fraco/reator forte); radiografia de tórax (normal/suspeito); baciloscopia de escarro ou de outros materiais inicial (negativa/positiva); baciloscopia de escarro de acompanhamento no segundo mês (negativa/positiva); cultura de escarro ou de outros materiais (negativa/positiva); exame histopatológico (BAAR positivo/sugestivo de tuberculose/não sugestivo de tuberculose); forma da tuberculose (pulmonar/extrapulmonar/pulmonar + extrapulmonar); doença adquirida no trabalho (não/sim); indicação de tratamento diretamente observado (TDO; não/sim); e realização de TDO (não/sim).

O teste do qui-quadrado de Pearson ou a razão de verossimilhança foram utilizados na comparação das proporções, e as variáveis associadas com o desfecho de interesse (p < 0,10) foram incluídas no modelo hierárquico de regressão logística multinomial. A regressão logística multinomial é uma técnica útil para modelar simultaneamente probabilidades de desfechos com múltiplas categorias.(13) Na presente análise, "cura" foi a categoria utilizada como referência para a variável resposta, sendo essa comparada com as demais categorias (cura vs. abandono; cura vs. óbito por tuberculose; e cura vs. óbito por outras causas).

A partir de um modelo conceitual de determinação da tuberculose(14) e para dar conta das inter-relações existentes entre esses determinantes,(15) foram definidos três níveis hierárquicos: no primeiro nível foram incluídas as variáveis sociodemográficas; no segundo nível foram incluídas as variáveis mantidas no nível 1 (p < 0,10) e as comorbidades; e no terceiro nível foram incluídas as variáveis mantidas no nível 2 (p < 0,10) e aquelas relacionadas às características da tuberculose. Os resultados são apresentados em OR e IC95%. As análises foram realizadas com o programa estatístico STATA, versão 12.0 (StataCorp LP, College Station, TX, EUA).

O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal do Espírito Santo sob o número 121/06.

Resultados

Entre os anos de 2007 e 2011, a prevalência de DRC entre os casos de tuberculose registrados no SINAN foi de 0,4% (IC95%: 0,37-0,42%).

No presente estudo, foram avaliados 1.077 indivíduos TB-DRC. Os desfechos nessa amostra foram os seguintes: cura, em 628 indivíduos (58,3%); abandono do tratamento, em 79 (7,4%); óbito por tuberculose, em 137 (12,7%); e óbito por outras causas, em 233 (21,6%). Apenas 1 indivíduo evoluiu para tuberculose resistente a múltiplas drogas e, por isso, foi excluído das análises subsequentes. Foram excluídos ainda 638 indivíduos com os seguintes desfechos: ignorado, em 476; transferência, em 145; e mudança de diagnóstico, em 17.

A proporção de indivíduos classificados como curados após o tratamento da tuberculose foi menor entre aqueles com idade  60 anos (p < 0,001). Em contrapartida, não foram encontradas diferenças significativas na distribuição das variáveis gênero, cor da pele, escolaridade e área de residência em relação aos desfechos (Tabela 1).



Na Tabela 2, verificamos que a mortalidade por tuberculose e por outras causas foi alta entre os indivíduos identificados como alcoolistas (24,1% e 31,0%, respectivamente). Diabetes mellitus, doença mental e AIDS foram comorbidades menos prevalentes entre aqueles que tiveram o desfecho de cura.



As principais características clínicas da tuberculose e de seu tratamento encontram-se na Tabela 3. Entre aqueles indivíduos que iniciaram um novo tratamento após o abandono, o desfecho foi de cura, em 22,6%; abandono, em 32,2%; óbito por TB, em 22,6%; e óbito por outras causas, em 22,6% (p < 0,001).



Diferenças significativas foram encontradas nas distribuições da forma de apresentação da doença entre os desfechos do tratamento (p = 0,004). A forma concomitante da doença (pulmonar + extrapulmonar) apresentou uma menor proporção entre os indivíduos curados (46,4%) do que as formas pulmonar e extrapulmonar (58,4% e 60,4%, respectivamente).

Tanto para a indicação quanto para a realização de TDO houve diferença na distribuição das proporções (p = 0,005 e p = 0,029, respectivamente).

Para a análise multivariável de regressão logística multinomial, o modelo hierárquico foi definido da seguinte forma: no nível 1, idade; no nível 2, diabetes, alcoolismo, doença mental, AIDS e transplante renal; e no nível 3, tipo de tratamento, radiografia de tórax, baciloscopia inicial, forma da doença, indicação de TDO e realização de TDO. A variável prova tuberculínica, apesar de estatisticamente significativa, não foi incluída no modelo devido à baixa proporção de exames realizados.

