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ISSN (on-line): 1806-3756

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Artigo Original

Periostina como um importante biomarcador do fenótipo inflamatório T2 em pacientes brasileiros com asma

Periostin as an important biomarker of inflammatory phenotype T2 in Brazilian asthma patients

Danielle Cristiane Baldo1,2, José Gustavo Romaldini1, Marcia Margaret Menezes Pizzichini3, José Eduardo D. Cançado1, Alessandra Dellavance2, Roberto Stirbulov1

DOI: 10.36416/1806-3756/e20220040

ABSTRACT

Objective: The aim of this study was to assess the laboratory performance of periostin associated with a panel of biomarkers to identify the inflammatory phenotype of Brazilian asthma patients. Methods: We evaluated 103 Brazilian individuals, including 37 asthmatics and 66 nonasthmatic controls. Both groups underwent analyses for serum periostin, eosinophil levels in the peripheral blood, the fraction of exhaled nitric oxide (FeNO), total serum IgE, urinary leukotriene E4, and serum cytokines. Results: Higher levels of periostin (p = 0.005), blood eosinophils (p = 0.012), FeNO (p = 0.001), total IgE (p < 0.001), and IL-6 (p = 0.001) were found in the asthmatic patients than the controls. Biomarker analyses by the ROC curve showed an AUC greater than 65%. Periostin (OR: 12,550; 95% CI: 2,498-63,063) and IL-6 (OR: 7,249; 95% CI: 1,737-30,262) revealed to be suitable asthma inflammation biomarkers. Blood eosinophils, FeNO, total IgE, IL-6, TNF, and IFN-? showed correlations with clinical severity characteristics in asthmatic patients. Periostin showed higher values in T2 asthma (p = 0.006) and TNF in non-T2 asthma (p = 0.029). Conclusion: The panel of biomarkers proposed for the identification of the inflammatory phenotype of asthmatic patients demonstrated good performance. Periostin proved to be an important biomarker for the identification of T2 asthma.

Keywords: Asthma; Biomarkers; Eosinophilia; Phenotype.

RESUMO

Objetivo: O objetivo deste estudo foi de avaliar o desempenho laboratorial da periostina associada a um painel de biomarcadores para identificar o fenótipo inflamatório de pacientes brasileiros com asma. Métodos: Foram avaliados 103 indivíduos brasileiros, incluindo 37 asmáticos e 66 controles não asmáticos. Ambos os grupos foram submetidos a análises de periostina sérica, níveis de eosinófilos no sangue periférico, a fração exalada de óxido nítrico (FeNO), IgE sérica total, leucotrieno E4 urinário e citocinas séricas. Resultados: Maiores níveis de periostina (p = 0,005), eosinófilos periféricos (p = 0,012), FeNO (p = 0,001), IgE total (p < 0,001) e IL-6 (p ≤ 0,001) foram encontrados nos pacientes asmáticos do que nos controles. As análises de biomarcadores pela curva ROC mostraram uma AUC superior a 65%. A periostina (OR: 12.550; IC 95%: 2.498–63.063) e a IL-6 (OR: 7.249; IC 95%: 1.737–30.262) se mostraram biomarcadores adequados da inflamação da asma. Eosinófilos periféricos, FeNO, IgE total, IL-6, TNF e IFN-γ apresentaram correlação com características clínicas de gravidade em pacientes asmáticos. A periostina teve valores mais elevados na asma T2 (p = 0,006) e o TNF na asma não T2 (p = 0,029). Conclusão: O painel de biomarcadores proposto para a identificação do fenótipo inflamatório de pacientes asmáticos demonstrou bom desempenho. A periostina provou ser um importante biomarcador para a identificação da asma T2.

Palavras-chave: Asma; Biomarcadores; Eosinofilia; Fenótipo.

