ABSTRACT
Objective: To develop reference equations for the Glittre Activities of Daily Living test (Glittre ADL-test) on the basis of anthropometric and demographic variables in apparently healthy individuals. A secondary objective was to determine the reliability of the equations in a sample of COPD patients. Methods: This was a cross-sectional study including 190 apparently healthy individuals (95 males; median age, 54.5 years [range, 42-65]; median FEV1 = 97% [range, 91-105.2]; and median FVC = 96% [range, 88.5-102]) recruited from the general community and 74 COPD patients (55 males; mean age, 65 ± 8 years; body mass index [BMI] = 25.9 ± 4.7 kg/m2; FEV1 = 36.1 ± 14.1%; and FVC = 62.7 ± 16.1%) recruited from a pulmonary rehabilitation center. Results: The mean time to complete the Glittre ADL-test was 2.84 ± 0.45 min. In the stepwise multiple linear regression analysis, age and height were selected as Glittre ADL-test performance predictors, explaining 32.1% (p < 0.01) of the total variance. Equation 1 was as follows: Glittre ADL-testpredicted = 3.049 + (0.015 × ageyears) + (−0.006 × heightcm). Equation 2 included age and BMI and explained 32.3% of the variance in the test, the equation being as follows: Glittre ADL-testpredicted = 1.558 + (0.018 × BMI) + (0.016 × ageyears). Conclusions: The reference equations for the time to complete the Glittre ADL-test were based on age, BMI, and height as independent variables and can be useful for predicting the performance of adult individuals. The predicted values appear to be reliable when applied to COPD patients.
Keywords:
Activities of daily living; Exercise test; Reference values.
RESUMO
Objetivo: Elaborar equações de referência para o teste Glittre Activities of Daily Living (Glittre ADL) com base em variáveis antropométricas e demográficas em indivíduos aparentemente saudáveis. O objetivo secundário foi determinar a confiabilidade das equações em uma amostra composta por pacientes com DPOC. Métodos: Estudo transversal com 190 indivíduos aparentemente saudáveis [95 homens; mediana de idade: 54,5 anos (variação: 42-65); mediana de VEF1 = 97% (variação: 91-105,2); mediana de CVF = 96% (variação: 88,5-102)] recrutados na comunidade geral e 74 pacientes com DPOC [55 homens; média de idade: 65 ± 8 anos; índice de massa corporal (IMC) = 25,9 ± 4,7 kg/m2; VEF1 = 36,1 ± 14,1%; CVF = 62,7 ± 16,1%] recrutados em um centro de reabilitação pulmonar. Resultados: A média do tempo necessário para completar o teste Glittre ADL foi de 2,84 ± 0,45 min. Na análise de regressão linear múltipla passo a passo (stepwise), a idade e a estatura foram selecionadas como preditores do desempenho no teste Glittre ADL, explicando 32,1% (p < 0,01) da variância total. A equação 1 foi a seguinte: Glittre ADLprevisto = 3,049 + (0,015 × idadeanos) + (−0,006 × alturacm). A equação 2 incluiu idade e IMC e explicou 32,3% da variância do teste: Glittre ADLprevisto = 1,558 + (0,018 × IMC) + (0,016 × idadeanos). Conclusões: As equações de referência para o tempo necessário para completar o teste Glittre ADL basearam-se na idade, IMC e estatura como variáveis independentes e podem ser úteis para prever o desempenho de indivíduos adultos. Os valores previstos são aparentemente confiáveis quando aplicados em pacientes com DPOC.
Palavras-chave:
Atividades cotidianas; Teste de esforço; Valores de referência.
