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Artigo Original

Tabagismo em idosos internados em instituições de longa permanência

Smoking in elderly patients admitted to long-term care facilities

Anderson Albuquerque de Carvalho, Lucy Gomes, Altair Macedo Lahud Loureiro

ABSTRACT

Objective: To determine the prevalence of smoking among elderly patients admitted to long-term care facilities (LTCFs) and to determine whether the degree of nicotine dependence is associated with sociodemographic variables, affective ties, motivation for smoking cessation and depression. Methods: Cross-sectional, population-based study involving 573 individuals over the age of 60, admitted to 13 LTCFs in the Federal District of Brasília, Brazil. We analyzed the following variables: type of LTCF, gender, age, level of education, monthly income, marital status, retirement status, affective ties, probable depression, motivation for smoking cessation and degree of nicotine dependence. In order to collect these data, the following instruments were used: a sociodemographic questionnaire; the Flanagan Quality of Life Scale; the Mini-Mental State Examination; the Geriatric Depression Scale; the Richmond test; and the Fagerström Test for Nicotine Dependence. Results: The prevalence of smokers in the study sample (573 individuals) was 23.0%. Of the 132 smokers, there were 90 males (25.8%) and 42 females (18.7%). Of these, 116 smokers were included in the study, 70 of whom (60.3%) presented with probable depression. The degree of nicotine dependence was found to be significantly associated with level of education, monthly income, affective ties, motivation for smoking cessation and probable depression, although not with the type of LTCF, gender, age, retirement status or marital status. Conclusions: Among elderly patients admitted to LTCFs in the Federal District of Brasília, the prevalence of smoking is high and the motivation for smoking cessation is low.

Keywords: Smoking; Homes for the aged; Health services for the aged.

RESUMO

Objetivo: Determinar a prevalência de tabagismo entre idosos internados em instituições de longa permanência para idosos (ILPIs) e verificar a associação do grau de dependência nicotínica com variáveis sociodemográficas, vínculo afetivo, motivação para cessação e depressão. Métodos: Estudo transversal de base populacional, incluindo 573 idosos com idade ≥ 60 anos, internados em 13 ILPIs no Distrito Federal. Foram analisadas as seguintes variáveis: tipo de ILPI, gênero, idade, escolaridade, renda mensal, estado civil, condição previdenciária, vínculo afetivo, motivação para a cessação, depressão provável e o grau de dependência nicotínica. Para a obtenção dos dados, foram utilizados os seguintes instrumentos: questionário sociodemográfico, Escala de Qualidade de Vida de Flanagan, Miniexame do Estado Mental, Escala de Depressão Geriátrica, teste de Richmond e Teste de Fagerström para Dependência de Nicotina. Resultados: A prevalência geral de fumantes na amostra (573 indivíduos) foi de 23,0%. Dos 132 fumantes, havia 81 homens (24,9%) e 35 mulheres (20,1%). Foram incluídos no estudo 116 fumantes, dos quais 70 (60,3%) apresentavam depressão provável. Houve significativas associações entre o grau de dependência nicotínica e as seguintes variáveis: escolaridade, renda mensal, vínculo afetivo, motivação para a cessação e depressão provável. Não houve associações significativas entre a dependência de nicotina e as seguintes variáveis: tipo de ILPI, gênero, idade, condição previdenciária e estado civil. Conclusões: Nos idosos institucionalizados em ILPIs no Distrito Federal, constatamos uma elevada prevalência de tabagismo, havendo entre eles baixa motivação para a cessação tabágica.

Palavras-chave: Tabagismo; Instituição de longa permanência para idosos; Serviços de saúde para idosos.

