ABSTRACT
Objective: To estimate the prevalence of current commercial cigarette smoking, as well as those of e-cigarette and hookah experimentation and current use among adults (= 18 years of age) in Brazil. Methods: This study was based on a countrywide cross-sectional telephone-based survey conducted in 2022. The sample was designed to be representative of the five macroregions in Brazil and included 1,800 individuals from each of the regions. Telephone numbers, using a random digit dialing procedure, were proportionally selected for each direct distance dialing code in each region and then electronically validated (i.e., 900 cell and 900 landline phone numbers per region). Information on current commercial cigarette smoking (regardless of frequency/amount), as well as lifetime history of or current e-cigarette and hookah use (regardless of amount), were collected. Results: The prevalence of lifetime history of e-cigarette and hookah use was identical (7.3%; 95% CI: 6.0-8.9), whereas the prevalence of current commercial cigarette smoking was 12.2% (95% CI: 10.4-14.1). Young adults (18-24 years) had the highest prevalence of e-cigarette experimentation (19.7%; 95% CI: 15.1-17.0) and hookah experimentation (17%; 95% CI: 12.2-23.2). E-cigarette and hookah use was more common in the Central-West region and among those with a high level of education, whereas current commercial cigarette smoking was more common among those with a lower level of education. Individuals who used the three forms of nicotine delivery corresponded to 1.5% of the sample (nearly 2 million individuals based on the estimated size of the Brazilian adult population). Conclusions: Surveillance is essential for the monitoring and prevention of these new forms of nicotine consumption.
Keywords:
Electronic nicotine delivery systems; Smoking water pipes; Nicotine; Tobacco products; Adults.
RESUMO
Objetivo: Estimar a prevalência do consumo atual de cigarros industrializados, bem como da experimentação e uso atual de cigarro eletrônico e narguilé entre adultos (≥ 18 anos) no Brasil. Métodos: Este estudo baseou-se em uma inquérito telefônico nacional realizada em 2022. A amostra foi projetada para ser representativa das cinco macrorregiões do Brasil e foi composta por 1.800 indivíduos de cada uma das regiões. Por meio de um procedimento de discagem aleatória, os números de telefone foram selecionados proporcionalmente para cada código de discagem direta à distância em cada região e, em seguida, validados eletronicamente (isto é, 900 telefones celulares e 900 telefones fixos por região). Foram coletadas informações sobre o consumo atual de cigarros industrializados (independentemente da frequência/quantidade), bem como sobre a história de uso ou uso atual de cigarro eletrônico e narguilé (independentemente da quantidade). Resultados: As prevalências de história de uso de cigarro eletrônico e narguilé foram idênticas (7,3%; IC95%: 6,0-8,9), ao passo que a prevalência de consumo atual de cigarros industrializados foi de 12,2% (IC95%: 10,4-14,1). Adultos jovens (18-24 anos) apresentaram as maiores prevalências de experimentação de cigarro eletrônico (19,7%; IC95%: 15,1-17,0) e de narguilé (17%; IC95%: 12,2-23,2). O uso de cigarro eletrônico e narguilé foi mais comum na região Centro-Oeste e entre aqueles com maior grau de escolaridade, ao passo que o consumo atual de cigarros industrializados foi mais comum entre aqueles com menor grau de escolaridade. Os indivíduos que usavam as três formas de liberação de nicotina corresponderam a 1,5% da amostra (quase 2 milhões de indivíduos com base na estimativa do tamanho da população adulta brasileira). Conclusões: A vigilância é essencial para o monitoramento e prevenção dessas novas formas de consumo de nicotina.
Palavras-chave:
Sistemas eletrônicos de liberação de nicotina; Cachimbos de água; Nicotina; Produtos do tabaco; Adulto.
