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Estudo sobre Asma Grave na América Latina e Espanha (1994-2004): características dos pacientes hospitalizados com asma aguda grave

The study of severe asthma in Latin America and Spain (1994-2004): characteristics of patients hospitalized with acute severe asthma

Gustavo Javier Rodrigo, Vicente Plaza, Jesús Bellido-Casado, Hugo Neffen, María Teresa Bazús, Gur Levy, Joseph Armengol

ABSTRACT

Objective: Studies assessing the characteristics and management of patients hospitalized with asthma have been limited to a small number of facilities and have evaluated short time periods. The present study evaluated long-term changes among hospitalized asthma patients at a large number of facilities. Methods: This was a retrospective, hospital-based observational case series, designated the Study of Severe Asthma in Latin America and Spain, which was conducted in Spain and in eight Latin-American countries. We reviewed the hospital records of 3,038 patients (age range, 15-69 years) hospitalized with acute severe asthma at one of nineteen tertiary-care hospitals in 1994, 1999 and 2004. Results: Over time, the use of inhaled corticosteroids and long-acting β2 agonists increased significantly, whereas the use of theophylline as a controller medication decreased. The utilization of pulmonary function tests also increased. There was a significant reduction in the mean hospital stay (8.5 days, 7.4 days and 7.1 days in 1994, 1999 and 2004, respectively, p = 0.0001) and a significant increase in the mean of the lowest arterial pH at hospital admission. In contrast, there was a significant decrease in the proportion of cases in which PEF was determined in the emergency room (48.6% in 1994 vs. 43.5% in 2004, p = 0.0001). We found the quality of asthma management and care to be generally better in Spain than in Latin America. Conclusions: Although there have been certain improvements in the management of asthma between severe exacerbations and during hospitalization, asthma management remains suboptimal in Spain and, especially, in Latin America.

Keywords: Status asthmaticus; Asthma/therapy; Hospitalization.

RESUMO

Objetivo: Estudos que avaliem as características e o gerenciamento de pacientes asmáticos hospitalizados têm sido limitados a um número pequeno de serviços e a curtos períodos de duração. O presente estudo avaliou alterações de longo prazo de pacientes asmáticos hospitalizados em um grande número de serviços. Métodos: Estudo retrospectivo, observacional, de base hospitalar, denominado Estudo sobre Asma Grave na América Latina e Espanha, realizado na Espanha e em oito países da América Latina. Foi realizada uma revisão dos registros hospitalares de 3.038 pacientes (variação de idade, 15-69 anos) hospitalizados com asma aguda grave em um dos 19 hospitais terciários em 1994, 1999 e 2004. Resultados: Ao longo do tempo, o uso de corticosteroides inalatórios e de β2-agonistas aumentou significativamente, ao passo que o uso de teofilina, como medicação de controle, decaiu. A utilização de testes de função pulmonar também aumentou. Houve uma redução significativa da média do tempo de internação (8,5 dias, 7,4 dias e 7,1 dias em 1994, 1999 e 2004, respectivamente; p = 0,0001) e um aumento significativo da média do menor pH arterial na admissão. Em contrapartida, houve uma diminuição significativa na proporção de casos submetidos ao PFE no pronto-socorro (48,6% em 1994 vs. 43,5% em 2004; p = 0,0001). O tratamento e o gerenciamento da asma foram, de forma geral, melhores na Espanha que na América Latina. Conclusões: Embora tenha havido avanços no gerenciamento da asma entre exacerbações graves e durante a hospitalização, esse gerenciamento continua subotimizado na Espanha e, em especial, na América Latina.

Palavras-chave: Estado asmático; Asma/terapia; Hospitalização.

