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ISSN (on-line): 1806-3756

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Cartas ao Editor

Manejo e prognóstico de derrames pleurais malignos tratados por meio de cateteres pleurais de longa permanência

Management and prognosis of malignant pleural effusions managed with indwelling pleural catheters

M Martins1, M Serino1, F Viana-Machado1, H Novais-Bastos1,2

DOI: https://dx.doi.org/10.36416/1806-3756/e20230225

 
AO EDITOR,
 
O derrame pleural maligno (DPM) afeta 15% dos pacientes oncológicos, e a incidência de DPM provavelmente aumentará à medida que a incidência global de câncer aumenta e a sobrevida global melhora.(1,2) A maioria dos pacientes com DPM é sintomática, e o sintoma mais comum é a dispneia. Como o DPM representa doença avançada ou metastática, a sobrevida geralmente é baixa: a mediana varia de 3 a 12 meses, dependendo dos fatores subjacentes do paciente e dos fatores relacionados ao tumor.(1) Foi recentemente relatada uma sobrevida global de 3 meses em pacientes com DPM, independentemente da expansibilidade pulmonar.(3) Os cateteres pleurais de longa permanência (CPLP) são a principal modalidade de tratamento em pacientes com DPM que apresentam encarceramento pulmonar e recorrência sintomática. Múltiplos estudos demonstram que os CPLP são eficazes para paliar os sintomas.(4)
 
Realizamos uma análise retrospectiva de uma coorte de pacientes adultos com DPM tratados por meio de CPLP entre agosto de 2014 e agosto de 2022 em um hospital universitário. O objetivo principal da análise foi validar o escore PROMISE em pacientes com DPM submetidos a drenagem por meio de CPLP. O escore PROMISE foi elaborado e validado por Psallidas et al.(5) e é o primeiro escore prognóstico para DPM a empregar marcadores biológicos e parâmetros clínicos em conjunto para estimar a mortalidade em 3 meses. Foi atribuída aos pacientes uma taxa de mortalidade em 3 meses baseada no escore PROMISE, calculado no momento da colocação dos CPLP. Os pacientes foram divididos em quatro grupos: grupo 1 (escore PROMISE = 0-20): taxa de mortalidade < 25%; grupo 2 (escore PROMISE = 21-27): taxa de mortalidade = 25-50%; grupo 3 (escore PROMISE = 28-35): taxa de mortalidade = 50-75%; grupo 4 (escore PROMISE > 35): taxa de mortalidade > 75%. O escore PROMISE inclui parâmetros como quimioterapia prévia, radioterapia prévia, hemoglobina, contagem sérica de leucócitos, proteína C reativa, performance status (estado de desempenho) na escala do Eastern Cooperative Oncology Group (ECOG), tipo de câncer e inibidor tecidual da metaloproteinase da matriz 1 (um biomarcador proteico opcional, usado para calcular o escore PROMISE biológico).
 
As curvas de sobrevida foram geradas pelo método de Kaplan-Meier e comparadas pelo teste de log-rank. O teste t para amostras independentes foi usado para avaliar diferenças entre variáveis contínuas com distribuição normal, e testes U de Mann-Whitney foram usados para avaliar diferenças entre variáveis contínuas com distribuição assimétrica. Os dados a respeito dos pacientes foram totalmente anonimizados, e o protocolo do estudo respeitou os princípios éticos da Declaração de Helsinque. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Hospitalar Universitário de São João, na cidade do Porto, em Portugal.
 
