ABSTRACT
Tuberculosis treatment remains a challenge due to the need to consider, when approaching it, the context of individual and collective health. In addition, social and economic issues have been shown to be variables that need to be considered when it comes to treatment effectiveness. We conducted a critical review of the national and international literature on the treatment of tuberculosis in recent years with the aims of presenting health care workers with recommendations based on the situation in Brazil and better informing decision-making regarding tuberculosis patients so as to minimize morbidity and interrupt disease transmission.
Keywords:
Tuberculosis/drug therapy; Tuberculosis/prevention & control; Tuberculosis/surgery; Tuberculosis/classification.
RESUMO
O tratamento da tuberculose permanece um desafio em função da necessidade de que, em sua abordagem, seja considerado o contexto da saúde do indivíduo e da saúde coletiva. Adicionalmente, as questões sociais e econômicas têm-se mostrado como variáveis a ser consideradas na efetividade do tratamento. Ao revisarmos de forma crítica a literatura científica nacional e internacional sobre o tratamento da tuberculose nos últimos anos, tivemos como objetivos apresentar aos profissionais da área de saúde as recomendações baseadas na realidade brasileira e fornecer os subsídios necessários para a melhor tomada de decisão frente ao paciente com tuberculose, de modo a minimizar a morbidade e interromper a transmissão da doença Em função disso, o TDO é recomendado.
Palavras-chave:
Tuberculose/tratamento farmacológico; Tuberculose/prevenção & controle; Tuberculose/cirurgia; Tuberculose/classificação.
INTRODUÇÃOO tratamento da tuberculose tem como objetivo a cura e a rápida redução da transmissão da doença. Para que isso ocorra, os fármacos utilizados devem ser capazes de reduzir rapidamente a população bacilar (interrompendo a transmissão), prevenir a seleção de cepas naturalmente resistentes (impedindo o surgimento de resistência durante a terapia) e esterilizar a lesão (prevenindo a recidiva de doença).(1)
Embora a eficácia do esquema antituberculose seja de até 95%, a efetividade do tratamento (pacientes que se curam ao final do tratamento em condições de rotina) varia muito de acordo com o local, estando em torno de 70% (50-90%) na média nacional. Uma das causas associadas à baixa efetividade é a falta de adesão, que pode ocorrer em três níveis(2,3):
abandono do tratamento (paciente para de usar todos os medicamentos) ou
uso errado dos medicamentos (paciente usa alguns dos medicamentos prescritos) e/ou
uso irregular dos medicamentos (paciente toma os medicamentos alguns dias da semana, mas não to-dos os dias)
Os problemas de adesão são responsáveis tanto pela falência terapêutica quanto pela seleção de germes resistentes e recidiva de doença. Visando aumentar a adesão ao tratamento da tuberculose e reestruturar os serviços de saúde, desde o início da década de 90 a Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda a adoção da estratégia directly observed treatment, short course (DOTS, tratamento diretamente observado de curta duração). A estratégia DOTS inclui cinco elementos(4,5):
1. Compromisso político e apoio financeiro para a manutenção das atividades de controle da tuberculose
2. Identificação dos casos de tuberculose através da baciloscopia do escarro de sintomáticos respiratórios
3. Esquema de fármacos antituberculose padronizado e administrado através de programas de tratamento diretamente observado (TDO) pelo menos nos 2 primeiros meses de tratamento
4. Garantia do suprimento regular dos medicamentos antituberculose
5. Sistema de notificação e avaliação dos resultados do tratamento de cada paciente e do programa de controle de tuberculose como um todo
Apesar de a supervisão da tomada dos medicamentos através do TDO permitir o contato frequente do paciente com o sistema de saúde e favorecer a adesão ao tratamento, revisões sistemáticas não conseguiram demonstrar uma maior efetividade do TDO em comparação ao tratamento autoadministrado.(6-8) Isso provavelmente ocorre porque a efetividade do tratamento é na verdade ligada a vários fatores (Quadro 1) e não apenas à tomada do medicamento, que é uma variável ligada ao atendimento do paciente.