Introdução

A asma é uma das doenças crônicas mais comuns em todo o mundo.(1) Nos Estados Unidos, ela é responsável por mais de 1,5 milhão de visitas ao pronto-socorro, por aproximadamente 500.000 hospitalizações e por quase 5.000 mortes por ano.(2) Na última década, houve vários avanços no diagnóstico e tratamento da asma. A ênfase mudou para a educação do paciente, as medidas objetivas do grau de obstrução brônquica e o uso de corticosteroides inalatórios para a prevenção das exacerbações.(3) Apesar desses avanços, muitos autores relatam subutilização de corticosteroides inalatórios e avaliação inadequada da obstrução das vias aéreas.(4) Entretanto, há poucos estudos avaliando as mudanças no gerenciamento da asma ao longo do tempo. Em geral, tais estudos avaliam casos ao longo de curtos períodos de tempo e são limitados em seu escopo: são realizados em serviços individuais, limitam-se a um pequeno número de serviços ou restringem-se a zonas urbanas prescritas.(5-8) Em virtude dessa falta de informação, realizamos um estudo para avaliar as modificações nas características de pacientes hospitalizados com asma aguda grave ao longo de um período de dez anos (1994-2004) na Espanha e em oito países da América Latina.

Métodos

Este projeto, denominado Estudio del Asma Grave en Latinoamérica y España (EAGLE, Estudo sobre Asma Grave na América Latina e Espanha), foi promovido pelos respectivos setores de asma da Sociedade Espanhola de Pneumologia e Cirurgia Torácica e da Associação Latino-Americana de Tórax. A amostra do estudo incluiu todas as internações hospitalares (> 48 h) por asma aguda grave em dezenove hospitais terciários da Espanha (nove serviços) e da América Latina (dez serviços) ocorridas em 1994, 1999 e 2004. A elegibilidade dos hospitais, em todos os três anos selecionados, baseou-se na existência de mais de 200 leitos, um pronto-socorro ativo e uma unidade de terapia intensiva (UTI) em funcionamento. Foram identificados e revisados retrospectivamente todos os registros hospitalares dos pacientes entre 15 e 69 anos de idade admitidos com diagnóstico principal de asma aguda, conforme definido na nona e décima revisões da Classificação Internacional de Doenças (códigos 493.01 e J45; J46, respectivamente).

Os comitês de ética locais aprovaram o delineamento do estudo. A análise restringiu-se à última admissão de cada paciente em cada ano.

Realizou-se uma revisão detalhada dos registros para a coleta dos seguintes dados: idade; sexo; mês e ano da admissão; uso de corticosteroides inalatórios e de β2-agonistas de longa duração; uso de teofilina como medicação de controle; dose de corticosteroides inalatórios (microgramas de beclometasona ou equivalente); gravidade da asma, de acordo com os critérios da Global Initiative for Asthma(1); medidas de alergenicidade (teste cutâneo de puntura, teste radioalergoabsorvente ou outros); testes de função pulmonar anteriores; hospitalizações anteriores por asma; causa provável da exacerbação; menor pH arterial na admissão; razão VEF1/PFE no pronto-socorro; admissão e tempo de permanência em UTI; tempo total de internação hospitalar; parada cardiorrespiratória; intubação/ventilação mecânica durante a hospitalização; tempo de intubação/ventilação mecânica; e mortalidade hospitalar. Para o estudo das variações sazonais do número de admissões hospitalares, as estações do ano foram definidas da seguinte forma: verão, de julho a setembro no hemisfério norte e de janeiro a março no hemisfério sul; outono, de outubro a dezembro no hemisfério norte e de abril a junho no hemisfério sul; inverno, de janeiro a março no hemisfério norte e de julho a setembro no hemisfério sul; e primavera, de abril a junho no hemisfério norte e de outubro a dezembro no hemisfério sul.

Todos os dados foram analisados utilizando-se o programa Statistical Package for the Social Sciences, versão 12.0 para Windows (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA). Para as variáveis contínuas, os valores foram expressos em média ± desvio-padrão. As diferenças entre os grupos foram avaliadas utilizando-se o teste ANOVA (one-way ou two-way). Para as variáveis categóricas, o teste do qui-quadrado com correção de Yates ou o teste exato de Fisher foi utilizado. Todos os testes estatísticos foram bicaudais, e os valores de p < 0,05 foram considerados significativos. Fórmulas padronizadas foram utilizadas para se calcular os IC95%.