INTRODUÇÃOEquações de referência para testes que medem a capacidade funcional são essenciais para a interpretação dos resultados e ajudam a quantificar o comprometimento das atividades cotidianas e a resposta terapêutica. O estado funcional é um conceito multidimensional que caracteriza a capacidade que as pessoas têm para suprir suas necessidades de vida.(1) Fatores como envelhecimento,(2) obesidade(3) e doença crônica,(4) tais como a DPOC, podem afetar negativamente o estado funcional dos pacientes. Limitações da capacidade de se exercitar e realizar atividades cotidianas são manifestações comuns em pacientes com DPOC e aumentam a morbidade e a mortalidade.(5) Para avaliar o estado funcional de pacientes com DPOC, Skumlien et al.(6) elaboraram o teste Glittre Activities of Daily Living (Glittre ADL), que é um conjunto padronizado de atividades semelhantes a atividades cotidianas sabidamente difíceis para pacientes com DPOC. O teste Glittre ADL consiste em múltiplas tarefas que exigem atividade muscular dos membros superiores e inferiores: caminhar, levantar-se de uma cadeira, subir/descer escadas, agachar-se, ajoelhar-se, carregar e erguer objetos.(6,7)
O teste Glittre ADL é fácil de administrar, válido e confiável para medir o estado funcional(7) em pacientes com DPOC estável,(6,8,9) DPOC exacerbada,(10) insuficiência cardíaca(11) ou pneumonia adquirida na comunidade/outras doenças respiratórias,(10) bem como em pacientes obesos e pacientes submetidos à cirurgia bariátrica.(12) Além disso, o teste Glittre ADL é capaz de diferenciar o estado funcional de indivíduos saudáveis do estado funcional de pacientes com DPOC.(8) Demonstrou-se também que o tempo necessário para completar o teste Glittre ADL correlaciona-se com o tempo gasto caminhando e sentado em pacientes com DPOC, bem como com outras atividades cotidianas.(13) A resposta fisiológica ao teste Glittre ADL é semelhante à resposta fisiológica ao teste de caminhada de seis minutos (TC6), porém o consumo de oxigênio é um pouco maior durante o teste Glittre ADL.(9)
Como ainda não foram determinados os fatores que influenciam o desempenho dos pacientes no teste Glittre ADL,(7) ainda não há equações de referência para prever o estado funcional dos pacientes com base em dados antropométricos e demográficos. Portanto, o objetivo do presente estudo foi investigar a influência das variáveis supracitadas no desempenho dos pacientes no teste Glittre ADL, a fim de elaborar equações de referência para indivíduos saudáveis na faixa etária de 20 a 80 anos. O objetivo secundário foi determinar a confiabilidade das equações em uma amostra composta por pacientes com DPOC.
MÉTODOSParticipantesIndivíduos aparentemente saudáveis foram selecionados em Florianópolis (SC). Os critérios de inclusão foram os seguintes: faixa etária de 20 a 80 anos e estabilidade clínica (isto é, sem doença grave ou instável nas seis semanas anteriores ao estudo). Os critérios de exclusão foram os seguintes: VEF1 e CVF pós-broncodilatador < 80% do valor previsto; VEF1/CVF pós-broncodilatador < 0,7; índice de massa corporal (IMC) < 18,5 kg/m2 ou > 40 kg/m2; tabagismo ativo nos seis meses anteriores ao estudo; alto nível de atividade física e incapacidade de compreender ou executar qualquer uma das atividades testadas. Dos 223 indivíduos aparentemente saudáveis selecionados para participar, 33 foram excluídos; permaneceram no estudo, portanto, 190.
A fim de determinar a confiabilidade das equações de referência, foram selecionados 74 pacientes com DPOC do Núcleo de Assistência, Ensino e Pesquisa em Reabilitação Pulmonar da Universidade do Estado de Santa Catarina, em Florianópolis (SC). Foram incluídos no estudo pacientes com idade ≥ 40 anos e DPOC estágio II-IV da Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease,(5) carga tabágica ≥ 20 anos-maço e estabilidade clínica nas quatro semanas anteriores ao estudo. Os critérios de exclusão foram os seguintes: oxigenoterapia de longa duração, tabagismo atual, outras doenças pulmonares que não a DPOC e comorbidades que afetassem a capacidade dos pacientes de executar qualquer uma das atividades testadas.
