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Artigo Original

Atualização do tratamento das vasculites associadas a anticorpo anticitoplasma de neutrófilos

Treatment of antineutrophil cytoplasmic antibody-associated vasculitis: update

Alfredo Nicodemos Cruz Santana, Viktoria Woronik, Ari Stiel Radu Halpern, Carmen S V Barbas

ABSTRACT

In its various forms, antineutrophil cytoplasmic antibody (ANCA)-associated vasculitis (AAV) is characterized by a systemic inflammation of the small and medium-sized arteries (especially in the upper and lower respiratory tracts, as well as in the kidneys). The forms of AAV comprise Wegener's granulomatosis (now called granulomatosis with polyangiitis), microscopic polyangiitis, renal AAV, and Churg-Strauss syndrome. In this paper, we discuss the phases of AAV treatment, including the induction phase (with cyclophosphamide or rituximab) and the maintenance phase (with azathioprine, methotrexate, or rituximab). We also discuss how to handle patients who are refractory to cyclophosphamide.

Keywords: Anti-neutrophil cytoplasmic antibody-associated vasculitis; Wegener granulomatosis; Antibodies, antineutrophil cytoplasmic.

RESUMO

As vasculites antineutrophil cytoplasmic antibody (ANCA, anticorpo anticitoplasma de neutrófilos) associadas (VAAs) são caracterizadas por uma inflamação sistêmica das artérias de pequeno e médio calibre (especialmente no trato respiratório superior e inferior, e nos rins). As VAAs compreendem a granulomatose de Wegener (agora chamada de granulomatose com poliangeíte), poliangeíte microscópica, VAA limitada ao rim e a síndrome de Churg-Strauss. Neste artigo, discutiremos as fases de tratamento dessas vasculites, como fase de indução (com ciclofosfamida ou rituximab) e fase de manutenção (com azatioprina, metotrexato ou rituximab). Além disso, discutiremos como manusear os casos refratários à ciclofosfamida.

Palavras-chave: Vasculite associada a anticorpo anticitoplasma de neutrófilos; Granulomatose de Wegener; Anticorpos anticitoplasma de neutrófilos.

Introdução

As vasculites active antineutrophil cytoplasmic antibody (ANCA, anticorpo anticitoplasma de neutrófilos) associadas (VAAs) são caracterizadas por uma inflamação sistêmica das artérias de pequeno e médio calibre. Tal inflamação acontece principalmente no trato respiratório superior e inferior e nos rins (glomerulonefrite necrosante pauci-imune; Figura 1). As VAAs compreendem a granulomatose de Wegener (GW) - agora chamada de granulomatose com poliangeíte - poliangeíte microscópica (PAM), VAA limitada ao rim e síndrome de Churg-Strauss.(1-6) Entretanto, no presente artigo, não será discutida a síndrome de Churg-Strauss, por essa ser uma doença que geralmente não necessita de imunossupressão mais intensa.(7)





Na década de 1980, foi descoberta a relação dessas vasculites com a presença de ANCA no soro. A presença de um marcador sérico comum, bem como a boa resposta dessas patologias ao uso da ciclofosfamida, levou alguns autores a classificarem em conjunto esse grupo de vasculites sistêmicas. Ainda assim, é importante ressaltar que nem toda VAA apresenta esse marcador e nem todo paciente com resultado ANCA positivo é portador de vasculite.(8)

