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Relato de Caso

Reoperação de tromboendarterectomia pulmonar em recidiva de tromboembolismo pulmonar crônico hipertensivo

Repeat pulmonary thromboendarterectomy after recurrence of chronic thromboembolic pulmonary hypertension

Walter José Gomes, Carlos Jogi Imaeda, João Alessio Perfeito, Petrúcio Abrantes Sarmento, Rodrigo Caetano Souza, Vicente Forte

ABSTRACT

Pulmonary thromboendarterectomy has been established as the standard method for the treatment of chronic thromboembolic pulmonary hypertension, with excellent results. However, repeat pulmonary thromboendarterectomy due to recurrence of pulmonary embolism has never been reported in the Brazilian literature. Its safety and effectiveness remain obscure. We report the case of a patient presenting recurrence of chronic thromboembolic pulmonary hypertension five years after the first pulmonary thromboendarterectomy and requiring a second operation for resolution of the symptoms.

Keywords: Hypertension, pulmonary; Pulmonary embolism; Endarterectomy/methods.

RESUMO

A cirurgia de tromboendarterectomia tem se estabelecido como método padrão de tratamento do tromboembolismo pulmonar crônico hipertensivo, com excelentes resultados. Entretanto, a reoperação na recidiva do embolismo pulmonar não tem relato na literatura nacional, permanecendo obscuras a sua segurança e efetividade. Relatamos o caso de uma paciente com recorrência de tromboembolismo pulmonar crônico hipertensivo ocorrido cinco anos após a primeira cirurgia de tromboendarterectomia pulmonar, e que necessitou de reoperação para resolução dos sintomas.

Palavras-chave: Hipertensão pulmonar; Embolia pulmonar; Endarterectomia/métodos.

Introdução

A cirurgia de tromboendarterectomia no tratamento do tromboembolismo pulmonar crônico hipertensivo (TEPCH) tem se estabelecido como a terapia de escolha, oferecendo na maioria dos casos a alternativa consistente e definitiva para esta doença, com bons resultados imediatos e tardios.(1,2) A recorrência do TEPCH após o primeiro tratamento cirúrgico é rara, com apenas um relato de série de pacientes na literatura mundial.(3)

Entretanto, a reoperação na recidiva do TEPCH não tem relato na literatura nacional, permanecendo obscuras a sua segurança e efetividade.

A seguir é relatado o caso de uma paciente com recorrência de TEPCH cinco anos após a primeira cirurgia de tromboendarterectomia pulmonar, e que necessitou de reoperação para a resolução dos sintomas.

Relato de caso

Paciente de 28 anos, do sexo feminino, apresentou-se com queixa de dispnéia progressiva aos esforços e dor no peito há dois meses. Havia sido submetida à cirurgia de tromboendarterectomia pulmonar há cinco anos, ficando após em uso de warfarina, que suspendeu há 1 ano. O eletrocardiograma mostrava sinais de sobrecarga ventricular direita, e a radiografia do tórax revelou aumento moderado da área cardíaca, com abaulamento do arco da artéria pulmonar.

O ecocardiograma revelou aumento do átrio direito, com o ventrículo direito dilatado e hipocinético, além de insuficiência tricúspide leve a moderada. Havia a presença de trombo ocluindo a artéria pulmonar esquerda e de outro trombo no átrio direito próximo à junção da veia cava superior. A pressão sistólica da artéria pulmonar foi estimada em 65 mmHg.

A TC do tórax revelou trombose e oclusão do ramo esquerdo da artéria pulmonar (Figura 1).



