AO EDITOR, Homem, 58 anos, deu entrada no serviço de emergência com queixas de tosse com expectoração e perda de peso havia três meses. Referiu dois episódios de hemoptise nos últimos 30 dias. Ao exame físico apresentava-se com roncos e murmúrio vesicular diminuído à direita. Hemograma sem anormalidades. A radiografia de tórax revelou extensa opacidade ocupando quase a totalidade do hemitórax direito, poupando seu ápice e ocasionando obliteração dos contornos do coração, da cúpula diafragmática e do seio costofrênico ipsilaterais (Figura 1A).
A TC de tórax evidenciou extensa consolidação parenquimatosa escavada no pulmão direito, com presença de imagens aéreas circundando massa arredondada no interior da consolidação que media aproximadamente 9,5 × 7,0 cm, caracterizando o sinal do crescente aéreo (Figuras 1B e 1C). A massa apresentou realce intenso após a administração de meio de contraste iodado endovenoso, compatível com formação aneurismática (Figuras 1D e 1E). Foi realizado exame de escarro e lavado broncoalveolar, sendo ambos positivos para BAAR, confirmando a presença de Mycobacterium tuberculosis e definindo o diagnóstico de aneurisma de Rasmussen (AR). Iniciado tratamento com tuberculostáticos. O paciente foi encaminhado para cirurgia, para possível oclusão vascular por embolização, porém foi a óbito antes da realização do procedimento.
O sinal do crescente aéreo é definido como uma coleção de ar em forma de menisco ou crescente que separa a parede de uma cavidade de um nódulo ou massa intracavitária. Embora aspergiloma (bola fúngica causada pela colonização por Aspergillus spp.) seja a causa mais comum de nódulo intracavitário, uma série de outras afecções devem ser consideradas no diagnóstico diferencial. Dentre essas, as mais importantes são as neoplasias, especialmente o carcinoma brônquico, a aspergilose angioinvasiva em fase de recuperação, o AR e os coágulos. Causas mais raras incluem corpos estranhos, pus espessado, material caseoso desidratado, teratoma e hidatidose. Um critério de imagem útil para o diagnóstico diferencial é a mobilidade do nódulo dentro da cavidade quando o paciente é submetido a mudanças de posição, especialmente quando examinado em decúbitos dorsal e ventral. A demonstração que a massa central está solta ou presa à parede da cavidade é extremamente importante porque, diferentemente da bola fúngica e dos coágulos, o câncer pulmonar crescendo no interior de cavidades e o AR estão fixados à parede da cavidade, não mostrando mobilidade com as alterações de decúbito.
(1-3) Contudo, essa técnica não tem utilidade na avaliação de grandes massas intracavitárias, como no caso de nosso paciente.
Com o recente ressurgimento mundial de casos relatados de infecção por M. tuberculosis, o reconhecimento de suas complicações e sequelas se torna extremamente importante. Em pacientes com tuberculose conhecida, a causa mais frequente de massa/nódulo intracavitário é o aspergiloma. Etiologias menos comuns incluem o AR. O AR é uma condição rara, mais comum em homens jovens, caracterizada pela ocorrência de pseudoaneurismas pulmonares em pacientes com tuberculose pulmonar. O enfraquecimento progressivo da parede arterial ocorre à medida que o tecido de granulação do processo tuberculoso substitui as camadas média e adventícia da artéria. O tecido de granulação na parede do vaso é então gradualmente substituído por fibrina, resultando no afinamento da parede arterial. Hemoptise é em geral a manifestação clínica inicial, podendo ser maciça e fatal. Hemoptise em presença de tuberculose pode ter várias etiologias, como aspergiloma, bronquiectasias, neoplasia, bronquite crônica e complicações vasculares, como pseudoaneurismas. A TC de tórax com uso de meio de contraste é o exame de imagem mais adequado para a avaliação de hemorragia pulmonar. O AR pode ser identificado como um nódulo com realce intenso dentro da parede de uma cavidade ou de uma consolidação tuberculosa. O tratamento ideal da hemoptise maciça no AR é motivo de discussão. A oclusão endovascular do colo do aneurisma geralmente tem desfecho positivo no tratamento do AR. A excisão cirúrgica é recomendada apenas quando a intervenção radiológica especializada não está disponível ou na presença de processo destrutivo considerável no pulmão.
(4,5) Em resumo, embora o aspergiloma seja a causa mais comum de nódulo intracavitário em pacientes com tuberculose, o diagnóstico diferencial deve ser feito com outras afecções, especialmente o AR. A precocidade no diagnóstico possibilita o emprego de terapêutica adequada, reduzindo riscos de morte por sangramento maciço.
REFERÊNCIAS
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