A técnica inicial para o estudo de ANCA é a imunofluorescência. Por esse método, podemos observar dois padrões particularmente relacionados com a presença de vasculite clinicamente evidente: cytoplasmic ANCA (c-ANCA, padrão citoplasmático), presente em 80% das GW e em 30% das PAM), e perinuclear ANCA (p-ANCA, padrão perinuclear), presente em 10% das GW e em 60% das PAM. O padrão citoplasmático geralmente corresponde à existência de anticorpos contra a proteinase-3 que podem ser detectados com maior sensibilidade por ELISA. Essa associação é altamente específica para esse tipo de vasculite, em especial, GW. Já a imunofluorescência de p-ANCA é inespecífica, geralmente corresponde a anticorpos contra mieloperioxidase por ELISA e pode ocorrer em diversas situações não relacionadas com vasculites sistêmicas, podendo representar a existência de anticorpos contra diferentes antígenos intracelulares. A presença de anticorpos contra a mieloperoxidase, que também pode ser detectada por ELISA, está particularmente relacionada com VAA, particularmente, PAM. O teste ELISA (específico para antiproteinase 3 ou antimieloperoxidase) é mais sensível que o teste de imunofluorescência. O ELISA é particularmente útil nos casos de resultados duvidosos de imunofluorescência, naqueles com padrão de imunofluorescência atípicos ou em casos de p-ANCA nos quais se deseja estabelecer a relação com a presença de anticorpos antimieloperoxidase (especialmente em situações clínicas duvidosas). No entanto, não existe ainda uma padronização quanto à técnica de ELISA a ser utilizada, ao contrário do teste de imunofluorescência, já padronizado internacionalmente. Por esse motivo, a pesquisa desses anticorpos deve sempre ser realizada por imunofluorescência, cabendo a pesquisa por ELISA especialmente para casos especiais.(8)

Em relação às manifestações pulmonares nas VAAs, elas acontecem especialmente na GW. Em uma série brasileira, com um viés de ter sido originada de um serviço de pneumologia, entre 98 pacientes com GW, com idade média de 48 ± 15 anos, o acometimento pulmonar esteve presente em 98% dos casos, caracterizado por nódulos pulmonares (cavitados ou não), massas (cavitadas ou não), consolidações pulmonares, padrão de vidro fosco (geralmente associado a hemorragia alveolar), lesão de vias aéreas inferiores (estenose subglótica, estenose traqueal, estenose brônquica, entre outras).(9) Além disso, 95% dos pacientes apresentavam acometimento de seios da face e, em 90% desses, o ANCA era positivo. Na PAM, o acometimento pulmonar é muito menos frequente que na GW e é geralmente caracterizado por áreas em vidro fosco (compatível com hemorragia alveolar) ou acometimento intersticial (compatível com fibrose pulmonar; Tabela 1, Figura 2).(9)







A segunda manifestação mais frequente entre as VAAs é a renal, que se apresenta como glomerulonefrite necrosante com formação de crescentes e com pobreza de expressão de imunoglobulinas (pauci-imune). Além disso, há deposição de fibrina e de trombos no glomérulo, havendo relatos esporádicos, na década de 1970, de reversão da insuficiência renal na VAA com o uso de anticoagulação.(10) O achado de necrose tubular aguda também é muito comum.

Recentemente, foi proposta uma nova classificação do acometimento glomerular nas VAAs, com capacidade de predizer a sobrevida renal, sendo subdividida em quatro classes:

 Classe 1 - Glomerulonefrite focal: 50% ou mais dos glomérulos são normais (ou seja, sem lesão vasculítica, sem esclerose global, mas pode haver alterações isquêmicas leves ou infiltração inflamatória mínima)
 Classe 2 - Glomerulonefrite crescêntica: 50% ou mais dos glomérulos têm crescentes (celulares ou fibróticas)
 Classe 3 - Glomerulonefrite mista: menos de 50% dos glomérulos são normais; menos de 50% dos glomérulos têm crescentes; menos de 50% dos glomérulos são globalmente esclerosados
 Classe 4 - Glomerulonefrite esclerosante: 50% ou mais dos glomérulos são globalmente esclerosados

Tal classificação foi validada em biópsias renais de 100 pacientes com pelo menos um ano de seguimento clínico e mostrou uma frequência maior de insuficiência renal crônica terminal entre as classes 3 e 4, quando comparadas às classes 1 e 2. Vale lembrar que as classes 2, 3 e 4 não se diferenciaram quanto à função renal de entrada, mas a classe 2 apresentou maior ganho de função ao longo da evolução. É importante lembrar também que no primeiro ano de seguimento, essas três últimas classes apresentaram alta mortalidade (25-39%).(11)

