ABSTRACT
Objective: To assess the quality of life (QoL) of patients with cystic fibrosis (CF) followed at a university referral center for CF. Methods: A cross-sectional study involving application of the Cystic Fibrosis Questionnaire (CFQ) and Shwachman score in CF patients between April of 2008 and June of 2009. Results: The sample consisted of 75 patients. The mean age was 12.5 ± 5.1 years (range, 6.1-26.4 years). The patients were divided into three groups by age in years: group I (< 12), II (12-14), and III (≥ 14). The highest and lowest CFQ scores were for the nutrition domain in group III (89.3 ± 16.2) and the social domain in group II (59.5 ± 22.3), respectively. Groups I and III differed significantly regarding the treatment domain (p = 0.001). Regarding Shwachman scores, there were significant differences between patients scoring ≤ 70 and those scoring > 70 in the social (group I; p = 0.045), respiratory (group II; p = 0.053), and digestive (p = 0.042) domains. In group III, severity did not correlate with QoL. In groups I and II, patients with an FEV1 < 80% of predicted did not differ from other patients for any CFQ domain. However, in group III, values for the following domains were significantly lower in patients with an FEV1 < 80%: physical (p = 0.012); body image (p = 0.031); respiratory (p = 0.023), emotional (p = 0.041); and social role (p = 0.024). Conclusions: It is important to assess QoL in CF patients, because it can improve treatment compliance.
Keywords:
Cystic fibrosis; Quality of life; Questionnaires.
RESUMO
Objetivo: Avaliar a qualidade de vida (QV) de pacientes com fibrose cística (FC) acompanhados em um centro universitário de referência em atendimento a FC. Métodos: Estudo transversal com a aplicação do Cystic Fibrosis Questionnaire (CFQ) e escore de Shwachman em pacientes com FC entre abril de 2008 e junho de 2009. Resultados: Participaram 75 pacientes, com média de idade de 12,5 ± 5,1 anos (variação: 6,1-26,4 anos). Os pacientes foram divididos em três grupos de acordo com a idade: grupo I (< 12 anos), II (12-14 anos) e III (≥ 14 anos). As pontuações mais altas e mais baixas no CFQ foram para o domínio alimentação do grupo III (89,3 ± 16,2) e para o domínio social no grupo II (59,5 ± 22,3), respectivamente. Houve uma diferença significativa no domínio tratamento entre os grupos III e I (p = 0,001). Pacientes com escore de Shwachman ≤ 70 apresentaram diferenças significativas em relação aos domínios social (grupo I; p = 0,045), respiratório (grupo II; p = 0,053) e digestivo (p = 0,042) quando comparados aqueles com escores > 70. No grupo III, não se observou associação entre gravidade e QV. Nos grupos I e II, não se observou diferenças entre os pacientes com VEF1 < 80% do previsto e os demais pacientes em todos os domínios do CFQ. Entretanto, no grupo III, as médias dos pacientes com VEF1 < 80% do previsto foram significativamente menores nos domínios físico (p = 0,012), imagem corporal (p = 0,031), respiratório (p = 0,023), emocional (p = 0,041) e papel social (p = 0,024). Conclusões: A avaliação da QV em pacientes com FC é importante, pois contribui para uma melhor aderência ao tratamento.
Palavras-chave:
Fibrose cística; Qualidade de vida; Questionários.
IntroduçãoA fibrose cística (FC) é uma doença hereditária, autossômica recessiva, multissistêmica e potencialmente letal, caracterizada por doença pulmonar crônica, insuficiência pancreática com má digestão, desnutrição e níveis elevados de eletrólitos no suor. Isso ocorre devido às secreções mucosas espessas e viscosas que obstruem os ductos das glândulas exócrinas.(1-3)
Sua incidência varia entre etnias, sendo de 1:2.000 a 1:5.000 em caucasianos nascidos vivos na Europa, Estados Unidos e Canadá.(3) No Brasil, a incidência varia de 1:1.850 até 1:9.600.(3)
Hoje, estima-se que os doentes nascidos em 2000 tenham uma expectativa de vida em torno de 35-40 anos.(4) Isso se tornou possível graças aos avanços que propiciaram tratamentos mais adequados, tais como antibioticoterapia agressiva, fisioterapia respiratória regular e orientação nutricional, exigindo intensa dedicação diária, e esse fato influencia de maneira negativa a qualidade de vida (QV) dos doentes e de seus familiares.(1,2)
Em 1995, segundo a definição da Organização Mundial da Saúde, QV representa "a percepção do indivíduo, tanto de sua posição na vida, no contexto cultural e nos sistemas de valores nos quais se insere, como em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações". Dessa forma, para ter boa QV é preciso que o indivíduo estabeleça uma boa relação entre os dominios social, psicológico e físico, inserindo suas expectativas no contexto em que vive.
