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Manifestações clínicas, radiológicas e laboratoriais em indivíduos com tuberculose pulmonar: estudo comparativo entre indivíduos HIV positivos e HIV negativos internados em um hospital de referência

Clinical, radiological, and laboratory characteristics in pulmonary tuberculosis patients: comparative study of HIV‑positive and HIV-negative inpatients at a referral hospital

Aline Besen, Guilherme Jönck Staub, Rosemeri Maurici da Silva

ABSTRACT

Objective: To compare clinical, radiological, and laboratory characteristics of individuals with pulmonary tuberculosis co-infected or not with HIV. Methods: A cross-sectional study, in which signs and symptoms were assessed by anamnesis and physical examination in patients hospitalized with pulmonary tuberculosis. The results of sputum smear microscopy and culture for Mycobacterium tuberculosis, as well as hemoglobin levels and CD4+ T-cell counts, were obtained from medical records, and chest X-ray reports were consulted. Results: We included 50 pulmonary tuberculosis patients, who were divided into two groups (HIV-positive and HIV-negative; n = 25 per group). The mean age of the participants was 38.4 ± 10.5 years; 46 (92%) were males; and 27 (54%) were White. Expectoration was presented by 21 (84%) and 13 (52%) of the patients in the HIV-negative and HIV-positive groups, respectively (p = 0.016). Radiological findings of cavitation were present in 10 (43%) and 2 (10%) of the patients in the HIV-negative and HIV-positive groups, respectively (p = 0.016), whereas an interstitial pattern was observed in 18 (78%) and 8 (40%), respectively (p = 0.012). The mean hemoglobin level was 11.1 ± 2.9 g/dL and 9.3 ± 2.2 g/dL in the HIV-negative and HIV-positive groups, respectively (p = 0.015). Conclusions: In our sample of tuberculosis patients, expectoration was less prevalent, hemoglobin levels were lower, and cavitation was less common, as was an interstitial pattern, among those co-infected with HIV than among those without HIV co-infection.

Keywords: HIV; Tuberculosis; Acquired immunodeficiency syndrome.

RESUMO

Objetivo: Comparar as manifestações clínicas, radiológicas e laboratoriais de indivíduos com tuberculose pulmonar coinfectados com HIV com aqueles sem a coinfecção. Métodos: Estudo transversal, no qual sinais e sintomas foram analisados por meio de anamnese e exame físico em pacientes internados com tuberculose pulmonar. A baciloscopia, a cultura para Mycobacterium tuberculosis, a dosagem de hemoglobina e a contagem de células T CD4+ foram obtidas de registros dos prontuários, assim como os laudos das radiografias de tórax. Resultados: Foram incluídos 50 pacientes com tuberculose pulmonar, que foram divididos em dois grupos (HIV positivo e HIV negativo; n = 25 por grupo). A média de idade dos participantes foi de 38,4 ± 10,5 anos, 46 (92%) eram do sexo masculino, e 27 (54%) eram caucasianos. Apresentaram expectoração 21 (84%) e 13 (52%) dos pacientes nos grupos HIV negativo e HIV positivo, respectivamente (p = 0,016). Achados radiológicos de cavitação estavam presentes em 10 (43%) e 2 (10%) dos pacientes nos grupos HIV negativo e HIV positivo, respectivamente (p = 0,016), ao passo que padrão intersticial estava presente em 18 (78%) e 8 (40%) dos pacientes nesses grupos (p = 0,012). O nível médio de hemoglobina foi de 11,1 ± 2,9 g/dL e 9,3 ± 2,2 g/dL nos grupos HIV negativo e HIV positivo, respectivamente (p = 0,015). Conclusões: Entre pacientes coinfectados com tuberculose e HIV desta amostra, houve menor prevalência de expectoração, foram menos frequentes os achados radiológicos de cavitação e de padrão intersticial, e os níveis de hemoglobina foram mais baixos do que naqueles sem essa coinfecção.

