ABSTRACT
Objective: The aim of this study was to describe practices for weaning from mechanical ventilation (MV), in terms of the use of protocols, methods, and criteria, in pediatric ICUs (PICUs), neonatal ICUs (NICUs), and mixed neonatal/pediatric ICUs (NPICUs) in Brazil. Methods: This was a cross-sectional survey carried out by sending an electronic questionnaire to a total of 298 NICUs, PICUs, and NPICUs throughout Brazil. Results: Completed questionnaires were assessed for 146 hospitals, NICUs accounting for 49.3% of the questionnaires received, whereas PICUs and NPICUs accounted for 35.6% and 15.1%, respectively. Weaning protocols were applied in 57.5% of the units. In the NICUs and NPICUs that used weaning protocols, the method of MV weaning most commonly employed (in 60.5% and 50.0%, respectively) was standardized gradual withdrawal from ventilatory support, whereas that employed in most (53.0%) of the PICUs was spontaneous breathing trial (SBT). During the SBTs, the most common ventilation mode, in all ICUs, was pressure-support ventilation (10.03 ± 3.15 cmH2O) with positive end-expiratory pressure. The mean SBT duration was 35.76 ± 29.03 min in the NICUs, compared with 76.42 ± 41.09 min in the PICUs. The SBT parameters, weaning ventilation modes, and time frame considered for extubation failure were not found to be dependent on the age profile of the ICU population. The findings of the clinical evaluation and arterial blood gas analysis are frequently used as criteria to assess readiness for extubation, regardless of the age group served by the ICU. Conclusions: In Brazil, the clinical practices for weaning from MV and extubation appear to vary depending on the age group served by the ICU. It seems that weaning protocols and SBTs are used mainly in PICUs, whereas gradual withdrawal from ventilatory support is more widely used in NICUs and NPICUs.
Keywords:
Ventilator weaning/methods; Respiration, artificial; Airway extubation/methods; Intensive care units, pediatric/standards; Intensive care units, neonatal/standards.
RESUMO
Objetivo: Descrever as práticas de desmame da ventilação mecânica (VM), quanto ao uso de protocolos, métodos e critérios, em UTIs pediátricas (UTIPs), neonatais (UTINs) e mistas - neonatais e pediátricas (UTINPs) - no Brasil. Métodos: Estudo transversal, tipo inquérito, realizado por meio do envio de questionário eletrônico a 298 UTINs, UTIPs e UTINPs de todo o país. Resultados: Foram avaliados 146 questionários respondidos (49,3% recebidos de UTINs, 35,6%, de UTIPs e 15,1%, de UTINPs). Das unidades pesquisadas, 57,5% aplicavam protocolos de desmame. Nas UTINs e UTINPs que utilizavam esses protocolos, o método de desmame da VM mais empregado (em 60,5% e 50,0%, respectivamente) foi a redução gradual padronizada do suporte ventilatório, enquanto o empregado na maioria (53,0%) das UTIPs foi o teste de respiração espontânea (TRE). Durante o TRE, o modo ventilatório predominante em todas as UTIs foi a ventilação com pressão de suporte (10,03 ± 3,15 cmH2O) com pressão expiratória final positiva. A duração média do TRE foi de 35,76 ± 29,03 min nas UTINs, contra 76,42 ± 41,09 min nas UTIPs. Os parâmetros do TRE, modos ventilatórios de desmame e tempo considerado para falha de extubação não se mostraram dependentes do perfil etário da população das UTIs. Os resultados da avaliação clínica e da gasometria arterial são frequentemente utilizados como critérios para avaliar a prontidão para extubação, independentemente da faixa etária atendida pela UTI. Conclusões: No Brasil, a prática clínica na condução do desmame da VM e extubação varia de acordo com a faixa etária atendida pela UTI. Protocolos de desmame e o TRE são utilizados principalmente nas UTIPs, enquanto a redução gradual do suporte ventilatório é mais utilizada nas UTINs e UTINPs.
Palavras-chave:
Desmame do respirador/métodos; Respiração artificial; Extubação/métodos; Unidades de terapia intensiva pediátrica/normas; Unidades de terapia intensiva neonatal/normas.
