Continuous and bimonthly publication
ISSN (on-line): 1806-3756

Licença Creative Commons
6260
Views
Back to summary
Open Access Peer-Reviewed
Artigo Original

Controle da asma, função pulmonar, estado nutricional e qualidade de vida relacionada à saúde: diferenças entre homens e mulheres adultos com asma

Asthma control, lung function, nutritional status, and health-related quality of life: differences between adult males and females with asthma

Gabriele Carra Forte1,a, Maria Luiza Hennemann2,b, Paulo de Tarso Roth Dalcin1,3,c

DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37562017000000216

ABSTRACT

Objective: To evaluate health-related quality of life in asthma patients treated at a referral center in southern Brazil, identifying differences between male and female patients, as well as to evaluate differences between the males and females in terms of asthma control, lung function, and nutritional status. Methods: This was a cross-sectional study involving patients ≥ 18 years of age treated at an asthma outpatient clinic. We evaluated clinical parameters, lung function, nutritional status, and quality of life. Results: A total of 198 patients completed the study. The mean age was 56.2 ± 14.8 years, and 81.8% were female. The proportion of patients with uncontrolled asthma was higher among females than among males (63.0% vs. 44.4%; p = 0.041). The body mass index (BMI) and percentage of body fat were higher in females than in males (30.2 ± 5.8 kg/m2 vs. 26.9 ± 4.5 kg/m2 and 37.4 ± 6.4% vs. 26.5 ± 7.4%; p = 0.002 and p < 0.001, respectively). Quality of life was lower in females than in males in the following domains: symptoms (3.8 ± 1.5 vs. 4.6 ± 1.7; p = 0.006); activity limitation (3.6 ± 1.3 vs. 4.4 ± 1.5; p = 0.001); emotional function (3.6 ± 1.9 vs. 4.5 ± 1.7; p = 0.014); and environmental stimuli (3.2 ± 1.6 vs. 4.3 ± 1.9; p = 0.001). Conclusions: Male asthma patients appear to fare better than do female asthma patients in terms of health-related quality of life, asthma control, BMI, percentage of body fat, and comorbidities.

Keywords: Asthma; Nutritional status; Quality of life; Adult.

RESUMO

Objetivo: Avaliar a qualidade de vida relacionada à saúde em pacientes com asma tratados em um centro de referência no sul do Brasil e identificar diferenças entre homens e mulheres, além de avaliar as diferenças entre os sexos no tocante ao controle da asma, função pulmonar e estado nutricional. Métodos: Trata-se de um estudo transversal com pacientes com idade ≥ 18 anos tratados em um ambulatório de asma. Foram avaliados parâmetros clínicos, função pulmonar, estado nutricional e qualidade de vida. Resultados: Cento e noventa e oito pacientes completaram o estudo. A média de idade foi de 56,2 ± 14,8 anos, e 81,8% eram do sexo feminino. A proporção de pacientes com asma não controlada foi maior entre as mulheres que entre os homens (63,0% vs. 44,4%; p = 0,041). O índice de massa corporal (IMC) e a porcentagem de gordura corporal foram maiores nas mulheres que nos homens (30,2 ± 5,8 kg/m2 vs. 26,9 ± 4,5 kg/m2 e 37,4 ± 6,4% vs. 26,5 ± 7,4%; p = 0,002 e p < 0,001, respectivamente). A qualidade de vida foi menor nas mulheres que nos homens nos seguintes domínios: sintomas (3,8 ± 1,5 vs. 4,6 ± 1,7; p = 0,006); limitação das atividades (3,6 ± 1,3 vs. 4,4 ± 1,5; p = 0,001); função emocional (3,6 ± 1,9 vs. 4,5 ± 1,7; p = 0,014); estímulos ambientais (3,2 ± 1,6 vs. 4,3 ± 1,9; p = 0,001). Conclusões: Homens com asma aparentemente apresentam melhores resultados que mulheres com asma no que tange à qualidade de vida relacionada à saúde, controle da asma, IMC, porcentagem de gordura corporal e comorbidades.

Palavras-chave: Asma; Estado nutricional; Qualidade de vida; Adulto.

