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Cartas ao Editor

Tratamento de hemangioma subglótico infantil com tubo T e propranolol

Management of infantile subglottic hemangioma with T-tube placement and propranolol

Paula Duarte D’Ambrosio1, Paulo F. Guerreiro Cardoso1, Priscila Loria da Silva1, Paulo Manoel Pêgo Fernandes1, Hélio Minamoto1

DOI: 10.36416/1806-3756/e20210297

AO EDITOR,
 
O hemangioma subglótico (HSG) é um tumor vascular benigno raro responsável por 1,5% de todas as lesões congênitas da laringe. Geralmente, o início dos sintomas respiratórios ocorre logo após o nascimento, durante a fase proliferativa da doença.(1) Como a maioria das lesões involui na primeira infância,(2) o tratamento se concentra na prevenção de complicações a longo prazo.
 
O HSG pode levar à obstrução das vias aéreas quando não tratada, com taxas de mortalidade próximas a 50%.(3) Nesse cenário, a traqueostomia é considerada um procedimento que salva vidas, embora possa causar complicações com risco de vida, principalmente relacionadas ao risco de obstrução das vias aéreas e decanulação durante os cuidados pós-operatórios. Devido à escassez de relatos, não há diretrizes de tratamento propostas para HSG. Uma abordagem alternativa por meio da colocação de tubo T de silicone tem sido utilizada para alcançar e manter a permeabilidade das vias aéreas. Os relatos de caso a seguir descrevem o tratamento e o resultado pós-operatório em três lactentes com HSG. O propranolol tornou-se um tratamento de primeira linha aceito para HSG, com seus benefícios superando seus riscos.(4)
 
Um lactente de 7 meses de idade com infecção respiratória recorrente e estridor há cinco meses tinha história de intubação e traqueostomia aos três meses, durante um episódio de obstrução das vias aéreas em outro hospital. Ele apresentou estridor inspiratório e o restante do exame físico transcorreu sem intercorrências. A tomografia computadorizada (TC) de tórax e pescoço com contraste mostrou um leve realce lateral ao nível das pregas vocais (PV), sugestivo de HSG. A laringoscopia de suspensão sob anestesia geral confirmou tumor vascular laringotraqueal do lado esquerdo causando obstrução da laringe e subglote. Os achados endoscópicos foram consistentes com hemangioma. Ainda sob anestesia, um tubo T de silicone de 8 mm foi colocado supraglóticamente através da traqueostomia. O paciente apresentou disfagia transitória leve com aspiração, necessitando de alimentação por sonda nasogástrica, com resolução completa em cinco dias de pós-operatório, o que permitiu-lhe retomar a ingestão oral. Foi iniciado propranolol (1 mg/kg/dia, via oral) e, em 3 semanas de pós-operatório, a dose diária foi aumentada para 3 mg/kg/dia, com boa tolerância. O paciente recebeu alta hospitalar uma semana após o procedimento, sem sintomas ou sinais de aspiração. Atualmente, ele permanece em uso de propranolol com evolução favorável, e o tratamento está previsto para dois anos.
 
Uma lactente de 6 meses de idade foi encaminhada para nossa instituição com infecções respiratórias recorrentes e estridor desde o nascimento. Ela desenvolveu insuficiência respiratória duas vezes, necessitando de intubação. A TC mostrou um leve realce sugestivo de obstrução das vias aéreas por HSG (Figura 1B). Foi realizada uma laringoscopia de suspensão, revelando um HSG logo abaixo das PV, causando obstrução da laringe e subglote (Figura 1A). No período pós-operatório, a paciente apresentou dispneia e estridor sustentados, que evoluíram para insuficiência respiratória e intubação, seguida de traqueostomia após 10 dias. Um ano depois, a cânula de traqueostomia foi retirada e um tubo T de silicone de 8 mm foi colocado com sua extremidade superior na supraglote (Figura 1C), sem sinais de aspiração. Propranolol (1 mg/kg/dia) foi então iniciado e aumentado para 3 mg/kg/dia em 14 dias e continuado por dois anos. Após 16 meses, o tubo T foi removido e a paciente foi submetida ao fechamento de um orifício de traqueostomia persistente aos nove anos de idade.



 
Uma lactente de 6 meses de idade foi admitida no pronto-socorro com insuficiência respiratória. Ela nasceu com 34 semanas e evoluiu com refluxo gastroesofágico e infecções respiratórias de repetição. Com exceção do estridor, o exame físico era normal. A TC de pescoço e tórax mostrou uma massa heterogênea e vascularizada na laringe. A broncoscopia rígida revelou uma massa pulsátil causando obstrução das vias aéreas, sugestiva de HSG à esquerda. O tratamento foi iniciado com propranolol (1 mg/kg/dia) e aumentado gradativamente para 3 mg/kg/dia, que foi mantido por dois anos. Uma broncoscopia rígida e tomografia computadorizada após 1 ano mostraram uma regressão do HSG. A paciente permanece em acompanhamento ambulatorial sem recorrência.
 