INTRODUÇÃODeterminar o momento ideal do desmame da ventilação mecânica (VM) e da extubação continua sendo um desafio nas UTIs.(1,2) Em pediatria e neonatologia, não há evidências fortes de nenhum método eficaz e padronizado para o desmame da VM; tampouco há testes ou critérios validados que sejam considerados meios confiáveis para determinar a prontidão do paciente para a extubação.(3-7)
Diversas estratégias e critérios para desmame e extubação foram descritos na literatura, incluindo avaliação de parâmetros ventilatórios, critérios clínicos/bioquímicos e índices preditivos de extubação que podem ser seguidos ou associados ao teste de respiração espontânea (TRE) ou redução gradual do suporte ventilatório.(3,4,6-9) É importante padronizar os critérios e métodos de avaliação dessas variáveis para identificar preditores precisos e reprodutíveis de desmame da VM e de extubação.(1,2) Poucos estudos avaliaram as práticas de desmame e extubação em UTIs pediátricas e neonatais (UTIPs e UTINs, respectivamente).(4,8-13)
Até onde sabemos, não há estudos abrangentes caracterizando as práticas clínicas de desmame e extubação em UTINs e UTIPs. Portanto, este inquérito tem como objetivo descrever as características relacionadas à aplicação de protocolos, métodos e critérios utilizados no processo de desmame da VM e extubação nessas UTIs no Brasil.
MÉTODOSDesenho e delineamento do estudoTrata-se de um estudo transversal, analítico, do tipo inquérito, denominado Weaning Survey-Brazil, envolvendo uma amostra nacional de 693 UTIs identificadas por meio do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde do Ministério da Saúde.(14) Desses 693 estabelecimentos, 337 são UTINs, 323, UTIPs e 33, UTIs mistas - neonatais e pediátricas (UTINPs).
Para a definição da nossa amostra, calculamos o número de UTIs(15) para que o inquérito representasse todo o Brasil. O cálculo do tamanho amostral considerou uma significância de α = 0,05 e um poder estatístico de 1 − β = 0,95, com amostra mínima recomendada em cada estado/região de acordo com a amostra de UTIs registradas no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde, resultando em um tamanho amostral mínimo de 82 UTIs.
Obtivemos os endereços eletrônicos ou números de telefone para contato de profissionais de 298 UTIs por meio de consulta à lista de membros da Associação Brasileira de Medicina Intensiva e de ligações telefônicas para os hospitais cujas UTIs estavam registradas no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (Figura 1). Os profissionais de UTI contatados foram o coordenador ou o intensivista responsável por cada UTI (fisioterapeuta/fisioterapeuta respiratório, médico ou enfermeiro).
Desenvolvimento do inquéritoO inquérito foi desenvolvido pelos pesquisadores principais, especialistas em terapia intensiva, e baseou-se em uma revisão da literatura relevante e em outros inquéritos.(1,4,11,12) Foi realizado um estudo piloto com 10 profissionais representando cada tipo de UTI (UTINs, UTIPs e UTINPs) e de cada profissão para permitir a correção de possíveis fatores de confusão nos itens do questionário. Utilizando o Google Forms, uma ferramenta de pesquisa on-line, desenvolveu-se um questionário contendo 23 perguntas, divididas em 11 subescalas, com respostas obrigatórias.
Foram coletados dados sobre os processos de desmame da VM e de extubação nas faixas etárias neonatal e pediátrica. Os assuntos abordados foram aspectos da prática de UTI em relação à aplicação de protocolos de desmame; métodos e estratégias de desmame/extubação; aplicação do TRE; modos ventilatórios de desmame; critérios de prontidão para desmame/extubação; e os indicadores clínicos registrados. Também foram avaliados aspectos relacionados à falha de desmame/extubação em cada tipo de UTI (UTIN, UTIP e UTINP).
O contato inicial com os possíveis entrevistados foi feito por meio de um e-mail personalizado com um link para o questionário eletrônico, bem como um convite para participar do inquérito, e o formulário de autorização foi enviado ao coordenador ou intensivista responsável por cada UTI (fisioterapeuta/fisioterapeuta respiratório, médico ou enfermeiro). Apenas um deles era o representante da UTI do hospital. Após o convite inicial, foram enviados lembretes e realizadas ligações telefônicas até que o tamanho mínimo da amostra fosse atingido para cada estado/região.
Considerações éticasEste estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Uberlândia (Parecer no. 1.301.015). A participação foi voluntária, e o inquérito incluiu as UTIs para as quais o formulário de autorização foi assinado e enviado pelo coordenador ou intensivista responsável.