Nas últimas duas décadas, a mensuração da QV relacionada à saúde tem sido mais utilizada. Apenas mais recentemente houve progresso quanto a sua mensuração, tanto em indivíduos saudáveis, quanto nos portadores de doenças crônicas.(5) Segundo o consenso de alguns especialistas, os relatos de QV devem sempre incluir domínios fundamentais, como condição da doença, sintomas físicos, sintomas psicológicos, sintomas emocionais, estado funcional e estado social.(5-8)
A importância de mensurar QV em FC foi descrita pela primeira vez em 1986 por um grupo de especialistas que participavam de um workshop no National Heart, Lung and Blood Institute. Desde então, a QV nesse grupo de pacientes passou a ser avaliada, tendo como modelo a DPOC, pelo fato de essa também demandar um tratamento tão complexo quanto o da FC.(6,8)
Existem basicamente dois tipos de instrumentos para a mensuração da QV: os instrumentos específicos e os genéricos.(9) Os instrumentos genéricos podem ser aplicados em diferentes populações e doenças, permitindo a comparação de pessoas doentes com aquelas saudáveis, mas sua sensibilidade para detectar pequenas mudanças na parte clínica e no tratamento de uma doença especifica é pequena.(6,9-12)
Em contraste, os questionários específicos estão voltados para os sinais e sintomas de uma única enfermidade, como a FC, permitindo avaliar a eficácia de novas medidas terapêuticas, ajudando no planejamento econômico e contribuindo para a melhoria na aderência ao tratamento. Além disso, permitem avaliar como a doença afeta as funções diárias.(7,12,13)
O primeiro questionário que avaliou a QV em FC foi desenvolvido em 1996 na França: Cystic Fibrosis Questionnaire (CFQ); posteriormente, esse foi denominado Cystic Fibrosis Questionnaire Revised (CFQ-R).(5) Em 2005, Quitter at al. realizaram sua tradução e validação para língua inglesa, com vantagens adicionais, como a possibilidade de sua aplicação em crianças menores (6-11 anos).(8)
Em 2006, o CFQ foi traduzido e validado para a língua portuguesa.(14) A tradução foi feita do questionário em inglês, constando de quatro versões, desenvolvidas segundo a faixa etária dos pacientes: de 6 a 12 anos incompletos; de 12 a 14 anos incompletos; acima de 14 anos; e para os pais dos pacientes entre 6 a 14 anos incompletos.(14)
O presente estudo teve como objetivo avaliar a QV dos pacientes com FC acompanhados em um centro de referência em atendimento a fibrocísticos de um hospital universitário através da aplicação do CFQ.
MétodosRealizou-se um estudo transversal, no qual foram incluídos 75 pacientes com idades entre 6,1 e 26,4 anos do Ambulatório de Fibrose Cística do Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas, na cidade de Campinas (SP). Nesse serviço, estavam em acompanhamento 120 pacientes, dos quais 94 tinham idades entre 6 e 27 anos. Foram convidados para participar do estudo todos os pacientes que compareceram para consulta de rotina durante o período de coleta dos dados, que ocorreu entre abril de 2008 e junho de 2009.
Aplicou-se o instrumento de avaliação de QV validado para uso no Brasil por Rozov et al..(14) Para as crianças entre 6 a 12 anos, os questionários foram aplicados pela autora principal do trabalho; os outros três questionários, para crianças de 12-14 anos, para aquelas acima de 14 anos e para os pais ou cuidadores, foram preenchidos pelos próprios pacientes ou pais. Por meio desses instrumentos são avaliados os seguintes domínios: físico, imagem corporal, digestivo, respiratório, emocional, social, nutrição, tratamento, vitalidade, saúde, papel social e peso. Os escores de cada domínio variam de 0 a 100, sendo esse último a expressão de muito boa QV. De uma maneira geral, considera-se que os escores superiores a 50 refletem boa QV.
Quanto à idade, os pacientes foram divididos em três grupos: grupo I, com pacientes com idade entre 6 e 12 anos incompletos; grupo II, com pacientes entre 12 e 14 anos incompletos; e grupo III, para os demais.
