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ISSN (on-line): 1806-3756

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Artigo Original

Desfechos clínicos antes e depois da videofluoroscopia da deglutição em crianças com 24 meses de idade ou menos

Clinical outcomes before and after videofluoroscopic swallow study in children 24 months of age or younger

Fabiola Luciane Barth1, Deborah Salle Levy1,2, Marisa Gasparin1, Cláudia Schweiger1,3, Denise Manica1,3, Camila Dalbosco Gadenz4, Paulo José Cauduro Maróstica1,5

DOI: https://dx.doi.org/10.36416/1806-3756/e20230290

ABSTRACT

Objective: To evaluate the combined impact of videofluoroscopic swallow study (VFSS) and therapeutic feeding and swallowing interventions on clinical outcomes in children with oropharyngeal dysphagia (OPD). Methods: This was an uncontrolled longitudinal analytical study in which OPD patients were evaluated before and after VFSS. Children = 24 months of age diagnosed with OPD in a clinical setting and undergoing VFSS for investigation and management of OPD were included in the study. The study participants received therapeutic feeding and swallowing interventions after having undergone VFSS, being followed at an outpatient clinic for pediatric dysphagia in order to monitor feeding and swallowing difficulties. Respiratory and feeding outcomes were compared before and after VFSS. Results: Penetration/aspiration events were observed in 61% of the VFSSs (n = 72), and therapeutic feeding and swallowing interventions were recommended for 97% of the study participants. After the VFSS, there was a reduction in the odds of receiving antibiotic therapy (OR = 0.007) and in the duration of antibiotic therapy (p = 0.014), as well as in the odds of being admitted to hospital (p = 0.024) and in the length of hospital stay (p = 0.025). A combination of oral and enteral feeding became more common than oral or enteral feeding alone (p = 0.002). Conclusions: A high proportion of participants exhibited penetration/aspiration on VFSS. Therapeutic feeding and swallowing interventions following a VFSS appear to be associated with reduced respiratory morbidity in this population.

Keywords: Fluoroscopy; Deglutition disorders; Respiratory tract diseases; Pneumonia, aspiration; Nutritional support.

RESUMO

Objetivo: Avaliar o impacto conjunto da videofluoroscopia da deglutição (VFD) e intervenções terapêuticas de alimentação e deglutição nos desfechos clínicos em crianças com disfagia orofaríngea (DOF). Métodos: Trata-se de um estudo analítico longitudinal não controlado em que pacientes com DOF foram avaliados antes e depois da VFD. Foram incluídas no estudo crianças com idade ≤ 24 meses e diagnóstico clínico de DOF, submetidas à VFD para a investigação e manejo da DOF. Os participantes do estudo receberam intervenções terapêuticas de alimentação e deglutição após terem sido submetidos à VFD, sendo então acompanhados em um ambulatório de disfagia pediátrica para o monitoramento das dificuldades de alimentação e deglutição. Os desfechos respiratórios e alimentares foram comparados antes e depois da VFD. Resultados: Eventos de penetração/aspiração foram observados em 61% das VFD (n = 72), e intervenções terapêuticas de alimentação e deglutição foram recomendadas a 97% dos participantes do estudo. Após a VFD, houve uma redução das chances de receber antibioticoterapia (OR = 0,007) e da duração da antibioticoterapia (p = 0,014), bem como das chances de internação hospitalar (p = 0,024) e do tempo de internação (p = 0,025). A alimentação por via oral e enteral em conjunto tornou-se mais comum do que a alimentação exclusivamente por via oral ou enteral (p = 0,002). Conclusões: Houve alta proporção de crianças que apresentaram penetração/aspiração na VFD. As intervenções terapêuticas de alimentação e deglutição após a VFD parecem estar associadas à redução da morbidade respiratória nessa população.

Palavras-chave: Fluoroscopia; Transtornos de deglutição; Doenças respiratórias; Pneumonia aspirativa; Apoio nutricional.