Palavras-chave: Tuberculose; Síndrome de imunodeficiência adquirida.

Introdução


A infecção pelo HIV é um dos maiores fatores de risco para a tuberculose. Nos imunocompetentes, a chance de uma infecção tuberculosa evoluir para doença é de 10% ao longo da vida; nos infectados pelo HIV, essa chance é de 8-10% a cada ano.(1)

Com o surgimento da AIDS, foi observado que as manifestações da tuberculose não eram iguais àquelas dos pacientes HIV negativos.(2) Quando a contagem de células T CD4+ está abaixo de 200 células/mm3, as apresentações radiológicas são, em sua maioria, atípicas. Além disso, a formação de granuloma habitualmente não ocorre.(3,4)

As alterações da imunidade têm repercussões nas manifestações teciduais e radiológicas, assim como, possivelmente, nas manifestações clínicas. O presente estudo foi realizado com o objetivo de comparar as manifestações clínicas, radiológicas e laboratoriais da tuberculose pulmonar entre indivíduos HIV positivos e HIV negativos.

Métodos

Foi realizado um estudo transversal no Hospital Nereu Ramos, localizado na cidade de Florianópolis (SC), o qual é o centro de referência para o tratamento de tuberculose no estado. Foram incluídos todos os pacientes, acima de 14 anos, admitidos entre junho de 2009 e maio de 2010 com tuberculose pulmonar. Aqueles que não dispunham de resultados de sorologia para HIV foram excluídos, assim como aqueles que não concordaram em participar do estudo e aqueles que apresentavam comorbidades respiratórias ou quaisquer outras comorbidades que pudessem causar imunodepressão. Foram considerados portadores do HIV aqueles indivíduos que apresentaram sorologia positiva para HIV, e foram considerados portadores de tuberculose aqueles com identificação de Mycobacterium tuberculosis em amostras respiratórias. Naqueles em que a cultura foi negativa ou não foi realizada, o diagnóstico foi presuntivo, através da baciloscopia. Todos os dados foram coletados em até sete dias do início do tratamento com tuberculostáticos.

Os participantes foram questionados, através de anamnese dirigida, sobre a presença dos seguintes sintomas: tosse, sibilância, febre, sudorese, emagrecimento, anorexia, astenia, dor torácica, dispneia e irritabilidade (alteração súbita do humor e/ou falta de paciência). No caso de positividade para tosse, foi questionada a presença de hemoptise e expectoração. Na presença de sudorese, o sintoma foi diferenciado em turnos diurno e noturno, não excludentes. Os participantes que referiram emagrecimento foram questionados sobre a quantidade de peso perdido. O período de duração de cada sintoma também foi investigado.

No exame físico, foi realizada a palpação das cadeias ganglionares da cabeça, do pescoço e da região supraclavicular. Foi considerada linfonodomegalia a presença de linfonodos maiores que 1 cm. Foi considerada artrite a presença de sinais flogísticos em qualquer articulação. A positividade do sinal do piparote ou macicez móvel à percussão do abdome traduziram ascite. Foi considerada hepatomegalia a hepatimetria superior a 14 cm. Foi pesquisada esplenomegalia por percussão do espaço de Traube e palpação na posição de Schuster. Percussão positiva ou palpação da borda esplênica foi considerada como esplenomegalia. Considerou-se hipocratismo digital a presença de índice digital ≥ 1.

A anamnese e o exame físico foram realizados por dois observadores, sendo que cada participante foi examinado por um deles, de forma aleatória.

As informações sobre as radiografias de tórax em projeção posteroanterior e em perfil foram retiradas dos laudos presentes nos prontuários dos pacientes e classificadas da seguinte forma: consolidação alveolar, infiltrado intersticial, derrame pleural, cavitação, linfonodomegalia mediastinal e/ou hilar, massa e nódulo, podendo estar associadas umas às outras.