INTRODUÇÃO

A asma é uma doença inflamatória crônica das vias aéreas caracterizada por sintomas respiratórios como chiado, falta de ar, aperto no peito e tosse que variam ao longo do tempo e em intensidade, bem como por limitação variável do fluxo aéreo expiratório e hiper-reatividade das vias aéreas a estímulos diretos ou indiretos. É uma doença prevalente que prejudica a qualidade de vida e é um grande problema de saúde pública. A asma afeta aproximadamente 10% dos adultos em todo o mundo.(1) A prevalência da asma segue um padrão característico relacionado com a idade e o sexo; é maior durante a infância e a doença afeta predominantemente os indivíduos do sexo masculino.(2) Após a puberdade, a prevalência da asma é maior nos indivíduos do sexo feminino que nos do sexo masculino.(2,3)

Muitos mecanismos estão envolvidos na expressão clínica da asma, incluindo hormônios sexuais, calibre das vias aéreas, obesidade, tipo de exposição e idade de início.(4,5) Embora homens e mulheres com asma compartilhem as características clínicas comuns da doença, o curso natural da asma difere entre os sexos. Takeda et al.(6) sugeriram que hormônios sexuais e diferenças entre os sexos estão envolvidos nas funções celulares na remodelação das vias aéreas. Vários estudos relataram que a prevalência e a gravidade da asma são maiores em mulheres adultas. Em um estudo transversal, observou-se que a gravidade da asma aumentou com o índice de massa corporal (IMC), embora apenas em mulheres; entretanto, o motivo ainda não foi explicado.(7-9) Zillmer et al.(10) observaram que asma mal controlada e sintomas respiratórios são mais comuns em mulheres que em homens. Além disso, a qualidade de vida relatada pelos próprios pacientes é frequentemente pior em mulheres que em homens, provavelmente em virtude de dispneia mais grave e maior uso de medicamentos.(11) Como resultado dessa heterogeneidade clínica, as abordagens de tratamento precisam ser individualizadas e modificadas a fim de manter um controle adequado dos sintomas e da doença ao longo do tempo.(12)

Embora vários estudos tenham examinado as diferenças entre os sexos em pacientes com asma, poucos investigaram o impacto da asma na qualidade de vida relacionada à saúde e no estado nutricional.(11,13) Além disso, há diferenças e disparidades regionais entre pacientes com asma no tocante ao controle da doença e expressão clínica.(14) Portanto, é importante avaliar as diferenças entre os sexos em diferentes populações de adultos com asma.

O objetivo do presente estudo foi avaliar a qualidade de vida relacionada à saúde em pacientes com asma tratados em um centro de referência no sul do Brasil e identificar diferenças entre homens e mulheres, além de avaliar as diferenças entre os sexos no tocante ao controle da asma, função pulmonar e estado nutricional.

MÉTODOS

Em um estudo transversal com dados coletados prospectivamente, foram avaliados pacientes adultos consecutivos com asma recrutados em um centro de referência para o tratamento de asma no sul do Brasil. O protocolo do estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), em Porto Alegre (RS), Protocolo n. 12.0103, e todos os pacientes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido.

Os pacientes foram recrutados no ambulatório de asma do HCPA, em Porto Alegre (RS). O estudo incluiu pacientes com idade ≥ 18 anos e diagnóstico médico de asma. O diagnóstico de asma foi confirmado por um membro da equipe de pesquisa com base nos seguintes critérios: sintomas de asma, acompanhados de obstrução reversível do fluxo aéreo (aumento do VEF1 de pelo menos 12% e 200 ml após a administração de um β2-agonista de curta duração) ou hiper-reatividade brônquica a um agente broncoconstritor (metacolina).(1)

Os critérios de exclusão foram os seguintes: outras doenças pulmonares crônicas além da asma (tais como DPOC e bronquiectasia); lobectomia; alterações na radiografia de tórax; gravidez e tabagismo atual ou passado (carga tabágica > 10 anos-maço).