Apesar disso, o TDO continua sendo a prática padrão da maioria dos programas de tuberculose dos EUA e da Europa, pois parece estar significativamente associado com o aumento da conversão da baciloscopia do escarro (de positiva para negativa) durante o tratamento. Em função disso, o TDO é recomendado tanto na Europa e nos EUA para todas as formas de tuberculose. Em 1998, o Programa Nacional de Controle da Tuberculose (PNCT) implantou o TDO no Brasil, e, a partir de 2000, ocorreram ações de descentralização, com a extensão do controle da tuberculose para a atenção básica e a proposta de se expandir o TDO para 100% das unidades de saúde dos municípios prioritários e para pelo menos 80% dos pacientes bacilíferos desses municípios; no entanto, isso não ocorreu. Deve ser lembrado que a maior parte dos países que utiliza o TDO realiza tratamento intermitente (não diário), como é feito no Brasil.(1,2,9,10)
Existem situações em que o tratamento autoadministrado, no entanto, não pode ser usado e, nesses casos, to-dos os esforços visando o TDO devem ser feitos. Entre esses casos, podem ser incluídos os pacientes com tubercu-lose resistente ou com alto risco de desenvolvimento de resistência (indivíduos sem residência fixa; etilistas; usuários de drogas ilícitas; indivíduos incapazes de tomar medicação por conta própria devido a deficiências men-tais, emocionais ou físicas; crianças e adolescentes; indivíduos privados de liberdade; e indivíduos com história de falta de adesão ao tratamento).(11,12)
TUBERCULOSE E O SISTEMA DE SAÚDE BRASILEIROA tuberculose é uma doença de notificação compulsória no Brasil. Na notificação devem constar os dados de identificação do paciente, local de origem do caso, forma clínica da doença, comorbidades e, no campo 32 (forma de entrada) da ficha de notificação, deve ser informado o tipo de caso de tuberculose. Seguem as definições das formas de entrada dos casos de tuberculose no Sistema de Informação de Agravos de Notificação. Caso novo: indivíduo que nunca se submeteu ao tratamento antituberculose ou o realizou por até 30 dias. Retratamento ou reingresso após abandono: indivíduo já tratado para tuberculose por mais de 30 dias que necessite de novo tratamento por recidiva após cura ou retorno após abandono. Recidiva: o Manual de 2011 do PNCT define recidiva como o caso de tuberculose em atividade, já tratada e curada anteriormente, independentemente do tempo decorrido do tratamento anterior. Na recidiva da tuberculose, a solicitação de cultura e de teste de sensibilidade para Mycobacterium tuberculosis é mandatória, e a possibilidade de resistência aos fármacos antituberculose deve ser afastada. Até que os resultados da cultura e do teste de sensibilidade estejam disponíveis, deve ser iniciado o tratamento com o esquema básico. Essa definição operacional não distingue a recidiva por ausência de esterilização da lesão da reinfecção exógena, informação que pode ser relevante na avaliação da eficácia e efetividade tanto do tratamento quanto do programa de tuberculose. Estudos realizados na África, Europa e EUA sugerem que a maior parte dos casos de recidiva que ocorrem após dois anos da cura é devido à reinfecção e não à recidiva propriamente dita. De fato, o diagnóstico de certeza de recidiva de tuberculose se daria independentemente do tempo de alta por cura e se basearia na identificação do mesmo cluster de M. tuberculosis com base em técnica de biologia molecular (fingerprinting). Entretanto, no Brasil, esse teste somente está disponível em laboratórios de pesquisa e em alguns laboratórios privados. Ainda, no campo 32 (tipo de entrada), existem as seguintes possibilidades: "transferência", "pós-óbito" e "não sabe". O termo "transferência" é utilizado para a entrada de paciente vindo de outro município, e essa forma de entrada pode modificar os indicadores de tuberculose, pois esses dados são excluídos dos cálculos das taxas de diagnóstico e de desfechos do tratamento, como o abandono de tratamento. O mesmo ocorre com os termos: "não sabe" e "pós-óbito". Por isso, no Brasil, há dúvidas quanto à representatividade dos indicadores de tuberculose apresentados pelo PNCT.
O fornecimento de medicamentos antituberculose é gratuito, garantido pelo PNCT, e esses não estão disponíveis comercialmente. Esses medicamentos são amplamente distribuídos na rede de saúde pública, mas são entregues ao paciente apenas se for apresentada a ficha de notificação preenchida. A responsabilidade de preencher a notificação é do profissional de saúde que firma o diagnóstico de tuberculose e prescreve a medicação.(1,10,13,14)
TRATAMENTO DA TUBERCULOSETratamento da tuberculose em adultosNa década de 1940, foi iniciada a Campanha Nacional Contra a Tuberculose e, naquele período, dois medicamentos antituberculose eram utilizados: a estreptomicina e o ácido para-aminossalicílico. Na década de 1950, o Brasil optou por utilizar o esquema isoniazida e estreptomicina, duas vezes por semana. Nos anos 1960, diante da resistência bacteriana e da piora da mortalidade por tuberculose, foram iniciadas as padronizações de esquema terapêutico e foi padronizado o uso de isoniazida (H), estreptomicina (S) e pirazinamida (Z) por 18 meses (esquema HSZ). (15,16) Em meados dos anos 70, desenvolveu-se a quimioterapia antituberculose de curta duração, com rifampicina (R), isoniazida (H) e pirazinamida (Z) por 6 meses (esquema RHZ). O Brasil foi o primeiro país do mundo a padronizar o esquema de 6 meses na rede pública de saúde, com todas as drogas administradas via oral e distribuídas gratuitamente. Durante os anos 80, as cápsulas com a combinação RH foram implementadas, já com o objetivo de evitar resistência bacteriana adquirida. Em 2009, o Brasil introduz o uso de comprimidos com dose fixa combinada (DFC) e adiciona o etambutol (E) ao esquema RHZ, segundo o PNCT, com base nos resultados preliminares do II Inquérito Nacional de Resistência aos Medicamentos Antituberculose, que mostrou um aumento da resistência primária à isoniazida (de 4,4% para 6,0%). Adicionalmente, além da mudança da apresentação para DFC, as dosagens de isoniazida e pirazinamida dos comprimidos foram reduzidas na mudança do tratamento (de 400 mg para 300 mg e de 2.000 mg para 1.600 mg, respectivamente), sem a realização de estudos de biodisponibilidade e de bioequivalência. O esquema básico atualmente utilizado no Brasil para o tratamento de adultos com tuberculose sem suspeita clínica de resistência está apresentado no Quadro 2. Ele consiste de uma fase intensiva de 2 meses com o esquema RHZE sob a forma de DFC, seguido por uma fase de manutenção de 4 meses com esquema RH (DFC), sendo utilizado para todas as formas da doença em pacientes acima de 10 anos. A exceção é nos casos de pacientes com meningite por tuberculose, os quais, na fase de manutenção, são tratados por 7 meses e com a associação de um corticosteroide oral (prednisona, na dose 1-2 mg/kg/dia por 4 semanas) ou um corticosteroide i.v. (dexametasona, na dose de 0,3-0,4 mg/kg/dia, por 4-8 semanas).(10,15,16) Os medicamentos são em comprimidos em DFC. Cada comprimido contém 150 mg de rifampicina, 75 mg de isoniazida, 400 mg de pirazinamida e 275 mg de etambutol.
