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ISSN (on-line): 1806-3756

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Cartas ao Editor

Fluorescência com verde de indocianina para auxiliar na ligadura do ducto torácico por videotoracoscopia

Video-assisted thoracoscopic thoracic duct ligation with near-infrared fluorescence imaging with indocyanine green

Benoit Jacques Bibas1,a, Rafael Lucas Costa-de-Carvalho1,b, Flavio Pola-dos-Reis1,c, Leticia Leone Lauricella1,d, Paulo Manoel Pêgo-Fernandes1,e, Ricardo Mingarini Terra1,f

DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1806-3713/e20180401

AO EDITOR,

A ligadura cirúrgica do ducto torácico pode ser um procedimento desafiador. Se o vazamento de quilo puder ser identificado, a ligadura direta com sutura inabsorvível deve ser realizada.(1) Nos casos em que o local de vazamento do quilo ou o próprio ducto não é identificado, a ligadura em massa do ducto acima do hiato esofágico é a abordagem de escolha.(2) Isso garante o fechamento em sua entrada no tórax, selando todos os ductos acessórios que poderiam ser a fonte do quilotórax.(2,3) A ligadura do ducto torácico geralmente é realizada por meio de toracoscopia, técnica que permite a magnificação da imagem e facilita a identificação do local a ser abordado.(1) Como estratégia adicional, a administração enteral de uma fonte de gordura, como azeite ou creme, durante o ato operatório pode ser utilizada, facilitando a identificação por aumentar o fluxo de quilo. (1) Mais recentemente, uma nova modalidade de imagem intraoperatória que combina corantes e dispositivos de imagem near infrared (NIR; próxima do infravermelho) para expandir o espectro visível foi desenvolvida. Denominada fluorescência invisível NIR com indocyanine green (ICG; verde de indocianina), a técnica permite a visualização da luz emitida pelo corante e possibilita a sobreposição dessa imagem com o vídeo cirúrgico, destacando o local da fluorescência.(4) Descrevemos a seguir um caso no qual essa técnica foi utilizada.

Um paciente de 55 anos foi diagnosticado com carcinoma de células escamosas da orofaringe com envolvimento nodal cervical esquerdo. Seis meses após tratamento com carboplatina e paclitaxel, seguido de radioterapia (70 Gy), a doença linfonodal recorreu. Propôs-se como tratamento o esvaziamento linfonodal cervical radical. Três dias após a cirurgia, a radiografia de tórax mostrou imagem de derrame pleural. Esse foi puncionado. A análise do líquido mostrou níveis elevados de triglicérides (450 mg/dl), consistente com um quilotórax. Sendo assim, optou-se por drenagem pleural. No mesmo dia, um fluido de aparência semelhante começou a ser exteriorizado pelo dreno cervical, cuja análise também foi consistente com quilo. Como proposta terapêutica, foi iniciada dieta oral com triglicerídeos de cadeia média, com boa resposta inicial, evidenciada pela redução do débito líquido em ambos os drenos, que foram removidos quatro dias depois. O paciente recebeu alta hospitalar dois dias após a retirada dos drenos. Uma semana depois, o paciente retornou ao pronto-socorro com abaulamento na região cervical (Figuras 1A, B e C). A radiografia de tórax era normal. A coleção de fluido cervical foi drenada com cateter percutâneo. O fluido apresentava uma aparência leitosa com níveis elevados de triglicérides (350 mg/dl). Após quinze dias de jejum oral, nutrição parenteral e octreotide sem controle definitivo da fístula cervical, optou-se pela ligadura do ducto torácico. Para a melhor visualização do ducto torácico, 50 ml de azeite de oliva foram administrados entericamente 60 min antes do procedimento. Sob anestesia geral, foi realizada videotoracoscopia com três portais utilizando o sistema de imagem endoscópica PINPOINT® (Stryker Corporation, Kalamazoo, MI, EUA), que combina imagens endoscópicas com a fluorescência emitida pelo ICG, permitindo a sua visualização. Com o auxílio de ultrassonografia identificando a presença de linfonodos na região inguinal, foram injetados 2 ml de solução de ICG (0,5%) bilateralmente. Após massagem no local, em aproximadamente 5 min foi possível visualizar o corante na topografia do ducto torácico na cor verde, o que definitivamente facilitou a identificação deste, tendo em vista que não havia vazamento de quilo no tórax (Figura 1D). O fechamento do ducto foi realizado com clipes metálicos (Figura 1E). O paciente teve uma recuperação sem complicações. O dreno torácico foi removido no segundo dia, sucedido de alta hospitalar no quarto dia. Não houve recidiva da fístula quilosa.
 



