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Artigo Original

Níveis de eosinófilos circulantes e declínio da função pulmonar em doença pulmonar obstrutiva crônica estável: um estudo longitudinal retrospectivo

Circulating eosinophil levels and lung function decline in stable chronic obstructive pulmonary disease: a retrospective longitudinal study

Marcello Ferrari1, Michela Pizzini1, Lucia Cazzoletti2, Valentina Ermon1, Francesco Spelta1, Sergio De Marchi1, Luca Giuseppe Dalle Carbonare1, Ernesto Crisafulli1

DOI: 10.36416/1806-3756/e20220183

ABSTRACT

Objective: Whether blood eosinophils (bEOS) in chronic obstructive pulmonary disease (COPD) are associated with disease progression is a topic of debate. We aimed to evaluate whether the differential white blood cell (WBC) count, symptoms and treatment may predict lung function decline and exacerbations in COPD patients. Methods: We retrospectively examined stable COPD patients with a minimum follow-up of 3 years at our outpatients' clinic. We collected information about lung volumes (FEV1, FVC), the total and differential WBC count, acute exacerbations of COPD (number in the 12 months before the beginning of the study=AE-COPD-B, and during the follow-up=AE-COPD-F), smoking status and treatment. FEV1 decline and AE-COPD-F were described by using a generalized linear model and a 2-level random intercept negative binomial regression, respectively. The models included eosinophil and neutrophil counts as potential predictors and were adjusted by sex, age, smoking status, AE-COPD-B, treatment with bronchodilators and inhaled corticosteroids (ICS). Results: Sixty-eight patients were considered, 36 bEOS- (<170 cells/µL, the median value) and 32 bEOS+ (=170 cells/µL). ?FEV1 was higher in bEOS+ than bEOS- (34.86 mL/yr vs 4.49 mL/yr, p=0.029). After adjusting for potential confounders, the eosinophil count was positively (ß=19.4; CI 95% 2.8, 36.1; p=0.022) and ICS negatively (ß=-57.7; CI 95% -91.5,-23.9; p=0.001) associated with lung function decline. bEOS were not found to be associated with the number of AE-COPD-F. Conclusion: In stable COPD patients, a higher level of blood eosinophils (albeit in the normal range) predicts a greater FEV1 decline, while ICS are associated with a slower progression of airflow obstruction.

Keywords: COPD; Blood eosinophils; FEV1 decline; Exacerbations; Biomarkers. Correspondence to:

RESUMO

Objetivo: Discute-se se eosinófilos no sangue (EOS) na doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) são associados à evolução da doença. O objetivo deste estudo foi avaliar se a contagem diferencial de células brancas do sangue (CBS), os sintomas e o tratamento podem prever o declínio da função pulmonar e as exacerbações em pacientes com DPOC. Métodos: Foram retrospectivamente examinados pacientes com DPOC estável submetidos a um monitoramento mínimo de três anos em nossas clínicas ambulatoriais. Coletaram-se informações sobre volumes pulmonares (VEF1 e CVF), contagens total e diferencial de CBS, exacerbações agudas de DPOC (número nos 12 meses anteriores ao início do estudo = EA-DPOC-B; e durante o monitoramento = EA-DPOC-F), status tabagístico e tratamento. Os declínios de VEF1 e EA-DPOC-F foram descritos empregando modelo linear generalizado e regressão binomial negativa com interceptação aleatória de nível 2, respectivamente. Os modelos incluíram contagens de eosinófilo e neutrófilo como potenciais preditores e foram ajustados de acordo com sexo, idade, status tabagístico, EA-DPOC-B, tratamento com broncodilatadores e corticosteroides inalados (CSI). Resultados: 68 pacientes foram considerados, dos quais 36 para EOS- (< 170 células/μL, valor da mediana) e 32 para EOS+ (≥ 170 células/μL). ∆VEF1 foi maior em EOS+ do que em EOS- (34,86 mL/ano vs 4,49 mL/ano, p = 0,029). Após o ajuste em relação aos potenciais confundidores, as contagens de eosinófilos (β = 19,4; CI 95% 2,8,36,1; p = 0,022) e CSI (β = -57,7; CI 95% -91,5,-23,9; p = 0,001) foram positivamente e negativamente associadas ao declínio da função pulmonar, respectivamente. Os EOS não foram associados ao número de EA-DPOC-F. Conclusão: Em pacientes com DPOC estável, o maior nível de EOS (embora em um intervalo regular) prevê um maior declínio de VEF1, enquanto os CSIs são associados a uma evolução mais lenta da obstrução do fluxo aéreo.