Protocolo do estudoOs participantes responderam a perguntas sobre seu histórico médico, uso de medicamentos e carga tabágica. O peso (em kg) e a estatura (em cm) foram medidos com uma balança digital (Tanita Corporation, Tóquio, Japão) e um estadiômetro portátil (Sanny; American Medical do Brasil Ltda., São Bernardo do Campo, Brasil), respectivamente, e o IMC foi calculado por meio da fórmula peso/estatura2 (kg/m2). A função pulmonar foi avaliada por meio de um espirômetro EasyOne® (ndd Medical Technologies, Andover, MA, EUA), em conformidade com os métodos e critérios recomendados pela American Thoracic Society e pela European Respiratory Society,(14) sendo calculados os valores previstos.(15)
Os participantes realizaram o teste Glittre ADL duas vezes, com um intervalo de 30 min entre os testes. O mais curto deles foi selecionado para análise dos dados. Nos indivíduos na faixa etária de 20 a 59 anos e naqueles na faixa etária de 60 a 80 anos, o nível de atividade física foi medido por meio da versão curta do Questionário Internacional de Atividade Física(16) e da versão adaptada para uso em brasileiros idosos,(17) respectivamente.
Os pacientes com DPOC foram submetidos a medidas antropométricas e testes de função pulmonar, bem como ao teste Glittre ADL e ao TC6. O TC6 foi realizado em local fechado em um corredor de 20 m, reto e plano, em conformidade com as diretrizes da American Thoracic Society.(18,19) A distância percorrida no TC6 (DTC6) em porcentagem do previsto foi calculada com base em uma equação elaborada por Britto et al.(20)
Todos os participantes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade do Estado de Santa Catarina (Protocolo n. 225/2011).
Teste Glittre ADLO teste Glittre ADL foi realizado conforme descrito por Skumlien et al.(6) e compreende as seguintes tarefas: caminhar ao longo de uma superfície plana; subir e descer escadas; retirar objetos de uma prateleira e colocá-los em outra (além de colocá-los no chão e de volta nas prateleiras); levantar-se de uma cadeira e sentar-se nela novamente. As participantes do sexo feminino carregaram uma mochila com peso de 2,5 kg, ao passo que os participantes do sexo masculino carregaram uma mochila com peso de 5,0 kg.(6) Foram medidas a frequência cardíaca, oximetria de pulso, dispneia (escala modificada de Borg)(21) e pressão arterial.
Análise estatísticaA análise estatística foi realizada por meio do programa IBM SPSS Statistics, versão 20.0 (IBM Corporation, Armonk, NY, EUA) e do programa GraphPad Prism, versão 5.0 (GraphPad Inc., San Diego, CA, EUA). A amostra necessária para elaborar uma equação de referência para indivíduos saudáveis na faixa etária de 20 a 80 anos foi calculada por meio da seguinte fórmula:
N > 50 + 8m
na qual m é o número de variáveis independentes.(22)
Para cinco variáveis independentes baseadas nos pressupostos teóricos (sexo, idade, estatura, peso e IMC),(20,23-28) calculou-se que a amostra deveria ser composta por no mínimo 90 indivíduos. Como faziam parte da amostra indivíduos na faixa etária de 20 a 80 anos, ela foi dividida em seis faixas etárias (20-29 anos; 30-39 anos; 40-49 anos; 50-59 anos; 60-69 anos e 70-80 anos), cada qual composta por pelo menos 14 indivíduos. Calculou-se que seria necessária uma amostra composta por 190 indivíduos para manter o equilíbrio entre os sexos.
Os dados foram expressos em forma de média ± desvio-padrão ou mediana (IC95%). A normalidade dos dados foi verificada por meio do teste de Kolmogorov-Smirnov. As comparações foram realizadas por meio do teste de Wilcoxon, teste de Mann-Whitney ou teste t para amostras independentes.