 
INTRODUÇÃO
 
A asma é uma doença inflamatória crônica caracterizada por hiperresponsividade das vias aéreas inferiores e limitações variáveis de fluxo aéreo que são reversíveis espontaneamente ou com tratamento. Considerada uma das doenças crônicas mais prevalentes no mundo, a asma é responsável direta e indiretamente por diversas perdas médicas e produtivas,(1,2) sendo o Brasil um dos países com maior prevalência.(3,4)
 
O diagnóstico da asma baseia-se clinicamente na presença de sintomas compatíveis associados a limitações variáveis de fluxo aéreo e manifestações de hiperresponsividade das vias aéreas.(5,6) Entre os pacientes asmáticos, existe um subgrupo de indivíduos com asma de difícil tratamento. Embora esses pacientes façam uso de altas doses de medicamentos para controlar seus sintomas, eles apresentam atributos que dificultam o controle, como fatores comportamentais, baixa adesão, técnicas inalatórias incorretas, exposição ambiental ou ocupacional e a presença de comorbidades.(7) Um subgrupo menor desses pacientes tem asma grave. Esses indivíduos carecem de controle adequado dos sintomas, mesmo quando diagnósticos alternativos são excluídos, comorbidades são tratadas, gatilhos são removidos e a adesão ao tratamento é satisfatória; eles representam cerca de 1 a 4% da população geral de asmáticos.(8,9)
 
Várias opções de agentes imunobiológicos estão atualmente disponíveis para o tratamento da asma grave. Para uma abordagem alvo-específica dentre as opções existentes, a identificação do fenótipo inflamatório é fundamental.(10) Dentre os fenótipos inflamatórios, o mais frequente é a inflamação do tipo 2 (T2), que se caracteriza pela presença de células T auxiliares do tipo 2  (Th2) ou células imunes inatas do tipo 2 (ILC-2), e se manifesta como eosinofilia das vias aéreas e/ou sistêmica.(11)
 
Todos os imunobiológicos aprovados para uso são direcionados ao tratamento da asma T2, que pode ser identificada por meio de biomarcadores disponíveis, como eosinófilos no sangue periférico (eosinófilos periféricos) e imunoglobulina E sérica total (IgE total), eosinófilos no escarro induzido (eosinófilos no escarro) e a fração exalada de óxido nítrico (FeNO).(12) Novos biomarcadores para a diferenciação da asma T2 têm sido propostos, como a periostina sérica e o leucotrieno E4 urinário (LTE4).(13,14) Há também estudos investigando o uso de citocinas envolvidas nas vias inflamatórias das células Th1 e Th17, como IL-6, TNF e IFN-γ, como biomarcadores para asma não T2.(15-17)
 
As diretrizes da Iniciativa Global pela Asma (GINA) de 2021 recomendam a identificação de pelo menos um dos seguintes achados para o estabelecimento da asma T2: (1) eosinófilos periféricos ≥ 150 células/μL e/ou (2) FeNO ≥ 20 ppb e/ou (3) eosinófilos no escarro ≥ 2% e/ou (4) asma induzida por alergia e/ou (5) a necessidade de terapia de manutenção com corticosteroides orais (CO). Se necessário, os valores de eosinófilos periféricos e FeNO devem ser medidos ao menos 3 vezes sob administração da menor dose possível de corticosteroides orais.(5)
 
Atualmente, os serviços de rotina dos laboratórios clínicos estão amplamente disponíveis para a quantificação de IgE sérica total e eosinófilos periféricos, mas carecem de validação metodologicamente direcionada no contexto clínico da asma. Também não há um serviço que forneça quantificações de FeNO, periostina e LTE4 para uso na prática clínica. A quantificação de eosinófilos no escarro é um teste ideal para a fenotipagem da asma; entretanto, é uma técnica complexa e de difícil aplicação na rotina clínica.(18) A disponibilidade e acessibilidade de outros biomarcadores são essenciais, não apenas visando a substituição de biomarcadores menos úteis, mas também para a complementação de informações sobre o fenótipo inflamatório dos pacientes. Nesse sentido, um painel mais completo de biomarcadores pode ser útil.(12,19,20) Para isso, é fundamental que os laboratórios clínicos validem esses ensaios no contexto clínico da asma para determinar o desempenho analítico dos testes para esse fim.
 
Diante do exposto, o objetivo do presente estudo foi de avaliar o desempenho analítico de um painel de biomarcadores para identificação do fenótipo inflamatório em um grupo de pacientes asmáticos no Brasil.
 
MÉTODOS
 
O presente estudo transversal, observacional e analítico foi devidamente registrado na Plataforma Brasil sob CAAE no 73640917.8.0000.5479 e aprovado pelos Comitês de Ética em Pesquisa da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo e do Grupo Fleury. Todos os participantes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido.
 