Palavras-chave: DPOC; Eosinófilos no sangue; Declínio de VEF1; Exacerbações; Biomarcadores.

 
INTRODUÇÃO
 
O declínio da função pulmonar é uma das características mais importantes da história natural em pacientes com doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC). Estima-se que o declínio médio de VEF1 seja de cerca de 20-40 mL/ano e que existam dois subgrupos de pacientes em relação ao ritmo de declínio, categorizados como “mais rápidos” e “mais lentos”(1).
 
A inflamação sistêmica e pulmonar pode contribuir para esse declínio. Já é de conhecimento comum o comprometimento primário de neutrófilos cujos níveis são maiores nas vias aéreas de pacientes com DPOC e positivamente associados à obstrução do fluxo aéreo.(2) Além disso, mesmo que os eosinófilos sejam a população de granulócito predominante em indivíduos com asma, evidências mais recentes têm sugerido a presença de inflamação eosinofílica em subgrupo de pacientes com DPOC.(3) Os eosinófilos em vias aéreas se correlacionam com seus níveis sanguíneos de maneira significativa, embora seja uma correlação fraca.(4)
 
Apesar de pacientes com DPOC terem mais eosinófilos circulantes que a população fumante sem DPOC,(5) não está claro se tal resultado é clinicamente relevante ou estatisticamente significativo. A contagem de eosinofilia sanguínea pode prever o risco de uma exacerbação aguda. No estudo de Copenhagen,(6) uma contagem de eosinofilia sanguínea com mais de 340 células/μL foi associada a um risco quase duas vezes maior de que exacerbações graves ocorram. Além disso, o maior risco de aumento na concentração de eosinófilos circulantes durante exacerbações tem relação com maior contagem de eosinófilos durante a fase de estabilidade.(7)
 
A literatura respalda a noção de que os eosinófilos no sangue (EOS) podem ser preditores de resposta a uma terapia baseada em corticosteroides em pacientes com exacerbações agudas de DPOC (EA-DPOC).(7,8) Durante uma exacerbação aguda, pacientes com DPOC cuja contagem de eosinófilos está acima de 2% de células brancas do sangue (CBS) totais têm menor probabilidade de reincidência caso sejam tratados com corticosteroide sistêmico.(9) Entretanto, não existem estudos prospectivos randomizados que tenham analisado o papel da contagem de eosinofilia sanguínea como um preditor de resposta à terapia no contexto de DPOC estável.(10) Apenas alguns poucos estudos investigaram a associação entre a evolução da obstrução do fluxo aéreo e os EOS, sendo que seus resultados são discordantes.(11-16) Nesse contexto, este estudo longitudinal retrospectivo foi conduzido a fim de investigar se fatores como características clínicas, dados laboratoriais e tratamento estariam associados ao declínio de VEF1 ao longo do tempo, com enfoque na contagem diferencial de leucócitos circulantes.
 
MÉTODOS
 
Trata-se de um estudo retrospectivo de observação com a utilização de dados referentes aos últimos cinco anos, presentes na base de dados da clínica ambulatorial do Hospital Universitário de Verona. Considerou-se um total de 239 pacientes com DPOC. O diagnóstico se baseou em critérios GOLD.(17) O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da referida instituição.
 
Foram selecionados pacientes com as seguintes características: 1) fase estável da doença, ex., ausência de EA-DPOC e de mudança no tratamento nos três meses anteriores; 2) contagem de eosinofilia sanguínea abaixo de 450 células/μL (limite normal superior do laboratório da instituição); e 3) monitoramento mínimo de três anos.
 
