ABSTRACT
Bronchial stenosis can impair regional lung ventilation by causing abnormal, asymmetric airflow limitation. Electrical impedance tomography (EIT) is an imaging technique that allows the assessment of regional lung ventilation and therefore complements the functional assessment of the lungs. We report the case of a patient with left unilateral bronchial stenosis and a history of tuberculosis, in whom regional lung ventilation was assessed by EIT. The EIT results were compared with those obtained by ventilation/perfusion radionuclide imaging. The patient was using nasal continuous positive airway pressure (CPAP) for the treatment of obstructive sleep apnea syndrome. Therefore, we studied the effects of postural changes and of the use of nasal CPAP. The EIT revealed heterogeneous distribution of regional lung ventilation, the ventilation being higher in the right lung, and this distribution was influenced by postural changes and CPAP use. The EIT assessment of regional lung ventilation produced results similar to those obtained with the radionuclide imaging technique and had the advantage of providing a dynamic evaluation without radiation exposure.
Keywords:
Tomography; Electric impedance; Positive-pressure respiration; Pulmonary ventilation; Airway obstruction; Tuberculosis, pulmonary.
RESUMO
A estenose brônquica pode comprometer a ventilação pulmonar regional devido a limitações anormais e assimétricas ao fluxo aéreo. A tomografia de impedância elétrica (TIE) é uma técnica que possibilita a avaliação da ventilação pulmonar regional por imagem e, portanto, pode complementar a avaliação funcional dos pulmões. Relatamos o caso de uma paciente com estenose brônquica unilateral à esquerda, pós-tuberculose, em que se avaliou a ventilação pulmonar regional através da TIE, relacionando-a com a cintilografia de ventilação/perfusão. Foram estudados os efeitos das mudanças posturais e da aplicação de continuous positive airway pressure (CPAP, pressão positiva contínua nas vias aéreas) nasal, uma vez que a paciente usava esse tratamento para síndrome da apneia obstrutiva do sono. A TIE demonstrou distribuição heterogênea da ventilação pulmonar regional com maior ventilação no pulmão direito, sendo essa distribuição influenciada pelas mudanças de decúbitos e pela aplicação de CPAP. A análise da ventilação pulmonar regional pela TIE se mostrou similar aos achados da cintilografia pulmonar de ventilação com a vantagem de possibilitar uma avaliação dinâmica e sem exposição à radiação.
Palavras-chave:
Tomografia; Impedância elétrica; Respiração com pressão positiva; Ventilação pulmonar; Obstrução das vias respiratórias; Tuberculose pulmonar.
IntroduçãoA tuberculose persiste como um sério problema de saúde pública mundial, podendo causar diversas sequelas no trato respiratório, sendo uma delas a estenose brônquica.(1-5) Essa pode causar dispneia por obstrução ao fluxo aéreo, com o agravante de se caracterizar frequentemente por lesões assimétricas das vias aéreas proximais. O brônquio fonte esquerdo é particularmente suscetível a essa complicação.(6,7)
As provas de função pulmonar avaliam os pulmões de forma global, mas nada informam sobre as alterações regionais da ventilação. Essas costumam ser avaliadas por exames de cintilografia com radioisótopos, que têm alto custo e são pouco disponíveis em nosso meio.
A tomografia de impedância elétrica (TIE) é uma técnica que possibilita a reconstrução de imagens de um corte axial dos pulmões, em tempo real, de forma dinâmica e segura, permitindo a avaliação da ventilação pulmonar regional.(8) Trata-se de uma ferramenta particularmente promissora em casos de doença pulmonar assimétrica, como ocorre na estenose brônquica unilateral.
Apresentamos o caso de uma paciente com estenose do brônquio fonte esquerdo e síndrome da apneia obstrutiva do sono (SAOS), tratada com continuous positive airway pressure (CPAP, pressão positiva contínua nas vias aéreas) nasal, e a ventilação pulmonar regional foi avaliada por TIE, ressaltando os efeitos das variações de decúbitos e da aplicação de CPAP sobre a mesma.
Relato de casoPaciente do sexo feminino, 53 anos, não tabagista, com história de tuberculose tratada aos 20 anos de idade, relatava dispneia progressiva há três anos. Na ausculta pulmonar, havia roncos e sibilos no hemitórax esquerdo.
Foi realizada espirometria que mostrou CVF, 2,56 L (88%); VEF1, 1,81 L (77%); VEF1/CVF, 0,71 (88%); e FEF25-75%:, 1,15 L/s (50%). Esses resultados são compatíveis com distúrbio ventilatório obstrutivo leve. Não houve variação significativa à prova broncodilatadora.
As reconstruções digitais de imagens de TC do tórax mostraram uma redução do calibre do brônquio fonte esquerdo, iniciando na sua origem e chegando a 4,8 cm na sua extensão, com 0,5 cm de largura (Figura 1A-D). A expiração forçada agravava a estenose brônquica, chegando a um colapso quase total e causando aprisionamento aéreo no pulmão esquerdo. A cintilografia de ventilação e perfusão (Figura 1E e 1F) mostrou o fluxo sanguíneo e a ventilação direcionados para o pulmão direito (68%). A broncoscopia confirmou a estenose brônquica à esquerda demonstrada na TC de tórax.