A paciente foi submetida a re-esternotomia mediana e, com o uso de circulação extracorpórea e parada circulatória total com hipotermia sistêmica a 18 °C, foi realizada tromboendarterectomia do ramo esquerdo da artéria pulmonar e exploração do ramo direito, que não revelou trombos (Figura 2). Também foi realizada a retirada do trombo do átrio direito. O tempo de circulação extracorpórea foi de 109 min, e o tempo de parada circulatória total foi de 31 min. A paciente apresentou boa evolução pós-operatória, sem intercorrências, recebendo alta hospitalar no quinto dia de pós-operatório. Também foi inserido um filtro de cava inferior Greenfield. Na evolução de 59 meses após a cirurgia, encontrava-se em classe funcional I (New York Heart Association), em uso continuado de warfarina. O controle de ecocardiograma recente mostrou pressão sistólica de artéria pulmonar em 40 mmHg, que tem se mantido estável nos últimos anos, além de insuficiência tricúspide discreta.



Discussão

O TEPCH é uma ocorrência infrequente, embora atualmente seja estimado que 3,8% dos pacientes após o quadro inicial de embolismo pulmonar agudo possam desenvolver TEPCH sintomático dentro de 2 anos.(4) A recorrência da doença após a cirurgia da tromboendarterectomia é ainda mais incomum e raramente relatada.

A sobrevida dos pacientes com pressão média de artéria pulmonar superior a 30 mmHg é de apenas 30% em 5 anos. A mortalidade é acima de 90% em 5 anos se a pressão média da artéria pulmonar exceder 50 mmHg.(5) Além do transplante pulmonar, a tromboendarterectomia pulmonar é a única terapêutica efetiva nesta doença, porém com risco considerável, já que a mortalidade relatada na literatura varia entre 6,6 e 23%.(6) As causas mais comuns de óbito pós-operatório são edema de reperfusão dos pulmões, hemoptise maciça, insuficiência ventricular direita, insuficiência respiratória e falência de múltiplos órgãos. Além disso, a tromboendarterectomia pulmonar nem sempre resulta em normalização da resistência vascular pulmonar, devido principalmente à doença pulmonar periférica concomitante.

Pacientes submetidos à cirurgia de tromboendarterectomia pulmonar necessitam anticoagulação por toda a vida. A interrupção ou níveis inadequados de anticoagulação deixam os pacientes sob o risco de recorrência da doença, como aconteceu nesta paciente.

Na única série relatada na literatura de reoperação de tromboendarterectomia pulmonar, os resultados mostraram que a morbidade perioperatória foi aumentada e a mortalidade foi similar em relação ao procedimento primário, assim como houve menor redução da pressão arterial pulmonar na evolução pós-operatória tardia. Porém, os pacientes apresentaram expressiva melhora sintomática no seguimento de longo prazo.(3) Portanto, a reoperação é o procedimento preferível quando comparado ao transplante pulmonar ou a inexorável evolução para insuficiência cardíaca direita e morte. Embora empírico e análogo aos outros procedimentos cardíacos, onde a reoperação carreia um risco aumentado de mortalidade, isto não foi observado na única série até agora relatada.(3) A evolução pós-operatória satisfatória desta paciente também corrobora esta observação.

Baseado nos achados angiográficos e tomográficos, foi possível fazer a indicação cirúrgica pelo achado anatômico, assim como também a estratégia e o planejamento cirúrgico. Na abordagem da artéria pulmonar, apesar do fato de ser uma reoperação, o plano de dissecção entre o trombo e a parede arterial pôde ser claramente destacado e significante parte do material tromboembólico extraída. Por segurança, o ramo direito da artéria pulmonar também foi explorado, não havendo, entretanto, evidência de trombo contralateral.

Outro adjunto na prevenção da recidiva do tromboembolismo pulmonar é a colocação de filtro de veia cava, que não foi colocado na primeira operação. Entretanto, a utilização do filtro de veia cava inferior na hipertensão pulmonar tromboembólica crônica tem sido controversa.

Alguns autores recomendam o uso do filtro para prevenir a recorrência de tromboembolismo pulmonar na evolução em longo prazo e durante o período perioperatório, de maior risco.(1,7) Todavia, outros especialistas receiam que a utilização do filtro possa aumentar a incidência de embolismo pulmonar e crêem que a anticoagulação somente é suficiente para evitar a recorrência deste evento.(8-10)

A experiência adquirida neste caso, assim como as recomendações das diretrizes nacionais e internacionais, ressalta bem a necessidade do uso contínuo por toda a vida do anticoagulante oral, assim como a manutenção dos níveis da anticoagulação dentro dos limites seguros preconizados.