Este estudo incluiu indivíduos brasileiros maiores de 18 anos de dois centros diferentes: pacientes diagnosticados com asma grave de acordo com os critérios internacionais descritos nas diretrizes da ATS/ERS,(21) acompanhados no ambulatório de asma grave da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, e pacientes com asma não grave e indivíduos controles, colaboradores da empresa Grupo Fleury, que se voluntariaram a participar por meio de comunicação interna do projeto de pesquisa. O tamanho amostral foi estimado seguindo a diretriz CLSI (Clinical & Laboratory Standards Institute) EP09-A3, que determina um requisito mínimo de 40 amostras para verificação conduzida pelo usuário.
 
Pacientes e controles foram recrutados de fevereiro de 2019 a maio de 2021. Os pacientes foram instruídos a não interromper o tratamento em andamento, pois a avaliação não era intervencionista e não abordava um tratamento específico. Para inclusão no grupo de asma não grave, foram aceitos pacientes previamente diagnosticados por um especialista, que tiveram crises de asma na vida adulta e que não preenchiam os critérios para asma grave pela história clínica e pelas medicações utilizadas para controle dos sintomas. O grupo de controle foi determinado por pareamento de sexo com o grupo de asma.
 
Todos os participantes do estudo (pacientes e controles) foram avaliados quanto à obesidade (cálculo do IMC), alergia a antígenos inalantes (detecção de IgE específica contra poeira doméstica, ácaros, pólen de gramíneas, epitélio e proteínas animais e/ou fungos) e se tinham qualquer uma das seguintes comorbidades: apneia do sono, bronquiectasia, dermatite atópica, urticária crônica, polipose nasal, rinossinusite crônica, disfunção das cordas vocais ou doenças autoimunes.
 
Os pacientes asmáticos foram avaliados quanto à história da doença (asma de início tardio foi definida como o início dos sintomas na idade adulta), os medicamentos em uso para categorização da etapa de tratamento de acordo com a GINA, o controle da asma por meio do Teste de Controle da Asma (TCA) e a função pulmonar pela análise dos valores da capacidade vital forçada (CVF) e do volume expiratório forçado no primeiro segundo (VEF1) da espirometria (Koko® PFT Spirometer, nSpire Health Inc, Longmont, CO, EUA) prevista (antes do uso do broncodilatador), realizados de acordo com os critérios de qualidade e reprodutibilidade da ATS/ERS.(22) Asma T2 foi definida quando os pacientes apresentavam ambos os biomarcadores: valores de eosinófilos periféricos ≥ 150 células/μL e FeNO ≥ 20 ppb.
 
As quantificações de IgE total e específica foram realizadas por imunofluorimetria automatizada e plataformas de eletroquimioluminescência, sendo os resultados expressos em kilo unidades por litro (kU/L). Os níveis sanguíneos de eosinófilos, expressos em células por microlitro (células/µL), foram determinados por citometria de fluxo fluorescente e impedância, com confirmação das contagens e análise morfológica por microscopia quando aplicável.
 
A quantificação da periostina sérica foi realizada por ensaio imunoenzimático (ELISA) utilizando o kit Human Periostin/OSF-2 (R&D Systems Inc, Minneapolis, MI, EUA), e os resultados foram expressos em nanogramas por mililitro (ng/mL). Os testes de quantificação de FeNO foram realizados de acordo com as recomendações da ATS/ERS(23) usando um dispositivo NIOX-MINO® (Circassia AB, Uppsala, Suécia) e expressos em partes por bilhão (ppb). A quantificação de LTE4 foi realizada por ELISA competitivo com o kit Leukotriene E4 ELISA (Cayman Chemical, Ann Arbor, MI, EUA). Os resultados de LTE4 foram normalizados pela concentração de creatinina sérica na amostra e expressos em picogramas por miligrama de creatinina (pg/mg Cr). Já as citocinas inflamatórias IL-6, TNF e IFN-γ foram quantificadas pela metodologia BD™ Cytometric Array Human (CBA) (BD Biosciences, San Diego, CA, EUA) e expressos em picogramas por mililitro (pg/mL). A IL-6 foi avaliada nos pacientes asmáticos e controles, enquanto TNF e IFN-γ foram analisados apenas nos pacientes asmáticos.
 