Resultados

Um total de 3.038 pacientes asmáticos (37,5% entre 15 e 34 anos de idade; 32,5% entre 35 e 55 anos de idade; e 30,0% entre 56 e 69 anos de idade) preencheu os critérios de inclusão e foi avaliado (Tabela 1). Muitos dos pacientes apresentavam exacerbações graves, com risco de morte (PFE, 30-50% do previsto em 49,2% da amostra).



Na análise dos dados coletados na admissão (estratificados por ano), observou-se que, nos anos avaliados, houve um aumento significativo da idade, da proporção de pacientes do sexo feminino (72% em 2004) e da gravidade da asma (Tabela 2). A maioria dos pacientes apresentou asma persistente (moderada ou grave). Mais de 50% dos pacientes haviam sido hospitalizados anteriormente por exacerbação da asma. Embora baixo, o uso total de corticosteroides inalatórios e de β2-agonistas de longa duração aumentou ao longo dos dez anos de estudo, ao passo que o uso de teofilina diminuiu no mesmo período. Observou-se que o uso de corticosteroides inalatórios apresentou uma correlação significativa com a gravidade da asma (p = 0,001). Finalmente, houve um discreto aumento na proporção de pacientes que relataram ter sido submetidos a testes de função pulmonar, e apenas alguns pacientes relataram ter sido
submetidos a testes alérgicos.



Observou-se que a maioria das hospitalizações ocorreu durante o outono e o inverno. Ao longo do estudo, houve um aumento significativo da frequência de infecções de vias aéreas superiores, bem como uma diminuição do número de casos nos quais a crise de asma havia sido desencadeada por aeroalérgenos. Além disso, a proporção de pacientes com exacerbações graves aumentou significativamente, embora tenha havido uma diminuição do número de crises com risco de morte. A média do menor pH arterial na admissão também aumentou significativamente nos anos avaliados. Além do mais, observou-se que a proporção de casos submetidos ao PFE no pronto-socorro diminuiu significativamente (de 33,3% em 1994 para 26,1% em 2004, p = 0,0001). Entretanto, também houve uma diminuição significativa da média de tempo de internação hospitalar (8,5 dias em 1994, 7,4 dias em 1999 e 7,1 dias em 2004, p = 0,0001). Não houve mudanças significativas na frequência de admissões em UTI, parada cardiorrespiratória, intubação/ventilação mecânica ou óbito hospitalar, embora tenha havido uma tendência de menor mortalidade hospitalar.

A comparação entre as hospitalizações que ocorreram na Espanha e as que ocorreram na América Latina (estratificadas por ano) mostrou que os pacientes hospitalizados na América Latina eram mais jovens e mais freqüentemente tinham asma moderada ou grave. Como se pode ver na Tabela 3, a proporção de pacientes que utilizavam corticosteroides inalatórios foi significativamente menor entre os hospitalizados na América Latina que entre os hospitalizados na Espanha (26,3% vs. 56,4% in 2004, p = 0,0001), da mesma forma que a proporção dos que utilizavam β2-agonistas de longa duração (10,1% vs. 43,3% em 2004, p = 0,0001). Entretanto, a proporção de pacientes que utilizavam teofilina com medicação de controle foi significativamente maior entre os hospitalizados na América Latina (17,4% vs. 6,6% em 2004, p = 0,0001). As infecções de vias aéreas superiores foram menos frequentemente a causa da exacerbação da asma entre os pacientes hospitalizados na América Latina que entre os hospitalizados na Espanha, e o número de admissões hospitalares durante os meses do verão foi menor entre estes. As medidas de alergenicidade também foram empregadas menos frequentemente na América Latina. Adicionalmente, os pacientes hospitalizados na América Latina apresentaram maiores taxas de admissão hospitalar anterior e de intubação/ventilação mecânica.
Contudo, a determinação do PFE no pronto-socorro foi empregada mais frequentemente nos hospitais da América Latina, embora não tenha havido diferenças no PFE em percentual do previsto.