Introdução

Embora os benefícios com a cessação do hábito de fumar sejam mais evidentes entre os jovens, a interrupção do uso do cigarro em qualquer idade reduz o risco de morte(1) e melhora a condição geral de saúde.(2)

Esse fato é exemplificado através do aumento de dois a três anos na esperança de vida, após o abandono do cigarro, entre idosos com 65 anos ou mais de idade que fumam até um maço de cigarros por dia.(3)

Diversos benefícios podem ser obtidos com a cessação tabágica em idosos e, dentre eles, destacam-se a redução do risco de adoecer, o melhor controle da evolução de doenças pré-existentes, a melhora na qualidade de vida e o aumento da expectativa de vida, o que reforça a relevância na abordagem dessa população.(2)

É estimada a existência de 1,0-1,5 milhão de idosos fumantes no Brasil.(4) Em um estudo epidemiológico focando o tabagismo na região sul do país, encontrou-se uma prevalência de fumantes de 10,6% nos indivíduos com idade ≥ 60 anos, que diminuía com o aumento da faixa etária.(5) Um estudo realizado na região metropolitana de Belo Horizonte e no município de Bambuí (MG) em indivíduos com idade ≥ 60 anos revelou, entre homens e mulheres, respectivamente, a prevalência de fumantes de 19,6% e 8,1% em Belo Horizonte e de 31,4% e 8,1% em Bambuí.(6)

Em 1999, nos Estados Unidos, 10,5% dos homens e 10,7% das mulheres com mais de 64 anos eram fumantes.(7) O Estudo Nacional de Saúde, realizado em 1997 na Espanha, mostrou que a prevalência de fumantes em indivíduos maiores de 15 anos era de 33,1%, sendo 12% de fumantes na faixa etária de 65-74 anos e 8% nos maiores de 74 anos.(8)

A causa do tabagismo é constituída de uma complexa relação entre estímulos ambientais, hábitos pessoais, condicionamentos psicossociais e ações biológicas da nicotina.(4) Nesse contexto, a sua inserção nos ambientes asilares compreende um campo de estudo diferenciado, visto que os processos patológicos aos quais os indivíduos idosos estão sujeitos precipitam-se no interior das instituições de longa permanência para idosos (ILPIs), pois a institucionalização frequentemente contribui para o isolamento e para a inatividade física e mental, provocando consequências negativas à saúde do idoso.(4) A identificação de possíveis relações associativas entre o tabagismo e a institucionalização devem ser testadas e melhor conhecidas. Entretanto, há escassa literatura acerca do tabagismo nessa população.

O objetivo do presente estudo foi determinar a prevalência do tabagismo e sua associação com variáveis sociodemográficas, condições de saúde e estilo de vida em idosos internados em ILPIs no Distrito Federal (DF).

Métodos

Trata-se de estudo transversal de base populacional, em indivíduos com idade ≥ 60 anos, institucionalizados em 13 ILPIs do DF, realizado em junho de 2008. Foi identificada a prevalência do tabagismo e analisadas as associações entre o grau de dependência à nicotina e as seguintes variáveis: tipo de ILPI, gênero, faixa etária, escolaridade, condição previdenciária (aposentado ou não), renda mensal, estado civil, vínculo afetivo, motivação para a cessação tabágica e depressão provável.

A população foi selecionada mediante os seguintes critérios de inclusão: ter idade ≥ 60 anos, ser tabagista e concordar em participar da pesquisa. A exclusão, no estudo, deu-se quando o indivíduo idoso não atingiu uma pontuação determinada no questionário Miniexame do Estado Mental (MEEM): ≤ 15 para indivíduos analfabetos, ≤ 22 para aqueles com escolaridade entre 1 e 11 anos e ≤ 27 para aqueles com escolaridade superior a 11 anos.(9,10) O MEEM é um teste cognitivo breve, composto por itens a respeito de orientação têmporo-espacial, memória de curto prazo, atenção, cálculo, linguagem e apraxia construcional, possibilitando uma avaliação concisa do estado mental do paciente. É um instrumento utilizado mundialmente, possuindo versões em diversas línguas e países, e com versão validada para uso na população brasileira.(10)

Foram contabilizados 573 idosos internados nas ILPIs, e 132 eram fumantes. Foram sujeitos do presente estudo 116 idosos tabagistas. Dos 16 idosos excluídos, 14 não obtiveram a pontuação mínima exigida no MEEM. Os 2 indivíduos restantes, apesar de terem assinado o termo de consentimento livre e esclarecido, posteriormente se negaram a participar do estudo.