As distribuições das variáveis numéricas foram avaliadas por meio dos testes de Kolmogorov-Smirnov e Shapiro-Wilk. Nos casos de distribuição não paramétrica de dados, o teste de Mann-Whitney foi usado para comparações entre dois grupos, e o teste de Kruskal-Wallis foi usado para comparações entre três grupos. Para variáveis categóricas, as interações de frequência foram analisadas pelo teste qui-quadrado ou exato de Fisher. A curva ROC foi utilizada para medir o desempenho dos testes como discriminador de asmáticos e controles. A inferência das variáveis preditoras do fenótipo inflamatório foi realizada por regressão logarítmica bivariada pelo método de regressão linear.
 
As análises foram realizadas com o software IBM SPSS Statistics (versão 20.0) e os gráficos foram gerados com o software GraphPad PRISM (versão 5.01).
 
Não foi possível quantificar todas as variáveis para todas as amostras devido a limitações de volume ou indisponibilidade; no entanto, essa perda não impactou significativamente nenhuma variável. A amostragem final em cada análise está detalhada nas Tabelas e Figuras abaixo.
 
RESULTADOS
 
A coleta de dados foi realizada em 103 indivíduos, 37 (36%) dos quais eram pacientes asmáticos e 66 (64%), controles não asmáticos. Dentre os 37 asmáticos, 15 (40,5%) eram asmáticos graves acompanhados no Ambulatório de Asma Grave da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, enquanto 22 (59,5%) eram asmáticos não graves, colaboradores do Grupo Fleury. Os dados demográficos dos pacientes estão apresentados na Tabela 1.

 

 

 
Análise comparativa dos biomarcadores nos pacientes com asma e nos controles
 
Para avaliar os métodos analíticos utilizados para a quantificação dos biomarcadores, os valores obtidos dos pacientes asmáticos foram comparados aos dos controles. A Figura 1 ilustra os resultados obtidos nesta análise, bem como a significância estatística encontrada em cada comparação. Valores mais elevados de eosinófilos periféricos (p = 0,012), FeNO (p ≤ 0,001), IgE (p ≤ 0,001), periostina (p = 0,005) e IL-6 (p ≤ 0,001) foram observados nos pacientes asmáticos em comparação com os controles; no entanto, não houve diferença nos valores de LTE4 (p = 0,353).
 

 

 
Verificação do desempenho analítico dos biomarcadores
 
Para estabelecer os pontos de corte de desempenho analítico ótimo em relação aos métodos avaliados no contexto da asma, os biomarcadores que apresentaram níveis significativamente mais elevados em pacientes asmáticos foram avaliados pela análise da curva ROC para determinar a sensibilidade e especificidade. Amostras com dados faltantes foram excluídas das análises. Os resultados mostraram uma curva estatisticamente significante para todos os biomarcadores analisados, com área sob a curva (AUC) superior a 65%. As curvas obtidas estão representadas na Figura 2.
 

 

 
A Tabela 2 descreve os resultados da curva ROC, bem como os pontos de corte de melhor desempenho analítico para cada biomarcador, incluindo a sensibilidade quando a especificidade foi superior a 90%.
 

 

 
A análise de regressão logística binária foi realizada para determinar se a associação de biomarcadores contribuiria para uma melhor sensibilidade no contexto clínico da asma. Para tanto, os biomarcadores foram categorizados de acordo com os pontos de corte estabelecidos em positivos (acima do ponto de corte) e negativos (abaixo do ponto de corte). A periostina (OR: 12.550; IC 95%: 2.498-63.063) e a IL-6 (OR: 7.249; IC 95%: 1.737-30.262) foram preditores significantes de asma, enquanto os outros biomarcadores não foram.
 
Análise da interferência de comorbidades nos valores dos biomarcadores
 
Para analisar a interferência das comorbidades nos valores dos biomarcadores, o grupo controle foi estratificado quanto à presença de alergias, obesidade e presença de uma ou mais comorbidades associadas a piores prognósticos na asma (apneia do sono, bronquiectasia, dermatite atópica, urticária crônica, polipose nasal, rinossinusite crônica, rinite alérgica ou disfunção das cordas vocais). Nenhuma das comorbidades foi associada a valores elevados de biomarcadores (Tabela S1).
 
Análise comparativa dos biomarcadores em pacientes asmáticos de acordo com as características clínicas e fenótipos
 
Para avaliar a associação entre os valores dos biomarcadores e os dados clínicos dos pacientes, o grupo asmático foi analisado separadamente quanto às variáveis clínicas estudadas.
 