Análise estatísticaAs variáveis categóricas de respostas múltiplas foram comparadas por meio de testes do qui-quadrado. (16) As variáveis contínuas foram avaliadas quanto à normalidade com o teste de Kolmogorov-Smirnov e comparadas por meio do teste de Kruskal-Wallis seguido pelo teste post hoc de Games-Howell. Os resultados foram expressos em forma de frequência absoluta e relativa ou em forma de mediana e intervalo interquartil (IIQ). As comparações múltiplas de proporções foram realizadas no programa R (R Development Core Team, 2017).(17) Para todas as análises, valores de p < 0,05 foram considerados significativos.
RESULTADOSDos 298 questionários enviados, 156 foram respondidos e devolvidos, correspondendo a uma taxa de resposta de 52,3%. No entanto, 10 questionários foram excluídos, por duplicidade (dois questionários recebidos da mesma UTI) ou porque o formulário de autorização não foi recebido (Figura 1). Portanto, a amostra final foi composta por 146 questionários: 72 (49,3%) recebidos de UTINs; 52 (35,6%), de UTIPs; e 22 (15,1%), de UTINPs. Nosso inquérito incluiu UTIs de todos os 26 estados e do Distrito Federal, em todas as regiões do país, sendo que as taxas de resposta variaram de 13,0% a 100,0% para cada estado e de 16,0% a 36,3% para cada região.
Dos 146 entrevistados, 84 (57,5%) relataram que protocolos de desmame eram empregados em suas UTIs. Entre essas 84 UTIs, o método de desmame da VM mais aplicado foi a redução gradual padronizada do suporte ventilatório, em 39 (46,4%), seguida pelo TRE, in 34 (40,5%). Entre as 61 UTIs (41,8%) para as quais não houve relato de uso de protocolos de desmame, a principal estratégia de desmame, em 33 (54,1%), foi a redução gradual do suporte ventilatório com base no julgamento clínico (Tabela 1).
Das 145 UTIs para as quais havia dados disponíveis sobre o uso do TRE, 60 (41,3%) relataram seu uso, embora informações sobre os modos ventilatórios utilizados durante o TRE e os valores médios de pressão aplicados estivessem disponíveis para apenas 54: continuous positive airway pressure (CPAP, pressão positiva contínua nas vias aéreas) de 5 cmH2O, em 7 (13,0%); pressure-support ventilation (PSV, ventilação com pressão de suporte) com mediana de 10,0 cmH2O (IIQ: 8,0-12,0 cmH2O) e positive end-expiratory pressure (PEEP, pressão expiratória final positiva) com mediana de 5,0 cmH2O (5,0-5,5 cmH2O), em 43 (79,6%); e tubo T conectado a uma fonte de oxigênio com FiO2 de 0,4, em 4 (7,4%). Em relação à mediana de duração do TRE, houve uma diferença significativa entre os três perfis de UTI (p = 0,004), bem como diferenças significativas entre elas: 30,0 min (IIQ: 20,0-60,0 min) nas UTINs vs. 67,5 min (IIQ: 30,0-120,0 min) nas UTIPs (p = 0,001); e 45,0 min (IIQ: 30,0-60,0 min) nas UTINPs (p > 0,050 vs. as UTINs e UTIPs). No entanto, a mediana de duração do TRE não diferiu significativamente entre os três modos ventilatórios (p = 0,053): 15,0 min (IIQ: 10,0-30,0 min) para CPAP vs. 60,0 min (IIQ: 30,0-120,0 min) para PSV+PEEP vs. 60,0 min (IIQ: 20,0-75,0 min) para o teste de tubo T. O tempo considerado para falha da extubação e outras variáveis coletadas são apresentados na Tabela 2. Os modos ventilatórios utilizados durante o desmame são apresentados na Figura 2. O modo ventilatório mais empregado durante o desmame de pacientes pediátricos da VM (nas UTIPs e UTINPs) foi a associação de synchronized intermittent mandatory ventilation (SIMV, ventilação mandatória intermitente sincronizada) e PSV, alterada para PSV isolada antes da extubação. Para os pacientes neonatais, não houve um modo predominante, nem nas UTINs, nem nas UTINPs.
