O termo “remissão” é frequentemente utilizado em medicina, particularmente no manejo de doenças inflamatórias crônicas e câncer. Define-se como a redução ou desaparecimento dos sinais e sintomas da doença. A redução é conhecida como remissão parcial, e o desaparecimento, como remissão completa. Há o importante elemento do tempo de desaparecimento dos sinais e sintomas, e essa duração varia com o tipo de doença crônica.
É importante ressaltar que a remissão não implica ausência de tratamento para a doença, nem é o mesmo que cura; no entanto, a remissão completa de evidências da presença de alguns tipos de câncer por um período de cinco anos é considerada uma evidência de cura.
A asma é a doença respiratória crônica mais comum, afetando mais de 350 milhões de pacientes em todo o mundo.(1) Há medicamentos eficazes para o tratamento da asma, principalmente os corticosteroides inalatórios (CI), isoladamente ou em conjunto com long-acting inhaled β2 agonists (LABA, β2-agonistas inalatórios de longa duração).(2) O objetivo do tratamento da asma é a obtenção do controle da doença. O conceito de controle da asma está em uso há mais de 20 anos. Consiste em (i) ausência de sintomas de asma diurnos ou noturnos; (ii) ausência de exacerbações de asma; (iii) função pulmonar normal; (iv) atividades cotidianas normais. A quantidade de tratamento necessária para alcançar o controle da asma tem sido utilizada como um indicador de gravidade da doença. O controle da asma pode ser alcançado na maioria dos pacientes com o uso de medicamentos inalatórios.
Há, no entanto, uma minoria de pacientes com asma (7-10%) que não alcança o controle da doença, mesmo com doses mais elevadas de terapia inalatória com CI/LABA.(3) Esses pacientes apresentam exacerbações graves de asma mais frequentes, muitas vezes redução da função pulmonar e grande impacto em seu cotidiano. Até 70% desses pacientes com asma grave reconhecidamente apresentam inflamação eosinofílica persistente das vias aéreas, denominada asma grave T2 alto.(3) Diversos anticorpos monoclonais que têm como alvo proteínas específicas associadas à asma T2 alto foram desenvolvidos, os quais são coletivamente conhecidos como imunobiológicos para asma. São anticorpos que se ligam à IL-5 (mepolizumabe e reslizumabe)(4,5); ao receptor α da IL-5 (benralizumabe)(6); ao receptor α da IL-4 (dupilumabe)(7); à IgE (omalizumabe)(8); ou à linfopoietina estromal tímica (tezepelumabe).(9,10) Cada um desses imunobiológicos melhora o controle da doença na asma grave T2 alto, reduzindo as exacerbações, melhorando os sintomas e melhorando a função pulmonar. Vários imunobiológicos para asma mostraram-se também poupadores de corticosteroides orais.(11-13)
Foi proposto um conceito de que, ao bloquear citocinas importantes na patogênese da asma, os imunobiológicos podem ter maior probabilidade de induzir a remissão da asma do que as terapias convencionais.(14) Essa não é uma hipótese irrealista. Há situações clínicas conhecidas em que ocorreu a cura da asma. A cura seria identificada não apenas pela ausência de sintomas, mas também pela ausência dos biomarcadores inflamatórios e alterações fisiológicas característicos da asma, particularmente a hiper-responsividade das vias aéreas. Isso foi descrito em pacientes com asma ocupacional causada pela exposição ao cedro vermelho ocidental; nesses casos, a remoção precoce dos pacientes do local de trabalho resultou em cura.(15) Além disso, muitas crianças com asma apresentam remissão completa dos sintomas durante a adolescência,(16) embora algumas apresentem recorrência da asma mais tarde na vida.
Com relação ao uso de imunobiológicos para asma, a maioria dos estudos identificou pacientes que têm uma maior resposta clínica, medida por desfechos clínicos padrão, do que os resultados médios do grupo de estudo. Esses pacientes foram chamados de “super-respondedores”.(17) Embora o conceito de remissão seja diferente, nem a definição nem o período de remissão foram acordados e diferem em estudos que avaliaram os benefícios dos imunobiológicos para asma na indução de remissão parcial (Tabela 1), e, como era de se esperar, a porcentagem de pacientes considerados em remissão varia de 15% a 41%.(18-21) As características mais consistentes de remissão parcial nesses estudos são o controle dos sintomas, a ausência da necessidade de corticosteroides orais e a ausência de exacerbações de asma por pelo menos 1 ano.
Há uma grande probabilidade de que o termo “remissão da asma” se torne mais amplamente utilizado em estudos que avaliam a eficácia dos imunobiológicos para asma. Será importante chegar a um consenso sobre a definição do termo, particularmente porque serão feitas comparações (muitas vezes inadequadas) entre estudos nos quais a remissão foi um desfecho clínico. Vários esforços foram feitos para fornecer uma definição,(22-24) mas ainda não há uma que seja amplamente aceita. Essa definição de remissão completa da asma deve incluir a ausência de sintomas de asma, a ausência de exacerbações e da necessidade de corticosteroides orais e a manutenção dos melhores valores de VEF1 dos pacientes, sem evidência de variabilidade. Esses benefícios devem se manter por pelo menos 1 ano. Sintomas ocasionais, cujo nível ainda não está definido, e particularmente se causados por estímulos externos, como exercício ou poluentes atmosféricos, podem ser aceitáveis para definir uma remissão parcial da asma.
Embora haja benefícios em focar a remissão da asma como desfecho clínico, há questões não respondidas e riscos. A ausência de uma definição amplamente acordada já foi discutida, mas também não há informações sobre o tempo de permanência em uso de imunobiológico para asma uma vez alcançada a remissão, nem sobre os riscos de recorrência dos sintomas de asma se o imunobiológico for suspenso. Além disso, se a remissão se tornar um desfecho clínico amplamente aceito para pacientes em uso de imunobiológicos para asma e um paciente não atingir a remissão enquanto em uso de um determinado imunobiológico, haverá a tentação de tentar outro, e os benefícios disso para os pacientes ainda não foram estudados.
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