Os pacientes com asma mais grave (em níveis mais elevados de tratamento de acordo com a GINA) apresentaram valores mais elevados de IL-6 (p ≤ 0,001) e IFN-γ (p = 0,007) e níveis mais baixos de eosinófilos periféricos (p = 0,030) do que pacientes com asma não grave. Na avaliação categórica quanto ao controle da asma, não foram encontradas diferenças nos níveis de biomarcadores em asma não controlada (TCA < 20) e controlada (TCA ≥ 20) ou em asmáticos em uso de corticosteroides orais. Já com relação às variáveis relativas a limitações de fluxo aéreo, menores percentuais (≤ 80%) de CVF foram associados a maiores valores de IL-6 (p = 0,002) e IFN-γ (p < 0,001). Da mesma forma, percentuais menores (≤ 80%) de VEF1 também foram correlacionados com maiores valores de IFN-γ (p = 0,045).
 
A asma alérgica, definida como a presença de IgE específica, apresentou valores significantemente maiores de FeNO (p = 0,008) e menores de IFN-γ (p = 0,044). Quanto à asma tardia, foram encontrados valores significantemente menores de FeNO (p = 0,038). A estratificação dos pacientes de acordo com o fenótipo da obesidade (IMC ≥ 30) evidenciou valores de IgE total significantemente maiores nos pacientes obesos (p = 0,033) (Figura 3).
 

 

 
Na classificação dos pacientes asmáticos pelos parâmetros FeNO ≥ 20 ppb e eosinófilos periféricos ≥ 150 células/μL para o estabelecimento da asma T2,(5) a periostina apresentou níveis significantemente mais elevados na asma T2 (p = 0,006), mas não LTE4 (p = 0,893) ou IL-6 (p = 0,593). O TNF apresentou valores menores na asma T2 (p = 0,029) (Figura 4).

 

 
DISCUSSÃO
 
O objetivo principal do presente estudo foi de validar o uso de um painel de biomarcadores na prática clínica e determinar o desempenho analítico de testes já utilizados e novos para identificar o fenótipo inflamatório da asma. Isso é de suma importância para médicos e pacientes, principalmente no contexto da asma grave, em que a identificação do fenótipo inflamatório é fundamental para a implementação de terapia alvo-específica.(6) Diante desse objetivo, verificou-se o desempenho analítico (sensibilidade e especificidade) dos ensaios isolados, bem como os benefícios de oferecer um painel de testes com mais informações sobre as características fisiopatológicas dos pacientes.
 
Corroborando com alguns estudos na literatura,(19,24) os valores de eosinófilos periféricos e IgE total foram maiores em pacientes asmáticos do que nos controles. Esses biomarcadores são amplamente utilizados atualmente na prática clínica e auxiliam na identificação de fenótipos inflamatórios eosinofílicos e alérgicos. No entanto, a validação analítica direcionada não é realizada no contexto clínico da asma por laboratórios. Níveis mais baixos de eosinófilos no sangue foram encontrados em pacientes asmáticos realizando as etapas 4 e 5 do tratamento GINA, um possível efeito de altas doses de corticosteróides inalatórios e do uso de corticosteróides sistêmicos por esses pacientes, resultando em supressão eosinofílica.(25) Um achado previamente descrito, embora pouco estudado, foram níveis mais elevados de IgE total em pacientes obesos.(26)
 
A FeNO também é um biomarcador importante não apenas para identificar o fenótipo inflamatório, mas também como preditor da resposta ao tratamento com anti-IL-4/IL-13.(27) Uma das formas de determinar a FeNO é por meio de um dispositivo portátil de fácil manuseio(28) na prática clínica. Com a aprovação deste método pela ANVISA, tornou-se possível a utilização desse biomarcador durante o manejo de pacientes asmáticos no Brasil. Este estudo corroborou achados da literatura referentes aos valores aumentados desse biomarcador no contexto clínico da asma e esclareceu suas características analíticas para validação nacional. A correlação entre FeNO e asma alérgica e de início precoce também já foi descrita anteriormente na literatura,(5,29) reforçando a relação entre FeNO e asma T2.
 