A evolução pós-operatória foi surpreendente pela ausência de complicações e rápida recuperação, mas este fato reforça que o tratamento cirúrgico desta condição grave pode ser realizado com segurança e bom resultado.

Em conclusão, a reoperação de tromboendarterectomia pulmonar em recidiva de tromboembolismo pulmonar crônico pode ser realizada com risco cirúrgico aceitável, proporcionando melhora funcional e sintomática em longo prazo.

Referências

1. Genta PR, Jatene FB, Terra-Filho M. Quality of life before and after pulmonary thromboendarterectomy: Preliminary results. J Bras Pneumol. 2005;31(1):48-51.

2. Dartevelle P, Fadel E, Mussot S, Chapelier A, Hervé P, de Perrot M, et al. Chronic thromboembolic pulmonary hypertension. Eur Respir J. 2004;23(4):637-48.

3. Mo M, Kapelanski DP, Mitruka SN, Auger WR, Fedullo PF, Channick RN, et al. Reoperative pulmonary thromboendarterectomy. Ann Thorac Surg. 1999;68 (5):1770-6; discussion 1776-7.

4. Pengo V, Lensing AW, Prins MH, Marchiori A, Davidson BL, Tiozzo F, et al. Incidence of chronic thromboembolic pulmonary hypertension after pulmonary embolism. N Engl J Med. 2004;350(22):2257-64.

5. Riedel M, Stanek V, Widimsky J, Prerovsky I. Long-term follow-up of patients with pulmonary thromboembolism. Late prognosis and evolution of hemodynamic and respiratory data. Chest. 1982;81(2):151-8.

6. Tscholl D, Langer F, Wendler O, Wilkens H, Georg T, Schäfers HJ. Pulmonary thromboendarterectomy--risk factors for early survival and hemodynamic improvement. Eur J Cardiothorac Surg. 2001;19(6):771-6.

7. Thistlethwaite PA, Jamieson SW. Pulmonary thromboendarterectomy. Ann Thorac Surg. 2004;78 (2):746-7.

8. Guidelines on diagnosis and management of acute pulmonary embolism. Task Force on Pulmonary Embolism, European Society of Cardiology. Eur Heart J. 2000;21(16):1301-36.

9. Peacock A, Simonneau G, Rubin L. Controversies, uncertainties and future research on the treatment of chronic thromboembolic pulmonary hypertension. Proc Am Thorac Soc. 2006;3(7):608-14.

10. Chiou AC, Biggs KL, Matsumura JS. Vena cava filters: why, when, what, how? Perspect Vasc Surg Endovasc Ther. 2005;17(4):329-39.


Sobre os autores
Walter José Gomes
Professor Associado. Disciplina de Cirurgia Cardiovascular, Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.
Carlos Jogi Imaeda
Médico Assistente. Disciplina de Cirurgia Torácica, Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.
Petrúcio Abrantes Sarmento
Médico Assistente. Disciplina de Cirurgia Torácica, Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.
Rodrigo Caetano Souza
Médico Assistente. Disciplina de Cirurgia Torácica, Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.
João Alessio Perfeito
Professor Adjunto. Disciplina de Cirurgia Torácica, Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.
Vicente Forte
Professor Adjunto. Disciplina de Cirurgia Torácica, Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.


Trabalho realizado no Serviço de Cirurgia Torácica e Pneumologia do Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.
Endereço para correspondência: Walter José Gomes. Rua Borges Lagoa, 1080, Conjunto 608, CEP 04038-002, São Paulo, SP, Brasil.
Tel 55 11 5572-6309. Fax 55 11 5572-6309. Email: wjgomes.dcir@epm.br
Apoio financeiro: Nenhum.
Recebido para publicação em 31/1/2008. Aprovado, após revisão, em 5/5/2008.

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