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ISSN (on-line): 1806-3756

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Artigo Original

Acompanhamento de um ano de crianças hospitalizadas com COVID-19: estudo prospectivo de coorte

One-year follow-up of children hospitalized with COVID-19: a prospective cohort study

Caroline Jacoby Schmidt1, Giovana Morin Casassola2, Guilherme Hoff Affeldt1, Debora Sana Morais3, Letícia Krás Borges Alvarenga4, Cristina Miller5, Bruna Ziegler1

DOI: https://dx.doi.org/10.36416/1806-3756/e20230151

ABSTRACT

Objective: Currently, little is known about the long-term outcomes of COVID-19 in the pediatric population. The aim of this study was to investigate the long-term clinical outcomes of pediatric patients hospitalized with COVID-19. Methods: This was a prospective cohort study involving unvaccinated children and adolescents admitted to a tertiary hospital in southern Brazil with a COVID-19 diagnosis. Data were collected from electronic medical records for one year after the diagnosis. Results: A total of 66 children were included: the median age was 2.9 years; 63.6% were male; and 48.5% were under 2 years of age. Over 70% had at least one comorbidity prior to the COVID-19 diagnosis. During the one-year follow-up period, 59.1% of the children revisited the emergency department, 50% required readmission, and 15.2% died. Younger children with longer hospital stays were found to be at greater risk of readmission. Having cancer and impaired functionality were found to increase the risk of death within one year. Conclusions: Our findings indicate that most children hospitalized with COVID-19 have comorbidities. Younger age at admission and a longer hospital stay seem to be risk factors for readmission. In addition, the presence of cancer and impaired functionality are apparently associated with the poor outcome of death within the first year after the diagnosis of COVID-19.

Keywords: COVID-19; Pediatrics; Physical functional performance.

RESUMO

Objetivo: Atualmente, pouco se sabe sobre os desfechos em longo prazo da COVID-19 na população pediátrica. O objetivo deste estudo foi investigar os desfechos clínicos em longo prazo de pacientes pediátricos hospitalizados com COVID-19. Métodos: Trata-se de um estudo prospectivo de coorte com crianças e adolescentes não vacinados internados em um hospital terciário do Sul do Brasil com diagnóstico de COVID-19. Os dados referentes ao período de um ano após o diagnóstico foram extraídos dos prontuários médicos eletrônicos. Resultados: Foram incluídas 66 crianças: a mediana da idade foi de 2,9 anos; 63,6% eram do sexo masculino; 48,5% tinham menos de 2 anos de idade. Mais de 70% tinham pelo menos uma comorbidade antes do diagnóstico de COVID-19. Durante o período de um ano de acompanhamento, 59,1% das crianças retornaram ao pronto-socorro, 50% necessitaram de readmissão e 15,2% morreram. O risco de readmissão foi maior em crianças mais novas que permaneceram internadas durante mais tempo. Câncer e funcionalidade prejudicada aumentaram o risco de morte até um ano depois. Conclusões: Nossos achados indicam que a maioria das crianças hospitalizadas com COVID-19 apresenta comorbidades. Ser mais jovem no momento da internação hospitalar e permanecer internado durante mais tempo parecem ser fatores de risco de readmissão. Além disso, câncer e funcionalidade prejudicada são fatores aparentemente relacionados com o mau desfecho de óbito no primeiro ano após o diagnóstico de COVID-19.

Palavras-chave: COVID-19; Pediatria; Desempenho físico funcional.

 
INTRODUÇÃO
 
O novo coronavírus foi identificado pela primeira vez em novembro de 2019, na cidade de Wuhan, na China, após a ocorrência de uma série de casos de pneumonia não especificada na cidade. Desde então, a infecção pelo SARS-CoV-2, que pode levar à COVID-19, tem sido amplamente estudada em todo o mundo.(1)
 
Sabe-se que as taxas de contaminação são mais baixas e os sintomas da COVID-19 são mais leves na população pediátrica do que na população adulta.(2,3) Além disso, as taxas de hospitalização por COVID-19 são mais baixas na população pediátrica,(4) e a maioria das crianças hospitalizadas por COVID-19, em enfermarias ou UTIs, apresenta comorbidades preexistentes.(2,3)
 
Como a doença é mais leve e as taxas de hospitalização são mais baixas na população pediátrica, a mortalidade da COVID-19 também é significativamente menor nessa população.(5) Em um estudo multicêntrico, realizado em sua maior parte nos Estados Unidos, foram relatadas taxas de mortalidade de aproximadamente 1,8%.(6) Um estudo realizado com um banco de dados nacionais a respeito da COVID-19 mostrou que 7,6% das crianças hospitalizadas por COVID-19 morreram durante a internação hospitalar. (7) Em pacientes pediátricos, as taxas de mortalidade são mais altas naqueles com idade < 2 anos e naqueles com idade entre 12 e 19 anos, bem como naqueles com comorbidades preexistentes.(6,7)
 