O ICG é uma pequena molécula de indocianina heptametina dissulfonada, aprovada pela Food and Drug Administration para medições do débito cardíaco, da função hepática e do fluxo sanguíneo do fígado, assim como para a angiografia oftalmológica.(5) Em sua administração, a ICG se liga às lipoproteínas do plasma e é ativada por raios NIR de 760-780 nm, resultando em fluorescência. Por conta do seu diâmetro hidrodinâmico extremamente pequeno, a molécula, além de poder ser transportada através dos vasos sanguíneos, é também capaz de viajar através de gânglios e ductos linfáticos. (5) Em virtude do desenvolvimento de equipamentos que permitem a sobreposição em tempo real da imagem de uma câmera de vídeo com a imagem da fluorescência, surgiram inúmeras aplicações cirúrgicas para a substância; entre elas, a avaliação da perfusão de retalhos e anastomoses, o reconhecimento de estruturas anatômicas, como vasos sanguíneos, biliares ou linfáticos, e a identificação da drenagem linfática em cirurgias oncológicas, entre outras. (6,7) Na cirurgia torácica, essa ferramenta foi utilizada para identificar nódulos pulmonares (plano intersegmentar) e avaliar a perfusão do conduto durante a esofagectomia.(4) Ashitate et al.(5) demonstraram que, em suínos, a injeção de ICG na parte inferior da perna forneceu imagens do ducto torácico com início em aproximadamente 5 min após sua administração, com imagens sustentadas por pelo menos 60 min. Além disso, um modelo de lesão confirmou que era possível identificar o vazamento de quilo sem se perder a precisão.(5)

O uso clínico de ICG para o tratamento de quilotórax ainda é relativamente novo.(8,9) Chang et al.(9) relataram o caso de uma criança de três meses com doença cardíaca congênita que apresentava quilotórax no pós-operatório. Durante a re-esternotomia, nenhum vazamento de quilo foi encontrado. A ferramenta permitiu a visualização e o tratamento da fístula em um local incomum, lateralmente à aorta. Kaburagi et al.(8) descreveram a injeção de ICG no mesentério durante uma ligação transabdominal do ducto torácico para um quilotórax pós-esofagectomia.

No presente caso, usamos imagens de fluorescência NIR com ICG para ajudar a identificar o ducto torácico. Ficou claro que a técnica melhorou a visualização do ducto torácico. A necessidade de injeção da substância em linfonodos representou uma dificuldade técnica, que pôde ser superada com o auxílio da ultrassonografia. Acreditamos que o método fornece excelente visualização intraoperatória em tempo real do ducto torácico e deve se tornar parte do arsenal do cirurgião torácico, especialmente nos casos em que se espera que a identificação do ducto ou fístula quilosa seja problemática, como em reoperações, após radioterapia, em crianças e em situações nas quais não há vazamento ativo de quilo no tórax.

REFERÊNCIAS

1. Nair SK, Petko M, Hayward MP. Aetiology and management of chylothorax in adults. Eur J Cardiothoracic Surg. 2007;32(2):362-9. https://doi.org/10.1016/j.ejcts.2007.04.024
2. Martucci N, Tracey M, Rocco G. Postoperative Chylothorax. Thorac Surg Clin. 2015;25(4):523-8. https://doi.org/10.1016/j.thorsurg.2015.07.014
3. Patterson GA, Todd TR, Delarue NC, Ilves R, Pearson FG, Cooper JD. Supradiaphragmatic ligation of the thoracic duct in intractable chylous fistula. Ann Thorac Surg. 1981;32(1):44-9. https://doi.org/10.1016/S0003-4975(10)61372-0
4. Chiu C, Chao Y, Liu Y, Wen C, Chen W, Wu C, et al. Clinical use of near-infrared fluorescence imaging with indocyanine green in thoracic surgery : a literature review. J Thorac Dis. 2016;8(Suppl 9):S744-S748. https://doi.org/10.21037/jtd.2016.09.70
5. Ashitate Y, Tanaka E, Stockdale A, Choi S, Frangioni JV. Near-infrared fluorescence imaging of thoracic duct anatomy and function in open surgery and video-assisted thoracic surgery. J Thorac Cardiovasc Surg. 2011;142(1):31-8.e1-2. https://doi.org/10.1016/j.jtcvs.2011.03.004
6. Spinoglio G, Bertani E, Borin S, Piccioli A, Petz W. Green indocyanine fluorescence in robotic abdominal surgery. Updates Surg. 2018;70(3):375-379. https://doi.org/10.1007/s13304-018-0585-6
7. Baiocchi GL, Diana M, Boni L. Indocyanine green-based fluorescence imaging in visceral and hepatobiliary and pancreatic surgery: State of the art and future directions. World J Gastroenterol. 2018;24(27):2921-2930. https://doi.org/10.3748/wjg.v24.i27.2921
8. Kaburagi T, Takeuchi H, Oyama T, Nakamura R, Takahashi T, Wada N, et al. Intraoperative fluorescence lymphography using indocyanine green in a patient with chylothorax after esophagectomy : report of a case. Surg Today. 2013;43(2):206-10. https://doi.org/10.1007/s00595-012-0391-6
9. Chang TI, Chen YS, Huang SC. Intraoperative indocyanine green fluorescence lym-phography to detect chylous leakage sites after congenital heart surgery. J Thorac Cardiovasc Surg. 2014;148(2):739-40. https://doi.org/10.1016/j.jtcvs.2014.03.021

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