 
INTRODUÇÃO
 
A deglutição e a alimentação exigem a coordenação ativa do mecanismo orofaríngeo, estruturas craniofaciais, trato gastrointestinal, sistema cardiopulmonar, sistema musculoesquelético, sistema nervoso central e sistema nervoso periférico.(1) Disfagia orofaríngea (DOF) refere-se ao comprometimento da mecânica da deglutição oral, faríngea ou orofaríngea.(2)
 
A taxa de diagnóstico de DOF tem aumentado em decorrência da melhoria das técnicas de diagnóstico e do tratamento de crianças cujas condições de saúde são complexas.(2-4) A DOF está relacionada a um maior risco de aspiração (aguda ou recorrente) de secreções, líquidos ou partículas alimentares(5) e é uma causa grave de morbidade e mortalidade em crianças (além de ser uma causa de morbidade nos cuidadores).(1,6-8) Algumas crianças com DOF continuam a apresentar infecções do trato respiratório inferior e outras doenças respiratórias mesmo após o tratamento. Pacientes com infecções recorrentes do trato respiratório inferior sem outros sinais evidentes de disfunção da deglutição devem ser investigados quanto à presença de disfagia.(7,9)
 
Já se estabeleceu uma relação entre o comprometimento da biomecânica da deglutição, avaliado por videofluoroscopia da deglutição (VFD), e o aumento da morbidade respiratória.(9-15) A DOF deve ser considerada em qualquer criança que apresente dificuldades respiratórias inespecíficas.(7) Pouco se sabe sobre o valor preditivo da VFD ou até que ponto ela pode contribuir para o manejo da DOF, especialmente no tocante a aspectos respiratórios, nutricionais e do desenvolvimento.(13,14) Assim, o objetivo do presente estudo foi avaliar o impacto conjunto da VFD e intervenções terapêuticas de alimentação e deglutição nos desfechos clínicos em crianças com DOF.
 
MÉTODOS
 
Trata-se de um estudo analítico longitudinal não controlado realizado no Hospital de Clínicas de Porto Alegre, um hospital terciário em Porto Alegre (RS). O estudo foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa da instituição (Protocolo n. 2015.0418). A amostra do estudo foi composta por pacientes acompanhados no Ambulatório de Disfagia Pediátrica do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Todos os pacientes foram encaminhados ao ambulatório por especialistas do nosso hospital. O ambulatório oferece aos pacientes com disfagia e seus familiares/cuidadores principais apoio quanto à segurança de alimentação em consultas mensais ou mais frequentes, conforme necessário.
 
Os critérios de inclusão foram os seguintes: idade ≤ 24 meses; sintomas respiratórios crônicos; avaliação clínica da deglutição por fonoaudiólogo(a) e, em seguida, VFD para a avaliação e manejo da DOF, em conformidade com as diretrizes da American Speech-Language-Hearing Association.(16) Foram excluídas as crianças cujos prontuários médicos eletrônicos não continham informações sobre a VFD e aquelas em que já haviam se passado mais de seis meses desde a VFD.
 
Os desfechos de interesse foram comparados entre dois períodos de seis meses (antes e depois da VFD). Para as crianças com idade < 6 meses, o período de análise anterior à VFD correspondeu a sua idade. Foram avaliados os seguintes desfechos: via de alimentação, hospitalização e antibioticoterapia para infecções respiratórias. Após a análise dos resultados da VFD, os cuidadores principais receberam orientações a respeito do tratamento da DOF, em conformidade com as recomendações da American Speech-Language-Hearing Association,(17) e os pacientes foram acompanhados no Ambulatório de Disfagia Pediátrica do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Os dados foram extraídos retrospectivamente dos prontuários médicos dos pacientes.
 
As intervenções terapêuticas consistiram em mudanças na consistência dos alimentos, na postura de alimentação, no posicionamento do paciente e no uso de utensílios adaptados às necessidades do paciente. (17) Durante a VFD, foram feitos esforços para manter práticas domiciliares bem estabelecidas, embora tenham sido feitas, quando necessário, modificações visando aumentar a segurança da deglutição.
 
Todas as VFD foram realizadas com fluoroscopia contínua (sistema de fluoroscopia Axiom Iconos R100; Siemens Healthineers, Erlangen, Alemanha), com duração total máxima de 150 s, resolução padrão de 30 quadros por segundo e exposição à radiação tão baixa quanto possível (as low as reasonably achievable), obtendo-se informações relevantes no menor tempo possível.(18) As imagens foram registradas em formato digital em um sistema de comunicação e arquivamento de imagens para que, em seguida, fossem analisadas. O sulfato de bário foi usado como meio de contraste na concentração de 30%. Os resultados foram armazenados digitalmente. A VFD foi realizada e analisada por um(a) fonoaudiólogo(a) e um(a) radiologista com no mínimo 20 anos de experiência em DOF pediátrica e estudos radiográficos de deglutição.
 
