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Comunicação Breve

Medidas de controle dispensadas a contatos ≤ 15 anos de casos índices com tuberculose pulmonar ativa

Control measures to trace ≤ 15-year-old contacts of index cases of active pulmonary tuberculosis

Cláudia Di Lorenzo Oliveira1, Angelita Cristine de Melo2, Lílian Ruth Silva de Oliveira3, Emerson Lopes Froede1, Paulo Camargos3

ABSTRACT

This was descriptive study carried out in a medium-sized Brazilian city. In ≤ 15-year-old contacts of index cases of active pulmonary tuberculosis, we assessed compliance with the Brazilian national guidelines for tuberculosis control. We interviewed 43 contacts and their legal guardians. Approximately 80% of the contacts were not assessed by the municipal public health care system, and only 21% underwent tuberculin skin testing. The results obtained with the Chi-square Automatic Interaction Detector method suggest that health care teams have a biased attitude toward assessing such contacts and underscore the need for training health professionals regarding tuberculosis control programs.

Keywords: Tuberculosis, pulmonary\epidemiology, Tuberculosis, pulmonary\prevention and control; Contact tracing.

RESUMO

Estudo descritivo realizado em uma cidade de médio porte no Brasil. Em contatos ≤ 15 anos de casos índices de tuberculose pulmonar ativa, avaliamos o cumprimento das etapas do manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil. Foram entrevistados 43 contatos e seus responsáveis legais. Aproximadamente 80% deles não foram avaliados pelo sistema de saúde pública municipal e apenas 21% realizaram a prova tuberculínica. Os resultados obtidos pelo método Chi-square Automatic Interaction Detector sugerem que as equipes de saúde têm uma postura tendenciosa quanto à avaliação desses contatos e ressaltam a necessidade de capacitação desses profissionais na adequada abordagem dos contatos no âmbito de programas de controle da tuberculose.

Palavras-chave: Tuberculose pulmonar\epidemiologia; Tuberculose pulmonar\prevenção & controle; Busca de comunicante.

A avaliação dos contatos é uma das etapas essenciais previstas nos programas de controle da tuberculose e tem como objetivo diagnosticar ou afastar infecção latente ou tuberculose ativa nesses indivíduos.(1)

No Brasil, as atividades que devem ser desenvolvidas pelos serviços de saúde com os contatos estão descritas em um manual de recomendações para o controle da tuberculose do Ministério da Saúde.(1) Nele, estão previstas cinco etapas para essa avaliação, a saber, convite para os contatos comparecerem à unidade de saúde para serem avalia-dos, entrevista pela equipe de saúde, realização da prova tuberculínica, realização de radiografia de tórax e, quando indicado, prescrição de tratamento para a infecção latente da tuberculose (ILTB) ou, se for o caso, para tuberculose ativa.(1)

A despeito de sua importância estratégica, tais medidas têm apresentado baixos índices de cumprimento (até cerca de 60%) no Brasil,(2,3) ao passo que, em países desenvolvidos, a aplicação das medidas de controle e vigilância acima citadas atinge cerca de 90% dos indivíduos.(4)

O presente estudo teve como objetivo verificar o cumprimento das etapas aplicáveis a contatos ≤ 15 anos de idade de casos índices de tuberculose pulmonar ativa.

Trata-se de um estudo descritivo realizado em um município de médio porte no centro-oeste do Estado de Minas Gerais. Minas Gerais é o segundo estado mais populoso e o terceiro em importância econômica para o Brasil; o município em estudo é um polo regional para atenção à saúde para 55 municípios e possuía entre 2007-2010 uma população residente média de 213.501 habitantes.(5)

Os critérios de inclusão dos contatos foram os seguintes: ter idade ≤ 15 anos; ser residente no município em estu-do; e ser contato de casos de tuberculose pulmonar ativa notificados entre janeiro de 2007 e dezembro de 2010, segundo os registros do Sistema de Informação de Agravos de Notificação. A localização dos casos índices foi feita através do endereço disponível nas fichas de notificação e de investigação de tuberculose que alimentam esse sis-tema.

A coleta das informações sobre os contatos ocorreu em dezembro de 2010 e foram obtidas por meio da aplicação de um instrumento codificado e estruturado, em visita domiciliar; da verificação, no sistema de informação municipal de saúde, da realização ou não, até dois anos após a época da notificação do caso índice, de prova tuberculínica e radiografia de tórax; e da verificação da prescrição e adesão ao tratamento da ILTB pelos registros de dispensação de isoniazida.