Empregou-se um aparelho de TIE de 32 eletrodos (DX 1800, Dixtal Biomédica, Manaus, Brasil)(6,7) para o estudo da ventilação pulmonar regional, assim como dos efeitos da adoção de diferentes decúbitos - decúbito dorsal (DD), decúbito lateral direito (DLD) e decúbito lateral esquerdo (DLE) - e da aplicação de CPAP de 10 cmH2O. Em todas as situações, a paciente permaneceu por 10 min deitada, com a cabeceira elevada a 30°, com um intervalo de 5 min entre as medidas nas diferentes condições.
A Figura 2 apresenta mapas funcionais da distribuição da ventilação pulmonar regional nos diferentes decúbitos, em respiração espontânea e com CPAP nasal, obtidos pela TIE.
O Vídeo 1 (disponível no site do Jornal Brasileiro de Pneumologia, tp://www.jornaldepneumologia.com.br/detalhe_artigo_pre_visualizar.asp?id=2ht236) demonstra de forma dinâmica a ventilação regional nos vários decúbitos em respiração espontânea e com a aplicação de CPAP. Em respiração espontânea, é possível evidenciar que a ventilação foi direcionada quase totalmente para o lado direito, sendo visualizada através da coloração azul clara; quanto mais claro o tom de azul, maior a ventilação naquela área. Com a aplicação de CPAP, ocorreu uma distribuição de parte da ventilação para o pulmão esquerdo.
Vídeo clique aquiDiscussãoNo presente caso, em respiração espontânea, a distribuição relativa da ventilação pulmonar regional foi sempre maior no pulmão direito, com valores de 91%, 82% e 58% para DD, DLD e DLE, respectivamente, o que mostra o efeito da estenose brônquica sobre a distribuição da ventilação pulmonar regional e a influência da variação postural (Figura 2). As imagens obtidas com a TIE são compatíveis com aquelas da cintilografia de ventilação pulmonar.
Em indivíduos sadios em respiração espontânea e em DD, a ventilação pulmonar regional é maior nas zonas dependentes em relação às não dependentes, fenômeno fisiológico já bem documentado por estudos com TIE. Os estudos com TIE em voluntários sadios têm demonstrado a marcada influência da variação postural sobre a distribuição da ventilação pulmonar. Estudos que analisaram a ventilação pulmonar regional em voluntários sadios demonstraram que essa ventilação é invariavelmente maior para o pulmão dependente nos decúbitos laterais.(9,10)
Com a aplicação de CPAP de 10 cmH2O, as diferenças na distribuição regional da ventilação foram aumentadas. A distribuição gravitacional da ventilação se deu em maior grau para as zonas dependentes nos decúbitos estudados. No caso do DD, o uso de CPAP causou uma discreta redistribuição da ventilação regional para o pulmão esquerdo, predominantemente para sua porção dorsal. Em contrapartida, o DLD amplificou a assimetria da ventilação, concentrando quase totalmente a ventilação no pulmão direito. No DLE, a ventilação foi aumentada para o pulmão dependente de 42% para 48%, possivelmente por broncodilatação mecânica do brônquio esquerdo pela aplicação de CPAP.(8)
O presente caso reforça o interesse na utilização da TIE para a avaliação da ventilação pulmonar regional, especialmente na lesão assimétrica das vias aéreas. Além disso, a TIE tem a vantagem, em relação à cintilografia, de ser um exame de alta resolução temporal que avalia de forma dinâmica os efeitos das mudanças de decúbitos e da aplicação de CPAP.
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* Trabalho realizado na Universidade Federal do Ceará, Fortaleza (CE) Brasil.
Endereço para correspondência: Liégina Silveira Marinho. Avenida Gonçalves Dias, 509, Rodolfo Teófilo, CEP 60431-145,
Fortaleza, CE, Brasil.
Tel. 55 85 3366-8499. E-mail: lieginasm@gmail.com
Apoio financeiro: Este estudo recebeu apoio financeiro da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
Carlos Augusto Barbosa da Silveira Barros e Marcelo Silveira Matias são bolsistas do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação
Científica (PIBIC), vinculado ao Laboratório da Respiração da Universidade Federal do Ceará.
Recebido para publicação em 19/10/2012. Aprovado, após revisão, em 25/1/2013.
Sobre os autoresLiégina Silveira Marinho
Mestranda. Programa de Pós-Graduação em Ciências Médicas, Universidade Federal do Ceará; e Pesquisadora. Laboratório da
Respiração, Centro de Biomedicina, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza (CE) Brasil.
Nathalia Parente de Sousa
Mestranda. Programa de Pós-Graduação em Ciências Médicas, Universidade Federal do Ceará; e Pesquisadora. Laboratório da
Respiração, Centro de Biomedicina, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza (CE) Brasil.
Carlos Augusto Barbosa da Silveira Barros
Acadêmico de Medicina. Universidade Federal de Ceará, Fortaleza (CE) Brasil.
Marcelo Silveira Matias
Acadêmico de Medicina. Universidade Federal de Ceará, Fortaleza (CE) Brasil.
Luana Torres Monteiro
Doutoranda. Programa de Pós-Graduação em Biotecnologia, Universidade Federal de Ceará, Fortaleza (CE) Brasil.
Marcelo do Amaral Beraldo
Pesquisador. Universidade de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.
Eduardo Leite Vieira Costa
Médico Intensivista. Hospital Sírio-Libanês; e Pesquisador. Universidade de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.
Marcelo Britto Passos Amato
Supervisor da UTI-Respiratória. Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.
Marcelo Alcantara Holanda
Professor Associado. Departamento de Medicina Clínica, Universidade Federal de Ceará, Fortaleza (CE) Brasil.