Segundo o manual de tuberculose do PNCT,(10) a segunda fase do tratamento poderá ser prolongada para 7 meses, após uma unidade de referência ser consultada, nos seguintes casos:
Portadores de HIV/AIDS
Pacientes com presença de poucos bacilos no exame direto do escarro no quinto ou sexto mês de tratamento, isoladamente, se acompanhada de melhora clinicorradiológica, sendo que o tratamento poderá ser prolon-gado por mais 3 meses, período no qual o caso deve ser redefinido ou concluído
Pacientes com exame direto do escarro negativo e evolução clinicorradiológica insatisfatória
Pacientes com formas cavitárias, que permaneçam com baciloscopia positiva ao final do segundo mês de trata-mento, sendo que, nesses casos, a solicitação de cultura e de teste de sensibilidade é mandatória
Pacientes que apresentem monorresistência à rifampicina ou isoniazida, identificada na fase de manutenção do tratamento, devendo ser realizada uma criteriosa avaliação da evolução clínica, bacteriológica e radiológica, além da adesão e da história de tratamento anterior para tuberculose em uma unidade de referência terciá-ria ou orientada por ela
De acordo com a literatura, são indivíduos com maiores riscos de recidiva de tuberculose (por não esterilização da lesão), por exemplo, aqueles que têm peso abaixo de 10% do ideal e que não ganham mais de 5% de peso na fase intensiva do tratamento; fumantes; e portadores de diabetes insulinodependente, HIV ou outra condição imunossupressora. Para esses, deve-se considerar o prolongamento do tratamento durante a fase de manutenção. Adicionalmente, pacientes que apresentem imagem de cavitação (diâmetro total ≥ 2 cm) na radiografia de tórax inicial, associada à cultura positiva para M. tuberculosis ao final das primeiras 8 semanas de tratamento (conclusão da fase intensiva do tratamento), também podem ter a fase de manutenção do tratamento estendida por 3 meses pelo risco maior de recidiva. Infelizmente, apenas 15-20% dos casos de tuberculose pulmonar são submetidos à cultura e ao teste de sensibilidade no Brasil.(1,17-23)
Nos casos de impossibilidade de uso do esquema básico por intolerância a dois ou mais medicamentos, está indicado o uso do esquema para tuberculose multirresistente (TBMR; Quadro 3). Nas situações de falência de tratamento (segundo o PNCT, persistência da positividade no escarro ao final do tratamento, indivíduos com baciloscopia positiva com resultados ++ ou +++ e que mantêm essa situação até o quarto mês de tratamento; e aqueles com positividade inicial seguida de negativação e nova positividade por 2 meses consecutivos, a partir do quarto mês de tratamento), deve-se prolongar a utilização do esquema básico até o resultado da cultura e do teste de sensibilidade. Devem ser considerados a possibilidade de infecção por micobactéria não tuberculosa, erro nas dosagens, irregularidade de uso e absorção inadequada dos medicamentos. A biodisponibilidade dos fármacos usados no tratamento da tuberculose (exceto rifapentina) é maior quando tomados com o estômago vazio (a biodisponibilidade da rifapentina aumenta em até 86% com refeições de alto teor de gordura). Se os medicamentos precisarem ser combinados com alimentos ou líquidos para a administração, devem ser evitados alimentos ricos em glicose ou lactose, pois essas reduzem a absorção da isoniazida. Poucas interações medicamentosas podem alterar substancialmente as concentrações das medicações para o tratamento da tuberculose; entretanto, as medicações para tratamento da tuberculose frequentemente causam alterações clinicamente relevantes nas concentrações de outras drogas.(1,10,24,25)
Tratamento da tuberculose em criançasNo Brasil, pacientes com menos de 10 anos de idade são tratados com três medicamentos: rifampicina (10 mg/kg), isoniazida (10 mg/kg) e pirazinamida (35 mg/kg). Esta decisão se baseia no menor risco de resistência à isoniazida em pacientes com pequena carga bacilar, como é mais comum na tuberculose infantil, e no risco de alterações visuais causadas pelo uso do etambutol, cujo diagnóstico pode ser difícil em crianças.(24,26,27)
