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Artigo de Revisão

Treinamento muscular inspiratório na doença pulmonar intersticial: revisão sistemática de escopo

Inspiratory muscle training in interstitial lung disease: a systematic scoping review

Mariana Hoffman1

DOI: 10.36416/1806-3756/e20210089

ABSTRACT

Inspiratory muscle training (IMT) has been described as one of the components of the treatment of chronic lung conditions such as obstructive and restrictive lung diseases. Although the number of studies showing results of IMT in patients with interstitial lung disease (ILD) is scarce when compared with studies in patients with COPD, evidence points to benefits of IMT in this population. This scoping review aimed to explore the role and the rationale of IMT in patients with ILD and to gather recent evidence on the effects of IMT in this population. The studies included in this review showed improvements in respiratory muscle function, quality of life, exercise capacity and dyspnea after ILD patients participated in programs that included stand-alone IMT or combined with pulmonary rehabilitation. There is still a gap in the literature to allow a clear conclusion on the indications of IMT as part of ILD treatment because of poor research design and small numbers of participants. Therefore, although IMT seems to have a positive effect in patients with ILD, current evidence prevents us from drawing a definite conclusion. Further studies need to be conducted using better research methodology to demonstrate and confirm the positive effects of IMT.

Keywords: Respiratory muscles; Lung diseases, interstitial; Rehabilitation.

RESUMO

O treinamento muscular inspiratório (TMI) já foi descrito como um dos componentes do tratamento de doenças pulmonares crônicas obstrutivas e restritivas. Embora os estudos que mostram os resultados do TMI em pacientes com doença pulmonar intersticial (DPI) sejam escassos em comparação com os estudos em pacientes com DPOC, as evidências indicam que o TMI traz benefícios para essa população. O objetivo desta revisão de escopo foi explorar o papel e a lógica do TMI em pacientes com DPI e reunir evidências recentes sobre os efeitos do TMI nessa população. Os estudos incluídos nesta revisão mostraram melhora na função muscular respiratória, qualidade de vida, capacidade de exercício e dispneia depois que pacientes com DPI participaram de programas com TMI apenas ou em conjunto com reabilitação pulmonar. Ainda há uma lacuna na literatura que impede que se chegue a uma conclusão clara a respeito da indicação do TMI como parte do tratamento de DPI em virtude da baixa qualidade do desenho dos estudos e do pequeno número de participantes. Portanto, embora os efeitos do TMI em pacientes com DPI sejam aparentemente positivos, as evidências atuais não permitem que se chegue a uma conclusão definitiva. São necessários mais estudos com metodologia de pesquisa melhor para demonstrar e confirmar os efeitos positivos do TMI.

Palavras-chave: Músculos respiratórios; Doenças pulmonares intersticiais; Reabilitação.

CONTEXTO
 
Os músculos respiratórios são responsáveis por criar fluxo de ar para os pulmões por meio da elevação das costelas, aumento das dimensões da parede torácica e diminuição da resistência das vias aéreas e da pressão intratorácica.(1) Durante a respiração, a ativação dos músculos respiratórios pode ser muito diferente da ativação de outros músculos esqueléticos. No entanto, esses dois grupos musculares apresentam capacidade comparável de adaptação a diferentes condições e demandas funcionais e, portanto, reagem de maneira semelhante ao estímulo do treinamento.(1,2) Uma revisão da literatura realizada por Powers & Criswell(3) descreveu um aumento do número de fibras e da atividade mitocondrial nos músculos respiratórios após treinamento respiratório específico de resistência. O estudo mostrou efeitos positivos do treinamento, com a redução do estresse oxidativo e o aumento do tempo até a fadiga muscular respiratória.(3) Três tipos diferentes de fibras podem ser encontrados nos músculos respiratórios e são os mesmos encontrados nos músculos esqueléticos periféricos: tipo I, tipo IIA e tipo IIB. No entanto, existem diferenças entre o diafragma, por exemplo, e outros músculos periféricos, tais como o quadríceps, quanto à proporção e distribuição dessas fibras. O diafragma apresenta 80% de fibras oxidativas (tipos I e IIA), isto é, fibras resistentes à fadiga, ao passo que o quadríceps apresenta apenas 35-45% de fibras oxidativas.(4)
 
O papel dos músculos inspiratórios ainda não foi muito bem investigado em pacientes com doença pulmonar intersticial (DPI). No entanto, os mecanismos do treinamento muscular inspiratório (TMI) já foram amplamente estudados, e é possível que os efeitos do TMI possam ser estendidos a pessoas com doenças parenquimatosas pulmonares.
 