INTRODUÇÃO Nos últimos anos, o mundo vem enfrentando um paradoxo do tabagismo: por um lado, o consumo de cigarros industrializados diminuiu em virtude de políticas públicas de longo prazo. Por outro lado, estão em ascensão outras formas de tabagismo ou vaping, tais como o narguilé (também conhecido como cachimbo de água ou shisha) e o cigarro eletrônico.(1-3) Enquanto as instituições de saúde e governos vêm lutando contra todos os tipos de tabaco e os proibindo, a indústria encontra novos meios criativos de lucrar. O uso do cigarro eletrônico (também chamado de vaping em inglês) tem como principal alvo os jovens e, mais importante, é anunciado como sendo inofensivo e seguro.(1,4) Apesar dessa mensagem da indústria, sabe-se que a maioria dos novos dispositivos eletrônicos contém nicotina (cuja concentração é desconhecida em alguns casos), escondida por cores, sabores e uma variedade de outros disfarces para alcançar novos consumidores.(1,4-8)
O Brasil alcançou uma das quedas mais significativas da prevalência do tabagismo no mundo: uma queda de quase 70% entre adultos (com idade ≥ 20 anos) de 1990 a 2017 (de 35,3% para 11,3%).(2) Essa queda resultou de uma série de medidas regulatórias e políticas antitabaco implantadas no país.(9) No entanto, os novos sistemas de liberação de nicotina, já muito comuns nos EUA e em outros países,(1,10) estão na moda no Brasil, não só entre os adolescentes, mas também entre os adultos jovens.(11-13) Atualmente, os profissionais de saúde e pesquisadores devem perguntar aos pacientes não apenas a respeito do uso de cigarros industrializados, mas também a respeito de outros tipos de tabagismo/vaping, o tipo de dispositivo e a frequência de uso (ou número de sessões), pois é possível que os pacientes usem mais de um tipo de cigarro/sistema/dispositivo (“uso duplo”).(14,15)
De acordo com pesquisas realizadas no Brasil, as estimativas mais recentes da prevalência do uso experimental de sistemas eletrônicos de liberação de nicotina (ENDS, do inglês electronic nicotine delivery systems) entre adultos variaram de 1,6% em 2013(13,16) a 6,7% em 2019.(17) Uma pesquisa nacional realizada em 2013 revelou que a prevalência do uso de narguilé entre adultos que declararam fumar cigarros industrializados foi de 1,2%.(13,16) No entanto, essas pesquisas apresentaram diferenças no tocante às perguntas formuladas e às estratégias de entrevista (presencial ou por telefone) e amostragem. Um inquérito telefônico nacional (denominada Covitel) foi realizada em 2022 para estimar a carga de fatores de risco de doenças não transmissíveis no Brasil. O objetivo do presente estudo foi estimar a prevalência do consumo de cigarros industrializados, com foco na experimentação de cigarro eletrônico e narguilé em adultos (com idade ≥ 18 anos).
MÉTODOS O presente estudo baseou-se em um inquérito telefônico nacional realizada durante o primeiro trimestre de 2022 no Brasil. A pesquisa foi projetada de modo a representar a população com idade ≥ 18 anos no país como um todo e em suas cinco macrorregiões. O tamanho da amostra foi calculado com IC95% e margem de erro das estimativas de prevalência de até três pontos percentuais. O resultado foi uma amostra composta por 1.800 indivíduos por região (900 telefones celulares e 900 telefones fixos), num total de 9.000 pessoas.
Os números de telefone foram selecionados por meio de um procedimento de discagem aleatória proporcionalmente para cada código de discagem direta à distância em cada região (unidade primária de amostragem). Os números de telefone foram checados eletronicamente, e os números validados em cada região foram selecionados aleatoriamente para a entrevista. No caso de telefones celulares, a pessoa que atendesse ao telefone era entrevistada se preenchesse o critério de inclusão (idade ≥ 18 anos); quanto aos telefones fixos, foi feita uma lista dos moradores do domicílio com idade ≥ 18 anos antes da seleção aleatória de um morador.