Com base em revisões sistemáticas da literatura, a American Academy of Pediatrics(27) indica o tratamento com quatro fármacos na fase intensiva do tratamento, com a inclusão do etambutol, com o monitoramento da acuidade visual e da capacidade de discriminar as cores vermelha e verde. No caso de crianças cuja acuidade visual não pode ser monitorada, orienta-se que deve ser considerada a relação risco-benefício para o uso do etambutol, observando-se que o fármaco pode ser usado rotineiramente para tratar a tuberculose ativa em lactentes e crianças a menos que haja alguma outra contraindicação.(27) A OMS recomenda que crianças HIV negativas com tuberculose pulmonar que vivem em locais com baixa prevalência de HIV e de baixa prevalência de resistência à isoniazida podem ser tratadas com três drogas (esquema RHZ) na fase de indução, sem a adição de etambutol. No caso de crianças que vivem em locais com alta prevalência de HIV e/ou alta prevalência de resistência à isoniazida, o etambutol deve ser acrescentado ao esquema na fase de indução.(27,28)
Tratamento da tuberculose: conduta na interrupçãoEventualmente o paciente interrompe a tomada de medicamentos durante o tratamento. No Quadro 4 é apresentado o manejo desses casos em cada uma das circunstâncias.(1)
Desfechos do tratamento da tuberculoseAssim como a notificação do caso de tuberculose é obrigatória para o início do tratamento, o mesmo ocorre para o encerramento (desfecho) do caso. As definições de desfecho de tratamento estão citadas a seguir. Cura: indivíduo com tuberculose bacteriologicamente confirmada no início do tratamento que apresentou resultado negativo na baciloscopia ou na cultura no último mês de tratamento e em pelo menos uma ocasião prévia. Falência: indivíduo que apresenta baciloscopia ou cultura positiva no quinto mês ou posteriormente durante o tratamento. Abandono: indivíduo que interrompe o tratamento para tuberculose por um período ≥ 30 dias após a data prevista para seu retorno no tratamento autoadministrado ou 30 dias após a última ingestão de dose no TDO (para o manejo das interrupções do tratamento, ver Quadro 4). Óbito por tuberculose: óbito causado pela tuberculose e ocorrido durante o tratamento. Óbito por outra causa: óbito devido a causas diferentes da tuberculose e ocorrido durante o tratamento.(10,29)
Tuberculose resistenteOs casos de tuberculose resistente são classificados de acordo com a sensibilidade do M. tuberculosis às medicações de primeira e segunda linha usadas no tratamento medicamentoso dessa doença. A seguir, as definições dos principais termos usados na comunicação sobre os casos de tuberculose resistente. Tuberculose monorresistente: caso de tuberculose causado por bacilo resistente a um fármaco antituberculose de primeira linha. Tuberculose polirresistente: caso de tuberculose causado por bacilo resistente a mais de um fármaco antituberculose de primeira linha (exceto isoniazida e rifampicina, o que caracteriza multirresistência). TBMR: caso de tuberculose causado por bacilo resistente à rifampicina e à isoniazida. Tuberculose extensivamente resistente: caso de tuberculose causado por bacilo resistente à rifampicina, isoniazida, uma fluoroquinolona e ainda a pelo menos um dos três fármacos injetáveis de segunda linha (amicacina, canamicina ou capreomicina). Tuberculose resistente à rifampicina: resistência à rifampicina identificada por meio de um teste rápido molecular para tuberculose (podendo haver outras resistências ainda desconhecidas, já que uma grande proporção dos casos identificados com resistência à rifampicina também apresenta resistência à isoniazida).(29,30)
Além da classificação da tuberculose relacionada à sensibilidade do bacilo aos medicamentos, pode-se classificar a resistência micobacteriana em primária ou adquirida. A resistência primária ocorre na tuberculose causada por uma população bacilar primariamente resistente a algum fármaco antituberculose. Nesse caso, o indivíduo nunca fez uso de um fármaco antituberculose e é infectado por uma cepa já resistente, presumidamente transmitida por um caso de resistência adquirida. A resistência adquirida é aquela que surge em uma população bacilar inicialmente sensível aos fármacos antituberculose que posteriormente adquire resistência a algum desses. Como a frequência de mutações espontâneas é baixa e como o uso de uma apropriada combinação de fármacos no tratamento medicamentoso da tuberculose torna a ocorrência de resistência clinicamente significativa improvável, esse tipo de resistência é presumivelmente resultado de tratamento irregular ou inadequado.(1)
Tratamento da tuberculose resistenteO tratamento da tuberculose resistente depende do tipo de resistência apresentada. As condutas no caso de monorresistência e polirresistência estão descritas no Quadro 5.