Visão geral do tratamento

História

Desde a descrição dessa nova doença por Wegener, em 1936, a VAA caracterizava-se por uma alta letalidade, com sobrevida de apenas 10% em um ano. Entretanto, na década de 1970, iniciou-se o uso da ciclofosfamida, o que resultou em uma mudança drástica na sobrevida dessa doença.(12) Atualmente, a sobrevida em cinco anos é de 70-90%, inclusive em uma série brasileira.(9) Entretanto, o uso estendido de ciclofosfamida (por no mínimo 18 meses) está associado ao aumento de risco de cistite hemorrágica, câncer de bexiga, leucemias e linfomas. Assim, passou-se a definir o tratamento em fase de indução (retirar o paciente da inflamação da vasculite), utilizando ciclofosfamida, e tratamento em fase de manutenção (manter o paciente fora da inflamação da vasculite), que é idealmente realizado com uma droga menos tóxica que ciclofosfamida.(13-20)

Além do problema da fase de manutenção, existe o risco de recidiva de doença (com indicação de utilização de ciclofosfamida novamente para o tratamento da inflamação da vasculite, com consequente aumento dos riscos inerentes a seu uso, pelo uso repetido da droga) e da ocorrência de doença refratária a ciclofosfamida (o paciente mantém-se com inflamação apesar da medicação).(15)

Nos tópicos a seguir serão discutidas especificamente as fases do tratamento da VAA: indução, manutenção, tratamento de recidiva da VAA e tratamento da VAA refratária a ciclofosfamida.

Fase de indução

As principais medicações usadas na fase de indução são ciclofosfamida, metotrexato, plasmaférese, pulso de metilprednisolona e/ou rituximab. O micofenolato de mofetil (MMF) também pode ser usado na fase de indução; porém, tem uma eficácia inferior à da ciclofosfamida e à de rituximab, sendo assim considerada uma droga de segunda linha.(13)

Na fase de indução, utiliza-se a associação ciclofosfamida (2 mg  kg−1  dia−1) e prednisona (1 mg  kg−1  dia−1). Deve-se usar a ciclofosfamida até 1-2 meses após conseguir a remissão da VAA, o que geralmente equivale a aproximadamente 3-9 meses de tratamento. Define-se ausência de inflamação na VAA com resultados de urina tipo 1 (elementos anormais e sedimentos) sem hematúria glomerular e ausência de lesão pulmonar ativa.(21)

Em relação à prednisona, geralmente após 1 mês de uso na dose de 1 mg  kg−1  dia−1, o paciente começa a apresentar sinais de melhora da inflamação, podendo-se, a partir desse ponto, reduzir a dose na velocidade de 2,5 mg/semana. Alguns autores recomendam suspender o uso de prednisona com 6 meses de tratamento se houver controle da vasculite, enquanto outros sugerem utilizar continuamente prednisona na dose de 5-10 mg/dia, pois talvez isso reduza o risco de recidiva da VAA.(13,14) Optamos por manter a dose de 5-10 mg/dia continuamente.

Quanto ao uso de pulso de metilprednisolona (500-1.000 mg/dia por 3 dias) na fase de indução, seu uso está indicado nos casos de VAA associados à insuficiência renal aguda ou à hemorragia alveolar difusa (HAD), caracterizada pela tríade de infiltrado pulmonar novo, piora da SpO2 e queda da hemoglobina.(13)

