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ISSN (on-line): 1806-3756

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Cartas ao Editor

Conhecimento e percepção de médicos e enfermeiros em três capitais brasileiras com alta incidência de tuberculose a respeito da transmissão e prevenção da doença

Knowledge and perceptions of tuberculosis transmission and prevention among physicians and nurses in three Brazilian capitals with high incidence of tuberculosis

Jonas Ramos1,a, Maria F Wakoff-Pereira1,b, Marcelo Cordeiro-Santos2,3,c, Maria de Fátima Militão de Albuquerque4,d, Philip C Hill5,e, Dick Menzies6,f, Anete Trajman,6,7,g

DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37562018000000019

AO EDITOR:

Os Sustainable Development Goals (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável)(1) e a End TB Strategy (Estratégia para o Fim da TB)(2) estabeleceram metas para que a tuberculose seja eliminada até 2050. Projeções recentes mostram que, para atingir as metas intermédias de 2030, é essencial a prevenção por meio da detecção e tratamento da infecção tuberculosa latente (ITBL).(3) Os principais grupos-alvo do tratamento de ITBL são pacientes imunodeprimidos(4) e contatos próximos de casos iniciais (index cases),(5) pois o risco de TB ativa é muito alto nesses indivíduos. No entanto, menos de 5% dos contatos infectados são diagnosticados e tratados de modo a prevenir a TB.(6) Os motivos disso ainda não estão claros.

No Brasil, ocorrem grandes perdas nas primeiras etapas do processo de tratamento da ITBL: apenas 43% de todos os contatos próximos são identificados, e, destes, apenas 3% passam a receber tratamento.(7) A percepção de pacientes iniciais e contatos não parece ser a raiz do problema. Os pacientes iniciais temem que os contatos adoeçam e, portanto, dizem a eles que têm tuberculose. Os contatos também temem a tuberculose e declaram que aceitariam receber tratamento para prevenir a doença caso fosse prescrito.(7) No presente estudo, usamos uma pesquisa de conhecimento, atitudes e práticas(8) para explorar as perspectivas de médicos e enfermeiros da atenção primária a respeito da transmissão e prevenção da tuberculose em 12 unidades básicas de saúde nas cidades de Recife, Manaus e Rio de Janeiro, onde a incidência de tuberculose no Brasil é maior.(9) O presente estudo faz parte de um estudo maior cujo objetivo é apresentar soluções para o problema supracitado (ClinicalTrials.gov identifier: NCT00931736 [http://www.clinicaltrials.gov/]). As unidades básicas de saúde supracitadas são as mesmas em que foram entrevistados os pacientes iniciais e contatos.(7)

Entre janeiro de 2015 e julho de 2016, entrevistadores treinados aplicaram um questionário semiestruturado com perguntas abertas sobre transmissão e prevenção de tuberculose aos médicos e enfermeiros que concordaram em participar do estudo. O questionário usado no presente estudo é uma versão abreviada de um questionário que já foi usado na Indonésia,(10) previamente traduzido para o português e adaptado para uso no Brasil por nosso grupo de pesquisa. Um estudo piloto com 10 profissionais de saúde permitiu que refinássemos o instrumento. As respostas dos participantes foram divididas em categorias pré-definidas, e as categorias foram consideradas satisfatórias (não necessariamente 100% corretas) caso as respostas tenham incluído categorias consideradas "obrigatórias" e não tenham incluído nenhuma categoria considerada "inaceitável". Por exemplo, a prevenção de doença tuberculosa em contatos infectados foi considerada satisfatória caso tenha sido mencionado tomar remédios, isoniazida ou qualquer esquema profilático eficaz e caso não tenha sido mencionada nenhuma crença religiosa. Para determinar se as respostas eram satisfatórias ou não, um grupo de três especialistas julgava as respostas ligeiramente incorretas de modo a determinar se teriam impacto negativo no tratamento de contatos ou não. As respostas foram comparadas entre médicos e enfermeiros, entre profissionais de saúde com e sem treinamento prévio em tuberculose e entre as três cidades envolvidas no estudo.

O estudo foi aprovado pelos comitês de ética em pesquisa das instituições envolvidas (Rio de Janeiro, Protocolo n. CAAE 762.361; Manaus, Protocolo n. CAAE 998.112 e Recife, Protocolo n. CAAE 1.097.557). Todos os participantes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido, e suas respostas permaneceram anônimas.

Os entrevistadores abordaram 55 médicos e 46 enfermeiros, todos os quais concordaram em participar. Do total da amostra, 58% disseram que haviam recentemente recebido treinamento formal em tuberculose. Destes, 57% haviam recebido treinamento em prevenção de tuberculose e tratamento de ITBL. Não obstante o treinamento formal, menos de 50% dos participantes respondeu satisfatoriamente 7 das 16 perguntas (Tabela 1). As lacunas no conhecimento incluíram prevenção de ITBL entre contatos (51%), prevenção de doença tuberculosa após a infecção (32%), diagnóstico de ITBL (43%), indicações de tratamento de ITBL (62%), duração mínima do tratamento com isoniazida (44%), dose de isoniazida (84%) e tratamento de eventos adversos (57%). Do total da amostra, 46% afirmaram que não consideravam importante investigar a presença de tuberculose e ITBL em contatos infantis e 49% afirmaram que não consideravam importante investigar a presença de tuberculose e ITBL em contatos adultos, atitudes que não estão de acordo com as Diretrizes Nacionais de Controle da Tuberculose.