Após a alta hospitalar, pacientes adultos e pediátricos ainda podem apresentar sintomas de COVID-19, um fenômeno conhecido como COVID longa ou sequelas pós-agudas da COVID-19.(8) Estudos mostram que, em crianças e adolescentes com COVID-19, necessitar de internação na UTI e ter mais comorbidades são fatores relacionados com apresentar mais sintomas em longo prazo; os sintomas mais comuns são fadiga, intolerância ao exercício e dispneia.(9,10) No entanto, poucos estudos abordaram os desfechos clínicos em longo prazo em crianças hospitalizadas com COVID-19.
 
Um estudo multicêntrico recente realizado nos Estados Unidos mostrou que 11% dos pacientes pediátricos hospitalizados com COVID-19 foram readmitidos no hospital até quatro meses depois da alta.(10) No entanto, poucos estudos até aqui avaliaram readmissões e mortalidade tardia em pacientes pediátricos hospitalizados com diagnóstico de COVID-19. Portanto, o objetivo deste estudo foi investigar os desfechos clínicos em longo prazo de pacientes pediátricos hospitalizados com COVID-19.
 
MÉTODOS
 
Trata-se de um estudo prospectivo de coorte com crianças não vacinadas com diagnóstico de COVID-19 e internadas no Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) entre março de 2020 e julho de 2021. Os pacientes foram acompanhados ao longo de um ano após o diagnóstico, por meio do monitoramento de seus prontuários médicos eletrônicos. Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do HCPA (Referência n. 57286822000005327), e o protocolo do estudo seguiu os preceitos éticos de pesquisa com seres humanos definidos na Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde.
 
Os dados sociodemográficos e os resultados dos exames laboratoriais foram extraídos dos prontuários médicos eletrônicos. Foram coletados dados a respeito da internação hospitalar, incluindo a data de internação, estado nutricional, prematuridade, sinais e sintomas da doença e presença de comorbidades, bem como os resultados de exames laboratoriais, tais como gasometria arterial e proteína C reativa. Durante a hospitalização, foi registrada a necessidade de suporte ventilatório — oxigenoterapia, uso de cânula nasal de alto fluxo e ventilação não invasiva/invasiva — e de internação na UTI pediátrica (UTIP). Após a alta hospitalar, o acompanhamento foi realizado por meio da avaliação dos prontuários médicos eletrônicos, e informações sobre atendimentos em pronto-socorro, internações hospitalares e óbitos foram registradas ao longo de um ano após o diagnóstico de COVID-19. Foram incluídos no estudo todos os pacientes internados na Pediatria do HCPA com diagnóstico de COVID-19, confirmado por RT-PCR positiva para SARS-CoV-2.(11,12)
 
Em cada uma das crianças incluídas no estudo, o nível de funcionalidade foi avaliado nas primeiras 24 h depois da internação hospitalar por meio da aplicação da Functional Status Scale (FSS, Escala de Estado Funcional), previamente traduzida e validada para uso na população pediátrica do Brasil.(13) A FSS avalia seis domínios de funcionalidade, e a pontuação total varia de 6 a 30 pontos; quanto maior a pontuação, pior a funcionalidade.(13-15) Os indivíduos foram estratificados em dois grupos para análise: aqueles com pontuação ≤ 9 na FSS (função preservada ou disfunção leve) e aqueles com pontuação ≥ 10 na FSS (disfunção moderada, grave ou muito grave).
 
As variáveis estão expressas em forma de valores absolutos e porcentagens ou medianas e intervalos interquartis. O teste de Shapiro-Wilk foi usado para avaliar a normalidade das variáveis contínuas. Foram realizadas análises de regressão de Cox univariada e multivariada; a variável dependente foi o óbito no primeiro ano após o diagnóstico. Também foram realizadas análises de regressão univariada e multivariada de Poisson com variância robusta; a variável dependente foi a readmissão hospitalar até um ano depois. Os dados foram armazenados no Microsoft Office Excel e analisados por meio do Predictive Analytics Software, versão 18.0 (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA). O nível de significância estatística adotado foi de 5% (p < 0,05).
 