Ainda se pode usar a plasmaférese na fase de indução da VAA. O seu uso foi avaliado em um estudo prospectivo, randomizado, envolvendo 137 pacientes com creatinina sérica ≥ 5,8 mg/dL. Todos os pacientes receberam ciclofosfamida oral mais prednisona. Parte dos pacientes recebeu também plasmaférese (sete sessões de plasmaférese em 14 dias), enquanto outra parte não recebeu plasmaférese. O resultado do estudo foi que a plasmaférese reduziu o risco de insuficiência renal crônica dialítica em 3 meses (de 51% para 31%), sem aumento de efeitos adversos. A plasmaférese também é associada a ciclofosfamida + prednisona nos casos de HAD grave (PaO2/FiO2 < 200-300). Deve-se lembrar de realizar a reposição de plasma no final da plasmaférese nos casos de HAD grave ou nos casos de biópsia ou de manipulação cirúrgica recente.(22)

Resumindo, nos casos de VAA com HAD grave ou com insuficiência renal agudo (creatinina sérica ≥ 5,8 mg/dL), deve-se utilizar a associação ciclofosfamida, prednisona, pulsoterapia de metilprednisolona e plasmaférese.

Outra importante droga na fase de indução, que pode substituir ciclofosfamida, é rituximab. Em um estudo prospectivo e randomizado com 197 pacientes com VAA, sendo 49% com diagnóstico recente de VAA (virgens de tratamento) e 51% com recidiva da VAA (com tratamento prévio), utilizou-se rituximab na dose 375 mg/m2 de área corporal (1 vez por semana, durante 4 semanas) associado a pulsoterapia de metilprednisolona (1 dose) e prednisona (1 mg  kg−1  dia−1) em um grupo de pacientes, comparando-se a outro grupo onde foi usada a combinação de ciclofosfamida (2 mg  kg−1  dia−1) com prednisona (1 mg  kg−1  dia−1).(23) O resultado do estudo demonstrou que rituximab foi similar a ciclofosfamida nos pacientes com VAA com diagnóstico recente e que o sucesso com o uso de rituximab foi superior àquele com o uso de ciclofosfamida nos pacientes com recidiva da VAA. Os efeitos adversos foram semelhantes nos dois grupos.(23) Assim, caso esses resultados sejam confirmados em estudos futuros, rituximab passa a ser uma excelente opção no lugar de ciclofosfamida na fase de indução nos pacientes com VAA recém-diagnosticada, e pode ser a primeira opção na fase de indução em pacientes com recidiva da VAA.

O rituximab é um anticorpo monoclonal anti-CD20 (linfócito B) quimérico, ou seja, determina a eliminação dos linfócitos B CD20+, com o potencial efeito de controle de inflamação da VAA. O uso de rituximab pode determinar alguns efeitos adversos, como febre, calafrios, reações alérgicas e choque anafilático. Para minimizá-los, deve-se fazer uma pré-medicação com paracetamol (750 mg), ranitidina (50 mg), difenidramina (uma ampola) e metilprednisolona (100 mg). O rituximab deve ser diluído em soro fisiológico 0,9% para se obter uma concentração < 4 mg de rituximab/mL de soro fisiológico 0,9%. Deve-se iniciar a infusão de rituximab a 50 mg/h, aumentando-a em 50 mg/h a cada 30 min, até chegar a 400 mg/h. No mês de uso de rituximab, deve-se fazer a profilaxia de pneumocistose. As contraindicações ao seu uso são ter alergia ao medicamento, ter leucócitos abaixo de 1.000-3.000 mm3, ter infecção ativa e estar em gestação. Os efeitos adversos mais graves associados a seu uso são hipotensão leve, febre, leucopenia, plaquetopenia, arritmia grave, congestão grave e síndrome de Stevens-Johnson.(23)

Finalmente, o metotrexato também pode ser usado na fase de indução. Sua dose inicial é 0,2 mg/kg por semana (máximo de 15 mg/semana), aumentando-se 2,5 mg/semana até o máximo de 25 mg/semana, se o paciente tolerar (dosagem de transaminases/bilirrubinas abaixo de 3 vezes o valor normal e leucócitos acima de 3.000-4.000 mm3). Entretanto, o metotrexato só pode ser usado na fase de indução em casos de VAA com atividade/inflamação leve (sem HAD e sem glomerulonefrite), com clearance de creatinina superior a 50 mg/dL. Além disso, deve-se ter atenção especial em sua associação com sulfametoxazol/trimetoprima (pelo risco de anemia, leucopenia e/ou plaquetopenia). Deve ser administrado folato (1 mg/dia) a todo paciente utilizando metotrexato.(13,24,25)