Dos 45 pacientes incluídos na presente análise, 68,9% eram do sexo masculino (n = 31). A mediana da idade foi de 68 anos (IIQ: 60,5-74,5), e a maioria (55,5%) dos pacientes era fumante ou ex-fumante (n = 25). Os DPM estavam localizados principalmente no lado direito (em 53,3% dos pacientes; n = 24), e as etiologias mais comuns foram adenocarcinoma pulmonar (em 48,9% dos pacientes; n = 22), câncer de mama (em 11,1%; n = 5) e adenocarcinoma pancreático (em 8,9%; n = 4). As indicações para colocação de CPLP incluíram encarceramento pulmonar (em 44,4% dos pacientes; n = 20) e falha da pleurodese com suspensão de talco em solução salina (em 31,1%; n = 14). A maioria (73,3%) dos pacientes estava hospitalizada no momento da colocação dos CPLP (n = 33). A toracocentese fora realizada numa mediana de 59 dias antes da colocação dos CPLP (IIQ: 35,0-109,0), e houve complicações imediatas decorrentes do procedimento (enfisema subcutâneo e hemotórax) em dois casos. Houve infecção pleural em 22,2% dos pacientes (n = 10). Destes, 40% (n = 4) foram identificados até uma semana depois da colocação dos CPLP. A quimioterapia não se correlacionou com um maior risco de complicações (p = 0,177), isto é, de infecção pleural. Em conformidade com um protocolo estabelecido em agosto de 2016, substituímos os cateteres Tenckhoff por cateteres Rocket® (Rocket Medical plc., Watford, Reino Unido), e a frequência de complicações decorrentes dos CPLP diminuiu. Os CPLP foram retirados precocemente em 24,4% dos pacientes (n = 11), em virtude de infecção pleural (em 36,4%; n = 4), pleurodese espontânea (em 36,4%; n = 4) ou acidentalmente (em 27,3%; n = 3).
 
O escore LENT (do inglês lactate dehydrogenase, ECOG performance status, neutrophil-to-lymphocyte ratio, and tumor type, isto é, desidrogenase lática no líquido pleural, estado de desempenho na escala do ECOG, relação neutrófilos/linfócitos e tipo de tumor) é, segundo se relata, uma ferramenta acessível e fácil de usar para prever de modo bastante preciso a sobrevida de pacientes com DPM. O escore LENT pode ser útil para paliar os sintomas de doenças malignas avançadas, por meio da modificação das estratégias de tratamento.(6) Segundo Psallidas et al.,(5) o escore PROMISE é o primeiro modelo prognóstico validado prospectivamente para DPM a empregar parâmetros biológicos e clínicos em conjunto para estimar com precisão a mortalidade em 3 meses. É um escore prognóstico robusto e clinicamente relevante que pode ser aplicado imediatamente, fornecer informações importantes a respeito do prognóstico dos pacientes e orientar a seleção de estratégias apropriadas de manejo. Em um estudo recente no qual foram comparados os escores LENT e PROMISE, este último foi considerado mais preciso para prever a sobrevida.(7)
 
Aproximadamente 30% dos 45 pacientes incluídos na presente análise (n = 13) estavam recebendo cuidados paliativos no momento da colocação dos CPLP. Dezesseis pacientes foram posteriormente encaminhados para alívio dos sintomas. A mediana do tempo de espera até a primeira consulta de cuidados paliativos foi de 53,5 dias (IIQ: 17,5-108,0). Os pacientes foram divididos em quatro grupos com base no escore PROMISE (não incluindo o inibidor tecidual da metaloproteinase da matriz 1): grupo 1 (n = 21); grupo 2 (n = 18); grupo 3 (n = 6); grupo 4 (n = 0). Metade (51,1%) dos pacientes apresentou estado de desempenho > 2 na escala do ECOG (n = 23). A mediana da sobrevida foi de 63,0 dias (IIQ: 22,25-190,5), com diferença significativa entre os grupos (p < 0,001): 87,5 dias (IIQ: 20,5-184,5) no grupo 1; 76 dias (IIQ: 30,5-268,0) no grupo 2; 22,5 dias (IIQ: 3,5-40,5) no grupo 3 (Figura 1). Não houve diferença significativa entre os grupos quanto à frequência de infecção pleural (p = 0,171).
 