Todas as imagens de VFD foram obtidas com o paciente em posição lateral. O cuidador principal teve a oportunidade de acompanhar o paciente, usando os equipamentos de proteção necessários. As variáveis de desfecho deste estudo foram a presença ou ausência de penetração isoladamente e a presença ou ausência de aspiração. O resultado mais grave entre todas as consistências avaliadas foi considerado. Nos casos em que os pacientes apresentavam evidências anteriores ou atuais de aspiração, nem todas as consistências alimentares foram testadas, já que a aspiração era uma preocupação.
 
A caracterização dos pacientes incluiu dados neonatais. Para os nascidos prematuros, a idade foi corrigida com base na idade gestacional ao nascimento para a análise. Comorbidades como comprometimento do sistema nervoso central, doenças respiratórias e doenças genéticas foram categorizadas.
 
Os desfechos respiratórios foram a duração da antibioticoterapia (em dias), o número de hospitalizações e o tempo de internação (em dias) associados a pneumonia, asma, bronquiolite, bronquite, insuficiência respiratória aguda e outras infecções das vias aéreas superiores e inferiores. As doenças respiratórias foram analisadas como variável única em virtude da complexidade diagnóstica dos sinais e sintomas em pacientes com DOF(6,7) e sua relação com manifestações de doenças respiratórias.(7,9,10,12,14,15)
 
As vias de alimentação foram classificadas da seguinte forma: alimentação exclusivamente por via oral; alimentação por via oral e enteral; alimentação exclusivamente por via enteral. As intervenções terapêuticas de alimentação e deglutição após a VFD foram classificadas da seguinte forma: sem modificações; manutenção ou início da alimentação por via oral; interrupção ou manutenção da suspensão da alimentação por via oral (contraindicação de alimentação por via oral e encaminhamento obrigatório para terapia fonoaudiológica); manutenção ou início da alimentação por via oral e enteral concomitantemente.
 
O teste de Kolmogorov-Smirnov foi usado para testar a normalidade da distribuição. As variáveis contínuas foram descritas em forma de mediana [intervalo interquartil], e as variáveis categóricas foram descritas em forma de frequências absolutas e relativas. As variáveis categóricas foram analisadas por meio do teste exato de Fisher ou do teste do qui-quadrado de Pearson.
 
Para grupos pareados, foram usados o teste de McNemar e o teste de Wilcoxon. Os grupos não pareados foram comparados por meio do teste U de Mann-Whitney ou do teste de Kruskal-Wallis. Todas as análises estatísticas foram realizadas por meio do programa IBM SPSS Statistics, versão 21.0 (IBM Corporation, Armonk, NY, EUA). O nível de significância adotado foi de p < 0,05. Modelos de regressão linear múltipla e modelos lineares generalizados foram usados para avaliar associações e correlações entre desfechos clínicos antes e depois da VFD, sendo ajustados de modo a levar em conta a idade dos pacientes no momento do exame. As associações foram expressas em forma de OR e IC95%.
 
RESULTADOS
 
Foram incluídas no estudo 72 crianças. Destas, 43 (59,72%) foram submetidas à VFD durante a hospitalização. Além disso, 21 (29,17%) haviam sido orientadas a modificar a consistência dos alimentos. As características clínicas dos participantes do estudo estão descritas na Tabela 1.
 

 
Na VFD, a maioria dos participantes do estudo apresentou penetração/aspiração. Os eventos de aspiração foram silenciosos na maioria dos casos. Embora 38,9% dos participantes do estudo apresentassem VFD sem penetração/aspiração, apenas 2 (2,8%) não receberam a recomendação de mudar as estratégias de alimentação (Tabela 2).
 

 
As crianças que apresentaram penetração/aspiração na VFD eram mais jovens (mediana da idade: 4,5 meses; IIQ: 1-12,75 meses) do que as que não o fizeram (mediana da idade: 8,5 meses; IIQ: 4,25-15,75 meses; p = 0,039). As crianças nascidas prematuramente (n = 28) apresentaram maior frequência de penetração/aspiração (n = 20; 71,42%) do que as nascidas a termo (n = 19; 52,73%), embora a diferença não tenha sido significativa (p = 0,129).
 
No tocante às vias de alimentação, não houve diferenças significativas entre os grupos antes e depois da VFD, sendo respectivamente 31 (43,1%) e 29 (40,3%) para a alimentação por via oral (p = 0,0842), 22 (30,6%) e 25 (34,7%) para a alimentação por via oral e enteral (p = 0,711), e 19 (26,4%) e 18 (25%) para a alimentação por via enteral (p = 1). No entanto, no tocante a mudanças nas vias de alimentação durante o período de acompanhamento, houve alteração significativa no número de pacientes em cada grupo (p = 0,002).
 