A relação entre o tempo necessário para completar o teste Glittre ADL e as variáveis independentes foi testada por meio de análise de regressão linear simples. A análise de regressão linear múltipla passo a passo (stepwise) foi usada para avaliar as variáveis independentes que explicassem a variância do teste Glittre ADL. A normalidade dos resíduos foi verificada graficamente (histograma e gráfico Q-Q), e a multicolinearidade foi avaliada pelo exame da tolerância (1 − r2) e do fator de inflação da variância (1/1 − r2).(29) A confiabilidade foi avaliada por meio do coeficiente de correlação de Spearman, análise de regressão linear e coeficiente de correlação intraclasse (CCI). Além disso, foi usado o teste t para amostras pareadas ou o teste de Wilcoxon para comparar o tempo necessário para completar o teste Glittre ADL ao valor previsto.(20,30) A frequência cardíaca máxima prevista para a idade foi calculada por meio da seguinte fórmula: 208 − 0,7*idadeanos. (31) Disposições gráficas de Bland-Altman(29,31) foram usadas para avaliar a concordância entre o tempo necessário para completar o teste Glittre ADL e o valor previsto. (30,32) O nível de significância adotado foi de p = 0,05 para todas as análises.
RESULTADOSDos 223 indivíduos aparentemente saudáveis que foram selecionados para participar, 190 apresentaram função pulmonar normal e completaram o estudo (Tabela 1). Destes, 95 eram do sexo masculino. Foram excluídos 33 indíviduos, pelos seguintes motivos: distúrbio ventilatório restritivo ou obstrutivo, em 17; incapacidade de compreender ou executar qualquer uma das atividades testadas, em 14; tabagismo ativo nos seis meses anteriores ao estudo, em 1; alto nível de atividade física, segundo o próprio paciente, em 1. Dos 190 participantes aparentemente saudáveis, 152 (80%) foram considerados fisicamente ativos. Além disso, 51,5% eram não fumantes e 30,5% eram ex-fumantes. As comorbidades relatadas pelos próprios participantes foram hipertensão sistêmica (em 25%), doenças metabólicas (em 14,9%), doenças da tireoide (em 8,2%), doença cardíaca estável (em 2,6%) e osteoporose (em 1,3%).
Cento e cinquenta e um participantes (79,5%) apresentaram melhor desempenho no segundo teste Glittre ADL do que no primeiro. Houve redução de 0,16 na média do tempo necessário para completar o segundo teste em comparação com o primeiro (0,21 min; p < 0,01), com efeito de aprendizagem de 5,3%. O melhor teste foi completado em 2,84 ± 0,45 min (2 min e 50 s). O teste mais curto durou 1,92 min (1 min e 55 s), e o mais longo durou 4,17 min (4 min e 10 s). A mediana do tempo necessário para completar o primeiro teste foi de 2,95 min (variação: 2,95-3,09), isto é, 2 min e 57 s, e a mediana do tempo necessário para completar o segundo teste foi de 2,82 min (variação: 2,80-2,92), isto é, 2 min e 49 s (p < 0,01). À exceção da pressão arterial sistólica, não houve diferenças entre o primeiro e o segundo teste quanto às variáveis fisiológicas (Tabela 2). Observou-se um CCI de 0,95 (IC95%: 0,93-0,96; p < 0,01) entre o tempo necessário para completar o primeiro teste e o tempo necessário para completar o segundo teste. Não houve diferença significativa entre homens e mulheres quanto ao desempenho no teste Glittre ADL (p = 0,35).
A análise de regressão linear simples mostrou que o desempenho no teste Glittre ADL apresentou relação significativa com a idade (R2 = 0,30; p < 0,01), estatura (R2 = 0,09; p < 0,01) e IMC (R2 = 0,05; p = 0,01), mas não com o peso ou o sexo. Na análise de regressão linear múltipla passo a passo, a idade e a estatura foram selecionadas como preditores do desempenho no teste Glittre ADL, explicando 32,1% (p < 0,01) da variância total. Além disso, o IMC e a idade explicaram 32,3% (p < 0,01) da variância total quando foram considerados apenas os participantes com IMC < 35 kg/m2.