Do ponto de vista genético, os pacientes foram agrupados em DF508 homozigotos, DF508 heterozigotos e com outras mutações.
Empregou-se o escore de Shwachman para avaliar a gravidade dos pacientes: escore < 40, grave; de 41-55, moderado; de 56-70, médio; de 71-85, bom; e de 86-100, excelente.(15) Para fins de análise, os pacientes foram divididos em dois grupos: escore de Shwachman bom/excelente e escore grave/moderado/médio.
Avaliaram-se os resultados espirométricos mais recentes; como ponto de corte para CVF, VEF1 e relação VEF1/CVF, adotou-se o valor de 80% do previsto; enquanto para FEF25-75%, o ponto de corte foi de 70% do previsto.(16)
Para o processamento dos dados, empregou-se o software Statistical Package for the Social Sciences, versão 16.0 (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA). Os escores são apresentados na forma de médias e desvios-padrão ou medianas e variação. Para a comparação de dois grupos, empregou-se o teste de Mann-Whitney, e para a comparação de mais de dois grupos, utilizou-se o teste de Kruskal-Wallis. Adotou-se o nível de significância de 5%.(17)
Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas (Parecer nº 027/2008). Todos os sujeitos completaram o questionário após concordarem em participar do estudo e assinarem o termo de consentimento livre e esclarecido.
ResultadosA média da idade dos pacientes foi de 12,5 ± 5,1 anos (variação: 6,1-26,4 anos). As distribuições em relação a gênero, cor da pele, renda familiar per capita e escores de Shwachman são apresentadas na Tabela 1.
No grupo I, 28 pacientes (71,8%) faziam fisioterapia orientados por um profissional, o mesmo ocorrendo em 6 pacientes (50,0%) do grupo II e em 10 (41,7%) do grupo III (Tabela 1).
Os dados referentes à espirometria são apresentados na Tabela 2. Dos 75 pacientes, 41 apresentavam VEF1 < 80% do previsto (média = 57,2 ± 16,4%), 30 apresentavam CVF < 80% (média = 60,5 ± 13,3%), 41 FEF25-75% < 70% (média = 37,4 ± 17,5%), e 29 apresentavam a relação VEF1/CVF < 80% do previsto (média = 60,9 ± 15,5%). No grupo I, 14 pacientes (42,4%) tinham VEF1 < 80% do previsto, o mesmo ocorrendo em 6 (50,0%) do grupo II e em 21 (87,5%) do grupo III.
No grupo I, as médias dos escores variaram de 71,4 no domínio físico a 83,5 no domínio tratamento. No grupo II, essas variaram de 59,5 no domínio social a 75,0 nos domínios digestivo e nutrição. No grupo III, a média dos escores variou de 63,9 no domínio peso a 89,3 no domínio nutrição. Quando comparamos as médias dos escores dos três grupos, somente observamos uma diferença estatisticamente significante entre o grupo I e o grupo III no domínio tratamento (p = 0,001; Tabela 3).
Na Tabela 4, são apresentados os dados referentes aos questionários respondidos pelos pais. Só encontramos uma diferença significante entre os grupos I e II no domínio emocional (p = 0,043). Observamos uma boa concordância entre as médias dos escores dos pais com as informações obtidas pelos questionários aplicados aos pacientes.
Com relação ao escore de Shwachman, nos pacientes do grupo I, a média do grupo excelente/bom é maior que a dos demais no domínio social (76,4 ± 15,2 vs. 65,5 ± 17,6; p = 0,045); enquanto no grupo II o mesmo ocorreu no domínio respiratório (79,2 ± 12,6 vs. 50,0 ± 34,0; p = 0,042). No grupo III, não se observaram diferenças entre as médias. Com relação ao questionário dos pais, nos pacientes do grupo I, a média do grupo excelente/bom é maior que a dos demais no domínio físico (90,2 ± 14,1 vs. 74,1 ± 25,3; p = 0,032) enquanto no domínio nutrição ocorreu o inverso (74,1 ± 30,4 vs. 93,1 ± 19,4; p = 0,019). No grupo II, a média do grupo excelente/bom é maior que a dos demais no domínio imagem corporal (86,1 ± 19,5 vs. 50,0 ± 33,3; p = 0,023) e respiratório (88,2 ± 8,6 vs. 65,3 ± 8,3; p = 0,005).