Durante uma consulta ambulatorial, os participantes foram submetidos a uma avaliação clínica abrangente e responderam a questionários sobre o seguinte: histórico médico; status socioeconômico; características demográficas; histórico de tabagismo; comorbidades crônicas; uso de medicamentos; menopausa (sem menstruação nos últimos 12 meses); estado nutricional; gravidade da asma; grau de controle da asma e qualidade de vida relacionada à saúde.

O estado nutricional foi avaliado pelo índice de massa corporal (IMC), que foi calculado pela fórmula peso/estatura2 (kg/m2). Com base no IMC, os participantes foram divididos nas seguintes categorias(15): baixo peso (< 18,5 kg/m2); peso normal (18,5-24,9 kg/m2); sobrepeso (25-29,9 kg/m2) e obesidade (≥ 30 kg/m2). A impedância bioelétrica foi usada para avaliar a composição corporal (isto é, as proporções de músculo, gordura e água).(16)

A gravidade da asma foi determinada de acordo com as diretrizes da Global Initiative for Asthma (GINA) (1); os pacientes foram classificados em pacientes com asma intermitente leve, asma persistente leve, asma persistente moderada e asma persistente grave com base no uso diário de medicamentos. O grau de controle da asma também foi determinado de acordo com as diretrizes da GINA(1); os pacientes foram classificados em pacientes com asma bem controlada, parcialmente controlada e não controlada com base no seguinte: frequência de sintomas diurnos e noturnos; uso de medicação de resgate; limitação da atividade física diária e número de exacerbações nas 4 últimas semanas.

A espirometria foi realizada com um espirômetro v4.31a (Jaeger, Würzburg, Alemanha). A CVF, o VEF1 e a relação VEF1/CVF foram medidos três vezes; foi registrada a melhor das três medidas. Todos os resultados dos testes de função pulmonar foram expressos em porcentagem dos valores previstos para a idade, a estatura e o sexo.(17)

A qualidade de vida foi avaliada por meio do Asthma Quality of Life Questionnaire (AQLQ),(18) previamente traduzido para o português e validado para uso no Brasil. (19) O AQLQ é dividido em quatro domínios: sintomas; limitação das atividades; função emocional e estímulos ambientais. A pontuação obtida em cada domínio varia de 1 a 7; uma pontuação = 1 indica prejuízo máximo, e uma pontuação = 7 indica ausência de prejuízo.

O cálculo do tamanho da amostra baseou-se em um estudo realizado por Dalcin et al.(14) Para uma proporção de 60% de pacientes do sexo feminino com asma não controlada, uma proporção de 45% de pacientes do sexo masculino com asma não controlada, largura total de 0,15, erro tipo I de 0,05 (bilateral) e erro tipo II de 0,20 (ou um poder de estudo de 0,80), calculou-se que seria necessária uma amostra de 186 pacientes.

A análise estatística dos dados foi realizada com o programa IBM SPSS Statistics, versão 20.0 (IBM Corporation, Armonk, NY, EUA). Os dados quantitativos foram expressos em forma de média ± desvio-padrão ou mediana (intervalo interquartil), e os dados qualitativos foram expressos em forma de n (%). As variáveis categóricas foram comparadas por meio do teste do qui-quadrado com resíduos padronizados ajustados; usamos a correção de Yates ou o teste exato de Fisher conforme apropriado. Para variáveis contínuas, usamos o teste t de Student ou o teste U de Mann-Whitney para comparações entre os grupos. Todos os testes estatísticos foram bicaudais, e o nível de significância adotado foi de p < 0,05.

RESULTADOS

Entre março e dezembro de 2013, avaliamos 344 pacientes com asma. Destes, 75 não quiseram participar, 53 foram excluídos porque tinham outras doenças pulmonares crônicas além da asma, 8 foram excluídos porque eram fumantes ou ex-fumantes (com carga tabágica > 10 anos-maço) e 10 foram excluídos porque não conseguiram realizar todas as avaliações necessárias. Portanto, a amostra final consistiu em 198 pacientes.