A presença de multirresistência (resistência a RH ou a RH e outro fármaco de primeira linha) indica o uso do esquema de tratamento para TBMR. O tratamento da TBMR (Quadro 3) foi modificado com a incorporação da capreomicina (como medicação injetável de primeira escolha por apresentar menos efeitos colaterais e menos resistência cruzada com outros injetáveis), substituição do etambutol pela etionamida quando ocorrer resistência ao etambutol no teste de sensibilidade e utilização da levofloxacina (conforme recomendações da OMS). Observar que a pirazinamida deve ser sempre utilizada na fase intensiva do tratamento, mesmo quando o teste de sensibilidade mostrar resistência, pois há limitações para a interpretação do mesmo (não utilizar o fármaco somente em hepatotoxicidade ou efeitos adversos graves).(30)
Ao identificar tuberculose resistente à rifampicina por meio de um teste rápido molecular para tuberculose, iniciar o tratamento com o esquema recomendado (Quadro 4) e aguardar os resultados do teste de sensibilidade. Se o teste de sensibilidade evidenciar sensibilidade a todos os medicamentos, avaliar individualmente o risco de resistência. Em pacientes de baixo risco, iniciar o esquema básico, que deve ser administrado por 6 meses, independentemente do tempo de uso do esquema de TBMR. Em pacientes de alto risco (por exemplo, casos de retratamento, contatos de TBMR ou usuários de álcool e drogas), manter o esquema de TBMR.
Em pacientes que já usaram a capreomicina, utilizar amicacina como segunda opção em pacientes que não apresentem resistência a estreptomicina ao teste de sensibilidade e que não a tenham usado; ela pode ser considerada para uso em pacientes com histórico de tratamentos anteriores. Avaliar cada caso individualmente conforme as medicações utilizadas e os resultados dos testes de sensibilidade.(30)
O tratamento da tuberculose extensivamente resistente (Quadro 3) deve ser realizado em uma rede de assistência à saúde terciária, especializada no tratamento de tuberculose resistente. São utilizados esquemas individualizados e fármacos de reserva.(24)
Reações adversas ao tratamento da tuberculoseAs reações adversas mais frequentes do esquema RHZE são a mudança da coloração da urina (ocorre universalmente), intolerância gástrica (em 40% dos pacientes), alterações cutâneas (em 20%), icterícia (em 15%) e dores articulares (em 4%). Os principais fatores associados são idade (a partir da quarta década de vida), dependência química ao álcool (ingestão diária de álcool > 80 g), desnutrição (perda de mais de 15% do peso corporal), história de doença hepática prévia e coinfecção pelo HIV. No Quadro 6 estão apresentadas as condutas sugeridas nas principais reações adversas; é importante observar que, quando a reação adversa resultar de uma reação de hipersensibilidade (plaquetopenia, anemia hemolítica ou insuficiência renal), o medicamento suspeito não deve ser reiniciado após sua suspensão, pois a reação adversa é ainda mais intensa e grave na sua reintrodução.(10,24,31,32)
Em dois estudos observacionais no Brasil,(32,33) foi demonstrada uma frequência de reações adversas no uso do esquema RHZE de 47,5% e 83,4%, respectivamente, representando uma frequência maior do que a historicamente descrita; no entanto, não houve reações graves ou a necessidade de suspensão do tratamento. As reações adversas mais incidentes foram dor articular e reações gástricas, seguidas de reações de pele.(32,33)
TUBERCULOSE E HEPATOPATIAO risco de hepatite induzida pelos medicamentos usados no tratamento da tuberculose é maior nos hepatopatas, principalmente naqueles com doença hepática avançada, transplante hepático ou hepatite C, e, por isso, é necessária a monitorização das transaminases - transaminase glutâmico-pirúvica (TGP) e transaminase glutâmico-oxalacética (TGO) - e bilirrubinas a cada 1-4 semanas nos primeiros 2-3 meses.(1) Nos hepatopatas crônicos estáveis, assintomáticos, não cirróticos e com níveis de TGP ≤ 3 vezes o limite superior da normalidade (LSN), pode-se usar o esquema básico sem alterações; naqueles com níveis de TGP > 3 vezes o LSN, deve-se usar o esquema RHE por 2 meses na fase intensiva e RH por 7 meses na fase de manutenção.