Foi apresentado aos participantes um termo de consentimento livre e esclarecido, e aqueles que aceitaram participar da pesquisa deram consentimento verbal. Todas as entrevistas foram gravadas e armazenadas de forma segura. O Comitê de Ética em Pesquisa da Escola Superior de Educação Física da Universidade Federal de Pelotas aprovou o projeto de pesquisa (CAAE n. 53255321.9.0000.5313; protocolo de aprovação n. 5125635).
Um breve questionário foi aplicado aos que concordaram em participar. As três variáveis de desfecho basearam-se nas seguintes perguntas: (1) “Atualmente, você fuma (cigarros industrializados)?”; (2) “Você já usou cigarro eletrônico para fumar tabaco ou outros produtos?”; (3) “Você já usou narguilé para fumar tabaco ou outros produtos?” No caso do cigarro eletrônico e do narguilé, também perguntamos sobre a frequência de uso. Foram considerados usuários atuais aqueles que responderam “sim, diariamente” ou “sim, mas não diariamente”.
Outras variáveis coletadas para análise foram sexo (masculino/feminino); cor da pele segundo o(a) próprio(a) participante (branca, preta, parda ou outras); idade, em anos completos (faixas etárias de 18-24, 25-34, 35-59 e ≥ 60 anos); escolaridade, em anos completos de estudo (0-8, 9-11 e ≥ 12 anos) e macrorregião do país (Centro-Oeste, Nordeste, Norte, Sudeste e Sul).
Na análise estatística, primeiramente descrevemos a prevalência dos três desfechos de acordo com as características da amostra, apresentando a estimativa pontual e o IC95% correspondente. Na análise específica, calculamos a prevalência de cada desfecho por sexo e região. Finalmente, elaboramos um diagrama de Venn para compreender a coocorrência dos três desfechos. Todas as análises foram realizadas com o peso amostral calculado para representar a população brasileira, levando-se em consideração a região de residência, o sexo, a escolaridade e a faixa etária; o programa Stata, versão 14.0 (Stata Corp LP, College Station, TX, EUA) foi usado para as análises estatísticas.
RESULTADOS Avaliamos 9.004 indivíduos, uma amostra que, se extrapolada, corresponde a 134 milhões de brasileiros com idade ≥ 18 anos. A Tabela 1 descreve as características da amostra no que tange ao consumo de tabaco/nicotina. A prevalência de consumo atual de cigarros industrializados foi de 12,2%, a de história de uso de cigarro eletrônico foi de 7,3%, e a de história de uso de narguilé foi de 7,3%. Essas prevalências foram maiores entre os homens que entre as mulheres.
O consumo atual de cigarros industrializados foi mais prevalente entre os indivíduos na faixa etária de 25 a 34 anos, ao passo que o uso de cigarro eletrônico e narguilé alguma vez na vida foi mais comum entre adultos mais jovens (na faixa etária de 18 a 24 anos). O uso de cigarro eletrônico e narguilé alguma vez na vida foi menor nos indivíduos com menor grau de escolaridade (de 0 a 8 anos de escolaridade), ao passo que a prevalência de consumo atual de cigarros industrializados foi menor nos indivíduos com maior grau de escolaridade.
A Figura 1 mostra o consumo atual de cigarros industrializados e a história de uso de cigarro eletrônico e narguilé ao longo da vida em homens e mulheres no Brasil e nas cinco macrorregiões do país. Quase 20% dos homens nas regiões Centro-Oeste, Sudeste e Sul, bem como 14% das mulheres na região Sul relataram que atualmente fumavam cigarros. Tanto entre os homens como entre as mulheres, a história de uso de cigarro eletrônico (14,6% vs. 7,9%) e de narguilé (17,4% vs. 10,2%) foi maior na região Centro-Oeste.
