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Cartas ao Editor

Endometriose pulmonar: um caso incomum de hemoptise

Pulmonary endometriosis: an unusual cause of hemoptysis

Gláucia Zanetti1, Bruno Hochhegger2, Edson Marchiori1

AO EDITOR:

Uma mulher de 29 anos foi encaminhada ao nosso hospital com histórico de tosse há cinco meses e episódios mensais de hemoptise com duração de 2-3 dias. A hemoptise foi associada a seu ciclo menstrual. Seu histórico médico era significativo, pois incluía dois abortos induzidos. O exame físico e os resultados dos exames laboratoriais foram normais. A TC de tórax realizada no período menstrual mostrou dois pequenos nódulos escavados, contendo opacidades em vidro fosco, um em cada um dos lobos inferiores (Figuras 1A e 1B). Outra TC de tórax, adquirida duas semanas depois (entre as menstruações), demonstrou que essas anormalidades haviam desaparecido, exceto por uma pequena cavidade de paredes finas no lobo inferior direito (Figuras 1C e 1D). Uma fibrobroncoscopia realizada durante a menstruação mostrou sangue fresco na entrada do brônquio do lobo inferior direito. A suspeita diagnóstica era de endometriose pulmonar. A paciente foi submetida a cirurgia toracoscópica videoassistida com ressecção de ambos os nódulos. O exame histopatológico revelou células endometriais uterinas com componentes estromais (achados típicos da endometriose). O pós-operatório transcorreu sem intercorrências. Até o momento da escrita, a paciente estava assintomática há mais de 18 meses após a cirurgia, sem tratamento farmacológico adjuvante.



A endometriose é caracterizada pela presença de tecido endometrial em locais que não a cavidade uterina. Essa condição afeta mais frequentemente mulheres em idade reprodutiva com histórico de cirurgia pélvica, parto ou procedimentos cirúrgicos envolvendo a cavidade uterina. (1-3) A endometriose torácica, envolvendo a pleura e o parênquima pulmonar, pode ocorrer, manifestando-se como as bem reconhecidas entidades clínicas de pneumotórax catamenial, hemotórax catamenial e hemoptise catamenial, bem como nódulos na pleura ou no pulmão. Embora os achados tomográficos da endometriose torácica sejam relativamente inespecíficos, a TC continua sendo o método de imagem de primeira linha, pois pode ser usado para descartar outros diagnósticos e mapear lesões para cirurgia. O exame por TC é mais sensível durante a menstruação, pois as lesões podem variar de tamanho ou até desaparecer durante outras fases do ciclo menstrual. As imagens adquiridas pela TC também podem mostrar pneumotórax, hidrotórax ou hidropneumotórax. Pneumotórax espontâneos recorrentes ocorrem entre 24 h antes e 72 h depois do início da menstruação. O hemitórax direito está envolvido em mais de 90% de todas as formas de endometriose torácica.(4)

Estudos demonstraram que a ressonância magnética (RM) desempenha um papel importante na avaliação de pacientes com endometriose torácica, uma vez que essa é mais capaz do que a TC para caracterizar tecidos hemorrágicos e detectar nódulos endometrióticos. Além disso, a RM é bastante útil na detecção de produtos de degradação da hemoglobina no nível do diafragma ou da cavidade pleural, o que, no contexto da endometriose, é de grande valor. Nódulos endometrióticos exibem componentes sanguíneos distintos que podem aparecer como hiperintensos em imagens ponderadas em T1 e T2, em alguns casos acompanhados por derrame pleural hemorrágico, que também pode mostrar um sinal hiperintenso nas imagens ponderadas em T1. Os nódulos endometrióticos são geralmente hiperintensos quando estão localizados na superfície pleural, embora a intensidade do sinal possa diferir entre imagens ponderadas em T1 e T2.(4-6) Uma das técnicas de evolução mais rápida no campo da RM é a imagem ponderada em difusão (IPD). Em alguns casos, a difusão restrita observada na IPD pode ser útil para a detecção de pequenos endometriomas, que mostram graus variáveis de difusão restrita, dependendo da idade da lesão.(4,5) Portanto, a RM é uma opção viável para a caracterização de nódulos endometrióticos pleurais e derrame pleural hemorrágico.(4-6)

