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20085
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Relato de Caso

Teratoma de mediastino com degeneração maligna

Mediastinal teratoma with malignant degeneration

Fabiano Alves Squeff, Eduardo Salvador Gerace, Roberto Saad Júnior, Márcio Botter, Roberto Gonçalves, Juliana Fracalossi Paes

ABSTRACT

Here, we report the case of a patient with a slowly-progressing anterior mediastinal teratoma submitted to surgical resection. The anatomopathological examination of the sample revealed malignant degeneration to carcinoid tumor. Such evolution is very rare, and we have found only three related studies in the literature. We describe the clinicopathological features of the tumor and discuss the treatment administered. The evolution was satisfactory, and the patient was submitted to oncological treatment.

Keywords: Mediastinal neoplasms; Teratoma; Carcinoid tumor; Mediastinum/surgery.

RESUMO

No presente artigo, relatamos o caso de um paciente portador de teratoma de mediastino anterior, de evolução lenta, o qual foi submetido à ressecção cirúrgica. O exame anatomopatológico da peça revelou degeneração maligna para tumor carcinóide. Tal evolução é extremamente rara, sendo encontrados na literatura apenas três artigos correlatos. Apresentamos uma descrição clínico-patológica do tumor e, por fim, discutimos a conduta terapêutica. Houve evolução satisfatória, e o paciente foi submetido a tratamento oncológico.

Palavras-chave: Neoplasias do mediastino; Teratoma; Tumor carcinóide; Mediastino/cirurgia.

Introdução

Os teratomas são tumores de células germinativas originados dos três folhetos embrionários. São benignos em sua maioria e se localizam nos mais variados sítios. São os tumores mais freqüentes do mediastino anterior, após os timomas, sendo mais comumente presentes em adultos jovens.(1) Representam cerca de 8 a 13% dos tumores nessa região e apresentam prognóstico bastante favorável com o tratamento cirúrgico, sendo sua evolução para degeneração maligna pouco conhecida e extremamente rara.(2,3)

Relatamos o caso de um paciente de 66 anos submetido à ressecção de teratoma cístico de mediastino anterior, de evolução lenta, com achado anatomopatológico de degeneração maligna para tumor carcinóide. Trata-se de um caso extremamente raro, tanto pela presença desse tipo de tumor em paciente idoso como por sua evolução para degeneração maligna. Isso, aliado ao fato de termos encontrado na literatura apenas três referências a tumor mediastinal com degeneração carcinóide localizado no mediastino, nos motivou a escrever este artigo.

Relato de caso

Paciente de 66 anos, do sexo masculino, natural de São Luiz (MA) e procedente de São Paulo, sem antecedentes mórbidos e sem história de tabagismo, foi admitido no ambulatório sem queixas e em bom estado geral. Trazia exame radiológico, realizado em outro serviço há dez anos, revelando a presença de tumor de mediastino anterior, com cerca de 4 cm de diâmetro. A investigação prosseguiu com a realização de uma nova radiografia e uma nova tomografia computadorizada de tórax, as quais revelaram um tumor de contornos espiculados, medindo 3,0 × 4,0 cm, localizado no mediastino anterior à direita e com as mesmas características encontradas nos exames realizados anteriormente (Figura 1). Apresentava exames laboratoriais e prova de função pulmonar normais. Os marcadores tumorais estavam normais. Foi confirmado o diagnóstico sindrômico de tumor de mediastino anterior, e indicado tratamento operatório.




O paciente foi submetido à toracotomia póstero-lateral direita. No intra-operatório, encontramos um tumor de consistência cística e cor amarela, medindo 5,0 × 3,5 × 3,0 cm e pesando 35 g, com áreas de calcificação e localizado no mediastino anterior, sobre a face anterior da veia cava superior, infiltrando o pericárdio e o segmento anterior do lobo superior direito. Iniciou-se dissecção através da abertura da pleura mediastinal, sendo necessárias também ressecção parcial do pericárdio e segmentectomia pulmonar. O mediastino estava livre de linfonodomegalias. O paciente evoluiu sem intercorrências no pós-operatório. Foram encontrados pêlos e secreção sebácea no interior do tumor à abertura da peça (Figura 2). O exame microscópico revelou neoplasia embrionária caracterizada por proliferação de estruturas císticas, ora revestidas por epiderme com glândulas sebáceas e folículos pilosos, ora revestidas por epitélio cilíndrico ciliado de padrão respiratório. Observavam-se feixes musculares lisos, tecido adiposo disposto em lóbulos, agregados linfóides e tecido cartilaginoso. Em certas áreas, havia proliferação de células com núcleos regulares, com cromatina em sal-e-pimenta. Essas células formavam blocos irregulares e apresentavam-se positivas para cromogranina à imunohistoquímica, o que resultou no diagnóstico de teratoma cístico do mediastino com degeneração maligna para tumor carcinóide (Figura 3).