As frequências categorizadas de uso de cigarro eletrônico e narguilé por macrorregião e sexo são apresentadas na Figura 2. Em relação ao cigarro eletrônico, 1,4% das mulheres na região Centro-Oeste relataram uso diário, assim como o fizeram 0,9% e 1,0% dos homens nas regiões Centro-Oeste e Norte, respectivamente. Entre os homens na região Sul, 5,7% relataram que usavam cigarros eletrônicos esporadicamente. Na região Sudeste, 1,1% dos homens relataram que fumavam narguilé diariamente, ao passo que na região Sul, 5,5% dos homens e 3,0% das mulheres relataram uso esporádico.
A Figura 3 apresenta um diagrama de Venn da coocorrência de uso de cigarros industrializados, cigarro eletrônico e narguilé. Um em cada cinco indivíduos era fumante atualmente ou havia usado cigarro eletrônico ou narguilé alguma vez na vida, num total de mais de 25 milhões de adultos no Brasil. Indivíduos que usavam os três produtos corresponderam a 1,5% da amostra (quase 2 milhões de indivíduos). Dos quase 20 milhões de indivíduos com história de uso de cigarro eletrônico ou narguilé, apenas um terço usava exclusivamente esses produtos.
DISCUSSÃO Os achados do estudo Covitel reforçam nossa preocupação com um possível aumento da experimentação e uso diário de cigarros eletrônicos e narguilés como um novo caminho em direção à dependência de nicotina. A literatura documenta que essas novas formas de vaping/tabagismo têm sido usadas principalmente por adolescentes, já que a indústria criou dispositivos especificamente para essa faixa etária (os cigarros eletrônicos têm aparência muito moderna, e o narguilé também tem um design atraente e pode ser compartilhado com os amigos). De acordo com os resultados do Covitel, também devemos nos preocupar com os adultos jovens na faixa etária de 18 a 24 anos, que tiveram a maior prevalência de experimentação de cigarro eletrônico/narguilé entre todos os adultos. A nicotina está presente na maioria desses dispositivos, e aproximadamente 2,5% dos participantes declararam que usavam cigarro eletrônico ou narguilé, embora não o fizessem diariamente. É possível que esses adultos jovens gradualmente se tornem dependentes de nicotina e precisem consumi-la cada vez mais. Em um estudo com adolescentes de 14 anos, a probabilidade de apresentar padrões de tabagismo pesado em seis meses de acompanhamento foi duas vezes maior naqueles que haviam experimentado cigarros eletrônicos.(18) Além disso, é preocupante a dúvida a respeito das concentrações de nicotina nos diferentes tipos de cigarros eletrônicos, pois variam significativamente e podem até ser maiores que as encontradas nos cigarros industrializados.(19)
Existem poucos estudos nacionais nos quais se investigou o uso de cigarros eletrônicos, narguilés ou ENDS em adultos no Brasil. A primeira pesquisa representativa a investigar o uso de cigarros eletrônicos e narguilés (bem como o consumo de cigarros industrializados) foi o III Brazilian Household Survey on Substance Use (BHSU-3, III Levantamento Nacional sobre Uso de Drogas pela População Brasileira), realizado em 2015 com pessoas na faixa etária de 12 a 65 anos.(12,13) A prevalência foi calculada por meio da seguinte pergunta: “Você usou cigarros eletrônicos nos últimos 12 meses?”; a mesma pergunta foi formulada e aplicada ao narguilé e aos cigarros industrializados. As prevalências de uso de cigarro eletrônico, narguilé e cigarros industrializados foram de 0,4%, 1,7% e 15,4%, respectivamente. Outras pesquisas nacionalmente representativas envolvendo adultos foram a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), realizada em 2013 e 2019,(13,16) e a Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (VIGITEL), realizada entre 2006 e 2021.