Quando comparamos os seis meses antes e depois da VFD, notamos que houve melhora nos desfechos respiratórios. O modelo de regressão logística ajustado pela idade mostrou que a probabilidade de hospitalização diminuiu em 85% (p < 0,001) e a probabilidade de não usar antibióticos aumentou em 1,47 vezes (p = 0,007) após a VFD e as intervenções terapêuticas de alimentação e deglutição (Tabela 3). O modelo multivariado (Tabela 4) mostrou redução do tempo de internação hospitalar (p = 0,024) e da duração da antibioticoterapia (p = 0,014). O número de internações (p = 0,037) não permaneceu significativo após o ajuste para que se levasse em conta a idade (p = 0,072).
 





 
DISCUSSÃO
 
O presente estudo analisou os desfechos clínicos antes e depois da VFD em um grupo de crianças encaminhadas a um ambulatório de disfagia pediátrica. No período que se seguiu à VFD e às intervenções terapêuticas de alimentação e deglutição, a probabilidade de hospitalização e uso de antibióticos foi menor, assim como o foram o tempo de internação hospitalar e a duração da antibioticoterapia para infecções respiratórias. Os modelos estatísticos ajustados pela idade confirmaram os resultados e a força das associações, à exceção do número de hospitalizações. Acreditamos que embora o número de internações hospitalares não tenha mudado, a gravidade dessas internações era maior antes da VFD, como evidenciaram outros indicadores de morbidade respiratória.
 
Benfer et al.(19) relataram que, em crianças, as chances de apresentar DOF diminuem com o aumento da idade e aumentam com o aumento do nível no Gross Motor Function Classification System (GMFCS, Sistema de Classificação da Função Motora Grossa). No entanto, os autores observaram que a redução da DOF foi significativa apenas para crianças com níveis I e II no GMFCS. Embora com o tempo e o tratamento conservador muitos bebês com aspiração melhorem (dentro de 1-2 anos),(14,20) os autores relataram que faltavam dados detalhados a respeito das intervenções e que eles não foram capazes de determinar se as alterações estavam relacionadas à realização de intervenções alimentares ou se refletiam a história natural inicial da paralisia cerebral (cuja média foi de 27,3 meses na amostra em questão).(19) Por outro lado, nosso estudo avaliou os desfechos clínicos antes e depois das intervenções (VFD e manejo especializado da DOF) por um período máximo de 12 meses, com controle da idade. Durante o acompanhamento, a prevalência da alimentação por via oral e enteral aumentou em comparação com a da alimentação exclusivamente por via oral ou enteral, o que ressalta a importância do tratamento personalizado.
 
No presente estudo, o predomínio de crianças com idade < 12 meses no momento da VFD e a associação entre penetração/aspiração em crianças mais novas podem ser explicados pelo processo de maturação fisiológica. A deglutição segura exige a coordenação ativa do sistema nervoso central e periférico, do sistema cardiopulmonar e do trato gastrointestinal, que se desenvolvem durante a infância.(1,21) Além do processo de maturação, menos alterações na VFD em crianças mais velhas podem refletir a adoção de melhores práticas alimentares pelos cuidadores, de forma espontânea ou sob supervisão profissional.
 
Observamos uma alta prevalência de penetração/aspiração na VFD na população do estudo. Na literatura, o achado mais comum de comprometimento da deglutição é a penetração/aspiração. Embora concordemos que seja importante ampliar e descrever medidas quantitativas de deglutição para auxiliar na tomada de decisão clínica,(22,23) o objetivo deste estudo foi avaliar a evolução clínica dos pacientes; os resultados da VFD foram usados como dados complementares. Em virtude do risco de exposição à radiação, os encaminhamentos para a realização de VFD devem ser cuidadosamente considerados, idealmente em conjunto com a avaliação clínica da deglutição por um profissional experiente, que possa identificar sinais que sugiram a presença de aspiração. (2,7,16,20) A ausência de mecanismos de proteção das vias aéreas contra a aspiração (aspiração silenciosa) foi prevalente no presente estudo, corroborando achados anteriores na população pediátrica,(2,22,24,25) especialmente em crianças com idade < 24 meses e reflexos vagais protetores ainda não completamente desenvolvidos.(2)
 