Os principais achados dessa análise se encontram na Tabela 4. Verificou-se que, se comparados ao desfecho cura, indivíduos TB-DRC com idade  60 anos apresentaram menor OR para abandono (OR = 0,28; IC95%: 0,10-0,74) do que aqueles com menos de 20 anos.



Quanto às comorbidades, em relação ao desfecho cura, o alcoolismo foi associado tanto ao óbito por tuberculose (OR = 3,38; IC95%: 1,63-6,97) quanto ao óbito por outras causas (OR = 2,30; IC95%: 1,18-4,47). A presença de AIDS também esteve associada com óbito por outras causas (OR = 3,32; IC95%: 1,68-6,58).

O reingresso após o abandono do tratamento apresentou uma OR de 16,08 (IC95%: 5,41-47,82) para abandono em relação à cura, se comparado aos casos novos (referência), e de 4,82 (IC95%: 1,53-15,21) para óbito por tuberculose em relação à cura.

Os indivíduos com indicação de TDO apresentaram uma OR menor para abandono em relação à cura (OR = 0,33; IC95%: 0,12-0,92), mas uma OR maior para óbito por outras causas em relação à cura (OR = 1,71; IC95%: 1,03-2,85). Por outro lado, aqueles que realizaram TDO apresentaram uma OR menor para óbito por tuberculose (OR = 0,44; IC95%: 0,22-0,90), mesmo após o controle para as demais variáveis incluídas no modelo.

Discussão

A relação entre tuberculose e DRC vem sendo estudada ao longo dos anos.(16-18) O maior risco para o desenvolvimento de tuberculose entre os indivíduos portadores de DRC em estágio terminal já foi descrito em diversos estudos, podendo esse risco ser até 37 vezes maior naqueles cuja terapia de substituição renal é o transplante e de 10 a 25 vezes maior naqueles sob hemodiálise.(5,16) Entretanto, desconhecemos estudos que, entre indivíduos portadores de tuberculose ativa, tenham avaliado a prevalência de DRC, independentemente da realização de terapia de substituição renal.

O fato de terem sido avaliadas as associações entre a tuberculose, um já antigo problema global de saúde pública, e a DRC, um dos novos desafios deste século, reforça a importância e a pertinência do presente estudo. Contudo, algumas limitações devem ser consideradas. A prevalência de indivíduos TB-DRC pode ter sido subestimada, pelo fato de essa informação não ser de preenchimento obrigatório e depender do relato dos pacientes na hora da notificação, havendo, assim, a possibilidade de um viés de classificação, pelo qual indivíduos com DRC tenham sido classificados como sem DRC. No entanto, também é importante ressaltar que esse fato não interfere nas associações encontradas, uma vez que o relato de DRC não está relacionado com as variáveis estudadas.

Apesar de estudos ressaltarem o SINAN como uma fonte confiável de informações sobre a tuberculose, esses estudos apontam para limitações de completude de variáveis e para a subnotificação de casos e mortes por tuberculose.(12,19,20) Dessa forma, também se verificou a existência de indivíduos com informações ignoradas ou inconsistentes em algumas variáveis estudadas, e optamos por não excluí-las por conta do poder estatístico do estudo.

Nossos resultados mostraram que as características associadas com o abandono do tratamento da tuberculose foram os estratos etários, o retorno para o tratamento após abandono prévio e a indicação de TDO. As características associadas com o óbito por tuberculose foram a presença de alcoolismo, o retorno para o tratamento após abandono prévio, a presença de resultado suspeito para tuberculose em radiografia de tórax e a realização de TDO. Já as características que diferenciam a OR de óbito por outras causas em relação a cura no tratamento da tuberculose foram os estratos etários, a presença de alcoolismo, a presença de AIDS, a transferência do paciente para outra unidade de tratamento, a baciloscopia de escarro inicial positiva, e a indicação de TDO.

A associação entre o envelhecimento e um pior desfecho para o tratamento da tuberculose foi descrita em estudos prévios, indicando que as possíveis comorbidades que surgem durante o processo de envelhecimento possuem um papel fundamental no prognóstico da tuberculose.(21) A associação com o óbito por outras causas em relação à cura naqueles indivíduos TB-DRC com idade  60 anos confirma a importância das comorbidades nessa população, bem como nos sugere a possibilidade de uma relação bidirecional entre tuberculose e DRC; portanto, a DRC influencia o desfecho da tuberculose, assim como a tuberculose influencia o desfecho da DRC, conforme acontece com outras doenças crônicas não transmissíveis.(22)

Ainda em relação à idade, destaca-se uma menor OR para o abandono em relação à cura para aqueles acima de 20 anos. Esse dado diz a favor da qualidade do cuidado prestado pelas equipes de nefrologia do Brasil, que geralmente optam por um acompanhamento próximo de seus pacientes e adotam estratégias que promovam a adesão para o tratamento conservador, as terapias dialíticas ou o transplante renal, cujos resultados positivos podem ser extrapolados para o tratamento da tuberculose.(23)