(34,35) Na doença hepática crônica, sintomática e com níveis de TGP > 3 vezes o LSN, podem-se usar os seguintes esquemas: HRES por 2 meses seguido por HE por 6 meses; HRE por 2 meses seguido por HE por 6 meses; HSE por 2 meses seguido por HE por 10 meses; ou SE + ofloxacina (O) por 3 meses seguido por EO por 9 meses. Nos cirróticos, usa-se o esquema com menor potencial hepatotóxico: RE + fluoroquinolona ou ofloxacina ou cicloserina, por 12-18 meses. Nos casos de hepatite aguda, deve-se tentar retardar o início do tratamento da tuberculose até a resolução da hepatite. Caso isso não seja possível, prescrever o esquema SE por 3 meses seguido de RH por 6 meses ou SEO por 3 meses seguido por RH por 6 meses (em tuberculose extensa) e ofloxacina em dose única (400 mg/dia) matinal, independentemente do peso.(1,10,11,24,27,34-40)
Um aumento transitório de TGP/TGO pode ocorrer durante as primeiras semanas de tratamento, sem significado clínico. O tratamento somente deve ser suspenso se houver anorexia, mal-estar e vômitos com nível de TGP > 3 vezes o LSN ou nível de TGP > 3 vezes o LSN, mesmo assintomático, se observada icterícia. Nos casos de hepatotoxicidade induzida pelo tratamento da tuberculose e TGP > 5 vezes o LSN, mesmo sem sintomas, o tratamento também deve ser suspenso.(1,10,24)
Após a suspensão do tratamento da tuberculose, investigar abuso de álcool e uso de outros medicamentos hepatotóxicos. Todo paciente com história de alcoolismo e em tratamento de tuberculose deve utilizar piridoxina (50 mg/dia) para a prevenção de neurite periférica. Nos casos graves e até que se detecte a causa da anormalidade ou em casos em que as transaminases e/ou bilirrubinas não normalizam após 4 semanas, sem tratamento, utilizar o esquema SEO por 3 meses seguido por EO por 9 meses, acrescido ou não de isoniazida. Em função da eficácia da isoniazida e, sobretudo, da rifampicina, deve ser sempre tentado seu uso, mesmo quando da pré-existência de dano hepático.(1,10,24)
Na hepatotoxicidade causada pelo tratamento da tuberculose, pode-se reiniciar a medicação quando o nível de TGP < 2 vezes o LSN. A reintrodução deve ser gradual, droga a droga. Primeiro rifampicina, com ou sem etambutol; após 3-7 dias, reavaliar o nível de TGP: se não houve aumento, recomeçar o uso da isoniazida 1 semana após a introdução de rifampicina e de pirazinamida 1 semana após a introdução de isoniazida. Em caso de aumento dos níveis de TGP ou se os sintomas recorrerem, suspender o último medicamento adicionado. Nos pacientes com hepatotoxicidade prolongada ou grave (TGP > 10 vezes o LSN), não utilizar pirazinamida e usar o esquema RHE por 2 meses seguido por RH por 7 meses.(1,10,24)
TUBERCULOSE E DIABETESEm pacientes insulinodependentes sugere-se a extensão do esquema RHZE para 9 meses. Nos casos não insulinodependentes, o esquema é o habitual, chamando-se a atenção para o uso profilático da piridoxina e a possível necessidade de uso de insulina durante o tratamento da tuberculose.(1,10,21,24)
TUBERCULOSE E IMUNODEPRESSÃOEm casos da coinfecção tuberculose/HIV, o início da terapia antirretroviral (TARV) deve ser pautado pelo grau de imunossupressão; em situações cuja contagem de CD4 for menor que 50 células/mm3, deve-se iniciar a TARV 2 semanas após o início do tratamento antituberculose e, nas demais situações, apenas após a oitava semana de tratamento. Quando a tuberculose for diagnosticada em pacientes já em uso de TARV, pode ser necessário modificar a TARV de forma a permitir que o tratamento inclua a rifampicina, e, nessa situação, o antirretroviral de escolha é o efavirenz. A substituição da rifampicina pela rifabutina é recomendada quando é necessário utilizar um inibidor de protease associado ao ritonavir no esquema TARV. A dose de rifabutina recomendada nessa situação é de 150 mg/dia. As reações adversas mais frequentes da rifabutina são exantema (em 4%), intolerância gastrointestinal (em 3%) e neutropenia (em 2%).(1,23)
A ocorrência de síndrome inflamatória da reconstituição imune não indica a suspensão de nenhum dos tratamentos. Seu manejo inclui o uso de medicamentos para o tratamento dos sintomas e de corticosteroides nos casos mais graves.