Comparando-se os pacientes com VEF1 < 80% do previsto com os demais, não se encontrou diferença estatisticamente significante em quaisquer domínios nos grupos I e II, enquanto, no grupo III, a média é menor no grupo com VEF1 < 80% do previsto nos domínios físico (68,4 ± 24,1 vs. 100,0 ± 0,0; p = 0,012); imagem corporal (75,7 ± 20,4 vs. 100,0 ± 0,0; p = 0,031); respiratório (66,7 ± 15,4 vs. 83,3 ± 0,0; p = 0,023); emocional (80,6 ± 15,0 vs. 97,8 ± 3,9; p = 0,041) e papel social (74,2 ± 19,9 vs. 100,0 ± 0,0; p = 0,024). Na avaliação dos questionários dos pais, não se observou diferença estatisticamente significante em quaisquer domínios no grupo I, enquanto, no grupo II, os pacientes com VEF1 < 80% do previsto tinham maior média no domínio digestivo (87,0 ± 8,4 vs. 61,1 ± 16,8; p = 0,008).
DiscussãoNossos dados apontam que os pacientes com FC acompanhados no centro estudado têm boa QV, havendo evidências de pior desempenho entre os pacientes com mais de 14 anos de idade e VEF1 < 80% do previsto.
Em nosso serviço, a avaliação da gravidade nos pacientes com FC é realizada através do escore de Shwachman, enquanto a repercussão da doença no aparelho respiratório é avaliada por espirometria. Outros métodos também são utilizados, como o Cystic Fibrosis Clinical Score e o teste de caminhada de seis minutos. O controle da infecção do aparelho respiratório é realizado através de técnicas microbiológicas. Todos esses métodos têm como objetivo avaliar a gravidade da doença e o potencial risco de infecção do aparelho respiratório. Entretanto, eles pouco nos dizem sobre o dia-a-dia dos pacientes e como vivem, sem conseguir traduzir a percepção dos pacientes sobre como é viver com uma doença crônica e fatal.
Nossos resultados mostram que os pacientes entre 6 e 14 anos incompletos apresentam QV satisfatória em todos os domínios (saúde, condição física, psicossocial e em relação à rotina de tratamento), enquanto os adolescentes e adultos relatam insatisfação em relação ao tratamento. Possivelmente, isso se deve ao fato de que as crianças sejam menos ansiosas, menos deprimidas, apresentando maior otimismo em relação ao enfrentamento da doença quando comparadas com os adultos.(18-20) Além disso, a autopercepção da QV se modifica de indivíduo para indivíduo à medida que os valores, crenças, contexto cultural e contexto social modificam sua visão ao longo dos anos.(13,19)
Os sintomas de ansiedade e depressão em adolescentes e adultos estão associados com as baixas pontuações nos relatos de QV e têm sido descritos como fatores de risco para pobre aderência ao tratamento, aumento da morbidade e aumento dos cuidados com saúde em enfermidades crônicas.(19,21)
Entre os pais das crianças com FC que participaram desta pesquisa, observaram-se escores mais baixos apenas no domínio peso, sugerindo insatisfação desses em relação ao aparelho digestivo das crianças.
Alguns estudos têm mostrado diferenças entre os relatos dos pais e de seus filhos sobre a QV, principalmente em relação aos aspectos físicos e emocionais.(19,20,22-24) Provavelmente, isso acontece devido ao alto nível de sofrimento emocional dos pais. Os problemas de saúde das crianças limitam a participação dessas em atividades físicas, escolares e familiares, causando ansiedade e depressão nos cuidadores.(23,24)
Além disso, as preocupações sobre a expectativa de vida das crianças e os caros e exigentes regimes de tratamentos contribuem para o aparecimento de sintomas depressivos nos cuidadores, interferindo diretamente nas tarefas diárias e na aderência ao tratamento.(24)
Nosso estudo mostrou que as crianças classificadas como médios, moderados e graves pelo escore de Shwachman apresentam insatisfação em relação à condição social (grupo I) e sistema respiratório (grupo II), quando comparados com os excelentes/bons. Esses resultados sugerem que a gravidade da doença está associada com a QV das crianças; porém, não se encontraram na literatura outros estudos capazes de detectar essas associações, possivelmente devido à predominante utilização de questionários genéricos. Nos adolescentes e adultos, nossos resultados não mostraram uma associação entre relatos de QV e gravidade da doença, assim como encontrado em outras pesquisas.(6,19,25)
O comprometimento pulmonar vem sendo descrito na literatura como um importante fator para o aparecimento do estresse emocional em indivíduos com FC, pois se associa com maior morbidade e mortalidade, demandando tratamentos ainda mais rigorosos.(21,25)