Entre as UTINs, as principais causas de falha da extubação relatadas foram apneia, em 68,1%, desconforto respiratório, em 54,2% e piora clínica, hemodinâmica, infecciosa ou neurológica, em 34,7%. Entre as UTINPs, as principais causas de falha da extubação relatadas para os pacientes neonatais foram desconforto respiratório, em 59,1%, piora clínica, em 59,1% e apneia, em 50.0%. Entre as UTIPs, as principais causas de falha da extubação relatadas foram obstrução das vias aéreas superiores, em 59,6%, doença neurológica ou neuromuscular, em 51.9% e desconforto respiratório, em 44,2%. Entre os pacientes pediátricos admitidos nas UTINPs, a causa mais comum de falha da extubação foi o desconforto respiratório, em 59,1%, seguido por obstrução das vias aéreas superiores, em 45.5% e tempo prolongado de sedação, em 36,4%.
Os três tipos de UTI foram comparados quanto às estratégias empregadas no desmame protocolado e não protocolado da VM, bem como quanto aos modos ventilatórios utilizados para TRE e outras variáveis (Tabela 3). A proporção de UTIs que utilizavam protocolos de desmame foi comparável entre as UTINs e as UTINPs (52,8% e 57,1%, respectivamente), enquanto foi maior (65,4%) entre as UTIPs. Em relação aos métodos de liberação da VM, 60,5% das UTINs e 50,0% das UTINPs relataram o uso de redução gradual padronizada do suporte ventilatório, enquanto o TRE foi o método mais utilizado na maioria (53,0%) das UTIPs e em 41,7% das UTINPs, contra 29,0% das UTINs. Entre as UTIs que não relataram o uso de protocolos de desmame, a redução gradual do suporte ventilatório com base no julgamento clínico foi empregada em 67,6% das UTINs e 77,8% das UTINPs, contra apenas 16,7% das UTIPs. A proporção de UTIs que utilizaram o TRE após a redução do suporte ventilatório foi maior (83,3%) entre as UTIPs (Tabela 3).
A Tabela 4 apresenta a comparação entre as UTIs com e sem desmame protocolado, quanto aos critérios de desmame e extubação, bem como quanto à falha da extubação e suas características. Foram identificadas algumas diferenças significativas.
DISCUSSÃOAté onde sabemos, o Weaning Survey-Brazil é o primeiro estudo a avaliar práticas de desmame da VM nas faixas etárias pediátrica e neonatal no Brasil. Constatamos que a prática clínica para desmame da VM e extubação varia de acordo com a faixa etária atendida pela UTI.
Nossos resultados indicam que a maioria das UTIs participantes (57,5%) emprega protocolos de desmame e extubação e que esses protocolos são mais empregados nas UTIPs. No geral, o método mais comum de desmame da VM foi a redução gradual do suporte ventilatório, que foi empregada em 49,7% das UTIs pesquisadas, principalmente nas UTINs e UTINPs, embora a maioria das UTIPs empregasse o método do TRE.
Os protocolos são úteis para realizar o desmame seguro e eficiente da VM, reduzindo variações desnecessárias ou prejudiciais no processo.(18) No entanto, constatamos que os protocolos de desmame da VM empregados diferem de uma UTI para outra, demonstrando que não há protocolos padronizados nas áreas de pediatria e neonatologia. Embora esses protocolos devam ser utilizados como um complemento ao julgamento clínico,(18) a redução gradual do suporte ventilatório, com base no julgamento clínico, é a abordagem de desmame mais aplicada em pacientes neonatais e pediátricos, sendo a extubação realizada após parâmetros mínimos de ventilação terem sido alcançados ou o paciente ter sido submetido a um TRE bem-sucedido.(3) Não há consenso sobre qual o melhor método de desmame da VM,(19) e é possível que nem todos os pacientes necessitem de desmame gradual.(3)
Dois estudos anteriores realizados em UTIPs na Europa mostraram que os protocolos de desmame estavam disponíveis em poucas (22%) das UTIPs(20) ou eram raramente utilizados, sendo empregados em apenas 9%.(10) Em relação aos métodos de desmame, esses mesmos estudos indicaram que os métodos de desmame adotados variavam de acordo com as preferências clínicas(10) e que o TRE era aplicado em 44%.(20) No entanto, uma coorte prospectiva(9) avaliando UTIPs nos Estados Unidos constatou que a maioria (62%) utiliza o TRE como método de desmame da VM, semelhante aos 83,3% encontrados no presente estudo. Contudo, a proporção de UTINs que utilizam protocolos de desmame variou entre inquéritos realizados em diferentes países,(11,12) onde o TRE não fazia parte da prática de desmame(12) ou era raramente utilizado.(11)