Os resultados dos exames laboratoriais (contagem de linfócitos T CD4+, hemoglobina, baciloscopia para BAAR e cultura para M. tuberculosis) foram obtidos dos prontuários.

Cada participante concordou em participar no estudo por assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido. O programa Statistical Package for the Social Sciences, versão 16.0 (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA) foi utilizado para a elaboração e a análise do banco de dados. Os dados foram sumarizados como proporções ou médias. As comparações entre os grupos foram realizadas pelo teste do qui-quadrado e teste exato de Fisher para variáveis nominais, assim como através do teste t de Student para variáveis numéricas. O nível de significância estabelecido foi de 95%.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Santa Catarina (129/04, FR-255594).

Resultados


Foram avaliados 52 indivíduos, dos quais 2 foram excluídos por não terem realizado sorologia para HIV. A amostra ficou constituída por 50 pacientes, com média de idade de 38,4 ± 10,5 anos. Pertenciam ao sexo feminino 4 indivíduos (8%), e 27 (54%) eram caucasianos. Dos 50 pacientes, 25 (50%) apresentaram sorologia positiva para HIV, nos quais a contagem média de linfócitos T CD4+ foi de 174,6 ± 158,0 células/mm3, com contagem mínima de 25 células/mm3.

Na análise comparativa dos grupos de pacientes HIV positivos e HIV negativos, a média de idade foi de, respectivamente, 37,2 ± 10,6 anos e 39,6 ± 10,6 anos (p = 0,442). Quanto à etnia, 13 (52%) e 11 (44%) dos pacientes HIV negativos e positivos, respectivamente, eram caucasianos (p = 0,500). Com relação ao gênero, 23 indivíduos (92%) pertenciam ao gênero masculino nos dois grupos (p = 0,695).

Quando questionados sobre tratamento anterior para tuberculose, 33 (66%) declararam nunca ter feito tratamento, sem diferença significativa entre os grupos (p = 0,500).

Em relação à tosse, 42 pacientes (84%) declararam possuir o sintoma, apresentando-o, em média, por 3,0 ± 4,5 meses. Além disso, 9 (18%) referiram hemoptise, e 34 (68%) referiram expectoração. A presença de expectoração foi mais frequente nos indivíduos soronegativos (p = 0,016; Tabela 1).





O sintoma febre esteve presente em 40 pacientes (80%); sudorese foi referida por 43 pacientes (86%), sendo 9 (18%) relatos de sudorese diurna e 41 (82%) de sudorese noturna.

Perda de peso foi referida por 49 indivíduos (98%), com uma média de 10,5 ± 7,1 kg, não havendo diferença significativa entre os dois grupos. Inapetência foi referida por 40 pacientes (80%), e astenia foi referida por 47 pacientes (94%).

Entre os sinais pesquisados, linfonodomegalia foi encontrada em 22 pacientes (44%); artrite, em 7 (14%); ascite, em 3 (6%); hipocratismo, em 10 (20%); hepatomegalia, em 10 (20%); e esplenomegalia, em 12 (24%). Não houve diferenças significativas entre os grupos quanto a esses sinais.

Não houve diferença estatisticamente significativa entre o tempo médio de sinais e sintomas e resultado de sorologia para HIV (Tabela 2).





Foram avaliados os laudos das radiografias de tórax dos pacientes que dispunham dessas em seus prontuários, totalizando 23 indivíduos do grupo HIV negativo e 20 do grupo HIV positivo. Os padrões de cavitação e padrão intersticial foram mais frequentes em indivíduos com sorologia negativa ao HIV (p < 0,05). A distribuição dos padrões radiológicos encontra-se demonstrada na Tabela 3.