Uma breve revisão realizada recentemente por Jensen et al.(5) investigou os mecanismos fisiológicos da falta de ar aos esforços em pacientes com DPI e sugeriu que ela está relacionada com o aumento do drive respiratório neural. Em pacientes com DPI, a capacidade de responder a um aumento da demanda ventilatória é prejudicada principalmente por causa da redução da complacência pulmonar. Nesse caso, o sistema respiratório é forçado a trabalhar em uma relação pressão-volume não ideal, contribuindo para o enfraquecimento dos músculos inspiratórios. Consequentemente, a frequência respiratória aumenta até níveis anormais em virtude da expansão restrita do VT, levando a um aumento do esforço muscular respiratório e da taxa de falta de ar.(5)
 
Uma revisão da literatura publicada em 2013(6) explorou a conexão entre fraqueza muscular inspiratória e baixa tolerância ao exercício em pessoas com sarcoidose. Evidências de redução da PImáx e da resistência muscular inspiratória nessa população foram apresentadas e relacionadas com menor tolerância ao exercício e insuficiência muscular respiratória.(6)
 
Atualmente, diversos estudos descrevem o uso de TMI como parte do tratamento de pacientes com doenças pulmonares como DPOC, asma e DPI. A American Thoracic Society (ATS) e a European Respiratory Society (ERS)(7) recomendam que o TMI seja uma intervenção adicional aos programas de reabilitação pulmonar (RP) como parte do tratamento de pacientes com doenças pulmonares crônicas, especialmente na presença de fraqueza muscular inspiratória.
 
A recomendação de TMI para pacientes com doenças pulmonares crônicas está relacionada com um sintoma muito comum à maioria dos pacientes: a dispneia. O trabalho do diafragma aumenta durante o exercício, e pacientes com doenças pulmonares crônicas usam uma proporção maior de sua PImáx do que o fazem indivíduos saudáveis. Por causa desse padrão respiratório diferente, há um aumento da dispneia durante o exercício, que leva à fadiga dos músculos respiratórios e restrição da capacidade de exercício.(8,9) Além disso, quando há aumento do trabalho respiratório, pode ocorrer uma competição entre os músculos periféricos e os respiratórios. Em pacientes com DPOC, o consumo de suprimento sanguíneo dos músculos respiratórios durante o exercício pode chegar a 35%, ao passo que esse consumo é de 15% em indivíduos saudáveis.(10)
 
O TMI também está relacionado com alterações estruturais dos tipos de fibras musculares e da distribuição das fibras nos músculos inspiratórios. Após cinco semanas de TMI, pacientes com DPOC apresentaram um aumento do número de fibras do tipo I, bem como um aumento do tamanho das fibras do tipo II no músculo intercostal externo.(11) O TMI foi capaz de melhorar a capacidade de trabalho muscular inspiratório por meio da diminuição do trabalho relativo (porcentagem da capacidade máxima de trabalho muscular). Após o TMI, há uma diminuição da quantidade de débito cardíaco consumido pelos músculos inspiratórios; consequentemente, uma porção maior do débito cardíaco pode ser redirecionada para os músculos periféricos e aumentar a capacidade de exercício.(12)
 
Em uma revisão sistemática, Gosselink et al.(13) relataram que o TMI usado como intervenção independente é capaz de aumentar significativamente a força e resistência muscular inspiratória, além de melhorar a capacidade de exercício e a qualidade de vida e diminuir a dispneia em pacientes com DPOC. Os estudos incluídos na revisão supracitada mostraram que pacientes com fraqueza muscular inspiratória respondem melhor ao TMI do que aqueles sem fraqueza muscular inspiratória.(13) O TMI também resulta em melhoria da força muscular inspiratória e capacidade de exercício em pacientes com DPI como fibrose pulmonar idiopática (FPI), embora haja menos evidências na literatura.(14,15)
 