As características gerais dos pacientes participantes são apresentadas na Tabela 1. Dos 198 participantes, 162 (81,8%) eram do sexo feminino. A média de idade foi de 56,2 ± 14,8 anos. No tocante à gravidade da asma, 144 pacientes (72,2%) apresentavam asma persistente grave, 31 (15,7%) apresentavam asma persistente moderada e 23 (11,6%) apresentavam asma persistente leve. No tocante ao grau de controle da asma, 118 pacientes (59,6%) apresentavam asma não controlada, 28 (14,1%) apresentavam asma parcialmente controlada e 52 (26,3%) apresentavam asma bem controlada. A média do IMC foi de 29,6 ± 5,7 kg/m2; 83 pacientes (41,9%) foram considerados obesos, 72 (36,4%) foram considerados pacientes com sobrepeso e 43 (21,7%) foram considerados pacientes com peso normal.
 



A Tabela 2 mostra uma comparação entre os sexos quanto às características clínicas, qualidade de vida relacionada à saúde, grau de controle da asma, função pulmonar e estado nutricional. A prevalência de pacientes brancos foi maior entre os homens que entre as mulheres (91,7% vs. 72,0%; p = 0,024). A qualidade de vida foi menor nas mulheres que nos homens nos quatro domínios do AQLQ: sintomas (3,8 ± 1,5 vs. 4,6 ± 1,7; p = 0,006); limitação das atividades (3,6 ± 1,3 vs. 4,4 ± 1,5; p = 0,001); função emocional (3,6 ± 1,9 vs. 4,5 ± 1,7; p = 0,014) e estímulos ambientais (3,2 ± 1,6 vs. 4,3 ± 1,9; p = 0,001). A proporção de pacientes com asma não controlada foi maior entre as mulheres que entre os homens (63,0% vs. 44,4%; p = 0,041). Além disso, o IMC e a porcentagem de gordura corporal foram maiores nas mulheres que nos homens (30,2 ± 5,8 kg/m2 e 37,4 ± 6,4% vs. 26,9 ± 4,5 kg/m2 e 26,5 ± 7,4%; p = 0,002 e p < 0,001, respectivamente). Comorbidades crônicas foram mais comumente relatadas pelas mulheres do que pelos homens (68,5% vs. 38,9%; p = 0,001), assim como o foram comorbidades cardiovasculares (58,0% vs. 36,1%; p = 0,028). Não houve diferenças significativas entre os sexos quanto à idade (p = 0,805), gravidade da asma (p = 0,401), CVF em porcentagem do previsto (p = 0,078) e VEF1 em porcentagem do previsto (p = 0,085). Além disso, não houve relação entre menopausa e os desfechos do estudo.
 




DISCUSSÃO

No presente estudo, houve predomínio de mulheres entre pacientes adultos com asma tratados em um ambulatório de referência no sul do Brasil. A qualidade de vida relacionada à saúde foi menor nas mulheres que nos homens nos quatro domínios do AQLQ. Além disso, a proporção de pacientes com asma não controlada foi maior entre as mulheres que entre os homens, assim como o foram o IMC e a porcentagem de gordura corporal. Ainda, comorbidades foram mais comumente relatadas pelas mulheres que pelos homens.

A alta prevalência de asma em mulheres adultas no presente estudo é coerente com a literatura.(20-22) Zillmer et al.(10) entrevistaram 400 pacientes com asma em quatro cidades brasileiras e relataram que 272 (68%) eram do sexo feminino. Dursun et al.(23) estudaram 242 pacientes adultos com asma na Turquia e relataram que 77,3% eram do sexo feminino. Schatz & Camargo(24) usaram dados computadorizados do Kaiser Permanente do sul da Califórnia a fim de identificar pacientes com asma. Entre os 60.694 pacientes com asma, a razão de prevalência de mulheres e homens foi de aproximadamente 65:35 na faixa etária de 23 a 64 anos. Estudos anteriores realizados em nossa instituição em cenários diferentes e envolvendo diferentes amostras de adultos mostraram prevalência alta (68,6-75%) de mulheres que buscam tratamento hospitalar para asma.(7,25,26) Há evidências convincentes de que os hormônios sexuais são determinantes importantes de no mínimo essas diferenças biológicas na prevalência da asma.(20) Relatou-se que polimorfismos do receptor de estrógeno 1 estão relacionados com hiper-reatividade brônquica e declínio da função pulmonar, especialmente em mulheres com asma.(4)