O tratamento de pacientes transplantados deve ser realizado em unidades de referência com o uso do esquema RHZE por 2 meses seguido por RH por 4 meses, podendo o tratamento ser estendido por até 9 meses. Chama-se a atenção para possíveis interações medicamentosas com corticosteroides, ciclosporinas e azatioprina.(1,23,35)
TUBERCULOSE E GRAVIDEZO esquema RHZE pode ser administrado nas doses habituais, e é recomendada a utilização concomitante de piridoxina (50 mg/dia) durante a gestação pelo risco de crise convulsiva no recém-nato. Apesar de os medicamentos do esquema RHZE atravessarem a barreira placentária, parece não haver teratogenicidade. Em relação à amamentação, a despeito de os medicamentos estarem presentes no leite materno em pequenas concentrações, não existe risco de toxicidade aos recém-nascidos ou efeito profilático.(10,24,40)
TUBERCULOSE E INSUFICIÊNCIA RENALPacientes com tuberculose e insuficiência renal têm desfechos clínicos piores que os com função renal normal e devem ser avaliados mais frequentemente. A rifampicina e a isoniazida são metabolizadas no fígado e não precisam de ajuste de dose. A pirazinamida também é metabolizada no fígado, mas seu metabólito pode se acumular nos portadores de insuficiência renal, assim como o etambutol, pois 80% de seu metabolismo é renal; então, para esses dois medicamentos, seu uso é recomendado 3 vezes na semana.(41,42)
Outra recomendação é a administração das medicações após a sessão de hemodiálise, pois, embora essa não seja capaz de eliminar a rifampicina, ela retira eficientemente os metabólitos da pirazinamida e, parcialmente, a isoniazida e o etambutol. Não se conhece qual a influência da diálise peritoneal sobre as concentrações dos tuberculostáticos, e não se deve aplicar a esses pacientes as recomendações daqueles em hemodiálise; no entanto, deve-se atentar para uma possível toxicidade.(1)
O esquema mais seguro na insuficiência renal é o uso do esquema RHZ por 2 meses seguido de RH por 4 meses (clearance de creatinina entre 30-50 ml/min). O tratamento é modificado em casos de insuficiência renal com clearance de creatinina < 30 ml/min ou em diálise (administrar após a diálise). Nesses pacientes, utilizar isoniazida na dose de 300 mg/dia ou 900 mg 3 vezes por semana; rifampicina na dose de 600 mg/dia ou 600 mg em cada administração 3 vezes por semana; pirazinamida na dose de 25-35 mg/kg em cada administração 3 vezes por semana (não administrar diariamente); etambutol na dose de 20-25 mg/kg em cada administração 3 vezes por semana (não administrar diariamente); levofloxacina na dose de 750-1.000 mg/kg em cada administração 3 vezes por semana (não administrar diariamente); moxifloxacina na dose de 400 mg diariamente; etionamida na dose de 250-500 mg/kg em cada administração diariamente; estreptomicina na dose de 15 mg/kg em cada administração 2-3 vezes por semana (não administrar diariamente); e amicacina na dose de 15 mg/kg em cada administração 2-3 vezes por semana (não administrar diariamente).(1)
TRATAMENTO CIRÚRGICO DA TUBERCULOSEEmbora o tratamento da tuberculose seja realizado com medicamentos, eventualmente o tratamento cirúrgico ainda pode ser utilizado em casos específicos, sobretudo em casos de resistência aos medicamentos e em algumas complicações da tuberculose pulmonar. A biópsia pulmonar cirúrgica tem aplicação no diagnóstico diferencial entre tuberculose e neoplasia pulmonar. O tratamento cirúrgico está indicado principalmente na tuberculose endobrônquica, assim como nas reações adversas graves, hemoptise grave, empiema, pneumotórax e fístula broncopleural. Nas sequelas da tuberculose, as intervenções cirúrgicas podem ser necessárias nos casos de resíduo pulmonar sintomático, bola fúngica e hemoptise.(24)
TUBERCULOSE LATENTE (TBL)A TBL é definida como a presença de uma resposta imune específica contra o M. tuberculosis na ausência de sinais clínicos de doença. O número de bacilos viáveis nesses casos é desconhecido, mas acredita-se que seja baixo. O risco de reativação da tuberculose em um indivíduo com TBL documentada é de 5-10% ao longo da vida, e a maioria desenvolve a doença nos 5 primeiros anos após a infecção inicial. No entanto, esse risco depende de vários fatores, sendo o mais importante o status imunológico do indivíduo. No Brasil, o número estimado de infectados por M. tuberculosis é de 50 milhões de pessoas, o que representa um desafio para o controle da doença no país. Uma das estratégias de controle da tuberculose é a redução desse grande reservatório de indivíduos infectados pelo M. tuberculosis com risco de progressão para a doença ativa.(3,43-45)
Avaliação de usuários de anti-TNF-α e terapia imunossupressoraO TNF-α tem um papel central na formação do granuloma e, desde o início do uso dos anti-TNF-α, uma maior taxa de incidência de tuberculose foi relatada, sendo boa parte dos casos de tuberculose extrapulmonar e, em geral, durante as primeiras seis infusões. Por esse motivo, todo paciente candidato ao uso de bloqueadores de TNF-α deve ser avaliado quanto à TBL (epidemiologia, imagem do tórax e imunidade específica contra M. tuberculosis). O teste tuberculínico (TT) e os ensaios de liberação de IFN-γ são adversamente afetados pelo uso das várias drogas imunossupressoras frequentemente usadas por esse grupo de pacientes, e persistem as incertezas quanto à melhor escolha de teste de triagem. Até que melhores evidências estejam disponíveis, ambos parecem viáveis para o diagnóstico. Resultados de TT ≥ 5 mm(10) ou ensaio de liberação de IFN-γ positivo indicam a necessidade de tratamento de TBL, que deve ser instituído por pelo menos 30 dias antes do início da terapia com anti-TNF-α. Na impossibilidade de se realizar TT, valorizar o risco epidemiológico e o exame de imagem, assim como avaliar cada caso individualmente em relação ao risco/benefício. A TC de tórax pode trazer informações adicionais por ser mais sensível que a radiografia de tórax para demonstrar lesões sugestivas de TBL.(20,46-51)