As DPI são um grupo de doenças heterogêneas que afetam o parênquima pulmonar e estão principalmente relacionadas com taxas ruins de morbidade e taxas elevadas de mortalidade. A maioria das DPI tem características e sintomas comuns, tais como dispneia, tosse, troca gasosa deficiente, hipoxemia e diminuição dos volumes pulmonares que podem resultar em insuficiência respiratória. As DPI também podem ser definidas como doenças parenquimatosas pulmonares difusas (classificadas pela presença de causa conhecida), pneumonia intersticial idiopática, pneumonia granulomatosa e outras.(16,17) O Quadro 1 mostra a classificação das DPI de acordo com a ATS/ERS.(18)
 

 
O diagnóstico e o tratamento das DPI exigem uma abordagem multidisciplinar e uma avaliação abrangente por meio do histórico, exame físico e outros exames. O uso de exames adicionais é frequentemente necessário, e a TCAR é uma ferramenta valiosa para se chegar a um diagnóstico específico com convicção. Na maioria das vezes, a TCAR é suficiente para o diagnóstico definitivo, sem a necessidade de exames invasivos como a broncoscopia e a biópsia pulmonar cirúrgica. (19) Em 2014, Meyer(19) publicou uma interessante abordagem diagnóstica às DPI (Figura 1).
 

 
Uma vez alcançado o diagnóstico definitivo, há elementos essenciais que devem ser considerados para o tratamento de DPI, tais como agentes farmacológicos, transplante de pulmão, terapias de suporte, alívio de sintomas e tratamento de comorbidades.
 
Corticosteroides, agentes imunossupressores e agentes anti-inflamatórios são os medicamentos mais frequentemente prescritos para DPI; mais recentemente, medicamentos antifibróticos também têm sido recomendados para o tratamento de pacientes com FPI e outras DPI fibróticas, tais como DPI associada a artrite reumatóide, DPI associada a esclerose sistêmica, DPI associada a doença do tecido conjuntivo, pneumonite de hipersensibilidade e pneumonite idiopática inclassificável. Os medicamentos antifibróticos diminuem a progressão da doença (diminuição da CVF) com magnitude semelhante de efeitos para a população geral de pacientes com DPI.(20-23)
 
É importante considerar medidas de progressão da doença e alívio dos sintomas em pacientes com DPI. Medidas de dispneia e testes de função pulmonar que avaliam a CVF e DLCO são realizados rotineiramente para monitorar a doença. O teste de caminhada de seis minutos também faz parte da avaliação de rotina da progressão da doença e fornece informações valiosas sobre a capacidade funcional.(19)
 
A RP é uma das terapias não farmacológicas que deve ser considerada no manejo de DPI. Alguns estudos(24,25) foram realizados a fim de avaliar os efeitos da RP na capacidade funcional, falta de ar e qualidade de vida, por exemplo, em pacientes com DPI. A ATS/ERS definiram a RP como uma intervenção para reduzir os sintomas e melhorar o estado funcional e o desempenho de atividades cotidianas, contribuindo para a redução dos custos de cuidados de saúde.(7)
 
Uma revisão sistemática da Cochrane publicada em 2008(24) avaliou a segurança do treinamento físico para pacientes com DPI. Estudos randomizados e quase randomizados foram pesquisados na literatura, e cinco estudos foram incluídos na análise; foi realizada uma subanálise da FPI. Demonstrou-se que o treinamento físico é seguro e melhora a capacidade funcional de exercício, dispneia e qualidade de vida de pacientes com DPI, inclusive daqueles com FPI, embora não tenha sido possível demonstrar os efeitos em longo prazo do treinamento físico.(24)
 
Em 2013, Holland et al.(25) descreveram maneiras de adaptar programas de RP para pacientes com FPI. Em suma, o programa de RP para pacientes com DPI fibrótica deve incluir os mesmos componentes do programa de RP para pacientes com outras doenças pulmonares graves, tais como exercícios aeróbicos e de força, bem como um componente educacional sobre depressão e ansiedade, que geralmente estão presentes nessa população. O programa de RP, entretanto, deve considerar que a incidência de hipertensão pulmonar em pacientes com DPI é maior e que podem estar presentes menor tolerância ao exercício e dispneia incapacitante. Devem-se considerar diferentes protocolos/modalidades de exercícios, tais como treinamento intervalado, exercícios aquáticos e estimulação neuromuscular, pois esses pacientes são propensos a apresentar limitações mais graves.(25)
 