Foram excluídos pacientes com outras doenças pulmonares, tais como câncer pulmonar, doenças pulmonares intersticiais, asma, ressecção pulmonar e infecções pulmonares. Também foram excluídos pacientes com doenças relacionadas à atopia (tais como rinites) e aqueles com espirometria fora do limite aceitável.(18)
 
Informações demográficas, incluindo sexo, idade, altura, peso e hábito tabagista, foram coletadas a partir do histórico médico dos pacientes. Também foram registrados o histórico médico e as terapias prescritas para a doença respiratória (LABA, β2-antagonistas de longa duração; LAMA, antagonistas muscarínicos de longa duração; CSI, corticosteroides inalados). Um paciente estava em terapia com LABA, LAMA ou CSI quando esses medicamentos foram administrados (isolada ou combinadamente) no início do período de observação.
 
Foram registrados os valores de parâmetros espirométricos (volume expiratório forçado em 1 segundo, VEF1 L; e capacidade vital forçada, CVF L). O declínio da função pulmonar (mL/ano) foi expresso como o valor de VEF1 no início menos o valor de VEF1 ao final do período de observação dividido pelos anos de monitoramento (∆VEF1, mL/ano).
 
Informações sobre exacerbações e dispneia (escala MRC modificada(19)) também foram disponibilizadas. A presença de EA-DPOC foi definida como o agravamento de sintomas respiratórios que necessitam de tratamento antibiótico ou oral com corticosteroide.(17) A EA-DPOC-F se refere ao número de exacerbações nas visitas de controle conduzidas durante o período de monitoramento. A EA-DPOC-B se refere ao número de exacerbações nos 12 meses anteriores ao início do período de observação.
 
Análise estatística
 
Os dados estão expressos como ± DP médio ou mediana com intervalo interquartílico (MII), conforme o caso. O teste t e o teste de Wilcoxon-Mann-Whitney foram usados para avaliar as diferenças das variáveis contínuas entre os grupos de pacientes da mesma maneira. O teste de Qui-quadrado foi utilizado para comparar os dados expressos em porcentagens.
Um modelo linear generalizado multivariado foi usado para avaliar a associação entre as contagens de eosinofilia sanguínea e neutrófilo (variáveis independentes) e ∆VEF1 (mL/ano) (variável dependente), de acordo com sexo, idade e status tabagístico (fumante ativo vs. ex-fumante) (Modelo I). Em um estágio posterior, o tratamento de base com broncodilatadores e CSI e o número de EA-DPOC-B foram integrados ao modelo (Modelo II).
 
A associação entre as contagens de eosinófilo e neutrófilo no sangue (variáveis independentes) e a EA-DPOC-F (variável dependente) foi avaliada por meio de uma regressão binomial negativa com interceptação aleatória de nível 2, com unidades de nível 1 (visitas) agrupadas em unidades de nível 2 (pacientes) e ajustadas de acordo com o sexo e a idade de referência (Modelo III). Outro modelo foi ajustado aos dados a partir da adição de um modelo prévio como variáveis independentes dos tratamentos de base com broncodilatadores e CSI e o número de EA-DPOC-B (Modelo IV). Os coeficientes estimados da regressão binomial negativa foram expressos como razões da taxa de incidência (RTI) com intervalos de confiança de 95%. Os modelos III e IV não foram ajustados conforme os hábitos tabagistas, uma vez que o número de base de fumantes foi muito limitado (n = 5 de 68 pacientes com DPOC), sendo que nenhum deles relatou exacerbações no monitoramento.
 
O teste de adequação foi avaliado com base no critério de informação de Akaike (CIA)(20) e o critério de informação Bayesiano (CIB):(21) os melhores desempenhos quanto a prever o declínio de VEF1 e a taxa de exacerbações durante o monitoramento foram identificados nos menores valores de CIA e CIB, comparando os Modelos I e II e os Modelos III e IV.
 
Valores de p abaixo de 0,05 foram considerados estatisticamente significativos.
 
A análise estatística e os gráficos foram processados no programa STATA/IC, versão 16.1.
 
