INTRODUÇÃO A pneumonia infantil é um problema de saúde pública em virtude de sua alta incidência e potencial gravidade. É uma das três causas mais comuns de morte em crianças com menos de 5 anos de idade. Essa infecção pulmonar aguda, causada principalmente por vírus e bactérias, requer a compreensão de suas manifestações, tratamento e medidas preventivas. Este artigo tem como objetivo revisar os critérios para diagnóstico, hospitalização e abordagem clínica, com foco na pneumonia bacteriana e complicações comuns.(1) Os sintomas incluem febre, tosse, taquipneia, retrações torácicas, crepitações e dor torácica. É difícil distinguir clinicamente entre etiologias bacterianas e virais. Deve-se considerar pneumonia bacteriana em crianças que apresentem febre persistente ou recorrente ≥ 38,5°C nas últimas 48 h com recessão da parede torácica e taquipneia.(2) Diferenciar pneumonia de condições como asma e bronquiolite aguda é frequentemente um desafio em lactentes e pré-escolares, sendo a presença de sibilância um indicador diferencial fundamental. A sibilância não é frequentemente associada à pneumonia bacteriana. São também agentes etiológicos comuns o Streptococcus pneumoniae e o Staphylococcus aureus.(1)
MARCADORES DIAGNÓSTICOS E DE GRAVIDADE O diagnóstico de pneumonia adquirida na comunidade (PAC) pode ser baseado na apresentação clínica. Portanto, a radiografia de tórax não deve ser realizada na rotina ambulatorial. A radiografia é frequentemente indicada na presença de marcadores de gravidade, necessidade de hospitalização ou falta de melhora após 48-72 h de tratamento.(1) Hemoculturas são recomendadas para pacientes com PAC hospitalizados, para identificação do agente etiológico, juntamente com swabs para detecção viral. Além disso, testes inespecíficos como proteína C reativa, procalcitonina e contagem de leucócitos podem sugerir infecção bacteriana quando os valores são extremamente altos, mas têm valor limitado na presunção da etiologia da PAC. Por fim, a reação em cadeia da polimerase também pode ser utilizada no diagnóstico de agentes etiológicos.(2)
Incapacidade de beber/comer, vômitos incoercíveis, convulsões, cianose central, letargia e saturação de oxigênio < 90% são preditores de morte e devem ser utilizados como indicadores de hospitalização. Derrames pleurais moderados e grandes e infiltrados multilobares também estão associados à doença grave.
RECOMENDAÇÃO DE MANEJO Todas as crianças necessitam de oximetria de pulso. Na atenção secundária, crianças com saturação de oxigênio < 92% em ar ambiente necessitam de oxigênio suplementar para manter saturação > 94%. O oxigênio pode ser administrado por meio de cânulas nasais. Pode ser necessária a reposição intravenosa de fluidos se a hidratação ficar comprometida. Ensaios clínicos não demonstraram nenhum benefício da fisioterapia.(3)
Os antibióticos orais são seguros e eficazes para crianças com PAC. O uso de antibióticos intravenosos em crianças é recomendado se as crianças não forem capazes de tolerar fluidos orais (devido a vômitos) ou apresentarem sinais de septicemia ou pneumonia complicada.
A amoxicilina é a terapia de primeira linha para pacientes ambulatoriais. Macrolídeos podem ser adicionados em qualquer idade se não houver resposta à terapia de primeira linha. Os macrolídeos devem ser utilizados se houver suspeita de Mycoplasma pneumoniae ou Chlamydia pneumoniae em apresentações atípicas ou se a doença for grave; neste caso, é sempre necessária uma associação com outro agente. A antibioticoterapia intravenosa de primeira linha é a ampicilina ou a penicilina G. A ampicilina-sulbactam ou a ceftriaxona podem ser recomendadas para pneumonia grave (Quadro 1). A vancomicina também pode ser utilizada em casos de suspeita de Staphylococcus aureus resistente à meticilina.
A pneumonia complicada é uma doença grave caracterizada por complicações locais (derrame parapneumônico, empiema, pneumonia necrosante ou abscesso pulmonar) ou complicações sistêmicas (bacteremia). Deve-se suspeitar de PAC complicada em qualquer criança com pneumonia que não responda ao tratamento antibiótico adequado dentro de 48-72 h. O exame de imagem inicial é a radiografia de tórax, e a ultrassonografia também pode ser utilizada para identificar líquido pleural.
A pneumonia complicada deve ser tratada com um curso prolongado de antibióticos intravenosos e, então, antibióticos orais.(4) A escolha inicial do antibiótico é orientada pelo conhecimento microbiológico local e por posteriores culturas positivas, incluindo culturas de líquido pleural.
A maioria dos pacientes pode ser tratada com drenagem pleural. Informações de imagem e drenagem do espaço pleural devem orientar a decisão sobre a administração de agentes fibrinolíticos intrapleurais. Uma cirurgia mais extensa (videotoracoscopia) pode ser indicada em empiemas loculados.(5)
PREVENÇÃO E PROGNÓSTICO As diretrizes atuais de tratamento sugerem várias intervenções para a prevenção da PAC. Essas intervenções incluem lavagem frequente das mãos, evitar a fumaça do tabaco, promoção da amamentação, redução da exposição a outras crianças e imunização. As vacinas pneumocócicas conjugadas foram aprovadas para a prevenção de doença pneumocócica invasiva em crianças e são altamente eficazes na redução da doença contra os sorotipos pneumocócicos incluídos.
Várias novas intervenções para a prevenção do vírus sincicial respiratório como anticorpos monoclonais de longa duração e vacinas maternas têm potencialmente um grande impacto na epidemiologia da pneumonia. (6) As crianças também devem ser vacinadas contra outras potenciais causas de pneumonia, incluindo influenza, SARS-CoV-2, Haemophilus influenzae tipo B, coqueluche, varicela e sarampo.(3)
A evolução clínica da PAC pode ser longa, especialmente em pacientes com pneumonia necrosante, mas a recuperação completa é o desfecho habitual.(4,5)
APOIO FINANCEIRO Leonardo A. Pinto é bolsista de produtividade em pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq; Processo n. 309074/2022-3).
CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES LMP, MAULC, GABS e LGBB: pesquisa bibliográfica e redação do manuscrito. MCC e LAP: redação, revisão e edição do manuscrito. Todos os autores leram e aprovaram a versão final do manuscrito.
CONFLITOS DE INTERESSE Nenhum declarado.
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