A endometriose pleural é mais comum do que a endometriose pulmonar.(1-3,7,8) Na maioria dos casos, acredita-se que a endometriose pulmonar resulte da embolização do tecido endometrial no parênquima pulmonar. A ruptura de capilares ou alvéolos dentro da lesão durante a menstruação pode resultar em hemoptise ou pneumotórax. Além disso, o sangue invade o interstício do pulmão e se espalha para a área circundante. A absorção das lesões hemorrágicas ocorre entre as menstruações.(1-3,8) O diagnóstico de endometriose pulmonar é estabelecido com base em hemoptise recorrente sincronizada com o ciclo menstrual, juntamente com focos persistentes e patologicamente confirmados de endometriose. Os sintomas se manifestam durante a menstruação e depois desaparecem.(1,2,7,8) Na TC, a endometriose pulmonar pode ser caracterizada por pequenas áreas de consolidação ou atenuação em vidro fosco, lesões nodulares ou cavidades de paredes finas, cuja aparência muda ao longo do ciclo menstrual. Pode-se presumir que esses achados representem hemorragia pulmonar. O tamanho e a gravidade das lesões durante a menstruação diferem significativamente daqueles no período entre as menstruações.(1,3,8) Os achados histopatológicos incluem células endometriais uterinas com características de endométrio proliferativo ou secretório.(8) Os tratamentos incluem terapia hormonal e ressecção cirúrgica. A ressecção cirúrgica é considerada o tratamento mais eficaz, embora geralmente seja considerada apenas quando a terapia hormonal falha.(1,3,7) O sucesso do tratamento da endometriose pulmonar requer diagnóstico preciso e localização da lesão. A aquisição de TCs durante e duas semanas após a menstruação pode ajudar a confirmar o diagnóstico e facilitar a localização da endometriose pulmonar parenquimatosa.

REFERÊNCIAS

1. Chung SY, Kim SJ, Kim TH, Ryu WG, Park SJ, Lee DY, et al. Computed tomography findings of pathologically confirmed pulmonary parenchymal endometriosis. J Comput Assist Tomogr. 2005;29(6):815-818. https://doi.org/10.1097/01.rct.0000176014.37051.c7
2. Tong SS, Yin XY, Hu SS, Cui Y, Li HT. Case report of pulmonary endometriosis and review of the literature. J Int Med Res. 2019;47(4):1766-1770. https://doi.org/10.1177/0300060518800868
3. Suwatanapongched T, Boonsarngsuk V, Amornputtisathaporn N, Leelachaikul P. Thoracic endometriosis with catamenial haemoptysis and pneumothorax: computed tomography findings and long-term follow-up after danazol treatment. Singapore Med J. 2015;56(7):e120-e123. https://doi.org/10.11622/smedj.2015115
4. de Paula MC, Escuissato DL, Belém LC, Zanetti G, Souza Jr AS, Hochhegger B, et al. Focal pleural tumorlike conditions: nodules and masses beyond mesotheliomas and metastasis. Respir Med. 2015;109(10):1235-1243. https://doi.org/10.1016/j.rmed.2015.06.004
5. Marchiori E, Zanetti G, Rodrigues RS, Souza LS, Souza Jr AS, Francisco FA, et al. Pleural endometriosis: findings on magnetic resonance imaging. J Bras Pneumol. 2012;38(6):797-802. https://doi.org/10.1590/S1806-37132012000600017
6. Pessôa FM, de Melo AS, Souza AS Jr, de Souza LS, Hochhegger B, Zanetti G, et al. Applications of Magnetic Resonance Imaging of the Thorax in Pleural Diseases: A State-of-the-Art Review. Lung. 2016;194(4):501-509. https://doi.org/10.1007/s00408-016-9909-9
7. Fang HY, Jan CI, Chen CK, Chen WT. Catamenial pneumothorax due to bilateral pulmonary endometriosis. Respir Care. 2012;57(7):1182-1185. https://doi.org/10.4187/respcare.01256
8. Fujimoto K, Kasai H, Suga M, Sugiura T, Terada J, Suzuki H, et al. Pulmonary Endome-triosis which Probably Occurred through Hematogenous Metastasis after Artificial Abortion. Intern Med. 2017;56(11):1405-1408. https://doi.org/10.2169/internalmedicine.56.8265

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