O TMI é um dos componentes da RP e já foi amplamente descrito na literatura em pacientes com DPOC e asma. Um dos primeiros estudos a investigar o TMI foi o de Leith & Bradley, em 1976.(26) O estudo foi o primeiro a demonstrar que os músculos inspiratórios podem ser treinados de modo a aumentar sua força e resistência. O primeiro protocolo de TMI descrito na literatura empregou dispositivos de resistência não linear e apresentou resultados inconsistentes.(27) Em seguida, foram introduzidos um dispositivo de resistência linear e um dispositivo respiratório com limiar de pressão (Threshold-IMT; Respironics, Andover, MA, EUA)(28) e, em 1988, foram avaliados os efeitos do TMI em pacientes com DPOC que usaram os dispositivos durante dois meses.(29) O dispositivo respiratório com limiar de pressão fornece resistência de −7 cmH2O a −41 cmH2O. Larson et al.(30) compararam o TMI com resistência de 15-30% da PImáx a dois protocolos diferentes. Os resultados mostraram maior melhora na força muscular inspiratória, resistência e tolerância ao exercício avaliada pelo teste de caminhada de 12 minutos em pacientes que treinaram com maior resistência.(30)
 
Há muitos protocolos diferentes quanto ao número de semanas e resistência durante o treinamento. Em 2006, Hill et al.(31) inovaram ao propor um TMI intervalado de alta intensidade para pacientes com DPOC. O estudo comparou a resistência de treinamento intervalado de alta intensidade (≥ 60% da PImáx) com a resistência de treinamento constante a 10% da PImáx. O protocolo consistiu em oito semanas de TMI, três vezes por semana, durante 21 min (Figura 2).(31) O estudo mostrou que, em comparação com o treinamento constante de baixa intensidade, o treinamento intervalado de alta resistência permitiu que os participantes alcançassem maior resistência de treinamento com um aumento significativo da força, resistência e qualidade de vida, e uma redução significativa da dispneia durante as atividades cotidianas.(31)
 

 
O papel do TMI como terapia adicional à RP ou como intervenção independente em pacientes com DPI ainda não foi estabelecido, e há poucos estudos na literatura.
 
ESCOPO DA BUSCA SISTEMÁTICA
 
Como descreveram Arksey & O’Malley,(32) uma revisão de escopo visa explorar uma área de pesquisa e cobrir a literatura disponível a respeito de um tópico específico. O objetivo desta revisão de escopo foi explorar os efeitos do TMI em pacientes com DPI.
 
Foi realizada uma busca sistemática na plataforma Ovid MEDLINE e PubMed para identificar estudos de intervenção em inglês com os termos “interstitial lung disease” e “inspiratory muscle training” e suas variações. Foi realizada uma busca manual complementar com as listas de referências dos artigos incluídos e a literatura cinzenta (Figura 3).


 
Foram identificados 63 estudos, e apenas 4 relataram os efeitos do TMI separadamente ou com RP em pacientes com DPI. A Figura 3 mostra o fluxograma de busca de estudos.
 
EFEITOS DO TMI SEPARADAMENTE OU COM RP
 
Jastrzebski et al.(33) avaliaram os efeitos da RP em pacientes com fibrose pulmonar. O programa de RP de seis semanas incluiu ciclismo durante 15 min, exercícios gerais e TMI realizados com um dispositivo de limiar (seis ciclos de cinco respirações duas vezes por semana). Os resultados do estudo mostraram melhora na dispneia (escala de Borg) e qualidade de vida (Medical Outcomes Study 36-item Short-Form Health Survey e Saint George’s Respiratory Questionnaire).
 