RESULTADOS
 
O estudo incluiu 66 crianças não vacinadas com diagnóstico de COVID-19: 42 (63,6%) eram do sexo masculino; 32 (48,5%) tinham idade < 2 anos; a mediana da idade foi de 2,9 anos (IIQ: 0,4-9,5 anos). Os sintomas mais comuns foram febre (em 75,8%), tosse (em 50,0%), hipoxemia (em 40,9%), rinorreia (em 37,9%) e diarreia (em 25,8%). Das 66 crianças avaliadas, 48 (72,7%) apresentavam pelo menos uma comorbidade antes do diagnóstico de COVID-19. As comorbidades mais comuns foram câncer (em 21,2%) e doenças respiratórias (em 19,7%). Mais de 18% das crianças que compuseram a amostra nasceram prematuramente. A mediana do tempo de internação hospitalar foi de 10 dias (IIQ: 6,0-24,5 dias). O suporte ventilatório foi necessário em 27 pacientes (40,9%), e 23 pacientes (34,8%) foram internados na UTIP. A Tabela 1 mostra as características dos pacientes.
 

 
A prematuridade foi significativamente mais comum nos pacientes com idade < 2 anos (p = 0,008). Por outro lado, os níveis de proteína C reativa foram significativamente mais altos nos pacientes com idade > 2 anos (p = 0,000), os quais também apresentavam significativamente mais comorbidades (p = 0,004), principalmente câncer.
 
Após um ano de acompanhamento, 39 (59,1%) das crianças retornaram ao Pronto-Socorro do HCPA e 33 (50,0%) foram readmitidas no hospital. Das 33 readmissões, 4 (12,1%) ocorreram em virtude de nova infecção por SARS-CoV-2 e 27 (81,8%) ocorreram em virtude de complicações de alguma doença de base (comorbidade preexistente): câncer, em 36%; distúrbios metabólicos, em 18%; doenças neurológicas, em 18%; doenças respiratórias, em 15%; doenças cardiovasculares, em 9%; e distúrbios gastrointestinais, em 6%. Das 33 crianças que necessitaram de readmissão, apenas 6 (18,2%) estavam previamente saudáveis. Dessas 6 crianças, 4 foram readmitidas em virtude de problemas respiratórios (bronquiolite viral aguda nos quatro casos). Uma criança foi readmitida oito vezes durante o período de um ano de acompanhamento em virtude de sequelas e complicações respiratórias; a criança necessitou de ventilação mecânica e não conseguiu o desmame ventilatório repetidas vezes, o que levou à necessidade de traqueostomia durante a quarta internação hospitalar. A readmissão por motivos não respiratórios foi identificada em duas crianças: uma com infecção urinária e a outra com sintomas gastrointestinais.
 
Após um ano de acompanhamento, 10 (15,2%) das crianças haviam morrido. Todos os óbitos ocorreram em crianças que tinham pelo menos uma comorbidade preexistente na internação hospitalar inicial; a comorbidade mais comum foi o câncer, presente em 8 das 10 crianças. Dois óbitos (20%) ocorreram em virtude de síndrome do desconforto respiratório agudo decorrente da COVID-19, e sete (70%) ocorreram em virtude da progressão da doença de base: quatro por insuficiência ventilatória e três por choque séptico. Um óbito (10%) ocorreu em virtude de choque séptico após transplante de medula óssea. Cinco óbitos (50%) ocorreram durante a primeira hospitalização após o diagnóstico de COVID-19 (3 crianças tinham câncer, 1 tinha doença respiratória e 1 tinha distúrbio metabólico). Os outros cinco óbitos ocorreram durante as readmissões (4 crianças tinham câncer e 1 tinha distúrbio metabólico).
 
A Tabela 2 apresenta os resultados das análises de regressão linear univariada e multivariada cuja variável dependente foi a readmissão até um ano depois. Na análise multivariada, a variável dependente apresentou relação significativa com a idade (β = 0,589; p = 0,036) e o tempo de internação na primeira hospitalização (β = 1,004; p = 0,007).
 

 
A Tabela 3 apresenta os resultados das análises de regressão linear univariada e multivariada cuja variável dependente foi o óbito no primeiro ano após o diagnóstico. Na análise multivariada, a variável dependente apresentou relação significativa com a pontuação obtida na FSS (β = 1,235; p = 0,001) e o diagnóstico de câncer (β = 33,516; p < 0,001).
 