Os pacientes hospitalizados na Espanha foram submetidos a testes de função pulmonar mais frequentemente que os hospitalizados na América Latina. Ao longo do período de estudo, os pacientes hospitalizados na Espanha também apresentaram um aumento da média de menor pH arterial na admissão, uma redução significativa do tempo de internação hospitalar e uma diminuição significativa da frequência de admissões em UTI. Independentemente do grau de gravidade da asma, a proporção de pacientes que recebiam corticosteroides inalatórios foi maior entre os hospitalizados na Espanha que entre os hospitalizados na América Latina. Entretanto, não houve diferenças entre os dois grupos quanto à frequência de parada cardiorrespiratória ou à taxa de mortalidade.

Dos 3.038 pacientes que foram hospitalizados durante os anos avaliados, 206 (6,8%) foram admitidos em UTI (Tabela 4). Esses pacientes, comparados aos que não foram admitidos em UTI, apresentaram maior gravidade da asma. Entre os pacientes admitidos em UTI, a proporção dos que haviam sido hospitalizados anteriormente, bem como a proporção dos que utilizavam teofilina, dos com história de pneumonia e daqueles cuja crise de asma havia sido desencadeada por aeroalérgenos, também foram maiores. Adicionalmente, as infecções de vias aéreas superiores foram menos comuns entre os pacientes admitidos em UTI. Embora a maioria das admissões em UTI tenha ocorrido durante o outono e o inverno, não houve diferença entre os pacientes admitidos em UTI e os não admitidos quanto à estação do ano na admissão. Os pacientes admitidos em UTI apresentaram maior gravidade da exacerbação (menor média de pH arterial, menor média de PFE e menor tempo de internação hospitalar), bem como maiores taxas de intubação/ventilação mecânica, parada cardiorrespiratória e óbito hospitalar.



Houve 23 óbitos hospitalares (0,8% de todos os pacientes hospitalizados) durante os três anos estudados. Como seria de se esperar, as taxas de parada cardiorrespiratória, intubação/ventilação mecânica e admissão em UTI foram maiores entre os pacientes asmáticos que morreram durante a hospitalização. Entre os pacientes admitidos em UTI, a taxa bruta de mortalidade foi de 8,3% e a taxa de mortalidade para os que sofreram parada cardiorrespiratória foi de 24,7%. A taxa de mortalidade entre os pacientes hospitalizados que foram submetidos a intubação/ventilação mecânica foi de 2,5% (Figura 1). A gravidade da asma e a frequência de exacerbações anteriores foram maiores entre os não sobreviventes. A quase totalidade (95%) dos óbitos ocorreu em pacientes do sexo feminino. Houve relação entre óbito e idade do paciente, sendo que a maioria dos óbitos relacionados à asma ocorreu em pacientes > 50 anos de idade (< 35 anos, 12%; 35-50 anos, 20%; e > 50 anos, 68%). Entre os não sobreviventes, o tempo de internação hospitalar e a proporção dos que utilizavam teofilina foram maiores. Diferentemente das admissões em UTI, o óbito hospitalar por asma apresentou variação sazonal, atingindo o pico nos meses de inverno.



Discussão

O objetivo deste estudo retrospectivo, internacional, muticêntrico foi avaliar mudanças nas características de pacientes hospitalizados por asma aguda grave durante um período de dez anos na Espanha e em oito países da América Latina. Para tanto, foi realizada uma revisão de todos os registros hospitalares dos pacientes internados em dezenove hospitais terciários em 1994, 1999 e 2004. Os dados obtidos indicam um significativo avanço geral no gerenciamento de pacientes asmáticos entre crises graves e durante as hospitalizações (em relação ao uso de medicação de controle e ao tempo de internação hospitalar).

