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Cartas ao Editor

Distribuição da mortalidade por câncer de traqueia, pulmão e brônquios no Brasil segundo sexo, 1980-2010

Mortality distribution due to tracheal, lung, and bronchial cancer by gender, Brazil, 1980-2010

Raphael Mendonça Guimarães, Talami Sayole Costa Santos

Ao Editor:

O câncer de pulmão é o tipo mais comum de neoplasia no mundo em mortalidade e incidência.(1) O Instituto Nacional de Câncer estima que ocorreram 27.630 novos casos de câncer de pulmão no Brasil em 2010, tornando-se, respectivamente, o segundo e quarto tipo de câncer mais comum entre homens e mulheres,(2) com uma alta carga de doença atribuível a ele.(3)

Um grupo de autores,(4) ao avaliar o efeito idade-período-coorte, afirmaram que, no que diz respeito ao efeito de idade, há um aumento do risco desde as idades mais precoces. Com relação ao efeito de coorte, os autores referiram existir um menor risco de mortalidade entre os homens nascidos depois de 1950 e um risco cada vez maior em todos os grupos de mulheres. Finalmente, os resultados em relação às gerações mais jovens indicam que a tendência atual é provável que continue; o efeito coorte entre mulheres sugere uma tendência de aumento nas taxas de mortalidade, enquanto uma diminuição nas taxas entre homens com menos de 65 anos sugere que essa tendência irá continuar.

Estudos de tendências de mortalidade por câncer de pulmão no Brasil, publicados no Jornal Brasileiro de Pneumologia,(5,6) revelaram que a taxa de mortalidade ajustada por idade entre os homens aumentou de 10,6 mortes/100.000 habitantes em 1979 para 13,1 mortes/100.000 habitantes de em 2004. Durante o mesmo período, o aumento foi de 3,0 para 5,4 mortes/100.000 habitantes entre as mulheres. Mendonça et al.(7) observaram que, embora a magnitude da mortalidade por câncer de pulmão seja maior entre homens, o aumento da taxa de mortalidade ajustada à idade em mulheres (80%) era muito maior do que entre os homens (23,6%) no período estudado (1979-2003).

Passados 5 anos após aquelas publicações, entretanto, ao se observar a tendência da mortalidade, estratificada por sexo, um comportamento diferenciado pode ser evidenciado. Na Figura 1, apresenta-se a tendência linear da mortalidade por câncer de traqueia, pulmão e brônquios segundo o sexo. No período entre 1980 e 2010, observa-se, para a tendência linear, um aumento da mortalidade para ambos os sexos, ainda que em diferentes magnitudes para a taxa e para a tendência. Entretanto, ao realizar a análise de regressão joinpoint (ponto de inflexão), que permite o ajuste de dados de uma série a partir do menor número possível de joinpoints (zero, ou seja, uma reta sem pontos de inflexão) e que testa se a inclusão de mais joinpoints é estatisticamente significativa, observamos que o comportamento da tendência é diferente para cada gênero, conforme apresentado na Tabela 1. Observa-se, após a modelagem, que a aparente flutuação para o sexo masculino é explicada por diferentes tendências no período, com aumento da mortalidade para os períodos entre 1980 e 1995 (significativo) e entre 2000 e 2005, assim como um decréscimo da mesma nos períodos entre 1996 e 2001 e entre 2006 e 2010 (significativo). Já para as mulheres, a tendência é homogênea e de aumento para todo o período linearmente.






O estudo da mortalidade por análise de tendência do tempo pode ser um instrumento útil para a avaliação de câncer de traqueia, pulmão e brônquios, uma vez que fornece uma fonte de informação para apoiar a política de tomada de decisão, bem como servir como uma ferramenta para auxiliar na avaliação do impacto das medidas de prevenção já em implementação.(8) Ainda, as tendências temporais podem refletir diferenças na estrutura da população (como idade), o acesso aos serviços de saúde e a qualidade de atendimento. As taxas de mortalidade também são influenciadas por risco de doença e fatores de proteção, o que pode mudar com o tempo e afetar diferentes grupos populacionais.(8)