A identificação dos idosos tabagistas foi realizada por meio de informações cedidas pela equipe de enfermagem local, as quais foram cruzadas com a observação do entrevistador para a verificação de uma possível divergência, para enfim se confrontar os dados com a confirmação fornecida pelo próprio idoso. A abordagem à população estudada ocorreu por uma entrevista individual, durante a qual o participante foi informado quanto ao sigilo nas respostas obtidas. Foi feita uma aplicação piloto, com a finalidade de se avaliar a necessidade de possíveis adaptações dos instrumentos utilizados.

Para os cálculos de prevalência do tabagismo segundo o gênero e a faixa etária, foi utilizada a população total identificada como tabagista (n = 132). Para as demais análises estatísticas utilizadas, 116 idosos constituíram a população do presente estudo.

Os participantes do estudo responderam a um questionário sobre características sociodemográficas, incluindo gênero, idade, escolaridade, condição previdenciária, renda mensal e estado civil. Foram submetidos também ao MEEM(9) validado para uso na população brasileira.(10) A Escala de Depressão Geriátrica,(11) em sua versão reduzida e validada para uso no Brasil,(12) foi utilizada com a finalidade de rastrear aqueles indivíduos com um possível quadro depressivo. O questionário de Fagerström,(13) adaptado para uso no Brasil,(14) foi utilizado como instrumento de medida do grau de dependência nicotínica. O teste de Richmond(15) foi aplicado como instrumento de avaliação da motivação para cessar o consumo do tabaco. Para a avaliação da presença de vínculo afetivo, foram utilizadas algumas das questões da Escala de Qualidade de Vida de Flanagan,(16) em sua versão adaptada e validada para uso no Brasil.(17)

Os resultados foram analisados por meio de estatística descritiva (médias e desvios-padrão). A variável dependente utilizada foi o grau de dependência à nicotina e as variáveis independentes selecionadas foram as seguintes: 1) sociodemográficas: gênero, faixa etária, escolaridade, condição previdenciária, renda mensal (em salários mínimos), estado civil e tipo de ILPI; e 2) condições de saúde e estilo de vida: motivação para a cessação tabágica, vínculo afetivo e depressão provável.

A associação entre o grau de dependência nicotínica e as outras variáveis foi verificada na análise bivariada pelo teste do qui-quadrado, com nível de significância de 5%. Na análise multivariada, foram consideradas as variáveis que tiveram valor p < 0,20 na análise bivariada, permanecendo no modelo apenas aquelas com p ≤ 0,05. A análise estatística foi feita utilizando-se o programa Statistical Package for the Social Sciences, versão 14.0 para Windows (SPSS Inc, Chicago, IL, EUA).

Após a aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa em Seres Humanos da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal, os participantes que preencheram os requisitos de inclusão participaram voluntariamente da pesquisa após assinarem o termo de consentimento livre e esclarecido.

Resultados

A população foi composta de 573 idosos com idades ≥ 60 anos, internados nas 13 ILPIs pesquisadas, sendo 349 homens e 224 mulheres. Desses, 132 idosos eram fumantes - 90 homens e 42 mulheres - com média de idade = 70,0 ± 7,1 anos. Após a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, foram selecionados 116 idosos, que constituíram os sujeitos do presente estudo. Esses se caracterizaram por apresentar estado cognitivo normal (MEEM = 22,3 ± 3,8 pontos), o que se fazia imprescindível para a obtenção de resultados confiáveis nos testes e questionários aplicados. A prevalência geral de tabagismo encontrada foi de 23,0%, sendo de 25,8% nos homens e 18,7% nas mulheres (Figura 1).





A prevalência tabágica na faixa etária de 60-69 anos foi de 52,3%; na de 70-79 anos, essa foi de 40,1%; e na de 80 anos ou mais, de 7,6%.

Identificou-se uma redução da prevalência do tabagismo com o avançar da idade, todavia, sem significância estatística (p = 0,41).

Os sujeitos da pesquisa não se distribuíram de maneira homogênea quanto ao gênero, pois houve predomínio do gênero masculino (n = 81; 69,8%). Quanto às faixas etárias, os idosos com idade de 80 anos ou mais corresponderam a apenas 8,6% da amostra estudada.