Fase de manutenção

A fase de manutenção inicia-se de 1-2 meses após a remissão da inflamação da VAA. A principal droga usada nesta fase é a azatioprina, na dose de 2 mg  kg−1  dia−1, geralmente por 12 meses, substituindo a ciclofosfamida usada na fase de indução. Sua utilização é baseada em um estudo prospectivo e randomizado com 155 pacientes com VAA, no qual foi comparado o uso de azatioprina e ciclofosfamida após a remissão da vasculite. Naquele ensaio, a recidiva da inflamação na VAA foi similar com o uso de azatioprina e de ciclofosfamida, com efeitos adversos aceitáveis.(21)

Outro ponto discutido mais recentemente foi a duração da fase de manutenção, até então estabelecida por 1 ano. Como o risco de recidiva da VAA pode ser de até 4,3% ao mês, e como a recidiva implica novo uso de ciclofosfamida (com seus possíveis efeitos adversos graves), alguns autores já sugerem o uso de azatioprina por 2 anos, 3 anos ou até indefinidamente. Os fatores associados com a recidiva da VAA são resultados ANCA-PR3 positivo, lesão de vias aéreas superiores, acometimento pulmonar e recidiva prévia da VAA. Quanto maior for o número de fatores de risco, maior será a propensão ao uso por tempo indeterminado de azatioprina, no seguinte esquema: 2 mg  kg−1  dia−1 no primeiro ano, 1,5 mg  kg−1  dia−1 no segundo ano e 1 mg  kg−1  dia−1 indefinidamente.(13,14)

Outra medicação também usada na fase de manutenção é metotrexato (na dose máxima de 20-25 mg/semana). O tempo mínimo de uso de metotrexato na fase de manutenção é de 24 meses (ao contrário do mínimo de 12 meses para azatioprina). Em relação ao uso de metotrexato nessa fase, o clearance de creatinina deve ser superior a 50 mg/dL e não pode haver glomerulonefrite prévia. Deve-se fazer a associação de folato (1 mg/dia).(13,14,26)

Em pacientes que não apresentarem uma boa resposta ao uso de azatioprina ou de metotrexato na fase de manutenção, deve-se tentar MMF (1.000-3.000 mg/dia) ou rituximab (375 mg/m2 de área corporal, 1 vez por semana, durante 4 semanas, a cada 6 meses).(14)

Fase de tratamento de recidiva da VAA

A recidiva é caracterizada pelo surgimento de hematúria glomerular, acometimento pulmonar ou ocular, sinusite, neurite, lesão cutânea, entre outros. Em casos de recidiva leve (Tabela 2), em pacientes em fase de manutenção, deve-se aumentar a dose de manutenção (corticoide + imunossupressor: azatioprina ou metotrexato). Na recidiva leve após a suspensão da fase de manutenção, deve-se retornar à fase de manutenção, sem necessidade de usar novamente a fase de indução.(13,14)




Por outro lado, na recidiva grave, é sempre necessário realizar novamente a fase de indução. Se a recidiva grave ocorre em pacientes na fase de manutenção, deve-se fazer uma nova fase de indução (ciclofosfamida ou rituximab, preferindo rituximab se o paciente já usou dois ciclos prévios de ciclofosfamida); após conseguir atingir a remissão da vasculite, faz-se a fase de manutenção com uma droga diferente da utilizada na fase de manutenção prévia (se usou azatioprina antes, considerar metotrexato, MMF ou rituximab). Em caso de recidiva grave após a suspensão da fase de manutenção, deve-se fazer uma nova fase de indução (ciclofosfamida ou rituximab, com preferência para rituximab se tiver havido dois ciclos prévios de ciclofosfamida) e, após conseguir a remissão da vasculite, faz-se a fase de manutenção com a mesma droga usada na fase de manutenção prévia (porém, manter a fase de manutenção por no mínimo 24 meses, ou até indefinidamente: ver tópico "fase de manutenção").(13,14)