Em 1996, o Brasil promulgou a lei federal 9.294/96, que restringe o uso e a propaganda de produtos derivados de tabaco em locais coletivos, públicos ou privados, à exceção das áreas destinadas para seu consumo, desde que isoladas e ventiladas (fumódromos).(9) Ainda, com o objetivo de se aproximar mais do artigo 8 da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco,(10) tratado internacional elaborado pela Organização Mundial da Saúde e do qual o Brasil é signatário, estados e municípios têm elaborados leis que eliminam a presença dos fumódromos e proíbem o consumo de cigarros, charutos, cachimbos e cigarrilhas em bares, restaurantes, casas noturnas, escolas, áreas comuns de condomínios e hotéis, supermercados, shoppings, etc.(10)

A política de controle do tabagismo no Brasil tem sido exitosa para prevenir a iniciação de jovens. Entretanto, é possível que ela atinja de forma diferenciada gêneros, classes econômicas e faixas etárias. Os dados apresentados sugerem que a dinâmica de prevalência de tabagismo no país varia em função do gênero. Nesse sentido, ações efetivas para a cessação de fumar e para a redução da iniciação entre jovens devem ser encaradas como prioridades, pois essas são realmente necessárias para reduzir o câncer de pulmão e outras doenças associadas ao tabaco.

Raphael Mendonça Guimarães
Professor Adjunto, Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro (RJ) Brasil

Talami Sayole Costa Santos
Aluna em Promoção da Saúde e Desenvolvimento Humano, Instituto de Estudos em Saúde Coletiva, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro (RJ) Brasil


Referências

1. Ferlay J, Shin HR, Bray F, Forman D, Mathers C and Parkin DM. GLOBOCAN 2008 v2.0, Cancer Incidence and Mortality Worldwide: IARC CancerBase No. 10 [Internet]. Lyon, France: International Agency for Research on Cancer; 2010 [cited 2013 Jan 1]. Available from: http://globocan.iarc.fr

2. Instituto Nacional de Câncer. Estimativa 2010: incidência de câncer no Brasil. Rio de Janeiro: Instituto Nacional de Câncer; 2009.

3. Schmidt MI, Duncan BB, Azevedo e Silva G, Menezes AM, Monteiro CA, Barreto SM, et al. Chronic non-communicable diseases in Brazil: burden and current challenges. Lancet. 2011;377(9781):1949-61. http://dx.doi.org/10.1016/S0140-6736(11)60135-9

4. Souza MC, Vasconcelos AG, Cruz OG. Trends in lung cancer mortality in Brazil from the 1980s into the early 21st century: age-period-cohort analysis. Cad Saude Publica. 2012;28(1):21-30. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012000100003 PMid:22267062

5. Boing AF, Rossi TF. Temporal trend in and spatial distribution of lung cancer mortality in Brazil between 1979 and 2004: magnitude, regional patterns, and gender-related differences. J Bras Pneumol. 2007;33(5):544-51. PMid:18026652

6. Malta DC, Moura Ld, Souza Mde F, Curado MP, Alencar AP, Alencar GP. Lung cancer, cancer of the trachea, and bronchial cancer: mortality trends in Brazil, 1980-2003. J Bras Pneumol. 2007;33(5):536-43. PMid:18026651

7. Silva GA, Noronha CP, Santos MO, Oliveira JF. Diferenças de gênero na tendência de mortalidade por câncer de pulmão nas macrorregiões brasileiras. Rev Bras Epidemiol. 2008;11(3):411-9. http://dx.doi.org/10.1590/S1415-790X2008000300008

8. González Diego P, Jiménez Buñuales MT, Viñes JJ. Effect of birth cohort, period of diagnosis and age on cancer incidence in Navarra, 1973-1997 [Article in Spanish]. An Sist Sanit Navar. 2005;28(3):389-402. PMid:16421617

9. Brasil. Casa Civil. Lei nº 9.294, de 15 de julho de 1996. Dispõe sobre as restrições ao uso e à propaganda de produtos fumígeros, bebidas alcoólicas, medicamentos, terapias e defensivos agrícolas, nos termos do §
4° do art. 220 da Constituição Federal.

10. Instituto Nacional de Câncer. Convenção-quadro para o controle do tabaco. Texto oficial. Rio de Janeiro: INCA; 2011.

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