No tocante ao grau de dependência nicotínica nos idosos das ILPIs, 77,6% encontravam-se nos grupos de moderado (51,7%) e elevado (25,9%) grau de dependência. No que se refere à motivação para a cessação do tabagismo, 57,7% dos idosos participantes apresentavam baixa motivação. A prevalência de depressão provável nos idosos tabagistas foi de 60,3%, sendo esses indivíduos concentrados nos grupos de moderado e elevado grau de dependência.

A associação entre o grau de dependência nicotínica e os fatores sociodemográficos não demonstrou relevância estatisticamente significativa para as seguintes variáveis: tipo de ILPI, gênero, faixa etária, condição previdenciária e estado civil. Todavia, identificaram-se associações significativas entre esse e renda mensal e escolaridade (Tabela 1).





No modelo multivariado, as variáveis que permaneceram com valores de significância estatística foram as seguintes: escolaridade (p = 0,001), renda mensal (p = 0,05), vínculo afetivo (p = 0,002), motivação para a cessação do tabagismo (p = 0,001) e depressão provável (p = 0,001).

A associação entre o grau de dependência nicotínica e condições de saúde e estilo de vida foi significativa para vínculo afetivo, motivação para a cessação do tabagismo e depressão provável (Tabela 2).



Discussão

No presente estudo, a prevalência de tabagismo em idosos institucionalizados, com idade de 60 anos ou mais, foi de 23% (homens: 25,8%; mulheres: 18,7%). Foram identificados dois estudos que abordaram a prevalência de tabagismo em idosos asilados. Um primeiro, no ano de 2004, relatava uma prevalência de 14%(18) e outro, em 2008, uma prevalência de 11%,(19) sendo o segundo realizado em idosos com idade de 65 anos ou mais. Provavelmente a diferença dos resultados encontrados nessas pesquisas deve-se às diferenças na distribuição dos gêneros nas populações estudadas. Observamos menores prevalências de tabagismo nos estudos nos quais há predominância do gênero feminino, visto que 64% da população no primeiro estudo(18)
eram formadas por mulheres idosas e, no segundo,(19) 75% da amostra eram do sexo feminino. O predomínio do gênero feminino e uma menor prevalência tabágica vêm de encontro ao perfil sociocultural desses indivíduos, no qual o homem fuma mais enquanto jovem e permanece fumando mais quando comparado às idosas de faixa etária análoga.
Os demais estudos que fazem menção às prevalências do tabagismo na população idosa referem-se a indivíduos na população geral. Nessas pesquisas em idosos não institucionalizados, as prevalências não se mostram com valores lineares. Todavia, todas demonstram valores ≥ 14%.(6,20-23)

Um estudo realizado em idosos na cidade de Pelotas (RS), de caráter transversal com base populacional, apresentou uma prevalência de tabagismo de 14%.(21) Outro estudo mostrou que aproximadamente 3,5 milhões de idosos com idade ≥ 65 anos fumam nos Estados Unidos, com prevalência média de tabagismo de 26% nos idosos (homens: 40%; mulheres: 12%).(20)

No estudo atual, ao estratificarmos a prevalência de tabagismo quanto ao gênero, encontramos valores próximos aos relatados, sendo de 25,8% em homens e 18,7% em mulheres. Tal achado assemelha-se às elevadas taxas observadas entre os idosos da região metropolitana de Belo Horizonte (MG), de 19,6% no gênero masculino, assim como naqueles do município de Bambuí (MG), que foi de 31,4%.(6) Contudo, nesse mesmo estudo, a prevalência nas mulheres foi de 8,1% tanto em Belo Horizonte quanto no município de Bambuí, valor esse 2,5 vezes inferior ao verificado no presente estudo. Tal fato provavelmente se deve à influência da institucionalização na relação com o tabagismo, que pode ser diferenciada na população idosa asilada daquela não asilada. Questionamos se fatores, tais como a ausência de vínculo afetivo, depressão, menor requisição social e médica para deixar de fumar, oportunidades reduzidas, falta de atividade produtiva e insegurança quanto à autoeficácia, contribuiriam como reforço ao hábito de fumar.