A análise estatística compreendeu a realização de testes descritivos e análises bivariadas e multivariadas que tive-ram como variável resposta o cumprimento ou não das etapas da avaliação dos contatos através do algoritmo CHAID (acrônimo para CHi-square Automatic Interaction Detector),(6) com validação cruzada de 10 subamostras, máximo de 10 nós, 5 casos no nó filho. A separação entre os nós foi realizada pelo teste do qui-quadrado de Pearson e ajustado pelo método de Bonferroni. As variáveis explicativas foram o grau de contato e de parentesco dos conta-tos com o caso índice, o gênero, o número de cômodos existentes na residência do caso índice e o número de pesso-as residentes na mesma moradia. Para a análise da segunda etapa (entrevista com a equipe de saúde), além das variáveis citadas anteriormente, foram ainda incluídas a realização ou não de visita domiciliar e o convite para o comparecimento ao serviço de saúde.

O projeto de pesquisa e o respectivo termo de consentimento livre e esclarecido foram submetidos e aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos do Hospital São João de Deus - o único comitê do gênero existente no município à época de realização da pesquisa - sob o número 63/2011.

No período entre janeiro de 2007 e dezembro de 2010 foram realizadas 135 notificações de casos de tuberculose, das quais 54 (40%) representavam pacientes com tuberculose pulmonar ativa e, portanto, elegíveis para o estudo. Foram excluídos 11 pacientes (20,4%) porque não havia registros dos seus endereços, 18 (34,2%) porque não cum-priram os critérios de inclusão, a saber: 13 (24,0%), porque não tinham contatos ≤ 15 anos na época do diagnóstico, 5 (9,2%), porque residiam em outros municípios e, finalmente, 2 (3,7%), porque se recusaram a participar do estudo. Restaram, assim, 21 casos índices (38,9%), que foram revisitados no período entre julho de 2011 e fevereiro de 2013 e a partir dos quais foram identificados 43 contatos que preencheram os critérios de inclusão.

A Tabela 1 apresenta as características gerais da população estudada.

Entre os 43 contatos, todos foram vacinados com BCG, 22 (51,2%) eram do sexo masculino, 40 (93,0%) residiam com cinco ou mais pessoas na mesma moradia, 25 (58,1%) tinham contato frequente com o caso índice, e 25 (58,1%) declararam renda familiar de até dois salários mínimos.

A Figura 1 contém a árvore de decisão para as três primeiras etapas da avaliação dos contatos. Nela, destacam-se a ausência de convite para os contatos comparecerem ao serviço de saúde (em 44,2%; Figura 1A), a ausência de entrevista pela equipe de saúde (em 65,1%; Figura 1B), assim como de realização da prova tuberculínica (em 79,1%; Figura 1C). Observa-se, ainda, que o convite para comparecer ao serviço de saúde esteve associado apenas ao número de cômodos da moradia (proxi para nível socioeconômico), com predomínio para aqueles com menor número de cômodos (76,9%; Figura 1A). Não foram estatisticamente significativas as variáveis grau de contato e nível do sistema de saúde onde ocorreu o atendimento.



A realização da entrevista com os contatos e seus familiares foi determinada pelo recebimento de orientações para o comparecimento ao serviço de saúde e a duração do contato. Apenas 24 contatos (55,8%; Figura 1A) foram convi-dados a comparecer ao serviço de saúde, ao passo que, entre esses, a taxa de comparecimento foi de 62,5%.

A variável mais significativa (p < 0,0001) para a realização da prova tuberculínica foi a avaliação médica, ou seja, 77,8% daqueles que foram avaliados por um profissional médico realizaram a prova, o que denota a centralização da avaliação em um único profissional. Nas situações em que o contato não foi avaliado por um profissional médico, a segunda variável explicativa foi a entrevista pela equipe de saúde. (Figura 1B)

As duas últimas etapas da avaliação dos contatos não integraram a árvore de decisão porque não foram aplicadas a todos os contatos; elas são indicadas de acordo com o resultado obtido na avaliação da etapa anterior, ou seja, a realização de radiografia de tórax depende do resultado da prova tuberculínica, assim como o tratamento da ILTB ou da tuberculose ativa depende do resultado desses dois exames.

O tratamento para ILTB deveria ter sido indicado para pelo menos 2 dos contatos; porém, apenas 1 deles (2,3%) recebeu o tratamento e por apenas cerca de 30 dias.

A revisão da literatura não identificou nenhum estudo sobre a avaliação de contatos que tivesse utilizado o método CHAID, estratégia de análise estatística que permite identificar os pontos críticos de cada etapa da investigação desses indivíduos.