No geral, a qualidade de vida relacionada à saúde em nossa amostra foi moderada; a pontuação no AQLQ foi significativamente menor entre as mulheres que entre os homens. Outros estudos mostraram que a qualidade de vida relacionada à saúde é pior em mulheres com asma que em homens com asma.(11,27,28) Em um estudo transversal, Lisspers et al.(29) investigaram 1.226 pacientes na atenção primária à saúde e 499 pacientes na atenção secundária à saúde. Eles concluíram que a qualidade de vida e o grau de controle da asma eram menores em mulheres jovens que em homens jovens, embora tais diferenças não tenham sido observadas na comparação entre mulheres e homens mais velhos. Os hormônios sexuais femininos podem ser um fator importante que afeta esses desfechos. Correia de Sousa et al.(30) constataram que as chances de apresentar pior qualidade de vida eram 3,8 vezes maiores em mulheres que em homens. Esse achado relacionou-se com taxas mais elevadas de ansiedade e depressão na população feminina.(13) Uma possível explicação para esse achado é que o excesso de peso e a asma não controlada são mais comuns em mulheres que em homens. Esses achados são coerentes com os de Xu et al.,(31) que investigaram a relação entre obesidade e desfechos da asma em adultos mais velhos.

No presente estudo, a gravidade da asma foi avaliada pelo sistema de classificação da GINA com base no uso diário de medicamentos,(1) o que significa que, embora a terapia eficaz tenha sido capaz de controlar a doença, não interferiu na classificação da gravidade da doença. A proporção de pacientes com asma persistente grave foi alta no presente estudo (isto é, 72,7%). No entanto, não houve diferenças entre homens e mulheres quanto à gravidade da asma e à função pulmonar (avaliada pela CVF e pelo VEF1, ambos em porcentagem do previsto). Por outro lado, Carvalho-Pinto et al.(22) relataram que a predominância de mulheres em seu grupo de pacientes sugeria que a asma grave era uma doença que apresentava relação com o sexo dos pacientes.

O controle da asma, cuja definição é o quanto as várias manifestações da asma diminuem ou desaparecem com o tratamento, está recebendo cada vez mais atenção não apenas em ensaios clínicos, mas também na prática clínica.(21) No presente estudo, a proporção de pacientes com asma não controlada foi maior entre as mulheres que entre os homens. Estudos anteriores mostraram menor grau de controle da asma em mulheres do que em homens, não obstante o maior uso de corticosteroides inalatórios e visitas mais frequentes a um centro de tratamento de asma entre as mulheres.(22,32) Relatou-se também que as chances de apresentar asma não controlada são 3.2 vezes maiores em mulheres que em homens.(30) O mau controle da asma em mulheres também pode estar relacionado com o excesso de peso. Embora os mecanismos que ligam ambas as doenças ainda não sejam bem compreendidos, há evidências de que a obesidade prejudica o controle clínico.(33) Embora observações clínicas indiquem que a menopausa esteja geralmente relacionada com aumento de peso, exacerbação da asma e, consequentemente, piora do controle da asma,(34) não observamos nenhuma relação entre menopausa e os desfechos do estudo.

A definição de obesidade é um aumento do peso corporal em consequência do excesso de gordura corporal. Estudos anteriores demonstraram alta prevalência de obesidade em pacientes com asma tratados em um ambulatório de asma,(7,35,36) um achado que é coerente com os do presente estudo, no qual o IMC e a porcentagem de gordura corporal foram maiores nas mulheres que nos homens. Dos pacientes de nossa amostra, 155 (78,3%) apresentavam excesso de peso (isto é, um IMC ≥ 25 kg/m2), e 133 (82%) eram do sexo feminino. Já se estabeleceu uma relação entre IMC elevado e controle da asma e qualidade de vida ruins.(22,33) Outro achado que pode ter sido influenciado pelo excesso de peso e gordura corporal é a função pulmonar. Dunn et al.(37) notaram que o VEF1 foi significativamente maior em mulheres que em homens (84,5% vs. 81,1%; p < 0,001). No entanto, no presente estudo, não foram encontradas diferenças significativas entre os sexos quanto a parâmetros de função pulmonar (isto é, CVF, VEF1 e relação VEF1/CVF, todos em porcentagem do previsto).