Outro aspecto relevante quanto à prevalência de tabagismo em idosos é a sua redução com o aumento da faixa etária. No estudo atual, a prevalência foi de 50,9% nos indivíduos com idade de 60-69 anos, de 40,5% naqueles na faixa de 70-79 anos e de apenas 8,6% nos idosos com 80 anos ou mais. Tal fato corrobora, em parte, os achados de outros autores, que também demonstraram uma diminuição da prevalência tabágica com o aumento da faixa etária. Entretanto, devemos realçar que tais pesquisas abordavam idosos não institucionalizados.(5,6)

Não houve associação significativa entre gênero e dependência à
nicotina. Todavia, a disparidade na proporção de homens e mulheres estudados poderia justificar esse fato. Em ambos os gêneros, predominou a dependência moderada, havendo predominância do gênero masculino no grupo de elevada dependência.

A moderada dependência nicotínica preponderou independentemente da faixa etária analisada. Nos idosos na faixa de 70-79 anos e de 80 anos ou mais, o grau de dependência elevada mostrou-se maior do que no grupo de baixa dependência. Esse achado sugere que, com o aumento da idade, há uma tendência ao aumento da dependência ao tabaco. Um fator que poderia explicar essa situação é o maior tempo de exposição do organismo à nicotina.

O presente estudo mostra uma associação significativa entre escolaridade e o grau de dependência nicotínica. Identifica-se um decréscimo da dependência nicotínica à medida que o número de anos de estudo aumenta. Esse fato é semelhante ao identificado em um estudo.(5) Entretanto, esse achado entra em discordância com outro estudo que descreveu uma significativa associação do tabagismo à pior escolaridade entre os mais jovens, mas não entre os idosos. A ausência de associação entre escolaridade e tabagismo nos idosos nesse estudo é explicada como um possível viés de sobrevivência, visto que se espera um aumento na mortalidade precoce entre indivíduos fumantes com pior nível socioeconômico.(22)

A associação entre o grau de dependência nicotínica e condição previdenciária não mostrou significância estatística. Todavia, ao se analisar a renda mensal associada ao grau de dependência nicotínica, constata-se uma diminuição nesse com o aumento da renda.

Provavelmente, para a população em questão, a condição previdenciária não constitui um fator distintivo para maior ou menor grau de dependência. Ao estratificarmos os valores recebidos pelos idosos (em salários mínimos), foi identificada uma significativa associação. No Brasil, em 2004, pessoas de baixa escolaridade tinham uma probabilidade cinco vezes maior de serem fumantes, sendo o consumo de cigarros maior nas classes de menor rendimento.(24)

O estado civil não mostra relevância como um fator isolado para explicar o grau de dependência nicotínica. Todavia, a existência de vínculo afetivo apresenta uma associação significativa com o grau de dependência à nicotina. Percebe-se que os idosos que mantém algum nível de vínculo afetivo, não necessariamente um vínculo marital, são menos dependentes da nicotina.

A associação entre o grau de dependência à nicotina e a motivação para a cessação do tabagismo apresentou significância estatística no estudo atual. Na literatura, tem sido ressaltado que tais fatores estão interligados, sendo a motivação individual um dos fatores mais relevantes para a cessação definitiva do tabagismo, inter-relacionada com uma gama de variáveis hereditárias, psicológicas, fisiológicas e ambientais.(23)

No estudo atual, foi identificada uma baixa motivação para a cessação tabágica no grupo com elevada dependência à nicotina e uma concentração de idosos com alta motivação no grupo com baixa dependência. Esse resultado contrapôs-se ao exposto por outro autor, o qual relatou que fumantes com dependência leve ou moderada podem apresentar pouca motivação para abandonar o tabagismo, pois alguns acreditam que podem parar quando quiserem. O mesmo autor afirmou ainda que os fumantes com elevada dependência podem também apresentar baixa motivação devido à falta de confiança em conseguir seu intento, achando-se incapazes e com medo do sofrimento que a síndrome de abstinência produz, pois já tentaram e fracassaram outras vezes.(25)