No grupo dos pacientes HIV negativos, a cultura para M. tuberculosis foi positiva, negativa, contaminada e não realizada em 56%, 16%, 4% e 24%, respectivamente. Entre os indivíduos HIV positivos, a cultura foi positiva, negativa, contaminada e não realizada em 56%, 36%, 4% e 1%, respectivamente (p = 0,115). A baciloscopia apresentou, entre os soronegativos, os seguintes resultados: negativo, 1+, 2+ e 3+ em 12%, 28%, 20% e 40%, respectivamente. Para os indivíduos soropositivos, os resultados foram negativos, 1+, 2+ e 3+ em 28%, 36%, 16% e 20%, respectivamente (p = 0,336).

A média de resultados para hemoglobina foi de 10,2 ± 2,7 g/dL, sendo de 11,1 ± 2,9 g/dL e de 9,3 ± 2,2 g/dL para os grupos HIV negativo e HIV positivo, respectivamente (p = 0,015).

Discussão

A região sul do Brasil apresenta as menores taxas de incidência de tuberculose quando comparada às demais regiões brasileiras. Para o estado de Santa Catarina, a taxa de incidência descrita no ano de 2009 foi de 27,63/100.000 habitantes, inferior àquela descrita para o Brasil, que foi de 37,99/100.000 habitantes. Porém, a proporção de coinfecção tuberculose/AIDS em Santa Catarina é de 20,3%, superando aquela no Brasil, que é de 15,0%.(5,6) A proporção de coinfecção de 50%, encontrada no presente trabalho, coincide com os achados de um grupo de pesquisadores,(7) que relataram 48,9% de coinfecção em pacientes hospitalizados no sul do Brasil. A maior porcentagem de indivíduos HIV positivos entre pacientes hospitalizados em relação a todos os casos notificados de tuberculose pode denotar uma maior gravidade da doença nesse grupo ou refletir a tendência de internação em hospitais de referência para o tratamento de doenças infecciosas e parasitárias.

As manifestações clínicas da tuberculose são variadas e inespecíficas, não existindo sinal ou sintoma clínico exclusivo da doença. Um dos sintomas de alerta para a tuberculose é tosse seca ou produtiva, presente por mais de três semanas.(8) Um grupo de autores(9) encontrou o sintoma em 96% dos pacientes, semelhante ao encontrado no presente estudo.

A expectoração foi encontrada em 68% dos pacientes, corroborando dados da literatura, nos quais esse sintoma está presente em 65-72% dos pacientes.(10,11) Os indivíduos HIV negativos apresentaram expectoração com maior frequência do que os HIV positivos, o que pode refletir o estado imunológico alterado desses últimos, com diminuição do número de células de defesa e, consequentemente, menor produção de expectoração. A presença de tosse improdutiva nesse grupo específico de pacientes contribui para a dificuldade diagnóstica através de baciloscopia e cultura, por vezes exigindo a realização de exames invasivos.

Apesar de a sibilância não estar entre os sinais classicamente associados à tuberculose, a sua elevada frequência no presente estudo pode ter sido causada por fatores possivelmente associados, como o tabagismo, o qual não foi explorado, bem como pela possibilidade de coexistência com doenças obstrutivas das vias aéreas (asma ou DPOC) não relatadas ou cujo diagnóstico não era conhecido pelos participantes.

Em dois estudos,(12,13) foi relatada uma maior prevalência de febre e fadiga entre os pacientes HIV positivos, divergindo dos resultados aqui apresentados. Porém, esses estudos não foram realizados através de anamnese dirigida, mas sim com dados contidos em prontuários, o que pode responder pela diferença encontrada.

O sintoma sudorese foi positivo em 86% dos pacientes; desses, 82% referiram sudorese noturna. Foram encontradas na literatura taxas de 50,5-84,0% de prevalência de sudorese.(8,14,15) Os dados do presente estudo vêm corroborar a sudorese, principalmente noturna, como um sintoma clássico da tuberculose.