O uso de corticoides com doses equivalentes a 15 mg de prednisona/dia por mais de 1 mês indica o tratamento de TBL se TT ≥ 5 mm em indivíduos < 65 anos. Em indivíduos com 65 anos ou mais, o maior risco de hepatotoxicidade limitaria essa indicação. Pacientes em diálise apresentam risco de reativação de tuberculose pelo menos 10 vezes maior que a população em geral. O resultado de TT ≥ 10 mm parece distinguir pacientes com maior risco de adoecimento e indica o tratamento de TBL. Estima-se que 25-30% dos pacientes com silicose desenvolvam tuberculose. O tratamento de TBL está recomendado se TT ≥ 10 mm.(10,52,53)
Tratamento da TBLO tratamento da TBL é realizado com isoniazida na dose de 5-10 mg/kg de peso até, no máximo, 300 mg/dia por 6 meses ou isoniazida (900 mg) associada à rifapentina (900 mg) 1 vez por semana durante 3 meses, devendo o caso ser notificado em ficha específica. O risco de hepatite com o uso de ambos os esquemas é muito baixo, e a monitorização laboratorial das aminotransferases hepáticas durante o tratamento da TBL só é recomendada em indivíduos com doença hepática ou com fatores de risco para doença hepática. Em indivíduos que não toleram a isoniazida, uma alternativa de tratamento é o uso de rifampicina por 4 meses.(10,43,54)
Ainda não existem evidências seguras para orientar a escolha das drogas para o tratamento da TBL em contatos de casos índices sabidamente resistentes. A lógica indica que contatos de casos de TBMR devem ser tratados com fármacos aos quais os bacilos sejam sensíveis. A decisão sobre o melhor tratamento deverá ser tomada na unidade de referência onde o caso índice é acompanhado. A OMS sugere que os contatos sejam rigorosamente observados para o desenvolvimento de tuberculose ativa por 2 anos ao invés de serem tratados para TBL.(10,44)
Um estudo recente demonstrou que a administração por 3 meses, 1 vez por semana, da combinação de isoniazida e rifapentina para o tratamento de TBL é segura e de eficácia equivalente à da isoniazida em monoterapia em crianças de 2 a 17 anos. No entanto, a escassez de crianças menores de 5 anos e de crianças infectadas com HIV limita a generalização dos resultados do estudo nesses importantes grupos de risco.(55,56)
NOVOS TRATAMENTOS PARA TUBERCULOSE SENSÍVEL E TUBERCULOSE RESISTENTENovos fármacos e novas combinações com fármacos já conhecidos vêm sendo testados no tratamento da tuberculose com objetivos de reduzir o tempo e aumentar a efetividade do tratamento tanto de casos de tuberculose sensível quanto de TBMR. Depois de cinco décadas sem novos medicamentos para o tratamento da tuberculose, foram aprovados pelo Food and Drug Administration dos EUA os medicamentos bedaquilina (TMC-207) e delamanide (OPC-67683) para uso na prática clínica. Esses dois medicamentos têm sua indicação basicamente nos casos de TBMR. Desde 2009, estudos clínicos vêm demonstrando que a utilização de fluoroquinolonas, em especial da moxifloxacina, associada a outros fármacos antituberculose, RHZ e rifapentina, aumenta significativamente a taxa de conversão da cultura de M. tuberculosis na oitava semana de tratamento, sugerindo a possibilidade do encurtamento do tratamento. Em uma revisão sistemática publicada em 2016 com ensaios clínicos que utilizaram fluoroquinolona em substituição ao etambutol, os resultados mostraram que foi possível reduzir o tratamento para 4 meses, mantendo a mesma efetividade em pacientes com tuberculose pulmonar não cavitária e com cultura positiva; entretanto, seus resultados na prática clínica ainda são controversos.(57-59)
Novas evidências científicasUma recente publicação elaborada em conjunto pela Infectious Diseases Society of America, Centers for Disease Control and Prevention e American Thoracic Society(2) apresentou recomendações para o tratamento da tuberculose baseadas em evidências científicas obtidas através da abordagem Grading of Recommendations, Assessment, Development and Evaluations (GRADE; Quadro 7),(60) que foram endossadas pela European Respiratory Society.(1) Essa é uma abordagem sistemática que avalia a qualidade da evidência e a força da recomendação científica. A abordagem GRADE foi desenvolvida pelo grupo de trabalho GRADE e é vista como o método mais eficaz de avaliação da qualidade das evidências e recomendações clínicas.
Comparando as recomendações do PNCT com as novas evidências científicas podemos ver que alguns pontos podem ser avaliados para a revisão de futuras recomendações do PNCT, como, por exemplo, a adoção do tratamento intermitente com supervisão na segunda fase do tratamento e a não utilização de corticoide na pericardite por tuberculose.(1)
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