Em 2019, Kaushal et al.(34) também avaliaram os efeitos do treinamento muscular respiratório e RP em pacientes com DPI. O programa de RP incluiu treinamento físico durante 60 min — treinamento de resistência (cicloergometria), treinamento de flexibilidade, treinamento de força e treinamento muscular respiratório (TMI limiar) — três vezes por semana durante oito semanas. Todas as sessões foram supervisionadas, e os participantes também participaram de sessões educativas sobre exercícios respiratórios, saúde pulmonar, medicação e controle do estresse. Os desfechos — distância percorrida no teste de caminhada de seis minutos (DTC6), pressão dos músculos respiratórios, gravidade da dispneia e parâmetros de função pulmonar — foram medidos no início do estudo, no fim do programa de RP e em uma visita de acompanhamento seis meses depois do fim do programa. Depois de oito semanas de RP, os participantes com DPI (FPI e não FPI) apresentaram melhora estatisticamente significativa na capacidade funcional (aumento da DTC6), que diminuiu no fim do período de acompanhamento. A dispneia foi de grave para leve de acordo com a escala modificada do Medical Research Council (mMRC) após a RP. A pressão dos músculos inspiratórios aumentou significativamente após o treinamento físico e apresentou correlação negativa com a pontuação na escala de Borg de dispneia, o que indica que o aumento da força muscular pode ter levado à melhoria da dispneia. No entanto, esses efeitos não se mantiveram após a conclusão do programa de RP e se reverteram após seis meses de acompanhamento.(34)
 
Um estudo de intervenção(32) investigou os efeitos de um programa de TMI em pacientes com doença pulmonar avançada. A amostra incluiu 22 participantes com DPI (FPI ou pneumonite de hipersensibilidade). Embora houvesse pacientes com doença restritiva e/ou obstrutiva e não houvesse um grupo controle, os resultados mostraram os benefícios do TMI quanto à dispneia durante as atividades cotidianas e à qualidade de vida, bem como melhora na força e resistência muscular respiratória. No estudo supracitado,(32) o TMI foi definido como um programa de treinamento intervalado de alta intensidade realizado durante oito semanas com um dispositivo de carga resistiva e redução gradual do fluxo, mostrando-se mais viável e resultando em melhor adesão ao treinamento.(35,36) Em 2018, o mesmo grupo usou o mesmo programa para avaliar os efeitos do TMI com base na percepção dos pacientes com doença pulmonar avançada.(37) Os autores entrevistaram os pacientes, inclusive dois participantes com FPI, após o término do TMI de alta intensidade durante oito semanas. Os pacientes relataram melhora na mobilidade e na falta de ar após o TMI, o que melhorou o desempenho das atividades cotidianas e a comunicação.(37)
 
Foram incluídos na presente revisão 3 relatos de caso sobre RP na sarcoidose, na fibrose pulmonar com enfisema e na FPI. Herrera-Olivares et al.(38) relataram o caso de uma paciente com sarcoidose que realizou um programa de exercícios com treinamento intervalado de alta intensidade, treinamento de resistência de alta carga e TMI com um dispositivo mecânico de carga limiar durante 4,5 anos. Os resultados mostraram melhoria da aptidão cardiorrespiratória e capacidade funcional.(38) De Simone et al.(39) também relataram os efeitos de um programa de RP que incluiu treinamento intervalado, treinamento de resistência de alta carga e TMI com um dispositivo mecânico de carga limiar em um paciente de 65 anos com fibrose pulmonar e enfisema. Houve melhora na capacidade de exercício (DTC6), níveis de depressão, qualidade de vida relacionada à saúde (Saint George’s Respiratory Questionnaire) e dispneia.(39) Outro relato de caso demonstrou que treinamento aeróbio intervalado, treinamento de resistência e TMI em longo prazo ajudaram a manter a independência funcional, capacidade de caminhar e tolerância ao treinamento de resistência em um homem de 56 anos até o declínio da capacidade funcional em virtude da FPI.(40)
 