A perda de peso foi o sintoma mais frequente (98%). Em um estudo no Brasil,(16) o emagrecimento esteve presente em 74,5% dos pacientes. Outro grupo de autores(17) relatou que a má nutrição está relacionada com a tuberculose, tanto como fator de risco, quanto como consequência do adoecimento. O caráter consumptivo da doença está relacionado tanto à anorexia, quanto às citocinas inflamatórias, que geram um estado catabólico.

A astenia foi o segundo sintoma mais prevalente, sendo referida por 94% dos pacientes. Em um estudo com indivíduos HIV positivos,(18) encontrou-se 51,6% de astenia. São poucos os trabalhos com dados objetivos sobre a astenia em tuberculose; entretanto, frente à alta prevalência do sintoma, seria importante que mais pesquisas abordassem o tema, apesar de sua subjetividade.

A dor torácica foi referida por 58% dos participantes. A prevalência na literatura é divergente, com resultados de 13,1-76,0%.(16,18) A dor torácica está relacionada com acometimento pleural.(4) Como, no presente estudo, foi encontrada uma prevalência significativa de derrame pleural, a maior ocorrência de dor torácica também era esperada.

A dispneia foi referida por 68% dos pacientes, coincidindo com os resultados de um estudo,(9) mas divergindo dos de outros, nos quais foram relatadas proporções em torno de 26%.(16-18) A possibilidade de associação com outras infecções oportunistas, como pneumocistose, não pode ser descartada totalmente, visto que, apesar de essas terem sido um critério de exclusão quando relatadas no prontuário do paciente, não foram realizados exames mais aprofundados para afastar a presença de infecções oportunistas.

O acometimento articular da tuberculose é resultado da disseminação hematogênica ou por contiguidade da lesão óssea.(19) Em um estudo,(10) foi encontrado 0,2% de acometimento ósseo ou articular, valores marcadamente inferiores aos encontrados no presente estudo (14%).

O peritônio é o sexto sítio extrapulmonar mais acometido pela tuberculose. As principais manifestações são ascite, presente em 73% dos pacientes, e dor abdominal, presente em 64,5%.(20) Segundo um estudo,(20) a prevalência de ascite entre os casos de tuberculose é de 3,5% , próximo aos 6% encontrados no presente trabalho.

O baqueteamento digital é um achado de doença grave. Em um estudo,(21) a prevalência baqueteamento digital foi de 34%. As melhorias no tratamento e a instituição precoce desse podem ter levado à diminuição na prevalência do sinal.

Sintomas constitucionais, como perda de peso, inapetência e irritabilidade, não mostraram diferenças significativas entre os grupos. Em uma revisão sobre tuberculose e desnutrição, relatou-se uma maior perda de peso nos pacientes coinfectados com HIV.(17) Um grupo de autores(22) encontrou menor perda de peso entre os pacientes HIV positivos com CD4+ acima de 200 células/mm3.

O predomínio dos padrões intersticial e alveolar sobre o de cavitação pode ser explicado pela grande porcentagem de imunossuprimidos na amostra, com média de contagens de linfócitos T CD4+ abaixo de 200 células/mm3. O predomínio da consolidação sobre a cavitação também pode ser consequência de uma abordagem diagnóstica precoce da doença.(8,14)

O derrame pleural foi mais frequente no presente estudo (25,5%) do que é relatado na literatura, na qual são descritas proporções de 5,3-18,0%.(7,14,15,23) Nódulos foram encontrados em 16,3% dos casos. Em um estudo,(15) nódulos foram encontrados em 1,3% dos pacientes. Já para outro grupo de autores,(24) os nódulos foram a manifestação mais frequente da doença pulmonar ativa na TC, em 82% dos casos. Esta disparidade pode ser atribuída à diferença na sensibilidade dos dois métodos.