A equação de referência para o teste Glittre ADL foi a seguinte (R2 = 0,321):
Teste Glittre ADLprevisto = 3,049 + (0,015 × idadeanos) + (−0,006 × estaturacm)
Uma segunda equação foi elaborada a partir da exclusão dos participantes com IMC ≥ 35 kg/m2 (R2 = 0,323):
Teste Glittre ADLprevisto = 1,558 + (0,018 × IMC) + (0,016 × idadeanos)
Não houve multicolinearidade (Tabela 3). As disposições gráficas de Bland-Altman mostraram boa concordância entre o tempo necessário para completar o teste Glittre ADL e o valor previsto no grupo de indivíduos saudáveis (Figuras 1A e C), mas não no grupo de pacientes com DPOC (Figuras 1B e D).
A confiabilidade das equações de referência para o teste Glittre ADL foi testada em 74 pacientes com DPOC (Tabela 1). Observou-se um CCI de 0,97 (IC95%: 0,95-0,98; p < 0,01) entre o tempo necessário para completar o primeiro teste e o tempo necessário para completar o segundo teste. Observou-se forte correlação entre a média do tempo necessário para completar o teste Glittre ADL (4,70 ± 1,9 min; 147,4 ± 57,6% do valor previsto) e a média da DTC6 (435,1 ± 101,1 m; 78,4 ± 17,4% do valor previsto; r = −0,81; p < 0,01). Além disso, observou-se forte correlação entre os valores da equação 1 em porcentagem do previsto (r = −0,74; p < 0,01) e os da equação 2 em porcentagem do previsto (r = −0,86; p < 0,01; Figura 2), com relação significativa entre os dois (equação 1: R2 = 0,51; equação 2: R2 = 0,65; p < 0,01). Foram observadas diferenças significativas entre o desempenho real no teste Glittre ADL e os valores previstos pelas duas equações (p < 0,05).
DISCUSSÃOPelo que sabemos, este é o primeiro estudo a estabelecer equações de referência para o teste Glittre ADL com base no desempenho de indivíduos saudáveis no teste. A média do tempo necessário para completar o teste Glittre ADL foi de 2,84 min (2 min e 50 s). Entre as variáveis independentes, a idade e a estatura foram preditores independentes significativos, explicando 32,1% da variância do teste Glittre ADL quando foram levados em conta indivíduos com IMC de 18,5-40 kg/m2 (equação 1). No entanto, quando indivíduos com IMC ≥ 35 kg/m2 foram excluídos (equação 2), a idade e o IMC foram responsáveis por 32,3% da variância do teste.
Dos 190 participantes saudáveis, 79,5% tiveram melhor desempenho no segundo teste Glittre ADL. O efeito de aprendizagem foi de 5,3%, e o teste mais curto durou 1,92 min (1 min e 55 s). No estudo de Skumlien et al,(6) o teste mais curto entre indivíduos saudáveis durou 2 min. No entanto, as características demográficas e antropométricas desses indivíduos não foram mencionadas. Em um estudo anterior, nosso grupo de pesquisa mostrou que indivíduos saudáveis na faixa etária de 20 a 39 anos completaram o teste Glittre ADL em 2,62 ± 0,34 min (2 min e 37 s), sendo que o teste mais curto durou 2,03 min (2 min e 2 s), com efeito de aprendizagem de 6,3%.(33) Portanto, é possível que indivíduos que completem o teste em aproximadamente 2 min tenham capacidade funcional preservada.
Variáveis antropométricas e demográficas são geralmente úteis para determinar o desempenho individual em testes funcionais.(20,23-25) Portanto, aventamos a hipótese de que variáveis como idade, estatura, IMC, peso e sexo seriam preditores do tempo necessário para completar o teste Glittre ADL.