Nossos resultados mostram que as crianças entre 6 e 14 anos incompletos apresentam QV satisfatória, independente do VEF1. Já os adolescentes e adultos com maior comprometimento pulmonar apresentaram piores pontuações nos domínios respiratório, papel social, imagem corporal e físico. Outros estudos também descreveram essas associações, principalmente nos domínios referentes à função física e à percepção corporal e de saúde nos adolescentes e adultos com alteração no VEF1.(21,26,27)
Na literatura, há resultados discrepantes quanto à associação do comprometimento pulmonar com os relatos de QV em indivíduos com FC, devido ao uso de diferentes tipos de questionários e da faixa etária dos pacientes. Quando se utiliza instrumentos específicos, essa associação torna-se mais consistente, principalmente entre adolescentes e adultos.(12,13)
Adolescentes e adultos com FC já apresentando comprometimento pulmonar, avaliados pela escala Quality of Well-Being, apresentavam piores relatos de QV.(26) Porém, nos indivíduos menores de 18 anos, essa associação não foi observada.(28)
Em três estudos na década de 2000,(12,13,29) avaliou-se a associação da QV e VEF1 em indivíduos com FC através do The Child Health Questionnaire, mas os resultados obtidos foram discrepantes. Em dois dos estudos,(12,13) não houve tal associação. Entretanto, os autores do terceiro estudo observaram que os adolescentes e adultos com VEF1 anormal apresentavam piores relatos sobre a percepção da saúde física.(29)
Em um recente estudo no qual se utilizou o Cystic Fibrosis Questionnaire, observou-se que os adultos com FC com alteração do VEF1 apresentavam pontuações mais baixas nos domínios referentes à função física e saúde, indicando associações entre ansiedade, depressão e função pulmonar com os relatos de QV.(4,21)
Assim como observamos, a maior parte dos estudos sugere que a autopercepção da saúde está diretamente relacionada com a idade e com o comprometimento do sistema respiratório, tornando-se mais evidente nos adolescentes e adultos com maior dano pulmonar.(4,21,26)
A avaliação da QV desses indivíduos é importante, pois corresponde à percepção do paciente sobre como é viver com uma doença crônica e fatal, contribuindo para uma melhor aderência ao tratamento.(5,7,12) Além disso, fornece informações para o planejamento econômico e permite a avaliação do impacto de novos tratamentos, tal como apresentado em um estudo recente.(30)
Os pacientes entre 6 e 14 anos apresentam QV satisfatória em todos os domínios, enquanto os adolescentes e adultos relatam insatisfação em relação ao tratamento. Consideramos que o uso do questionário de QV é um método de baixo custo e de fácil aplicação; no entanto, somente a realização de estudos mais extensos permitirá que esses sejam, de fato, incorporados à rotina dos serviços. Essas avaliações, quando realizadas com periodicidade, forneceriam informações que ampliariam a possibilidade de atuação da família e dos profissionais que cuidam desses pacientes.
AgradecimentosAgradecemos à Professora Doutora Tatiana Rozov que muito gentilmente nos permitiu utilizar o instrumento CFQ.
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* Trabalho realizado na Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas (SP) Brasil.
Endereço para correspondência: André Moreno Morcillo. Rua Antonio Adami, 166, Santa Isabel, CEP 13084-240, Campinas, SP, Brasil.
Tel 55 19 9146-6379 ou 55 19 3521-7353. E-mail: morcillo@fcm.unicamp.br ou morcillo@hc.unicamp.br
Apoio financeiro: Nenhum.
Recebido para publicação em 1/10/2010. Aprovado, após revisão, em 14/12/2010.
Sobre os autoresMilena Antonelli Cohen
Fisioterapeuta. Hospital de Clínicas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas (SP) Brasil.
Maria Ângela Gonçalves de Oliveira Ribeiro
Fisioterapeuta. Departamento de Pediatria, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas (SP) Brasil.
Antonio Fernando Ribeiro
Professor. Departamento de Pediatria, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas (SP) Brasil.
José Dirceu Ribeiro
Professor Associado. Departamento de Pediatria, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas (SP) Brasil.
André Moreno Morcillo
Professor Associado. Departamento de Pediatria, Faculdade de Ciências Médicas, Universidade Estadual de Campinas, Campinas (SP) Brasil.