Fase de tratamento da VAA refratária a ciclofosfamida

Essa fase acontece se a vasculite se mantém ativa depois de 1-2 meses de uso de ciclofosfamida, ou seja, quando há persistência de hematúria glomerular com piora dos níveis de creatinina, persistência da atividade pulmonar, ocular, cutânea ou outras. É fundamental não confundir refratariedade à ciclofosfamida com infecção (especialmente em seios de face e pulmão), má adesão ao tratamento (especialmente em quem usa ciclofosfamida por via oral) e toxicidade medicamentosa. Os fatores de risco para refratariedade à ciclofosfamida são ser do sexo feminino, ter idade acima de 65 anos e apresentar creatinina inicial acima de 5 mg/dL.(15)

Nos casos refratários, a primeira opção é rituximab (375 mg/m2, uma vez por semana, durante 4 semanas), sendo a segunda opção MMF (500-1.500 mg, duas vezes ao dia). O beneficio de rituximab em casos refratários a ciclofosfamida foi relatado em um estudo retrospectivo, envolvendo quatro centros no Reino Unido e 65 pacientes com VAA, com idade variando de 7 a 77 anos. Naquele estudo, foi usado rituximab (geralmente na dose de 375 mg/m2, uma vez por semana, durante 4 semanas), com seguimento clínico de 6-55 meses. A taxa de remissão de VAA foi de 98%, acontecendo depois de 1-5 meses após a infusão do rituximab. A recidiva da VAA aconteceu em 57% dos pacientes (geralmente 4-37 meses após a infusão). Nos pacientes com recidiva, uma nova remissão da vasculite foi conseguida com uma nova infusão de rituximab em 84% das vezes. Vale mencionar que em um dos centros, 15 pacientes com VAA refratária à ciclofosfamida foram tratados com infusão rotineira de rituximab a cada 6 meses, não se observando recidiva, o que demonstra uma excelente perspectiva do uso de rituximab como droga nas fases de indução e de manutenção até mesmo em pacientes com VAA refratária à ciclofosfamida (Tabela 3).(27)





Referências

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* Trabalho realizado no Serviço de Doenças Torácicas, Hospital Regional da Asa Norte - HRAN - Escola Superior de Ciências da
Saúde/Secretaria de Estado da Saúde - ESCS/SES - Brasília (DF) Brasil.
Endereço para correspondência: Alfredo Nicodemos Cruz Santana, SQS 213, Bloco E, apto. 204, Asa Sul, CEP 70292-050, Brasília,
DF, Brasil.
Tel. 55 61 9828-0161. E-mail: alfredonicodemos@hotmail.com
Apoio financeiro: Nenhum.
Recebido para publicação em 17/06/2011. Aprovado, após revisão, em 11/7/2011.


Sobre os autores

Alfredo Nicodemos Cruz Santana
Médico Assistente Doutor da Unidade Torácica. Hospital Regional da Asa Norte - HRAN - Escola Superior de Ciências da Saúde/Secretaria de Estado da Saúde - ESCS/SES - Brasília (DF) Brasil

Viktoria Woronik
Médica Assistente da Nefrologia. Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - HCFMUSP - São Paulo (SP) Brasil.

Ari Stiel Radu Halpern
Médico Assistente da Reumatologia. Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - HCFMUSP - São Paulo (SP) Brasil.

Carmen S V Barbas
Professora Livre-Docente de Pneumologia. Instituto do Coração, Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - InCor/HCFMUSP - São Paulo (SP) Brasil



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