DISCUSSÃO
 
No presente estudo, avaliamos pacientes pediátricos hospitalizados com COVID-19 e observamos que mais de 70% apresentavam pelo menos uma comorbidade, sendo o câncer a mais comum. Durante o período de um ano de acompanhamento após o diagnóstico de COVID-19, aproximadamente 59% das crianças retornaram ao pronto-socorro pediátrico e 50% necessitaram de readmissão. Além disso, aproximadamente 15% das crianças morreram nesse período, e todas essas crianças tinham pelo menos uma comorbidade antes de receberem o diagnóstico de COVID-19. Demonstramos que o risco de readmissão durante o primeiro ano após o diagnóstico de COVID-19 foi maior nas crianças mais novas e naquelas com maior tempo de internação hospitalar; demonstramos também que o risco de morte até um ano depois do diagnóstico foi maior em crianças com câncer e naquelas com funcionalidade prejudicada.
 
Um estudo multicêntrico realizado nos Estados Unidos mostrou taxas de readmissão hospitalar inferiores às observadas no presente estudo. Maddux et al. observaram que 11% dos pacientes foram readmitidos 2-4 meses depois da alta inicial, e apenas um paciente estava saudável antes do diagnóstico de COVID-19. No estudo supracitado, as readmissões relacionaram-se com exacerbações das doenças de base.(10) Em nosso estudo, a maioria dos pacientes que necessitaram de readmissão apresentava pelo menos uma comorbidade preexistente. Portanto, podemos supor que as readmissões de nossos pacientes também estiveram relacionadas com exacerbações das doenças de base. Esses dados corroboram achados anteriores da literatura.
 
No presente estudo, o risco de readmissão até um ano depois do diagnóstico de COVID-19 foi maior nos pacientes mais jovens. Acreditamos que se trate de um achado novo. No entanto, sabe-se que a doença é mais grave em lactentes, e ter menos de um mês de idade é considerado um importante fator de risco de internação na UTIP.(5,16) Ter menos de 2 anos de idade também foi apontado como fator de risco de morte por COVID-19.(7,17,18)
 
Os resultados de nossas análises também indicam que um maior tempo de internação após a admissão por COVID-19 aumenta o risco de uma segunda hospitalização até um ano depois da primeira. A mediana do tempo de internação hospitalar em nosso estudo foi de 10 dias, consideravelmente maior que os 3-6 dias relatados em estudos anteriores.(10,17,19,20) Essa diferença pode estar relacionada à heterogeneidade dos estudos e aos diferentes níveis de complexidade das crianças incluídas nas amostras estudadas.
 
Até o momento, houve poucos estudos de acompanhamento e mortalidade na população pediátrica com COVID-19.(6) Em nossa amostra, a taxa de mortalidade em um ano foi de 15,2%, consideravelmente superior às taxas relatadas em outros estudos. Em um estudo multicêntrico no qual foram avaliadas crianças hospitalizadas com COVID-19, Bhalala et al. demonstraram uma taxa de mortalidade de 0,3% 28 dias depois da alta.(6) No entanto, a mediana da idade no estudo supracitado foi maior do que no nosso e as taxas de comorbidades preexistentes foram menores, o que pode ter influenciado as diferenças entre os resultados dos dois estudos. É importante observar que nenhum de nossos pacientes fora imunizado contra a COVID-19 e apenas dois morreram de síndrome do desconforto respiratório agudo decorrente da COVID-19; todos os demais óbitos relacionaram-se com exacerbação da doença de base, possivelmente relacionada com sequelas da COVID-19.
 
Aproximadamente 7,5% das crianças que compuseram nossa amostra morreram durante a hospitalização, desfecho semelhante ao relatado por Oliveira et al.(7) No entanto, estudos realizados em países de alta renda relataram taxas de mortalidade mais baixas.(5,6,11,19) Em uma revisão sistemática de uma amostra coletiva composta por aproximadamente 3.800 crianças que morreram de COVID-19, Kitano et al. demonstraram que as taxas de mortalidade foram mais altas em países de baixa e média renda do que em países de alta renda; mais de 90% dos óbitos por COVID-19 na população pediátrica ocorreram nos países de baixa e média renda.(18) É importante observar que o hospital onde foi realizado o presente estudo é um centro de referência no tratamento de doenças crônicas de alta complexidade no Sul do Brasil e regularmente recebe pacientes em estado crítico de saúde, fato que poderia explicar a taxa de mortalidade mais alta em nossa amostra.
 