O HSG é frequentemente diagnosticado durante os primeiros meses de vida. Os três casos descritos apresentavam insuficiência respiratória aguda, diagnosticada como HSG, e tiveram evolução favorável. Os casos 1 e 2 necessitaram de traqueostomia e foram tratados com sucesso com tubo T e propranolol, enquanto o terceiro foi tratado com sucesso apenas com propranolol. Os pacientes permaneceram em uso de propranolol por 2 anos, acompanhados por uma equipe multidisciplinar, incluindo cardiologista pediátrico e cirurgião torácico. Durante as visitas regulares de acompanhamento, os níveis de glicose no sangue, sinais vitais e função cardíaca foram monitorados e os pacientes não apresentaram recorrência.
 
Os HSGs são comumente encontrados logo abaixo das PV, geralmente são unilaterais e podem envolver ambos os lados. Esses tumores apresentam uma coloração de superfície que varia do rosa ao azul, são facilmente compressíveis e projetam-se para dentro das vias aéreas, fatores indispensáveis para o seu diagnóstico.(5) Os casos 1 e 2 evoluíram para obstrução das vias aéreas, sendo realizada traqueostomia antes da avaliação endoscópica, conforme recomendado.(6) No entanto, uma taxa de mortalidade de 40% a 60% tem sido relatada devido a complicações da traqueostomia, principalmente obstrução ou decanulação acidental. (6) A justificativa para o manejo desses pacientes é a colocação de stent com tubo T de silicone e administração oral de propranolol.(7) O ramo vertical do tubo T suporta o lúmen traqueal, enquanto seu ramo horizontal ancora o tubo no estoma da traqueostomia, evitando o deslocamento do tubo T.(8) O objetivo principal tanto da traqueostomia quanto do tubo T é de manter a permeabilidade das vias aéreas enquanto aguarda a resolução do HSG.
 
Em 2008, o tratamento do HSG recebeu uma nova abordagem médica com o uso de propranolol,(4) reduzindo o número de traqueostomias realizadas nesses pacientes em 2012 em relação a 2003.(9) Uma dose inicial de 1 mg/kg/dia por via oral é recomendada e, se bem tolerada, pode ser aumentada para 2 ou 3 mg/kg/dia. Não se sabe por quanto tempo as crianças com HSG devem permanecer em uso do propranolol, mas estudos sugerem sua manutenção até o término da fase proliferativa.(10) Durante o tratamento com propranolol, até o momento, ainda não observamos arritmias cardíacas ou outros efeitos colaterais da droga.
 
Pode-se concluir que o HSG obstrutivo em crianças pode ser tratado com segurança e eficácia por meio de propranolol oral a longo prazo e colocação de stent nas vias aéreas por meio de um tubo T de silicone quando uma traqueostomia for necessária.
 
CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES
 
Todos os autores participaram da escrita e revisão do manuscrito, bem como da aprovação da versão final.
 
REFERÊNCIAS
 
1.            Holinger PH, Brown WT. Congenital webs, cysts, laryngoceles and other anomalies of the larynx. Ann Otol Rhinol Laryngol 1967; 76:744–52. https://doi.org/10.1177/000348946707600402.
2.            Drolet BA, Esterly NB, Frieden IJ. Hemangiomas in children. N Engl J Med 1999; 341:173–181. https://doi.org/10.1056/NEJM199907153410307.
3.            Perkins JA, Duke W, Chen E, Manning S. Emerging concepts in airway infantile hemangioma assessment and management. Otolaryngol Head Neck Surg 2009; 141:207–212. https://doi.org/10.1016/j.otohns.2009.04.013.
4.            Denoyelle F, Leboulanger N, Enjolars O, Harris R, Roger G, Garabedian EN. Role of propranolol in the therapeutic strategy of infantile laryngotracheal hemangioma. Int J Pediatric Otorhinolaryngol 2009; 73:1168-72. https://doi.org/10.1016/j.ijporl.2009.04.025.
5.            Ferguson CF, Flake CG. Subglottic hemangioma as a cause of respiratory obstruction in infants. Ann Otol Rhinol Laryngol 1961; 70:1095-112. https://doi.org/10.1177/000348946107000414.
6.            Rahbar R, Nicollas R, Roger G, Triglia J, Garabedian E, McGill TJ, et al. The biology and management of subglottic hemangioma: past, present, future. Laryngoscope 2004; 114:1880-1891. https://doi.org/10.1097/01.mlg.0000147915.58862.27.
7.            Tamagno M, Bibas BJ, Minamoto H, Alfinito FS, Terra RM, Jatene FB. Subglottic and mediastinal hemangioma in a child: treatment with propranolol. J Bras Pneumol. 2011; 37(3):416-8. https://doi.org/10.1590/s1806-37132011000300021.
8.            Prasanna Kumar S, Ravikumar A, Senthil K, Somu L, Nazrin MI. Role of Montgomery T-tube stent for laryngotracheal stenosis. Auris Nasus Larynx 2014; 41:195-200. https://doi.org/10.1016/j.anl.2013.10.008.
9.            Espahbodi M, Yan K, Chun RH, McCormick ME. Management trends of infantile hemangioma: A national perspective. Int J Pediatr Otorhinolaryngol. 2018; 104:84–87. https://doi.org/10.1016/j.ijporl.2017.10.044.
10.          Maturo S, Hartnick C. Initial experience using propranolol as the sole treatment for infantile airway hemangiomas. Int J Pediatr Otorhinolaryngol. 2010; 74(3):323-5. https://doi.org/10.1016/j.ijporl.2009.12.008.

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