As intervenções terapêuticas de alimentação e deglutição após a VFD na maioria das crianças do presente estudo, inclusive naquelas com sinais e sintomas de DOF menos óbvios que penetração/aspiração, são justificadas pelo objetivo principal da VFD, que é avaliar a segurança da alimentação e a eficácia de estratégias compensatórias de alimentação. (2,7,16,22,23) Durante o período de acompanhamento, as estratégias de alimentação foram modificadas apesar da ausência de achados graves na VFD. Portanto, acreditamos que os achados da VFD por si só não propiciam a avaliação e manejo adequados de crianças com DOF.(10) O diagnóstico e tratamento da DOF devem se basear na impressão clínica (avaliação clínica e histórico de episódios de pneumonia aspirativa) e em achados objetivos de alterações na biomecânica da deglutição.(26)
 
No presente estudo, achados de DOF na VFD seguidos de manejo terapêutico relacionaram-se com redução da morbidade respiratória. Isso sugere que a proteção das vias aéreas pode ser alcançada por meio de maior atenção à DOF. Encontramos dois estudos nos quais foram avaliados os desfechos antes e depois de intervenções em crianças com comprometimento do desenvolvimento neurológico. Silverio & Henrique(27) relataram uma diminuição de eventos respiratórios após a terapia fonoaudiológica; entretanto, seus achados basearam-se apenas em protocolos de diagnóstico clínico de DOF. Sullivan et al.(28) realizaram VFD em alguns de seus pacientes e observaram uma diminuição do número de infecções pulmonares após a gastrostomia.
 
Muitas das crianças do presente estudo passaram a receber alimentação tanto por via oral como por via enteral durante o período de acompanhamento. Isso significa que a alimentação por via oral foi iniciada em pacientes que anteriormente recebiam apenas alimentação por via enteral e que houve um aumento do número de crianças que originalmente recebiam alimentação por via oral e que passaram a receber a alimentação tanto por via oral como por via enteral. Esses achados sugerem que a recomendação de estratégias de alimentação complementar também se baseou em aspectos nutricionais, e não apenas na DOF. Estudos anteriores aventaram a hipótese de que existe — ou de fato mostraram que existe — uma relação entre doenças que se manifestam durante o período de acompanhamento e o insucesso da alimentação exclusivamente por via oral.(6,29) Além disso, sabe-se que a alimentação exclusivamente por via oral não é suficiente para uma nutrição adequada em alguns pacientes.(7,30)
 
Nosso modelo estatístico ajustado pela idade mostrou menor probabilidade de uso de antibióticos, menor tempo de internação hospitalar e menor duração da antibioticoterapia após a VFD. Esses dados apoiam a conclusão de que a atenção especializada reduz a morbidade respiratória em crianças com DOF, e essa redução desempenha um papel importante no bem-estar dos pacientes e de suas famílias. É um desafio estabelecer uma relação causal entre aspiração e sintomas respiratórios; é preciso analisar fatores que são sabidamente difíceis de isolar em estudos retrospectivos. (9) Apesar de algumas limitações e fatores de confusão, os achados relevantes do presente estudo permanecem significativos após o ajuste pela idade, e, portanto, necessitam de mais atenção. A investigação e o tratamento da DOF foram realizados quando houve suspeita de que a causa das manifestações clínicas não era completamente compreendida pelo contexto da doença. Isso não resolve as questões metodológicas, mas reforça a importância dos dados. A DOF muitas vezes não é reconhecida como causa de sintomas respiratórios crônicos,(7,15) e sua apresentação respiratória pode ser menos característica do que se pensava.(6)
 
As limitações do presente estudo incluem o caráter retrospectivo, a coleta de dados provenientes de prontuários médicos, a ausência de um grupo controle, os diferentes diagnósticos respiratórios relacionados com antibioticoterapia e hospitalização e a heterogeneidade da população do estudo. Estudos com populações homogêneas e intervenções randomizadas devem ser realizados para esclarecer o impacto da DOF e seu manejo na morbidade respiratória, melhorar a qualidade de vida dos pacientes e de seus familiares e promover o reconhecimento dos centros de referência em DOF, ainda escassos na maioria dos locais.
 
CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES
 
Todos os autores participaram da concepção e planejamento do estudo; da interpretação dos achados; da redação e/ou revisão de todas as versões preliminares e da versão final do manuscrito; e da aprovação da versão final do manuscrito.
 
CONFLITOS DE INTERESSE
 
Nenhum declarado.
 
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