Em nossa amostra, o risco de morte até um ano depois do diagnóstico de COVID-19 foi maior nas crianças com câncer. Estudos anteriores mostraram que as taxas de mortalidade da COVID-19 são mais altas em crianças com câncer do que em crianças saudáveis ou mesmo em crianças com outras comorbidades. (21-24) No entanto, pelo que sabemos, ainda não houve estudos nos quais se avaliou a relação entre câncer e morte até um ano depois do diagnóstico de COVID-19 em pacientes pediátricos. Embora o risco de apresentar formas mais graves de COVID-19 seja maior em pacientes com câncer,(22) Węcławek-Tompol et al. observaram que crianças com câncer têm 97,3% de probabilidade de sobreviver até 100 dias depois do diagnóstico de COVID-19.(25)
 
No presente estudo, a funcionalidade prejudicada no momento da internação hospitalar também foi identificada como fator de risco de morte até um ano depois do diagnóstico de COVID-19. Casassola et al. demonstraram que mais da metade das crianças hospitalizadas com COVID-19 apresentam funcionalidade prejudicada, relacionada a um maior tempo de internação hospitalar e uma maior probabilidade de necessitar de suporte ventilatório. (26) Esses achados sugerem que pacientes pediátricos com funcionalidade reduzida tendem a apresentar formas mais graves de COVID-19 e que as taxas de mortalidade em um ano seriam, portanto, mais altas nesses pacientes, corroborando assim nossos achados.
 
O estudo realizado por Maddux et al.(10) também ressaltou a importância da avaliação da funcionalidade de pacientes pediátricos com COVID-19 durante a hospitalização. Os autores observaram que 9% de seus pacientes apresentaram deterioração da funcionalidade até o fim da internação hospitalar e que 3% obtiveram pontuação ainda pior na FSS no fim do período de acompanhamento, o que demonstra que a funcionalidade dos pacientes pediátricos pode mudar até mesmo quatro meses depois da alta.(10) Com base nesses achados, podemos supor que os pacientes pediátricos continuarão a apresentar sequelas da COVID-19 em longo prazo, resultando em perda de funcionalidade, possivelmente relacionada com óbito até um ano depois do diagnóstico.
 
Finalmente, mais de 70% dos pacientes que compuseram nossa amostra tinham pelo menos uma comorbidade preexistente e todos os pacientes que morreram durante o período de um ano de acompanhamento estavam nesse grupo. Dados semelhantes podem ser encontrados na literatura.(17,26) A maioria das crianças hospitalizadas com COVID-19 tem comorbidades preexistentes.(7,10,11) A presença de comorbidades é considerada um fator de risco de COVID-19 mais grave e desfechos desfavoráveis, como o óbito.(2,5,7,10,17)
 
Nosso estudo tem algumas limitações. Os dados foram extraídos de prontuários médicos eletrônicos locais, o que impossibilitou o monitoramento das readmissões em outros serviços de saúde. Além disso, nossa amostra foi heterogênea, incluindo pacientes com diversas comorbidades preexistentes, o que pode ter influenciado as taxas de mortalidade. Ainda, como foram incluídos apenas casos graves (aqueles que necessitaram de hospitalização), nossos achados não podem ser extrapolados para a população pediátrica em geral. Finalmente, trata-se de um estudo realizado em um único centro, com uma amostra pequena. Apesar dessas limitações, nosso estudo é, até o momento, o que apresenta o maior período de acompanhamento de pacientes pediátricos com COVID-19.
 
Reiteramos que a maioria das crianças com diagnóstico de COVID-19 apresentava comorbidades, uma característica observada em todos os casos cujo desfecho foi fatal. Ser mais jovem e permanecer hospitalizado durante mais tempo são fatores que aparentemente estão relacionados com um maior risco de readmissão. Câncer e funcionalidade prejudicada foram fatores que se relacionaram com um maior risco de morte no primeiro ano após o diagnóstico de COVID-19. Atualmente, pouco se sabe sobre as consequências em longo prazo da COVID-19 na população pediátrica, o que ressalta a importância de nossos resultados. Nosso estudo acrescenta à literatura alguns fatores de risco importantes para monitorar e enfatiza a importância do acompanhamento em longo prazo, especialmente em pacientes pediátricos que necessitem de hospitalização por COVID-19.
 
AGRADECIMENTOS
 
Os autores gostariam de agradecer a todos os colaboradores e participantes do estudo.
 
CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES
 
CJS, GMC, GHA, DSM, LKBA, CM e BZ: pesquisa bibliográfica. CJS, GMC, GHA e BZ: coleta de dados. CJS, GMC, DSM, LKBA, CM e BZ: desenho do estudo. CJS, GMC e BZ: análise dos dados. CJS, GMC, GHA, DSM, LKBA, CM e BZ: preparação do manuscrito. DSM, LKBA, CM e BZ: revisão do manuscrito. Todos os autores leram e aprovaram a versão final do manuscrito.
 
CONFLITOS DE INTERESSE
 
Nenhum declarado.
 
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