O alcoolismo, outro importante e muito estudado fator de risco para tuberculose,(5,24) também aumentou a OR para óbito tanto por tuberculose quanto por outras causas em nosso estudo, o que indica uma necessidade urgente de modificação das estratégias de ação voltadas para o controle do alcoolismo, pautando-as em medidas que deem conta da determinação social da tuberculose.(14)

Apesar dos grandes avanços alcançados com as colaborações entre os programas para o controle da tuberculose e para o controle de HIV/AIDS,(6) a infecção por HIV/AIDS continua aumentando o risco para um pior desfecho em indivíduos com tuberculose,(25) o que também foi verificado em nosso estudo. Uma recente revisão sistemática e meta-análise sugere que, para esses indivíduos, o tratamento da tuberculose deva ser estendido por um período maior do que 8 meses para a melhora do desfecho.(25)

Embora não tenhamos verificado diferenças estatisticamente significativas na distribuição de institucionalização entre os desfechos, há registros de que a tuberculose é a principal causa de morte na população encarcerada em países em desenvolvimento.(26) Ainda, nesses indivíduos, o diagnóstico da tuberculose geralmente é tardio, e há grandes dificuldades de adesão ao tratamento.(27)

Indivíduos que retornaram ao tratamento após o abandono, em um estudo realizado na cidade de Campinas na década de 1990, apresentaram uma maior proporção de novo abandono do tratamento bem como de morte por tuberculose em comparação a casos novos, resultado esse semelhante ao encontrado em nosso estudo.(28)

A positividade de baciloscopia de seguimento tem sido relacionada com um desfecho desfavorável para o tratamento da tuberculose.(24) Não foi verificada essa associação em nosso estudo, mas o alto índice de exames não realizados em nossa amostra, assim como o fato de que aproximadamente 40% dos indivíduos apresentavam tuberculose extrapulmonar, uma vez que há uma menor positividade na baciloscopia nessa forma clínica,(29) podem ter influenciado esse dado.

Em resposta às dificuldades para a aderência ao tratamento da tuberculose e para enfrentar as graves consequências no desfecho de um tratamento subsequente, algumas estratégias têm sido adotadas com o objetivo de influenciar o comportamento dos profissionais de saúde, a organização dos serviços e também o comportamento daqueles com suspeita ou diagnóstico de tuberculose.(30) A estratégia de TDO lançada pela Organização Mundial de Saúde, apesar de ainda ser muito controversa, alcançou resultados positivos, auxiliando o controle da doença em diversas partes do mundo.(5,30) Na população estudada, os indivíduos que estiveram sob o TDO apresentaram uma OR menor para óbito por tuberculose, indicando que o TDO reduziu a OR de ocorrência de um desfecho negativo da tuberculose.

Dessa forma, o desfecho desfavorável para o tratamento da tuberculose não se mostrou relacionado com as características da tuberculose em nosso estudo. As principais associações com o abandono e óbito estiveram relacionadas com características sociodemográficas e com condições do histórico de saúde.


Acreditamos que, para o Brasil, país que possui um abrangente e reconhecido programa de controle da tuberculose, nossos dados indicam a importância das características sociodemográficas na determinação da tuberculose em indivíduos com DRC e reforçam a necessidade de estratégias de controle direcionadas a determinados grupos populacionais, priorizando principalmente os portadores de doenças crônicas não transmissíveis, como a DRC.

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* Trabalho realizado no Laboratório de Epidemiologia, Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória (ES) Brasil.
Endereço para correspondência: Ethel Leonor Noia Maciel, Avenida Marechal Campos, 1468, Maruípe, CEP 29040-091, Vitória, ES, Brasil.
Tel/Fax: 55 27 3335-7287. E-mail: ethel.maciel@gmail.com
Apoio financeiro: Este estudo recebeu apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) - Estudo de Doenças Negligenciadas-2006 e Edital Universal-2009, assim como do International Clinical Operational and Health Services Research and Training Award, Edital ICOHRTA 5 U2R TW006883-02.
Recebido para publicação em 15/12/2012. Aprovado, após revisão, em 22/7/2013.




Sobre os autores

Barbara Reis-Santos
Colaboradora. Laboratório de Epidemiologia, Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória (ES) Brasil.

Teresa Gomes
Colaboradora. Laboratório de Epidemiologia, Universidade Federal do Espírito
Santo, Vitória (ES) Brasil.

Bernardo Lessa Horta
Professor Associado. Universidade Federal de Pelotas, Pelotas (RS) Brasil.

Ethel Leonor Noia Maciel
Professora Adjunta. Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória (ES) Brasil.

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