Os pacientes com asma grave hospitalizados posteriormente no período de estudo apresentaram menor gravidade fisiológica, demonstrada pelo maior pH arterial na admissão e maior PFE em percentual do previsto no pronto-socorro. Essas tendências foram relatadas anteriormente.(5,9)

Além disso, verificou-se uma tendência de redução da mortalidade hospitalar. A taxa de mortalidade hospitalar para todos os pacientes hospitalizados durante os três anos estudados foi de 0,8% (IC95%: 0,6-1,2), o que está de acordo com estimativas anteriores de mortalidade hospitalar em hospitais individuais e em UTI, bem como com dados nacionalmente representativos.(9,10) Também houve uma redução da freqüência de parada cardiorrespiratória (2,9% em 1994, 2,7% em 1999 e 1,8% em 2004), embora a diferença não tenha sido estatisticamente significativa (p = 0,2).

Qualquer otimismo gerado pelos aparentes avanços em certos aspectos do tratamento da asma ao longo do período estudado é enfraquecido pela falta de avanços, ou até por um declínio do padrão de tratamento, em outros aspectos. Um desses aspectos é o uso da medida do PFE no pronto-socorro, o qual diminuiu significativamente. Um recente estudo retrospectivo sobre o gerenciamento de pacientes hospitalizados com asma aguda na Espanha relatou que o PFE havia sido determinado em apenas 30% dos pacientes.(11) Está bem estabelecido que as medidas de função pulmonar, como VEF1/PFE, fornecem uma avaliação objetiva da obstrução das vias aéreas e é parte integrante da avaliação da gravidade da doença (avaliação estática) e da resposta à terapia (avaliação dinâmica) em ­qualquer paciente com mais de 5 anos de idade.
(1,3,12) Isso sugere que os pacientes com asma aguda estão sendo internados e tratados, bem como recebendo alta, de forma inapropriada.

As razões para a falta de uso mais intensivo da determinação do PFE nos prontos-socorros não estão claras, embora fatores influentes incluam o congestionamento dos prontos-socorros e a fragmentação do tempo dos médicos, dois fatores que são inerentes à prática diária da medicina de emergência.(13,14) No presente estudo, outras variáveis importantes, como admissão em UTI (em 6,5%), história de hospitalizações (em 58,9%) e intubação/ventilação mecânica (em 5,3%), se mantiveram inalteradas ou tiveram uma tendência de queda ao longo dos dez anos de estudo.

Observou-se que a média de idade dos pacientes e a proporção de pacientes do sexo feminino aumentaram ao longo do período de estudo, o que está de acordo com achados anteriores,(15,16) e tem-se sugerido que as diferenças entre os sexos podem ser atribuídas a influências hormonais, embora nenhum mecanismo específico tenha sido postulado.(17) Houve uma distribuição sazonal das hospitalizações por asma, com as admissões atingindo o pico durante o outono e o inverno. Esse pico sazonal ocorreu em meses sem contagem de pólen mais elevada e apresentou tendência de correlação mais próxima com a época das viroses respiratórias.(9,18) As infecções virais do trato respiratório têm sido associadas às exacerbações da asma em crianças e adultos.(19,20) De fato, o pico sazonal observado no presente estudo relacionou-se ao aumento da freqüência de infecções de vias aéreas superiores e de pneumonia, bem como a uma diminuição da proporção de casos nos quais a crise de asma foi desencadeada por aeroalérgenos.

Quando a amostra de pacientes foi estratificada por hemisfério (Espanha vs. América Latina), certas diferenças tornaram-se evidentes. Constatou-se que os padrões de gerenciamento da asma entre exacerbações (avaliação da alergenicidade e realização de testes de função pulmonar) foram maiores na Espanha, onde o número de hospitalizações anteriores também foi menor. A proporção de pacientes que recebiam corticosteroides inalatórios e β2-agonistas de longa duração foi maior na Espanha, ao passo que a dos que utilizavam teofilina como medicação de controle foi menor. Assim, o grau de gravidade da asma foi menor entre os pacientes hospitalizados na Espanha, e esses pacientes aparentemente receberam melhor tratamento hospitalar (taxas de admissão em UTI e intubação/ventilação mecânica foram menores).