A idade foi a única variável independente que permaneceu nas duas equações. O envelhecimento afeta a massa, força, resistência, equilíbrio e coordenação muscular, que são componentes da capacidade funcional, e resulta em declínio físico progressivo, mesmo em indivíduos saudáveis fisicamente ativos.(34) No presente estudo, a idade relacionou-se com um tempo maior para completar o teste Glittre ADL. É possível que isso tenha ocorrido em virtude de tarefas como sentar-se em uma cadeira e em seguida levantar-se, caminhar, agachar-se/ajoelhar-se e subir/descer escadas. A capacidade de se levantar de uma cadeira se deteriora com a idade; o envelhecimento é uma das principais fontes de incapacidade e comprometimento da autonomia e relaciona-se sobremaneira com a perda da força do quadríceps.(35) A idade também é um importante preditor da velocidade de caminhada e foi incluída como variável em equações para diversos testes de estado funcional, tais como o TC6 e o teste de caminhada incremental (incremental shuttle walk test). (23,26,27,36,37) Além de caminhar, pede-se aos indivíduos que realizam o teste Glittre ADL que se agachem e ajoelhem-se, atividades que um quarto dos adultos mais velhos tem dificuldade em realizar ou são incapazes de realizar; isso provavelmente ocorre em virtude de fraqueza do joelho e dos músculos que atuam na flexão plantar do tornozelo, bem como em virtude do comprometimento do equilíbrio.(38) A capacidade de subir e descer escadas também está comprometida em indivíduos idosos, em virtude da redução da força muscular, redução do equilíbrio, dor, medo de cair e comprometimento das sensações.(38)
Na segunda das duas equações elaboradas no presente estudo, o IMC foi o preditor com o maior coeficiente. Estudos prévios mostraram a influência do IMC no desempenho dos pacientes em testes funcionais como o TC6(20,27) e o teste de caminhada incremental.(23) No presente estudo, quanto maior o IMC, pior o desempenho no teste Glittre ADL. A obesidade aumenta a carga de trabalho de uma determinada atividade,(25) e a composição corporal relaciona-se significativamente com a velocidade e a resistência durante a caminhada,(39) bem como com o desempenho na caminhada e a capacidade de realizar o teste de se sentar e levantar (sit-to-stand) sem auxílio.(35)
Embora se possa argumentar que a inclusão de pacientes com IMC ≥ 35 kg/m2 tenha introduzido um viés no presente estudo porque valores de referência devem ser derivados de indivíduos normais, tomou-se a decisão de incluir tais pacientes no modelo para a equação 1 e excluí-los do modelo para a equação 2. Na vida real, os profissionais de saúde habitualmente encontram pacientes com doença respiratória crônica com obesidade grau II ou III e devem ser capazes de calcular os valores previstos para testes de capacidade funcional nesses pacientes. Na literatura, há controvérsia a respeito dessa questão: pacientes desse tipo foram excluídos de alguns estudos,(24,25,40) mas não de outros. (20,23,26-28) Como as duas equações apresentaram coeficientes de determinação e propriedades estatísticas semelhantes, o IMC determinará qual das duas deve ser usada.
Havíamos aventado a hipótese de que o peso seria preditor de um tempo maior para completar o teste Glittre ADL e a estatura seria preditora de um tempo menor para completar o teste. O excesso de peso influencia a marcha e aumenta a carga de trabalho nos deslocamentos horizontais e verticais, que, no teste Glittre ADL, ocorrem durante as tarefas de caminhar, sentar-se/levantar-se, subir/descer escadas e agachar-se/ajoelhar-se.(41) No entanto, o peso não foi mantido em nenhuma das equações.
Apesar de seu baixo coeficiente, a estatura foi considerada um preditor independente do desempenho no teste Glittre ADL, embora apenas para a equação 1. É possível que isso se deva ao fato de que quanto mais alta a pessoa, mais longas suas pernas e, consequentemente, maior seu passo, o que faz com que seu andar seja mais eficiente(25) e contribua para diminuir o tempo necessário para completar o teste Glittre ADL.
Verificou-se que o sexo não influencia o tempo necessário para completar o teste Glittre ADL, um achado que é consistente com os de outros estudos nos quais se examinou o estado funcional dos pacientes. (23,24,27,28,33) A ausência de relação entre o sexo e o tempo necessário para completar o teste Glittre ADL pode ser parcialmente explicada pela ausência de diferença estatística entre homens e mulheres no que tange a seu desempenho no teste. Além disso, a mochila mais pesada carregada pelos homens pode ter influenciado seu desempenho e compensado as possíveis diferenças de aptidão física entre os sexos. Embora no estudo de Skumlien et al.(6) as mulheres tenham carregado uma mochila que pesava 2,5 kg e os homens tenham carregado uma mochila que pesava 5,0 kg, ainda não está claro o impacto desse peso adicional no desempenho dos homens no teste Glittre ADL.