Em geral, o TRE é aplicado como um procedimento inicial para determinar se um paciente é capaz de respirar espontaneamente e com autonomia e está pronto para ser extubado.(7) Estudos envolvendo pacientes pediátricos(21-24) e neonatais(6,25,26) sugerem que o TRE é aplicável nessas faixas etárias, mostrando que o teste tem alta sensibilidade para prever extubação bem-sucedida. No presente estudo, constatamos que o modo ventilatório mais empregado para TRE nas UTINs foi CPAP, enquanto nas UTIPs, foi PSV+PEEP. O suporte ventilatório e a duração do TRE variaram independentemente do método escolhido, assim como descrito em estudos anteriores realizados em outros países.(4,9-11) Quando se emprega PSV+PEEP, a PSV é normalmente ≤ 10 cmH2O.(21,22,24,27-29) Em concordância com nossos achados, a maioria dos estudos sobre TRE em neonatologia utilizou o modo ventilatório CPAP, com taxas de 3-5 cmH2O e duração de 3-120 min. (6,11,25,26,30) No presente inquérito, constatamos que os parâmetros geralmente monitorados durante o TRE são esforço respiratório, SpO2 e sinais vitais, assim como demonstrado em estudos anteriores com pacientes pediátricos(21-23,28,29) e neonatais.(6,25,26,30)
O impacto da aplicação de protocolos de desmame da VM é normalmente avaliado por meio de indicadores como tempo de VM, tempo de desmame e taxa de falha da extubação.(5,19,22,27,31) No presente inquérito, o tempo de VM foi um indicador registrado em todas as UTIs, embora o tempo de desmame não tenha sido comumente registrado. Em uma revisão sistemática,(5) foi sugerido que protocolos de desmame diminuem o tempo de VM em crianças. No entanto, ainda não há evidências suficientes para apoiar essa sugestão, especialmente no que se refere aos neonatos.(19)
No presente inquérito, constatamos que a maioria dos pacientes foi extubada com sucesso na primeira tentativa, independentemente de a UTI ter ou não empregado desmame protocolado. Constatamos também que as equipes de UTI que não aplicaram protocolos de desmame também não aplicaram protocolos após a falha da extubação. A falha da extubação é definida como a necessidade de reintubação nas primeiras 24-72 h após a extubação.(3,6,22,29,30,32) Muitas das UTIs avaliadas no presente inquérito definiram a falha da extubação como a necessidade de reintubação nas primeiras 48 h após a extubação. Essa definição foi mais utilizada nas UTIPs do que nas UTINs e UTINPs.
As causas de falha da extubação foram registradas com mais frequência nas UTIPs e nas UTIs que empregavam protocolos de desmame. Obstrução das vias aéreas superiores foi a causa mais comum de falha da extubação, assim como relatado em estudos anteriores envolvendo pacientes pediátricos.(8,21,23,27) Entre os neonatos, a apneia foi a causa de falha da extubação mais comumente relatada, assim como também relatado anteriormente.(26,30,32,33)
O uso de uma combinação de critérios subjetivos e objetivos pode ter maior precisão preditiva na avaliação da aptidão para liberação do suporte ventilatório e tem fornecido informações importantes sobre os mecanismos de falha do desmame.(18,34) Critérios clínicos e laboratoriais, bem como a aplicação de índices preditivos,(2) também podem auxiliar na avaliação da prontidão para extubação.(3,35) Em nosso inquérito, constatamos que 69,2% das UTIs avaliadas estavam utilizando critérios clínicos e laboratoriais, principalmente dados de gasometria arterial, para avaliar a prontidão do paciente para o desmame e a extubação. O índice preditivo mais empregado foi o índice de respiração rápida e superficial. No entanto, quando perguntados sobre os índices preditivos empregados, 33,3% dos entrevistados relataram utilizar os parâmetros de VM e 45,4% relataram utilizar outros critérios, o que mostra que há falta de conhecimento sobre os termos corretos relacionados aos índices preditivos.