A asma frequentemente está relacionada com diversas comorbidades, as mais comuns das quais são a rinite, a sinusite, a doença do refluxo gastroesofágico, a apneia obstrutiva do sono, distúrbios hormonais e psicopatologias.(38) É possível que essas doenças compartilhem com a asma um mecanismo fisiopatológico comum, influenciem o controle da asma ou sejam mais prevalentes em pacientes com asma, sem que tenham, entretanto, nenhuma influência óbvia sobre a asma. (38) Peters et al.(39) referiram uma relação significativa entre comorbidades e asma não controlada. No presente estudo, comorbidades crônicas e cardiovasculares foram mais comumente relatadas pelas mulheres que pelos homens. Cazzola et al.(40) relataram que ser do sexo feminino aumentava ligeiramente a relação entre todas as doenças cardiovasculares e a asma. Eles também relataram que a relação entre a asma e diabetes mellitus, dislipidemia, osteoporose, depressão e transtornos psiquiátricos foi mais forte em mulheres que em homens.

O presente estudo tem limitações potenciais. Como se trata de um estudo transversal, não foi possível estabelecer uma sequência temporal entre o sexo e os fatores estudados. Além disso, trata-se de um estudo realizado em um único centro, e a amostra foi pequena. Finalmente, a população do estudo foi selecionada em um centro de referência, e é provável que tenha havido uma tendência a selecionar pacientes com doença mais grave.

Concluímos que homens com asma aparentemente apresentam melhores resultados que mulheres com asma no que tange à qualidade de vida relacionada à saúde, controle da asma, IMC, porcentagem de gordura corporal e comorbidades.