RESULTADOS
 
Foram analisados 239 históricos médicos de pacientes com DPOC. No total, 171 pacientes foram excluídos (Figura 1): 73 pacientes não estavam sendo monitorados há pelo menos três anos (incluindo 11 que haviam falecido); 75 pacientes não apresentavam informação sobre a contagem de eosinofilia sanguínea; 23 não estavam em uma fase estável da doença.
 

 

 
No total, 68 pacientes foram incluídos na análise (idade de 71,1 ± 6,6 anos; 18 mulheres, ou 26,5%). O monitoramento médio foi de 50,1 ± 16,3 meses. A mediana da contagem de eosinofilia sanguínea foi de 170 (MII: 115-260) células por μL. Com base nesse valor, os pacientes foram divididos em dois grupos: um com menos de 170 EOS/μL (36 pacientes, grupo EOS-) e outro com pelo menos 170 EOS/μL (32 pacientes, grupo EOS+).
 
As características demográficas e clínicas dos pacientes com DPOC no estudo estão apresentadas na Tabela 1. As informações sobre idade, IMC e distribuição entre homens e mulheres foram semelhantes nos dois grupos. Fumantes ativos estavam presentes somente no grupo EOS-, enquanto a mediana do valor de anos como fumantes foi maior, embora não significativamente, no grupo EOS+. O número de EA-DPOC-B apresentou uma tendência a ser maior no EOS+, apesar de a diferença entre os grupos não ter sido estatisticamente significativa. A escala de dispneia MRC modificada e o uso de LAMAs, LABAs e CSIs foram comparáveis no EOS+ e no EOS-. No início do estudo, os valores médios de CVF e VEF1, bem como as contagens de leucócito, neutrófilo e linfócito, foram semelhantes nos dois grupos.
 

 

 
Considerando a amostra como um todo, o ∆VEF1 médio e o declínio médio anual de CVF resultaram em 18,78 ± 58,25 mL/ano e 9,5 ± 125 mL/ano, respectivamente. O ∆VEF1 foi significativamente maior no EOS+ (34,86 ± 50,33) que no EOS- (4,49 ± 61,69) (p = 0,029). Por sua vez, não foi encontrada nenhuma diferença estatisticamente significativa em termos da mudança anual em CVF entre os dois grupos (p = 0,393). Durante o monitoramento, a mediana do número de exacerbações não se mostrou significativamente diferente entre os grupos EOS+ e EOS- (mediana: 0, MII: 0-2 em EOS-; e mediana: 0, MII: 0-1 em EOS+; p = 0,868).
 
Após o ajuste para sexo, idade e hábitos tabagistas na base, os eosinófilos se mostraram significativamente associados ao ∆VEF1, considerando tanto somente neutrófilos ou eosinófilos como possíveis determinantes (β = 16,9; CI 95% 2,0,31,8; p = 0,026) (Modelo I, Tabela 2) ou no modelo completo (β = 19,4; CI 95% 2,8,36,1; p = 0,0022) (Modelo II, Tabela 2). A Figura 2 mostra os valores observados e ajustados de ∆VEF1 médio por contagem de eosinófilos no modelo completo: no caso de um aumento na contagem de eosinófilos de 100 células por μL, era esperado que o declínio de VEF1 aumentasse em 19,4 mL/ano. O tratamento com CSI se mostrou associado a um menor declínio da função pulmonar (β = -57,7; CI 95% -91,5,-23,9; p = 0,001) (Modelo II, Tabela 2).

 


 

 


 

 
Uma vez realizada a adequação de sexo e idade na base, a contagem de neutrófilos se mostrou significativamente associada ao número de EA-DPOC-F ao se considerarem somente neutrófilos e eosinófilos como possíveis determinantes: a razão de taxa de exacerbações estimada para um aumento na contagem de neutrófilos de 100 células/μL foi de 1,03 (CI 95% 1,00,1,07; p = 0,032), ex., ao se manterem todas as outras variáveis no modelo constante, o aumento na contagem de neutrófilos parece aumentar o número esperado de exacerbações em 3%. Com a inclusão dos tratamentos de base com broncodilatadores e CSI e da EA-DPOC-B no modelo (Modelo IV, Tabela 3), as contagens de eosinófilo e de neutrófilo não foram significativamente associadas à taxa de exacerbações, enquanto o tratamento de base com broncodilatadores resultou em aumento significativo na taxa de exacerbações (valores estimados de RTI = 15,02, CI 95% 1,65,136,67).