(17) Os ENDS não foram investigados na PNS de 2013 (mas o uso de narguilé foi); na PNS de 2019 e em todas as pesquisas da VIGITEL, o desfecho foi ENDS, e a prevalência foi derivada da seguinte pergunta: “Você já usou dispositivos eletrônicos com nicotina líquida ou folhas de tabaco picadas (cigarros eletrônicos, cachimbos de água eletrônicos, cigarros aquecidos ou outros dispositivos eletrônicos) para fumar tabaco ou outros produtos?”; é importante mencionar que na PNS de 2019 e nas pesquisas da VIGITEL o termo “ENDS” abrangeu tanto os dispositivos eletrônicos quanto os de tabaco aquecido, e é possível que os entrevistados não tenham compreendido corretamente essa definição. Portanto, as pesquisas devem ser comparadas com cautela. A prevalência do uso de ENDS alguma vez na vida foi de 1,6% na população com idade ≥ 15 anos na PNS de 2019 e de 6,7% na VIGITEL de 2019 (em indivíduos com idade ≥ 18 anos)(13,17); em relação ao uso atual de narguilé, a PNS de 2019 perguntou a respeito do número de sessões independentemente da frequência (diária, semanal ou mensal), e a prevalência foi de 0,47%.(13)
Embora tanto o BHSU-3 como o Covitel tenham usado perguntas do tipo sim/não a respeito do uso de cigarros eletrônicos e narguilé, o BHSU-3 incluiu um período de tempo (nos últimos 12 meses), e o Covitel perguntou sobre a história de uso ao longo da vida, o que torna a comparação das prevalências pontuais um desafio. Em relação ao modo como os questionários foram aplicados, foi usada a abordagem presencial tanto no BHSU-3 como na PNS, ao passo que na VIGITEL e no Covitel foi usado o método de entrevista por telefone. Outra característica do Covitel foi a simplicidade das perguntas, o que pode ter evitado mal-entendidos, principalmente na população idosa, que pode ter dificuldade em compreender perguntas longas. Além disso, o questionário havia sido testado, e os entrevistados não tiveram dificuldade em responder às perguntas.
Outro ponto que merece destaque é a representatividade do Covitel: a amostra foi projetada de modo a representar cada uma das cinco macrorregiões brasileiras e o país como um todo. Os procedimentos de amostragem consideraram o número de telefones fixos e celulares cadastrados em cada região do país, e os números de telefone foram selecionados proporcionalmente por meio da inclusão de todos os códigos de discagem direta à distância na respectiva região. Nesse sentido, é possível que um viés de seleção tenha sido introduzido, pois a maioria dos números de telefones fixos e celulares é proveniente de grandes cidades e capitais. Embora a maioria das populações regionais esteja concentrada nesses locais, é comum que uma pessoa possua mais de uma linha de telefone celular. Portanto, a prevalência do desfecho “experimentar cigarros eletrônicos e narguilé” tende a ser superestimada. No entanto, para minimizar esse viés, recalculamos os pesos amostrais usando as projeções para a população brasileira com base no censo demográfico brasileiro de 2010, considerando as proporções esperadas de sexo, escolaridade e idade. Embora o objetivo desse procedimento seja corrigir a estimativa pontual do uso de cigarro eletrônico e narguilé alguma vez na vida, não podemos descartar completamente algum grau de viés de seleção.
As pesquisas supracitadas e a literatura internacional mostram que existe relação entre ser um adulto jovem com alto grau de escolaridade ou alta renda familiar e o uso de ENDS, cigarro eletrônico e narguilé. (12,13,16,17) Por outro lado, os fumantes de cigarros industrializados tendem a ser mais velhos e ter menor grau de escolaridade ou menor renda familiar. O Covitel revelou que a prevalência de experimentação de cigarros eletrônicos foi de quase 20% entre adultos jovens e de 1,6% entre indivíduos com idade ≥ 60 anos. O mesmo ocorreu com a experimentação de narguilé (17% vs. 1,3%).