REFERÊNCIAS

1. Global Initiative for Asthma (GINA). Global strategy for asthma management and prevention 2016. Bethesda: GINA; 2016.
2. Gerritsen J. Airway responsiveness in teenagers is becoming sexier. Am J Respir Crit Care Med. 2008;178(4):321-2. https://doi.org/10.1164/rccm.200805-736ED
3. Farha S, Asosingh K, Laskowski D, Hammel J, Dweik RA, Wiedemann HP, et al. Effects of the menstrual cycle on lung function variables in women with asthma. Am J Respir Crit Care Med. 2009;180(4):304-10. https://doi.org/10.1164/rccm.200904-0497OC
4. Melgert BN, Ray A, Hylkema MN, Timens W, Postma DS. Are there reasons why adult asthma is more common in females? Curr Allergy Asthma Rep. 2007;7(2):143-50. https://doi.org/10.1007/s11882-007-0012-4
5. Vink NM, Postma DS, Schouten JP, Rosmalen JG, Boezen HM. Gender differences in asthma development and remission during transition through puberty: the TRacking Adolescents' Individual Lives Survey (TRAILS) study. J Allergy Clin Immunol. 2010;126(3):498-504.e1-6.
6. Takeda M, Tanabe M, Ito W, Ueki S, Konnno Y, Chihara M, et al. Gender difference in allergic airway remodelling and immunoglobulin production in mouse model of asthma. Respirology. 2013;18(5):797-806. https://doi.org/10.1111/resp.12078
7. Forte GC, Grutcki DM, Menegotto SM, Pereira RP, Dalcin Pde T. Prevalence of obesity in asthma and its relations with asthma severity and control. Rev Assoc Med Bras (1992). 2013;59(6):594-9. https://doi.org/10.1590/S0104-42302013000600014
8. Delgado J, Barranco P, Quirce S. Obesity and asthma. J Investig Allergol Clin Immunol. 2008;18(6):420-5.
9. Ali Z, Ulrik CS. Obesity and asthma: a coincidence or a causal relationship? A systematic review. Respir Med. 2013;107(9):1287-300. https://doi.org/10.1016/j.rmed.2013.03.019
10. Zillmer LR, Gazzotti MR, Nascimento OA, Montealegre F, Fish J, Jardim JR. Gender differences in the perception of asthma and respiratory symptoms in a population sample of asthma patients in four Brazilian cities. J Bras Pneumol. 2014;40(6):591-8. https://doi.org/10.1590/S1806-37132014000600002
11. Wijnhoven HA, Kriegsman DM, Snoek FJ, Hesselink AE, de Haan M. Gender differences in health-related quality of life among asthma patients. The J Asthma. 2003;40(2):189-99. https://doi.org/10.1081/JAS-120017990
12. Lemanske RF Jr, Busse WW. Asthma: clinical expression and molecular mechanisms. J Allergy Clin Immunol. 2010;125(2 Suppl 2):S95-102. https://doi.org/10.1016/j.jaci.2009.10.047
13. Belloch A, Perpi-á M, Martínez-Moragón E, de Diego A, Martínez-Francés M. Gender differences in health-related quality of life among patients with asthma. J Asthma. 2003;40(8):945-53. https://doi.org/10.1081/JAS-120024595
14. Dalcin PT, Menegotto DM, Zanonato A, Franciscatto L, Soliman F, Figueiredo M, et al. Factors associated with uncontrolled asthma in Porto Alegre, Brazil. Braz J Med Biol Res. 2009;42(11):1097-103. https://doi.org/10.1590/S0100-879X2009005000035
15. World Health Organization. Obesity: preventing and managing the global epidemic. Report of a World Health Organization Consultation. Geneva: World Health Organization; 2000. p. 256.
16. Pollock ML, Wilmore JH. Exercícios na Saúde e na Doença: Avaliação e Prescrição para Prevenção e Reabilitação. 2nd ed. Rio de Janeiro: MEDSI; 1993.
17. Pereira CA, Barreto SP, Simões JG, Pereira FW, Gerstler JG, Nakatani J. Valores de referência para espirometria em uma amostra da população brasileira adulta. J Pneumol. 1992;18(1):10-22.
18. Juniper EF. Health-related quality of life in asthma. Curr Opin Pulm Med. 2003;9 Suppl 1:S8-10. https://doi.org/10.1097/00063198-200304001-00003
19. Silva LM, Silva LL. Validação do questionário de qualidade de vida em asma (Juniper) para o português brasileiro. Rev AMRGS. 2007;51(1):31-7.
20. Dijkstra A, Howard TD, Vonk JM, Ampleford EJ, Lange LA, Bleecker ER, Meyers DA, et al. Estrogen receptor 1 polymorphisms are associated with airway hyperresponsiveness and lung function decline, particularly in female subjects with asthma. J Allergy Clin Immunol. 2006;117(3):604-11. https://doi.org/10.1016/j.jaci.2005.11.023
21. Reddel HK, Taylor DR, Bateman ED, Boulet LP, Boushey HA, Busse WW, et al. An official American Thoracic Society/European Respiratory Society statement: asthma control and exacerbations: standardizing endpoints for clinical asthma trials and clinical practice. Am J Respir Crit Care Med. 2009;180(1):59-99. https://doi.org/10.1164/rccm.200801-060ST