Os achados das radiografias de tórax em pacientes HIV positivos têm sido descritos frequentemente como incaracterísticos. Na presente amostra, a imagem de cavitação foi menos frequente nos pacientes HIV positivos (p = 0,016). Em estudos que analisaram o grau de imunossupressão, a cavitação foi mais frequente naqueles com CD4+ > 200 células/mm3.(12,25)

Outra diferença encontrada na presente amostra foi a maior prevalência de lesões intersticiais em pacientes HIV negativos (p = 0,012). Um grupo de autores(26) encontrou, com maior frequência, lesão intersticial em pacientes com níveis de linfócitos T CD4+ < 200 células/mm3.

Vários autores citam a linfonodomegalia mediastinal como uma manifestação radiográfica frequente nos pacientes imunossuprimidos.(12,25) No presente estudo, a linfonodomegalia mediastinal esteve presente em 5% das radiografias de indivíduos HIV positivos e em nenhum dos HIV negativos (p = 0,465), assim como ocorreu em outro estudo.(15) Na avaliação do grau de imunossupressão, o aumento dos linfonodos intratorácicos é o achado radiográfico relacionado às menores contagens de células T CD4+.(26) O pequeno número de pacientes da presente amostra, assim como sua relativa alta contagem de células T CD4+, podem explicar as divergências com a literatura.

O derrame pleural é outro achado que a literatura indica como sendo mais comum entre os pacientes HIV positivos. Um grupo de autores(23) encontrou uma prevalência de 16% entre os pacientes soropositivos e de 6,8% entre os soronegativos (p < 0,001). Em outro estudo,(25) foi encontrada maior prevalência de derrame pleural em pacientes com níveis de linfócitos T CD4+ > 200 células/mm3. Por outro lado, outro grupo de autores(22) encontrou derrame pleural mais frequentemente entre indivíduos com linfócitos T CD4+ < 200 células/mm3. Os pacientes HIV positivos analisados no presente estudo apresentaram contagens médias de linfócitos T CD4+ muito próximas ao ponto de corte de 200 células/mm3, o que pode ter influenciado os resultados encontrados. A análise de um número maior de pacientes com contagens de CD4+ marcadamente inferiores e superiores ao ponto de corte poderá demonstrar resultados mais consistentes.

Entre as culturas realizadas, houve 65,1% de positividade, inferior aos 78,6% encontrados em outro estudo.(10) A diferença pode dever-se à grande proporção de pacientes soropositivos no presente estudo, que, sabidamente, não produzem expectoração espontânea e, por consequência, resulta em amostras inadequadas.(27)

A anemia é um achado frequente na tuberculose. Em um estudo,(28) foi encontrada uma prevalência de 31,9%. No presente estudo, os valores médios de hemoglobina foram significativamente menores no grupo HIV positivo, o que provavelmente reflete a condição maximizada pela presença de comorbidade.

Os resultados do presente estudo demonstram que a comparação dos dados clínicos, radiológicos e laboratoriais entre indivíduos HIV positivos e HIV negativos indicou as seguintes diferenças estatisticamente significativas nos pacientes HIV positivos da presente amostra: menor prevalência de expectoração, menor prevalência de imagem radiológica de cavitação e de lesão intersticial, assim como índices mais graves de anemia.

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* Trabalho realizado na Universidade do Sul de Santa Catarina e na Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis (SC) Brasil.
Endereço para correspondência: Rosemeri Maurici da Silva. Rodovia Virgílio Várzea, 2236, Residencial Villa Vernazza, apto. 601,
bloco A, Saco Grande II, CEP 88032-001, Florianópolis, SC, Brasil.
Tel. 55 48 3621-3363. E-mail: rosemaurici@hotmail.com
Apoio financeiro: Nenhum.
Recebido para publicação em 14/12/2010. Aprovado, após revisão, em 5/6/2011.




Sobre os autores

Aline Besen
Acadêmica de Medicina. Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis (SC) Brasil.

Guilherme Jönck Staub
Acadêmico de Medicina. Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis (SC) Brasil.

Rosemeri Maurici da Silva
Coordenadora de Pós-Graduação. Universidade do Sul de Santa Catarina, Florianópolis (SC) Brasil.

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