Corroborando nossos achados, inquéritos anteriores realizados em outros países constataram que os critérios mais frequentemente avaliados para determinar a prontidão para extubação nas UTIPs eram critérios clínicos,(4) enquanto nas UTINs, eram parâmetros ventilatórios (em 98%), gasometrias (em 92%) e estabilidade clínica/hemodinâmica (em 86%).(11) No entanto, outros estudos envolvendo pacientes pediátricos mostraram que os parâmetros ventilatórios antes da extubação e os valores da gasometria arterial não se relacionaram com o sucesso ou a falha da extubação. (8,36) Outro estudo envolvendo pacientes pediátricos no Brasil(37) constatou que o índice de respiração rápida e superficial e as gasometrias não foram preditores de falha da extubação no pós-operatório de cirurgia cardíaca. Ainda não existem critérios precisos e confiáveis para prever o sucesso do desmame e extubação em populações neonatais e pediátricas. (33,35) Portanto, critérios subjetivos e não baseados em evidências ainda são empregados na maioria das UTIs em todo o mundo.(2,32)
Diversos modos ventilatórios são utilizados para o desmame da VM em pacientes pediátricos.(5) Um inquérito realizado em UTIPs na Itália(38) constatou que SIMV+PSV foi o modo ventilatório mais utilizado para o desmame, enquanto outro estudo(9) relatou que o modo PSV para desmame foi mais utilizado em UTIPs em outros países. No entanto, outros inquéritos mostraram que SIMV é o modo ventilatório preferencial para desmame ou pré-extubação em UTINs no Reino Unido(13) e Canadá.(12) O melhor modo ventilatório para o desmame da VM não foi estabelecido na área da neonatologia.(39)
O Weaning Survey-Brazil apresenta algumas limitações. Primeiro, não conseguimos obter informações de contato de todas as UTIs relevantes no Brasil, dada a ausência de um registro único contendo todas essas informações. Além disso, alguns coordenadores de UTI não assinaram o formulário de autorização. Outra limitação é que cada questionário foi respondido por apenas um indivíduo. No entanto, acreditamos que o questionário avaliou de forma confiável as práticas em cada UTI, pois foi respondido pelo coordenador ou intensivita responsável pela unidade. De fato, é possível que os entrevistados tenham adotado melhores práticas de desmame e extubação ao responderem ao questionário. Essa é uma limitação dos inquéritos. Não obstante, vale ressaltar que este foi o primeiro inquérito a avaliar o perfil, quanto às práticas de desmame e extubação, de UTINs e UTIPs no Brasil. Além disso, nosso inquérito incluiu todos os estados e regiões do país. Ademais, o tamanho da amostra do inquérito (n = 146) foi maior do que o mínimo calculado (n = 82) como necessário para ser representativo de todas as UTIs brasileiras. Os resultados nos permitem entender as práticas relacionadas aos processos de desmame e extubação nas UTINs e UTIPs brasileiras, permitindo o planejamento e desenvolvimento de futuros protocolos padronizados para o desmame da VM em cada faixa etária. A otimização do processo de desmame pode reduzir variações na prática clínica, bem como o tempo de VM, reduzindo assim os riscos associados à ventilação e os custos para o sistema público de saúde.
Em suma, o presente inquérito mostrou que as práticas de desmame e extubação no Brasil variam amplamente em função da faixa etária atendida pela UTI. A estratégia de desmame mais comum no Brasil é a redução gradual do suporte ventilatório, e o desmame protocolado é mais comum nas UTIPs. Nas UTIPs, o TRE é mais frequentemente realizado no modo ventilatório PSV+PEEP, embora a duração do teste tenha sido bastante variável. Na maioria das UTINs e UTIPs brasileiras, a prontidão para extubação é avaliada principalmente por análises clínicas e gasométricas.
Mais estudos são necessários para avaliar o impacto clínico dos métodos e estratégias adotados para o desmame da VM e extubação de pacientes pediátricos e neonatais no Brasil. Esses estudos devem ser baseados nos indicadores de segurança, qualidade e produtividade aplicáveis nas UTIs.
AGRADECIMENTOSOs autores agradecem em especial ao Comitê de Pesquisa da Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB) e ao Departamento de Fisioterapia em Terapia Intensiva da AMIB a orientação e o comprometimento com a divulgação da pesquisa, bem como aos profissionais das UTIs que responderam aos questionários. Gostaríamos também de agradecer à Prof.ª Suzana Lobo, Presidente do Fundo da AMIB (2014-2015), a orientação durante o inquérito, ao Dr. Fernando Dias Suprarregui, Presidente da AMIB (2014-2015), a autorização deste projeto de pesquisa e a colaboração e à Prof.ª Débora Feijó Villas Bôas Vieira, da Universidade do Rio Grande do Sul, o auxílio na coleta de dados das UTIs.
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