 
Embora possam ser uma opção adequada de tratamento de primeira linha em pacientes com DPM, os CPLP não estão isentos de efeitos adversos como infecção pleural, que, em nossa população, não se correlacionou com quimioterapia prévia. O escore PROMISE foi considerado uma ferramenta valiosa para prever a mortalidade em 3 meses em pacientes com DPM tratados por meio de CPLP. O escore PROMISE permite que os clínicos reavaliem o prognóstico nesse subconjunto de pacientes e pode ter implicações clínicas quanto à possibilidade de prosseguir ou não com a colocação de CPLP, mesmo em pacientes com DPM sem encarceramento pulmonar. Além disso, é importante reconhecer que a colocação de CPLP é uma opção de tratamento que deve ser cuidadosamente discutida em pacientes frágeis. A aplicação do escore PROMISE antes da colocação de CPLP pode identificar aqueles que têm maior probabilidade de se beneficiar de medidas de suporte apenas, em vez de opções de tratamento definitivo como a colocação de CPLP, que não é uma estratégia terapêutica isenta de riscos. Assim, o escore PROMISE é importante para a tomada de decisão a respeito do uso de CPLP nessa população. Não recomendamos a colocação de CPLP em pacientes dos grupos 3 e 4 e recomendamos uma avaliação personalizada em pacientes dos grupos 1 e 2. Algumas das limitações da presente análise são seu caráter retrospectivo e a amostra limitada.
 
CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES
 
MM: conceituação; metodologia; investigação; curadoria dos dados; software; recursos; análise formal; visualização; redação, revisão e edição do manuscrito. MS e FVM: metodologia; investigação; curadoria dos dados; recursos; análise formal; redação, revisão e edição do manuscrito. HNB: conceituação; metodologia; investigação; curadoria dos dados; software; recursos; análise formal; visualização; redação, revisão e edição do manuscrito; supervisão. Todos os autores leram e aprovaram o manuscrito final.
 
CONFLITOS DE INTERESSE
 
Nenhum declarado.
 
REFERÊNCIAS
 
1.Bedawi EO, Guinde J, Rahman NM, Astoul P. Advances in pleural infection and malignancy. Eur Respir Rev. 2021;30(159):200002. https://doi.org/10.1183/16000617.0002-2020
2. Bibby AC, Dorn P, Psallidas I, Porcel JM, Janssen J, Froudarakis M, et al. ERS/EACTS statement on the management of malignant pleural effusions. Eur Respir J. 2018;52(1):1800349. https://doi.org/10.1183/13993003.00349-2018
3. Trovisco R, Freitas C, Serino M, Ferreira P, Martins B, Coelho D, et al. Predictors of lung entrapment in malignant pleural effusion [published online ahead of print, 2022 Sep 27]. Pulmonology. 2022;S2531-0437(22)00199-4. https://doi.org/10.1016/j.pulmoe.2022.08.001
4. Kulandaisamy PC, Kulandaisamy S, Kramer D, Mcgrath C. Malignant Pleural Effusions-A Review of Current Guidelines and Practices. J Clin Med. 2021;10(23):5535. https://doi.org/10.3390/jcm10235535
5. Psallidas I, Kanellakis NI, Gerry S, Thézénas ML, Charles PD, Samsonova A, et al. Development and validation of response markers to predict survival and pleurodesis success in patients with malignant pleural effusion (PROMISE): a multicohort analysis. Lancet Oncol. 2018;19(7):930-939. https://doi.org/10.1016/S1470-2045(18)30294-8
6.  Akram MJ, Khalid U, Ashraf MB, Bakar MA, Butt FM, Khan F. Predicting the survival in patients with malignant pleural effusion undergoing indwelling pleural catheter insertion. Ann Thorac Med. 2020;15(4):223-229. https://doi.org/10.4103/atm.ATM_289_20
7. Ermin S, Özdogan Y, Batum Ö, Yilmaz U. The role of LENT and PROMISE scores in predicting survival in malignant pleural effusion. Lung India. 2022;39(4):325-330. https://doi.org/10.4103/lungindia.lungindia_633_21
 

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