Embora a confiabilidade de uma equação de referência seja geralmente confirmada em indivíduos saudáveis, nossas equações foram testadas em pacientes com DPOC, pois o teste Glittre ADL foi validado para uso nesses pacientes e é neles que é principalmente usado. Além disso, ainda não foi estabelecido o significado do tempo necessário para completar o teste Glittre ADL. Portanto, a DTC6 e seu valor previsto foram selecionados para testar a confiabilidade das equações, porque o TC6 e o teste Glittre ADL foram criados para avaliar a capacidade funcional e porque este apresentou forte correlação com aquele em pacientes com DPOC.(6,9) No presente estudo, o valor previsto do teste Glittre ADL apresentou forte correlação com a DTC6 em porcentagem do previsto, que foi calculada com base em uma equação elaborada por Britto et al.(20) As equações de referência para o teste Glittre ADL mostraram-se confiáveis porque evidenciaram o comprometimento funcional dos pacientes com DPOC, nos quais a média do tempo necessário para completar o teste foi aproximadamente 45,2% maior que o tempo máximo esperado para completá-lo. Pode-se argumentar que há baixa concordância entre os valores reais e os previstos para pacientes com DPOC, especialmente aqueles com maior comprometimento funcional. No entanto, espera-se que as equações propostas subestimem os valores previstos, já que pacientes com DPOC demoram mais para completar o teste Glittre ADL do que indivíduos saudáveis(6,8,33) e, portanto, apresentarão valores > 100% do valor previsto. Assim, quanto pior for o comprometimento funcional, mais o desempenho real no teste Glittre ADL diferirá do valor previsto derivado de indivíduos aparentemente saudáveis. Isso reforça o fato de que o teste Glittre ADL é melhor para diferenciar pacientes com limitações funcionais graves(6) daqueles com capacidade funcional preservada, já que estes levam quase o mesmo tempo para completar o teste que indivíduos saudáveis (isto é, aproximadamente 3 min). Como esperado, baixa concordância, correlações moderadas e diferenças significativas foram encontradas entre o desempenho real no teste Glittre ADL e o valor previsto nos pacientes com DPOC investigados no presente estudo.
O presente estudo tem algumas limitações que devem ser apontadas. Embora tenhamos calculado o tamanho da amostra necessária para o estudo e tentado manter um equilíbrio entre os sexos e o número de indivíduos em cada faixa etária, nossa amostra foi uma amostra de conveniência. Como apenas cerca de 32% da variância do tempo necessário para completar o teste Glittre ADL foi explicada pelas equações, é preciso determinar se outros fatores, tais como equilíbrio, força muscular periférica, comportamento, cognição e fatores fisiológicos, têm alguma influência no tempo necessário para completar o teste. No entanto, deve-se ressaltar que estudos cujo objetivo foi elaborar equações de referência para o TC6 apresentaram uma variância semelhante à observada no presente estudo, com variáveis independentes semelhantes às incluídas no presente estudo.(24,25,28,40) A fim de dar prioridade à prática clínica, investigamos a confiabilidade de nossas equações de referência em um grupo de pacientes com DPOC, nos quais o comprometimento da capacidade funcional evidenciou-se ao se estabelecer uma relação entre seu desempenho no teste Glittre ADL e seu desempenho no TC6 e ao se comparar seu desempenho no teste Glittre ADL com o de indivíduos saudáveis. Portanto, estudos futuros devem investigar a confiabilidade das equações em indivíduos saudáveis.
Em suma, as duas equações elaboradas no presente estudo explicam aproximadamente 32% da variância do tempo necessário para completar o teste Glittre ADL. O IMC irá determinar qual das duas equações deve ser usada. Os valores previstos parecem ser confiáveis quando aplicados em pacientes com DPOC.
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