 

 

 
Os modelos completos (Modelos II e IV) alcançaram a melhor adequação, conforme demonstrado nos menores valores de CIA e CIB (Tabelas 2 e 3).
 
DISCUSSÃO
 
Os resultados deste estudo longitudinal retrospectivo em pacientes com DPOC demonstram que os EOS são associados a um declínio mais rápido de VEF1. Inversamente, a contagem de eosinofilia sanguínea não indica um maior risco de exacerbações.
 
São poucos os estudos que investigaram a associação entre inflamação eosinofílica e declínio da função pulmonar, sendo que seus resultados são contrastantes. Em um desses estudos, corroborando os resultados desta pesquisa, observou-se que uma contagem de eosinofilia sanguínea acima de 2% esteve associada a declínios mais rápidos de VEF1.(11) Ainda, um trabalho mais recente(15) demonstrou que uma contagem de eosinofilia sanguínea de ≥ 300 células/µL se mostrou como fator de risco independente para declínio acelerado da função pulmonar. O contexto foi de um amplo estudo de coorte canadense envolvendo adultos mais velhos da população em geral. Inversamente, no estudo ECLIPSE,(13) pacientes com DPOC cuja contagem de eosinofilia sanguínea foi maior ou menor que 2% tiveram declínios de VEF1 semelhantes em monitoramento de três anos. No estudo de coorte HOKKAIDO DPOC,(14) foi descrito que pacientes com DPOC com maiores níveis de eosinófilos circulantes mantiveram níveis de VEF1 substancialmente estáveis ao longo de um período de cinco anos, enquanto o maior nível de enfisema e a maior contagem de neutrófilos circulantes se caracterizaram como preditores de declínio mais rápido de VEF1. Diferenças étnicas e ambientais entre a amostra desta pesquisa e aquela apresentada no estudo japonês podem ser responsáveis por tais resultados contrastantes. Mais recentemente, outro estudo(22) demonstrou que, em pacientes com DPOC com contagem alta de eosinofilia sanguínea (≥ 350 células/μL), as exacerbações foram associadas à subsequente aceleração do declínio de VEF1. Além disso, a associação entre eosinófilos na expectoração e declínio da função pulmonar é incerta. Outro estudo(23) observou que as contagens tanto de neutrófilos quanto de eosinófilos na expectoração estiveram relacionadas ao declínio de VEF1 em DPOC. Por sua vez, ainda outro estudo(24) descreveu a associação entre eotaxina-1 (ativação de eosinófilo induzido por quimosina) na lavagem pulmonar e evolução mais rápida da doença em pacientes com DPOC.(11)
 
Neste estudo, não foi possível encontrar uma associação entre a contagem de eosinofilia sanguínea e o risco de exacerbação, em concordância com dois grupos de autores,(25,26) mas em contraste a outros estudos que descreveram o papel dos eosinófilos circulantes na indicação do surgimento de EA-DPOC.(27-30) A contagem de neutrófilos circulantes neste estudo foi associada a exacerbações durante o monitoramento, embora isso não tenha ocorrido apenas no modelo em que sexo e idade, mas não tratamentos, foram considerados como confundidores. Tal resultado respalda parcialmente um estudo recente o qual sugere que uma contagem alta de eosinofilia sanguínea pode representar um indicador útil do risco de exacerbações em pacientes com DPOC.(31)
 