Independentemente da localização geográfica, houve uma correlação direta entre o uso de corticosteroides inalatórios e a gravidade da asma. Entretanto, um achado perturbador foi o de que o uso de drogas anti-inflamatórias entre pacientes com asma persistente moderada a grave foi baixo (≈ 20%) na América Latina, sugerindo que uma parcela considerável desses pacientes recebeu tratamento subótimo.

Observou-se que, na Espanha e na América Latina, a monitoração objetiva da asma entre exacerbações foi insuficiente. Apesar do fato de que um dos objetivos da Global Initiative for Asthma é conseguir função pulmonar normal ou próxima do normal,(1) testes de função pulmonar haviam sido realizados anteriormente em apenas 51,8% dos pacientes hospitalizados na Espanha e em apenas 35,5% dos pacientes hospitalizados na América Latina. Esses dados estão de acordo com os obtidos em estudos anteriores realizados na Europa e na América Latina.(21,22)

Nossos dados sobre admissões em UTI e óbitos hospitalares são compatíveis com achados anteriores.(7) No presente estudo, 6,7% de todos os pacientes asmáticos hospitalizados necessitaram de cuidados em UTI, e a taxa de mortalidade entre os pacientes admitidos em UTI foi de 8,3%. Poucos pacientes foram submetidos a intubação/ventilação mecânica, e a taxa de mortalidade entre esses pacientes foi baixa (2,5%).

Da mesma forma, vários estudos realizados nas últimas duas décadas relatam taxas de mortalidade que variam de 0% a 6%.(23-25) Por outro lado, a mortalidade foi significativamente maior entre os pacientes que sofreram parada cardiorrespiratória (24,7%). Os óbitos ocorreram quase que exclusivamente em pacientes asmáticos do sexo feminino e em pacientes > 55 anos de idade. Os fatores associados à mortalidade foram analisados com base em dados do EAGLE em uma publicação separada.(26)

Este estudo tem muitas limitações. Apesar de seu caráter internacional e multicêntrico, ele foi realizado retrospectivamente, e a análise se restringiu a três períodos de tempo distintos. Portanto, é possível que nem todos os prontuários dos pacientes nos anos estudados tenham sido localizados e que dados contínuos não apresentem as mesmas tendências em pacientes hospitalizados com asma aguda grave. Além disso, como não havia critérios de admissão padronizados, alguns pacientes, especialmente os com mais de 50 anos de idade (típico de pacientes com DPOC), podem ter sido diagnosticados erroneamente. O estudo foi delineado para permitir a observação de mudanças temporais e não para explicar as razões para tais mudanças. Adicionalmente, embora se tenha selecionado uma amostra grande de pacientes asmáticos hospitalizados em dezenove hospitais da Espanha e da América Latina, os resultados não são necessariamente representativos de todos os pacientes hospitalizados com asma aguda grave. De fato, em razão das características da amostra, os pacientes hospitalizados na Espanha foram provavelmente muito melhor representados que os hospitalizados na América Latina. Além do mais, é provável que haja diferenças significativas entre a Espanha e a América Latina, bem como entre os países da América Latina, quanto às características de seus sistemas de saúde. O impacto potencial dessas diferenças deve ser considerado na avaliação das características de pacientes asmáticos hospitalizados.

Em conclusão, nossos achados sugerem que houve avanços no gerenciamento da asma entre exacerbações graves e durante as hospitalizações. Entretanto, ao longo dos dez anos de estudo, o padrão de tratamento aparentemente diminuiu em certos aspectos (por ex., determinação do PFE no pronto-socorro), e alguns indicadores (taxas de mortalidade, intubação/ventilação mecânica e admissão em UTI) permaneceram inalterados. Em geral, os pacientes asmáticos hospitalizados na Espanha tiveram acesso a um melhor padrão de tratamento e gerenciamento que os hospitalizados na América Latina.