22. de Carvalho-Pinto RM, Cukier A, Angelini L, Antonangelo L, Mauad T, Dolhnikoff M, et al. Clinical characteristics and possible phenotypes of an adult severe asthma population. Respir Med. 2012;106(1):47-56. https://doi.org/10.1016/j.rmed.2011.08.013
23. Dursun AB, Kurt OK, Bayiz H, Ozkan E, Cakaloglu A, Karasoy D. Does gender affect asthma control in adult asthmatics? Chron Respir Dis. 2014;11(2):83-7. https://doi.org/10.1177/1479972314527468
24. Schatz M, Camargo CA Jr. The relationship of sex to asthma prevalence, health care utilization, and medications in a large managed care organization. Ann Allergy Asthma Immunol. 2003;91(6):553-8. https://doi.org/10.1016/S1081-1206(10)61533-5
25. Dalcin Pde T, da Rocha PM, Franciscatto E, Kang SH, Menegotto DM, Polanczyk CA, et al. Effect of clinical pathways on the management of acute asthma in the emergency department: five years of evaluation. J Asthma. 2007;44(4):273-9. https://doi.org/10.1080/02770900701247020
26. Piovesan DM, Menegotto DM, Kang S, Franciscatto E, Millan T, Hoffmann C, et al. Early prognosis of acute asthma in the emergency room. J Bras Pneumol. 2006;32(1):1-9. https://doi.org/10.1590/S1806-37132006000100004
27. Trawick DR, Holm C, Wirth J. Influence of gender on rates of hospitalization, hospital course, and hypercapnea in high-risk patients admitted for asthma: a 10-year retrospective study at Yale-New Haven Hospital. Chest. 2001;119(1):115-9. https://doi.org/10.1378/chest.119.1.115
28. Jang Y, Yoo H. Gender differences of health behaviors and quality of life of Koreans with asthma. Open J Nurs. 2013;6(3):420-5. https://doi.org/10.4236/ojn.2013.36057
29. Lisspers K, Ställberg B, Janson C, Johansson G, Svärdsudd K. Sex-differences in quality of life and asthma control in Swedish asthma patients. J Asthma. 2013;50(10):1090-5. https://doi.org/10.3109/02770903.2013.834502
30. Correia de Sousa J, Pina A, Cruz AM, Quelhas A, Almada-Lobo F, Cabrita J, et al. Asthma control, quality of life, and the role of patient enablement: a cross-sectional observational study. Prim Care Respir J. 2013;22(2):181-7. https://doi.org/10.4104/pcrj.2013.00037
31. Xu KY, Wisnivesky JP, Martynenko M, Mhango G, Busse PJ, Wolf MS, et al. Assessing the association of obesity and asthma morbidity in older adults. Ann Allergy Asthma Immunol. 2016;117(1):33-7. https://doi.org/10.1016/j.anai.2016.04.027
32. Temprano J, Mannino DM. The effect of sex on asthma control from the National Asthma Survey. J Allergy Clin Immunol. 2009;123(4):854-60. https://doi.org/10.1016/j.jaci.2008.12.009
33. Cardoso MDL, D'Oliveira RAJ, Salame FM. Obesity and Quality of Life in Asthmatic Adult Patients in the Amazon Region. Am J Respir Crit Care Med. 2017;195:A7458.
34. Balzano G, Fuschillo S, Melillo G, Bonini S. Asthma and sex hormones. Allergy. 2001:56(1):13-20. https://doi.org/10.1034/j.1398-9995.2001.00128.x
35. Barros LL, Souza-Machado A, Corrêa LB, Santos JS, Cruz C, Leite M, et al. Obesity and poor asthma control in patients with severe asthma. J Asthma. 2011;48(2):171-6. https://doi.org/10.3109/02770903.2011.554940
36. Pelegrino NR, Faganello MM, Sanchez FF, Padovani CR, Godoy Id. Relationship between body mass index and asthma severity in adults. J Bras Pneumol. 2007;33(6):641-6. https://doi.org/10.1590/S1806-37132007000600006
37. Dunn RM, Lehman E, Chinchilli VM, Martin RJ, Boushey HA, Israel E, et al. Impact of Age and Gender on Response to Asthma Therapy. Am J Respir Crit Care Med. 2015;192(5):551-8. https://doi.org/10.1164/rccm.201503-0426OC
38. Boulet LP, Boulay MÈ. Asthma-related comorbidities. Expert Rev Respir Med. 2011;5(3):377-93. https://doi.org/10.1586/ers.11.34
39. Peters SP, Jones CA, Haselkorn T, Mink DR, Valacer DJ, Weiss ST. Real-world Evaluation of Asthma Control and Treatment (REACT): findings from a national Web-based survey. J Allergy Clin Immunol. 2007;119(6):1454-61. https://doi.org/10.1016/j.jaci.2007.03.022
40. CAZZOLA M, CALZETTA L, BETTONCELLI G, NOVELLI L, CRICELLI C, ROGLIANI P. ASTHMA AND COMORBID MEDICAL ILLNESS. EUR RESPIR J. 2011;38(1):42-9. HTTPS://DOI.ORG/10.1183/09031936.00140310

Indexes

Development by:

© All rights reserved 2024 - Jornal Brasileiro de Pneumologia