 



Embora os médicos tenham mostrado melhor conhecimento a respeito do tratamento de eventos adversos do que os enfermeiros, não houve outras diferenças significativas entre médicos e enfermeiros (com ou sem treinamento prévio) quanto ao conhecimento e percepção. No tocante às diferenças entre as três cidades, as proporções de respostas satisfatórias a respeito da transmissão da tuberculose e da investigação de contatos foram menores em Manaus, ao passo que as proporções de respostas satisfatórias a respeito da duração do tratamento com isoniazida e da dose de isoniazida foram menores no Rio de Janeiro. Em Recife, nenhum dos participantes afirmou que é importante investigar a presença de ITBL em contatos infantis ou adultos (dados referentes às respostas por categoria profissional, status de treinamento e cidade não são apresentados aqui, mas estão disponíveis, assim como o questionário usado no presente estudo, mediante solicitação ao autor correspondente).

Não obstante o treinamento prévio em tuberculose, médicos e enfermeiros da atenção primária apresentam grandes lacunas no conhecimento e atitude a respeito de como tratar contatos de pacientes com tuberculose. A inclusão do tema prevenção de tuberculose nos treinamentos e a motivação de profissionais de saúde são necessárias para superar os gargalos do tratamento de ITBL no Brasil. Propomos treinamento padronizado como solução para problemas referentes ao tratamento de ITBL em contatos próximos de pacientes com tuberculose, em conformidade com as recomendações das Diretrizes Nacionais de Controle da Tuberculose. Acreditamos que essa abordagem possa ajudar a estabelecer prioridades no tratamento de ITBL em cenários em que o processo de tratamento de contatos de pacientes com tuberculose seja um problema para o controle da doença.

REFERÊNCIAS

1. United Nations [homepage on the Internet]. New York City: United Nations; [cited 2017 Aug]. Sustainable Development Goals; [about 2 screens]. Available from: http://www.un.org/sustainabledevelopment/sustainable-development-goals/
2. World Health Organization [homepage on the Internet]. Geneva: World Health Organization [cited 2017 Aug 25]. WHO End TB Strategy--Global strategy and targets for tuberculosis prevention, care and control after 2015; [about 2 screens]. Available from: http://www.who.int/tb/post2015_strategy/en/
3. Dye C, Glaziou P, Floyd K, Raviglione M. Prospects for tuberculosis elimination. Annu Rev Public Health. 2013;34:271-86. https://doi.org/10.1146/annurev-publhealth-031912-114431
4. World Health Organization [homepage on the Internet]. Geneva: World Health Organization [cited 2017 Aug 25]. Scaling up the Three I's for TB/HIV; [about 1 screen]. Available from: http://www.who.int/hiv/topics/tb/3is/en/
5. World Health Organization [homepage on the Internet]. Geneva: World Health Organization [cited 2017 Aug 29]. Guidelines on the management of latent tuberculosis infection; [about 3 screens]. Available from: http://www.who.int/tb/publications/latent-tuberculosis-infection/en/
6. Alsdurf H, Hill PC, Matteelli A, Getahun H, Menzies D. The cascade of care in diagnosis and treatment of latent tuberculosis infection: a systematic review and meta-analysis. Lancet Infect Dis. 2016;16(11):1269-1278. https://doi.org/10.1016/S1473-3099(16)30216-X
7. Salame FM, Ferreira MD, Belo MT, Teixeira EG, Cordeiro-Santos M, Ximenes RA, et al. Knowledge about tuberculosis transmission and prevention and perceptions of health service utilization among index cases and contacts in Brazil: Understanding losses in the latent tuberculosis cascade of care. PLoS One. 2017;12(9):e0184061. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0184061
8. World Health Organization. Stop TB Partnership [homepage on the Internet]. Geneva: World Health Organization; [cited 2017 Aug 25]. Advocacy, communication and social mobilization for TB control: a guide to developing knowledge, attitude and practice surveys; 2008 [Adobe Acrobat document, 68p.]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/43790/1/9789241596176_eng.pdf
9. Brasil. Ministério da Saúde [homepage on the Internet]. Brasília: o Ministério; [cited 2017 Aug 25]. Available from: http://portalsaude.saude.gov.br/
Rutherford ME, Ruslami R, Anselmo M, Alisjahbana B, Yulianti N, Sampurno H, et al. Management of children exposed to Mycobacterium tuberculosis: a public health evaluation in West Java, Indonesia. Bull World Health Organ. 2013;91(12):932-941A. https://doi.org/10.2471/BLT.13.118414

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