Neste estudo retrospectivo, não foi possível chegar a conclusões confiáveis em relação a possíveis efeitos de medicamentos inalados no declínio da função respiratória e exacerbações. Entretanto, houve um achado importante em relação à associação negativa entre CSI e declínio de VEF1, o que pode sugerir um efeito de desaceleração de CSI sobre a evolução da doença. A associação positiva entre o tratamento com broncodilatadores e a taxa de exacerbações durante o monitoramento ainda não tem uma explicação clara. Neste estudo, quase todos os pacientes foram tratados por meio de uma combinação de medicamentos, sendo que somente uma minoria deles foi tratada com LAMA ou LABA isoladamente. Sendo assim, não foi possível avaliar o efeito isolado dos dois tipos de broncodilatadores. Considerando tal limitação, a hipótese é de que pacientes com exacerbações mais frequentes na base e, consequentemente, com maior risco de desenvolverem exacerbações ao longo do monitoramento são tratados mais frequentemente. O uso de medicações pode ainda explicar a falta de uma associação entre EA-DPOC-B e EA-DPOC-F. Claramente, somente estudos prospectivos e randomizados poderiam esclarecer essa questão definitivamente.
 
A contagem de eosinofilia sanguínea é influenciada por diversos fatores, tais como variações diurnas, sazonais e hormonais.(32,33) Além disso, flutuações na doença e no tratamento podem aumentar tal variabilidade.(32) Portanto, tem sido indicado que uma única estimativa da contagem de eosinófilos, como no caso deste estudo, provavelmente não reflita o padrão global de eosinofilia sanguínea.(34) Entretanto, um grupo de autores observou que a proporção de pacientes com DPOC com contagem estável de eosinófilos em um intervalo de seis meses foi alta (93%) em indivíduos com uma média de idade de 70 anos.(5) A variabilidade é ainda mais limitada em contagem absoluta de eosinófilos abaixo de 340 células/μL, como aquela observada nos pacientes deste estudo.(5) Finalmente, a contagem de eosinófilos neste estudo foi medida em uma fase estável da doença, na mesma hora do dia, após jejum noturno, para todos os fatores que podem ter reduzido a variabilidade da contagem.
 
Este estudo apresenta algumas limitações. Além dos limites relacionados ao seu caráter retrospectivo de observação, a escolha por selecionar pacientes em uma fase estável da doença e os vários critérios de exclusão também impedem que os achados sejam estendidos a pacientes com DPOC com características diferentes. Outra limitação diz respeito ao baixo número de pacientes, o que pode explicar a ausência de algumas associações, tais como entre eosinófilos e exacerbações. Entretanto, o tamanho amostral foi amplo o suficiente para respaldar a hipótese acerca da relação entre eosinófilos e declínio de VEF1.
 
Neste estudo, considera-se a ocorrência de exacerbação em uma situação na qual o paciente reporte o uso de antibióticos ou corticosteroides após o agravamento de sintomas, independentemente de terem sido admitidos em um pronto-socorro ou para hospitalização. Portanto, os resultados deste estudo não podem ser aplicados a exacerbações graves (ex., que necessitam de hospitalização) ou a exacerbações leves (ex., que produzem somente uma leve variação do tratamento regular).
 
Admite-se que o declínio de VEF1 foi calculado em somente dois pontos, ao início e ao final do período de observação. É possível que um maior número de medições tenha gerado um valor de mudança funcional mais confiável. Entretanto, testes de função pulmonar foram conduzidos durante a fase estável da doença com base em critérios do parecer técnico ATS,(16) o que possibilitou a obtenção de dados de alta qualidade.
 
Como conclusão, os resultados deste estudo sugerem que, em pacientes com DPOC estável, um maior nível de EOS (ainda que em intervalo regular) indicaria maior declínio de VEF1 ao longo do tempo, mas não maior número de exacerbações. Além disso, a terapia à base de CSI parece minimizar a evolução da obstrução do fluxo aéreo; ainda assim, é necessário que se conduzam estudos prospectivos randomizados a fim de confirmar tais resultados.
 
CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES
 
MF, MP, LC: elaboração e projeto de estudo. MF, MP, LC, VE, FS, SDM, LGDC, EC: aquisição, análise ou interpretação dos dados. MF, MP, LC, LGDC, EC: rascunho do estudo ou revisão crítica em relação ao conteúdo intelectual relevante. MF, LC, EC: Aprovação da versão final do manuscrito.
 
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