Foram incluídos nesta revisão de escopo 3 resumos que relataram os efeitos do TMI na DPI. Kerti et al.(41) buscaram investigar os efeitos do TMI com RP em parâmetros funcionais e na qualidade de vida em pacientes com DPI. Embora aparentemente não tenha havido um grupo controle, os resultados mostraram melhoria da capacidade funcional (DTC6), qualidade de vida, dispneia (escala mMRC) e força muscular inspiratória. Nykvist et al.(42) usaram a mesma ideia e avaliaram os efeitos do TMI com exercícios físicos em pacientes com FPI. Foram relatadas melhoras na DTC6, força muscular inspiratória, dispneia (escala mMRC), fadiga e qualidade de vida (chronic respiratory disease questionnaire) no grupo que realizou TMI e exercícios físicos em comparação com o grupo que realizou apenas TMI.(42) Koulopoulou et al.(43) apresentaram os resultados de um estudo piloto no qual foram investigados os efeitos do TMI de alta intensidade na capacidade de exercício, dispneia, função muscular inspiratória e qualidade de vida relacionada à saúde. O estudo incluiu 17 pacientes com DPI que participaram de um programa de TMI de alta intensidade (n = 9) ou de baixa intensidade (n = 8) durante oito semanas. Foram avaliadas a qualidade de vida, dispneia e força muscular inspiratória. Os resultados revelaram um aumento significativo da força muscular inspiratória no grupo de intervenção, mas não foram encontradas diferenças entre os grupos de intervenção e controle quanto à qualidade de vida, dispneia e capacidade de exercício.(43)
 
Os resultados desta revisão de escopo mostram que ainda não se investigou bem o papel dos músculos inspiratórios e do TMI em pacientes com DPI. Os estudos variam quanto à metodologia e carecem de grupos de controle para comprovar os benefícios do TMI realizado em conjunto com a RP recomendada. No entanto, os mecanismos do TMI já foram amplamente estudados, e os efeitos do TMI poderiam ser estendidos a pacientes com doenças parenquimatosas pulmonares. Uma revisão recente realizada por Álvarez-Herms et al.(44) investigou o papel do TMI na hipóxia e mostrou que o TMI é uma terapia eficaz para aumentar a força e resistência dos músculos respiratórios em atletas saudáveis, contribuindo para melhorar a função ventilatória. Os autores concluíram que é possível que o TMI tenha efeitos em fatores que limitam o sistema respiratório sob estresse, tais como fadiga prematura, atraso do metaborreflexo muscular respiratório, percepção de dispneia, aumento da saturação periférica de oxigênio e redistribuição sanguínea positiva para os músculos locomotores.(44) Esses resultados poderiam explicar como o TMI poderia beneficiar pacientes com DPI ao contribuir para a redução da fadiga durante o exercício, da dispneia e do atraso do metaborreflexo.
 
Um estudo recente de O’Connor et al.(45) avaliou a viabilidade do TMI como opção de tratamento aceitável para pacientes com DPOC que recusaram a RP. O estudo mostrou que havia desmotivação, desinformação a respeito dos benefícios dos programas de RP e obstáculos ao comparecimento, tais como transporte para o centro de RP. Os mesmos obstáculos provavelmente também seriam enfrentados por pacientes com DPI, e são necessários mais estudos nessa área. No estudo supracitado,(45) o TMI mostrou-se aceitável e exequível, e os participantes investigados apresentaram boa adesão à terapia, que se mostra portanto uma opção para o manejo de pacientes com DPI que se recusam a participar da RP.
 
CONSIDERAÇÕES FINAIS
 
A inclusão do TMI no tratamento de pacientes com DPI precisa ser mais bem explorada, pois há um número limitado de artigos na literatura que comprovam seus benefícios para essa população. Há uma lacuna evidente na literatura quanto aos efeitos do TMI em pacientes com DPI, embora os estudos publicados tendam a demonstrar benefícios no que tange à qualidade de vida, atividades cotidianas e capacidade de exercício. As evidências a respeito dos efeitos do TMI na DPI são de baixa qualidade, e os estudos que exploraram essa terapia incluíram um número pequeno de participantes ou empregaram uma metodologia ruim de pesquisa. Consequentemente, não é possível chegar a conclusões definitivas a respeito dos possíveis benefícios do TMI para essa população. Devem ser realizados mais estudos bem desenhados para avaliar os efeitos do TMI em pacientes com DPI e a possibilidade de incluir o TMI no manejo de pacientes com DPI, como um componente de programas de RP ou mesmo como uma opção para pacientes que recusam a RP.
 
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