Dois biomarcadores que atualmente não são utilizados rotineiramente na prática clínica também foram avaliados: periostina sérica e LTE4 urinário; ambos são relacionados à asma T2,(14,30) embora o LTE4 urinário frequentemente apresente resultados controversos na literatura.(31) A periostina é uma proteína matricelular envolvida em diferentes funções biológicas(32) que foi identificada na asma no processo de remodelação dos tecidos das vias aéreas.(33) Sua expressão é induzida por IL-13, uma citocina que desempenha um papel fundamental na resposta à asma T2 e que está envolvida na hiperresponsividade das vias aéreas.(13) A periostina é usada como um biomarcador da asma T2 e seu papel na identificação de bons respondedores a corticosteroides (34) e anti-IL-13(35) já foi descrita. Este estudo não apenas corroborou o aumento dos valores da periostina no contexto clínico da asma, mas também reforçou seu papel complementar no valor preditivo da doença quando comparado aos controles e seus níveis elevados em pacientes com eosinófilos periféricos e FeNO elevados (asma T2). Em relação ao LTE4 urinário, não foram observadas diferenças entre os valores obtidos nos controles ou quanto às características clínicas.
 
Outro biomarcador investigado, a IL-6, apresentou valores maiores em pacientes asmáticos do que nos controles e valores ainda mais altos em pacientes com asma não T2. Semelhante aos outros biomarcadores, a IL-6 pode estar elevada em diferentes condições clínicas, como a COVID-19,(36) por sua conhecida participação em processos inflamatórios crônicos.(37) No presente estudo, valores mais altos de IL-6 também foram preditores de asma e relacionados às etapas 4 e 5 do tratamento GINA e menores percentuais de CVF, refletindo diretamente uma possível relação com a gravidade da doença. Valores mais elevados de IFN-γ também foram observados em pacientes em estágios mais elevados de tratamento, com menor CVF e VEF1, e na asma não alérgica, mostrando possível ativação imunológica mediada por células Th1.(16) A citocina TNF também apresentou valores mais elevados em asmáticos não T2, fato que reforça a identificação de outras vias fisiopatológicas nesses pacientes.
 
Os dados obtidos com as curvas ROC evidenciaram pontos de corte com melhor equilíbrio entre especificidade e sensibilidade na asma. Esses pontos são superiores aos indicados pela GINA,(5) porém mais próximos do ponto de corte, com aplicações clínicas sólidas, como FeNO ≥ 25 ppb para indicação de tratamento com anti-IL-4/IL-13(27) e eosinófilos periféricos ≥ 300 células/μL com anti-IL-5/receptor anti-IL-5.(38,39) A sensibilidade modesta encontrada era esperada, uma vez que todos os biomarcadores avaliados, com exceção da IL-6, estão aumentados na asma eosinofílica, que representa a maioria, mas não todos os casos da doença.(40) Em relação à especificidade, esta coorte mostrou que a presença de comorbidades associadas à dificuldade de controle da asma não afetou significativamente os níveis dos biomarcadores. No entanto, o número de pacientes analisados foi uma limitação; mais estudos são necessários para sustentar este achado.
 
Por fim, uma limitação importante do presente estudo foi a ausência da coleta de escarro induzido, um dos testes mais importantes para a identificação do fenótipo inflamatório. Com a pandemia da COVID-19, procedimentos capazes de liberar aerossóis de material respiratório, como nebulização durante a coleta de escarro induzido, foram proibidos fora de contextos de emergência. Portanto, estudos futuros com a adição de testes de escarro induzido podem fortalecer nossos achados. Além disso, o acesso a uma amostra maior de asmáticos graves e pacientes de outros centros no Brasil é fundamental para melhor avaliar a aplicabilidade clínica desse painel, bem como os desfechos relacionados à resposta ao tratamento. É possível que a falta de diferenças referente aos níveis de biomarcadores e pacientes asmáticos não controlados se deva ao pequeno número de pacientes graves.
 
A utilização de um painel de biomarcadores como teste único, com informação técnico-laboratorial relativa à validação de cada exame no contexto clínico da asma, é uma abordagem fundamental para auxiliar os clínicos e doentes no tratamento individualizado e efetivo. Os biomarcadores já consolidados na prática clínica, juntamente com os novos, oferecidos em conjunto, poderiam fornecer informações confiáveis e precisas para a determinação do fenótipo inflamatório da asma, permitindo assim intervenções direcionadas que poderiam prever sintomas graves e complicações relacionadas à doença.
 
CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES
 
Concepção e desenho do estudo: DCB e RS; coleta de dados: DCB e JGR; análise e interpretação dos dados: DCB e RS; redação do manuscrito: DCB; revisão crítica do manuscrito: DCB, JGR, MMMP, JEDC, AD e RS; aprovação final do manuscrito: RS.
 
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