Agradecimentos

Aos pesquisadores do EAGLE: Argentina: R. Gené (Hospital de Clínicas, Buenos Aires) e L. J. Nannini (Hospital General Baigorria, Rosário); Brasil: R. Stirbulov (Santa Casa de São Paulo, São Paulo); Chile: R. Sepúlveda (Instituto del Tórax, Santiago); Colômbia: I. Solarte (Fundación Neumológica Colombiana, Bogotá); Espanha: J. Armengol (Hospital de Terrassa, Terassa), S. Bardagí (Hospital de Mataró, Mataró), M. T. Bazús (Instituto Nacional de Silicosis, Oviedo), J. Bellido (Hospital de la Santa Creu i Sant Pau, Barcelona), A. J. Cosano (Hospital Rein Sofí, Córdoba), A. Lopez-Viña (Hospital Puerta de Hierro, Madri), E. Martinez Moragón (Hospital de Sagunto, Sagunto), M. Perpiñá (Hospital La Fe, Valência), V. Plaza (Hospital de la Santa Creu i Sant Pau, Barcelona), G. Rodriguez-Trigo (Hospital Juan Canalejo, La Coruña) e J. Sanchis (Hospital de la Santa Creu i Sant Pau, Barcelona); México: J. Salas (Instituto Nacional de Enfermedades Respiratorias, Cidade do México); Peru: M. Tsukayama (Clínica Ricardo Palma, Lima); Uruguai: L. Piñeyro (Hospital Maciel, Montevidéu) e G. J. Rodrigo (Hospital Central de las Fuerzas Armadas, Montevidéu); e Venezuela: G. Levy (Hospital Universitario, Caracas).


Referências


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Sobre os autores

Gustavo J. Rodrigo
Médico. Departamento de Emergência, Hospital Central de las Fuerzas Armadas, Montevidéu, Uruguai.

Vicente Plaza
Médico. Departamento de Pneumologia, Hospital de la Santa Creu i Sant Pau, Barcelona, Espanha.

Jesús Bellido-Casado
Médico. Departamento de Pneumologia, Hospital de la Santa Creu i Sant Pau, Barcelona, Espanha.

Hugo Neffen
Médico. Unidade de Medicina Respiratória, Hospital de Niños "O. Allassia", Santa Fé, Argentina.

María Teresa Bazús
Médica. Serviço de Pneumologia, Instituto Nacional de Silicosis, Oviedo, Espanha.

Gur Levy
Médico. Serviço de Pneumologia, Hospital Universitário de Caracas, Universidade Central de Venezuela, Caracas, Venezuela.

Joseph Armengol
Médico. Serviço de Pneumologia, Hospital de Terrassa, Terrassa, Espanha.




Trabalho realizado nos seguintes locais: Departamento de Emergência, Hospital Central de las Fuerzas Armadas. Montevidéu, Uruguai; Departamento de Pneumologia, Hospital de la Santa Creu i Sant Pau, Barcelona, Espanha; Unidade de Medicina Respiratória, Hospital de Niños "O. Allassia" Santa Fé, Argentina; Serviço de Pneumologia, Instituto Nacional de Silicosis, Oviedo, Espanha; Serviço de Pneumologia, Hospital Universitário de Caracas, Universidade Central de Venezuela, Caracas, Venezuela; e Serviço de Pneumologia, Hospital de Terrassa, Terrassa, Espanha.
Endereço para correspondência: Gustavo J. Rodrigo. Departamento de Emergencia, Hospital Central de las Fuerzas Armadas, Av. 8 de Octubre 3020, Montevideo, 11600, Uruguay.
Tel 5982 487-0165. Fax 5982 487-2506. E-mail: gurodrig@adinet.com.uy
Apoio financeiro: Este estudo foi financiado por AstraZeneca, Espanha, como parte do Programa de Investigación Integrada (PII, Programa de Pesquisa Integrada) do Setor de Asma da Sociedad Española de Neumología y Cirugía Torácica (SEPAR, Sociedade Espanhola de Pneumologia e Cirurgia Torácica). AstraZeneca não teve qualquer envolvimento na coleta ou na interpretação dos dados, nem tampouco na confecção do manuscrito.
Recebido para publicação em 8/1/2009. Aprovado, após revisão, em 26/2/2009.

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