Na análise das cinco macrorregiões brasileiras, o uso de cigarro eletrônico e narguilé foi mais comum na região Centro-Oeste, seguida pela região Sul. Resultados semelhantes foram observados em outros estudos realizados no país: a prevalência de experimentação de narguilé foi de 3,4% em ambas as regiões de acordo com a PNS de 2013, e a prevalência de experimentação de ENDS na região Centro-Oeste foi de 2,8% na PNS de 2019 e de 11,59% na VIGITEL de 2019.(13,16) Acreditamos que a experimentação de ENDS possa estar relacionada ao contrabando desses dispositivos, já que, de acordo com resolução de 2009 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, é proibido comercializar, importar e anunciar qualquer um desses produtos.(20) Infelizmente, as vendas on-line acontecem com muita facilidade, e esses produtos também podem ser encontrados em diversos lugares onde o tabaco é vendido no Brasil. No entanto, como o acesso gratuito à Internet não está disponível para todos e como esses dispositivos são bastante caros no Brasil, é possível que seja esse o motivo pelo qual seu uso esteja relacionado com maior grau de escolaridade e maior renda. A maior frequência de uso diário de cigarro eletrônico (1,4%) foi observada entre as mulheres da região Sul, a qual ocupa o segundo lugar no consumo de produtos do tabaco no país. A prevalência global de consumo de cigarros industrializados encontrada neste estudo está de acordo com o declínio observado na última década no Brasil: mais prevalente entre os homens e adultos na faixa etária de 25 a 69 anos, enquanto outras formas de tabagismo/vaping são mais comuns entre os mais jovens.
Embora seja difícil comparar estudos, a experimentação e o uso atual de cigarros eletrônicos e narguilé aparentemente estão aumentando no Brasil. Todos os esforços devem ser feitos para que seja possível comparar estudos internacionais e, principalmente, brasileiros, inclusive a padronização das perguntas formuladas. De acordo com o questionário básico da Global Adult Tobacco Survey,(21) perguntas sobre diferentes categorias de produtos de tabaco/nicotina devem ser feitas separadamente. Para cada categoria, devem constar perguntas tais como uso atual ou história de uso ao longo da vida, uso diário ou semanal, idade de início e cessação, entre outras; entretanto, ainda não se sabe a validade de uma única pergunta a respeito de muitos produtos. As especificidades locais exigirão adaptações; entretanto, em virtude do tamanho da Global Adult Tobacco Survey,(21) a tarefa pode ser bastante difícil, e apenas as perguntas principais devem ser selecionadas para que se possa comparar a prevalência de cada um dos principais produtos. A vigilância continuada no ambiente digital, nas fronteiras e nos pontos de venda, além de campanhas educativas na mídia, com foco principalmente em jovens e adolescentes, é essencial para prevenir a iniciação do tabagismo/vaping e contribuir para medidas regulatórias e políticas públicas para catalisar uma redução do uso de cigarros eletrônicos e narguilé no futuro.
Estudos de longo prazo para monitorar a curva de prevalência desses produtos e seus malefícios à saúde também são fundamentais para identificar possíveis impactos nas políticas de controle do tabaco.
AGRADECIMENTOS Os autores gostariam de agradecer aos participantes do estudo Covitel e a nossos parceiros, a saber, a associação Umane (articulação e financiamento), o Instituto Ibirapitanga (cofinanciamento) e a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (apoio ao desenvolvimento da pesquisa).
CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES AMBM, FCW, LMVS, PCBP, TAC, PAC e PCH: conceituação. LMVS, PCBP e TAC: aquisição de financiamento. AMBM, FCW, PAC e PCH: análise formal. AMBM, FCW, LMVS, PCBP, TAC, PAC e PCH: metodologia. LMVS, PCBP e TAC: administração do projeto. AMBM, FCW e PCH: supervisão. AMBM, FCW, PAC e PCH: visualização. AMBM, FCW, PAC e PCH: redação do manuscrito. AMBM, FCW, LMVS, PCBP, TAC, PAC e PCH: revisão e edição do manuscrito. Todos os autores aprovaram a versão final do manuscrito.
CONFLITOS DE INTERESSE Nenhum declarado.
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