Por fim, constatamos uma relação, com diferença significativa, entre o grau de dependência nicotínica e depressão provável. Nos idosos que obtiveram valores indicativos de depressão no Questionário Simplificado de Yesavage, verificou-se uma predominância de moderada e elevada dependência nicotínica. Tal fato vem de encontro ao já demonstrado em outros estudos.(21,26,27) Em um desses, afirmou-se que a associação entre as diversas formas de transtornos de ansiedade e de depressão e a dependência tabágica está bem estabelecida.(27) Entretanto, sabe-se que a influência do tabagismo no aparecimento da depressão é controversa.(28) A predominância, em nosso estudo, de sintomas depressivos no grupo de idosos com elevado grau de dependência nicotínica pode servir como impulso para futuras pesquisas de cunho neurobiológico e epidemiológico, direcionadas exclusivamente à relação tabaco e depressão.

Quanto ao grau de dependência nicotínica nos idosos das ILPIs, 77,6% encontram-se nos grupos de moderado (51,7%) a elevado (25,9%) grau de dependência, constituindo uma clientela de difícil abordagem na intervenção para a cessação do tabagismo. Para tanto, faz-se necessário um adequado planejamento estratégico preliminar a fim de que se obtenha uma maior probabilidade de êxito. Dos idosos participantes, 57,7% apresentam baixa motivação para a cessação do tabagismo. Esse dado corrobora os dados do grau de dependência nicotínica, demonstrando que os idosos institucionalizados apresentam dois importantes fatores dificultadores para o sucesso do tratamento antitabágico.

Não foram encontradas associações significativas entre o grau de dependência à nicotina e tipo de ILPI, gênero, faixa etária, condição previdenciária e estado civil. Todavia, para as demais variáveis, observa-se, tanto na análise bivariada quanto no modelo multivariado, significativas associações com o grau de dependência nicotínica.

Acredita-se que a institucionalização possa contribuir na perpetuação do tabagismo, devido ao abandono familiar, aos possíveis maus tratos e ao menor acesso a profissionais de saúde devidamente qualificados na abordagem geriátrica e gerontológica, assim como à consequente solidão que tal população, por vezes, enfrenta nesses locais.

Consideramos este estudo como um despertar para a realidade do tabagismo ligado às ILPIs, pois o consumo do tabaco constitui um problema de saúde pública entre os idosos institucionalizados no DF.

Ressaltamos a relevância da realização de trabalhos semelhantes em outras localidades do país. Identificamos uma lacuna a ser preenchida na literatura científica, referente às possíveis peculiaridades dessa população, visto que a causa do tabagismo é multifacetada e multifatorial, podendo o idoso institucionalizado responder às diferentes influências do meio no qual está inserido de maneira não análoga à população de idosos não asilados.


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Trabalho realizado no Curso de Pós-Graduação Stricto Sensu em Gerontologia, Universidade Católica de Brasília - UCB - Brasília (DF) Brasil.
Endereço para correspondência: Anderson Albuquerque de Carvalho. Alameda das Acácias, Quadra 107, Lote 08, Ed. Park Boulevard, Bloco B, apto. 202, Águas Claras, CEP 71920-540, Brasília, DF, Brasil.
Tel 55 61 3381-5193. E-mail: anderson.carvalho@ls.edu.br ou carvalhofisio2003@yahoo.com.br
Apoio financeiro: Nenhum.
Recebido para publicação em 25/6/2009. Aprovado, após revisão, em 2/3/2010.



Sobre os autores

Anderson Albuquerque de Carvalho
Fisioterapeuta Respiratório. Hospital das Forças Armadas - HFA - e Professor Titular de Anatomia Humana. Faculdade Lourdes Santana, Brasília (DF) Brasil.

Lucy Gomes
Professora. Pós-Graduação Stricto Sensu em Gerontologia, Universidade Católica de Brasília - UCB - Brasília (DF) Brasil.

Altair Macedo Lahud Loureiro
Professora. Pós-Graduação Stricto Sensu em Gerontologia, Universidade Católica de Brasília - UCB - Brasília (DF) Brasil.

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