Como demonstrado no presente estudo, a avaliação dos contatos evidenciou índices de cumprimento aquém do desejado. Um estudo realizado em Mato Grosso revelou que 60,5% dos contatos menores de 15 anos foram avalia-dos, e a proporção de contatos examinados foi 40,0% maior entre os expostos a casos bacilíferos, maior do que o verificado no presente estudo.(3) Em São José do Rio Preto (SP), os serviços de saúde municipais examinaram 63,1% dos comunicantes no ano de 2002.(2) A situação quase inversa, todavia, é observada em países desenvolvidos; neles, a proporção de contatos investigados varia de 80% a 90%, como é o caso, por exemplo, dos EUA e da Holan-da.(4,7)

É possível admitir a ocorrência de vieses na abordagem dos contatos. O primeiro deles sugere que somente as baixas condições socioeconômicas às quais estavam submetidos os contatos (percebidas, talvez, pelo tamanho das moradias, visto que aproximadamente 60% delas tinham no máximo seis cômodos; Tabela 1) favoreceriam a trans-missão da tuberculose. Entretanto, no presente estudo, tal situação não foi observada, pois apenas 11,6% dos conta-tos residiam com mais de cinco pessoas em moradias com até seis cômodos. O segundo viés permite especular que os profissionais de saúde parecem ter admitido que o risco de adoecimento seria mais elevado entre aqueles 60% (Tabela 1) cuja duração da exposição à fonte bacilífera tenha ocorrido nas primeiras 10 semanas e não após esse período (p < 0,01). Em outras palavras, esses profissionais acreditaram que, se os contatos não tivessem contraído tuberculose até aquele momento, não adoeceriam no futuro; essa percepção é totalmente equivocada. Observa-se, ademais, que, ao contrário das recomendações do Programa Nacional de Controle da Tuberculose, que estimula veementemente a participação de todos os profissionais de saúde,(2) a avaliação dos contatos esteve fortemente centralizada no médico no presente estudo.



Em conclusão, o presente estudo coloca em evidência a necessidade premente de capacitação das equipes de saú-de que atuam na rede básica para a adequada abordagem dos contatos e, muito especialmente, quando esses conta-tos estiverem expostos a pacientes bacilíferos.

AGRADECIMENTOS

Os autores externam seus agradecimentos a Abiqueila da Silva Conceição, Bruna Carolina Lapertosa Santos, Bru-na Pereira Bicalho e Samuel Milanez Carvalho, estudantes do curso de graduação em Medicina da Universidade Federal de São João Del-Rei, pela ajuda prestada durante as visitas domiciliares e a aplicação dos questionários.

REFERÊNCIAS

1. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.

2. Gazetta CE, Ruffino-Netto A, Pinto Neto JM, Santos Mde L, Cury MR, Vendramini SH, et al. Investigation of tuberculosis contacts in the tuberculosis control program of a medium-sized municipality in the southeast of Brazil in 2002. J Bras Pneumol. 2006;32(6):559-65. http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132006000600014

3. Hartwig SV, Ignotti E, Oliveira BF, Pereira HC, Scatena JH. Evaluation of surveillance of contacts of new tuberculosis cases in the state of Mato Grosso - Brazil. J Bras Pneumol. 2008:34(5):298-303. http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132008000500009

4. Anger HA, Proops D, Harris TG, Li J, Kreiswirth BN, Shashkina E, et al. Active case finding and prevention of tuberculosis among a cohort of contacts exposed to infectious tuberculosis cases in New York City. Clin Infect Dis. 2012;54(9):1287-95. http://dx.doi.org/10.1093/cid/cis029

5. Brasil. Ministério da Saúde. Departamento de Informática do SUS - DATASUS [homepage on the Internet]. Brasília: Ministério da Saúde [cited 2015 Feb 12]. População Residente - Minas Gerais. Available from: http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?ibge/cnv/popmg.def

6. Von Zuben FJ, Attux RR. Notas de aula IA004. Tópico 7 - Árvores de Decisão [database on the Internet]. Campinas: Unicamp. Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação. Departamento de Engenharia de Computação e Automação Industrial [cited 2015 Feb 12]. [Adobe Acrobat document, 44p.]. Available from: ftp://ftp.dca.fee.unicamp.br/pub/docs/vonzuben/ia004_1s10/notas_de_aula/topico7_IA004_1s10.pdf

7. Mulder C, Erkens CG, Kouw PM, Huisman EM, Meijer-Veldman W, Borgdorff MW, et al. Missed opportunities in tuberculosis control in The Netherlands due to prioritiza-tion of contact investigations. Eur J Public Health. 2012;22(2):177-82. http://dx.doi.org/10.1093/eurpub/ckr017

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