O paciente foi submetido à quimioterapia adjuvante com cisplatina e bleomicina e, até o quarto mês pós-operatório, encontrava-se bem e sem sinais de recidiva da doença, apresentando marcadores tumorais normais.

Discussão

No caso relatado, o paciente apresentava-se assintomático há dez anos, desde a realização da primeira tomografia. Quando procurou o nosso serviço, discutimos se haveria necessidade de operá-lo, uma vez que não apresentava sintomas, e o exame radiológico mantinha-se inalterado há dez anos. A revisão da literatura, entretanto, mostrou que a degeneração maligna dos teratomas, apesar de rara, pode ocorrer, e então decidimos pela realização da operação. Para nossa surpresa, o tumor apresentava-se com degeneração carcinóide, confirmada pelo exame anatomopatológico.

Teratomas maduros são tumores que se originam de mais de um dos três folhetos de células germinativas primárias, sendo mais freqüentemente encontrados em crianças e em adultos jovens, sem diferenças entre os sexos. São os tumores de células germinativas mais freqüentes, correspondendo a 75% dos casos, e são mais comumente localizados nas gônadas, seguido do mediastino. Entre os tumores localizados no mediastino anterior, sua incidência varia de 8 a 20%.(2,4) A maioria é anatomopatologicamente bem diferenciada e benigna e apresenta crescimento lento, sendo, portanto, diagnosticada incidentalmente em exames radiológicos, como no caso relatado. Em adultos, cerca de dois terços dos casos são assintomáticos.(2,5)

Os teratomas císticos, como no caso aqui relatado, dificilmente provocam sintomas, principalmente em razão de seu componente cístico. Quando presente, o sintoma mais encontrado é a dor torácica. A ruptura cística pode ocorrer na vigência de infecção, causando hemoptise, empiema pleural, insuficiência respiratória aguda e tamponamento cardíaco.(1) Um sintoma raro, porém patognomônico, é a tricoptise.(6)

O diagnóstico síndrômico é realizado por meio de radiografia e de tomografia computadorizada de tórax. Apresenta-se como um tumor encapsulado de limites, contornos e tamanhos bem definidos, contendo áreas císticas e elementos ósseos no seu interior. A ressonância nuclear magnética é útil para avaliar a relação do mediastino com as estruturas hilares.(6,7)

Histologicamente caracteriza-se por apresentar áreas císticas e sólidas. Pode conter dentes, pele e pêlo (folheto ectoderma); cartilagem e osso (folheto mesodérmico); e tecido brônquico, intestinal ou pancreático (folheto endodérmico).(5,8) No caso aqui relatado, foram encontrados tecidos cartilaginoso, epidérmico e ósseo, e também pêlos.

O exame anatomopatológico da peça cirúrgica do caso aqui relatado revelou teratoma com degeneração maligna, a qual é definida como crescimento de células malignas não germinativas em um teratoma pré-existente. Essa evolução é rara tanto em gônadas como em sítios extragonadais e permanece indeterminada. Há relatos de ­surgimento em pacientes submetidos à quimioterapia e/ou à radioterapia. Em cistos dermóides de ovário, a degeneração é descrita em cerca de 1-2% dos casos.(3) Em 1987, descreveu-se um caso de tumor carcinóide crescendo no interior de uma neoplasia de célula germinativa de mediastino em paciente que havia sido tratado com quimioterapia e radioterapia.(9)

Na literatura, há poucos casos documentando degeneração maligna de teratomas mediastinais. Em 1985, descreveram-se três casos (adenocarcinoma, sarcoma e neuroepitelioma maligno).(10) Em 1989, relatou-se um caso de carcinoma de células escamosas.(11) Em 1994, relatou-se um caso de adenocarcinoma bem diferenciado.(12)

No caso aqui relatado, foi encontrado um tumor carcinóide primário com degeneração maligna no interior do teratoma. Tal evolução é extremamente rara, havendo apenas três casos semelhantes publicados em periódicos das bases de dados Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde, Medline e PubMed.(1,4,13)

No estudo anatomopatológico da peça, foram encontradas células com núcleos regulares e aspecto em sal-e-pimenta no interior do teratoma. A imunohistoquímica dessa região mostrou-se positiva para cromogranina, o que é característico de tumor carcinóide.(14)

Os teratomas maduros são usualmente tratados por ressecção cirúrgica. A abordagem mais usual é a esternotomia mediana,(14) porém, no caso em questão, optamos pela toracotomia direita em razão da localização justa-mediastinal direita do tumor. Acessamos o tumor por completo. Realizamos dissecção do tumor junto à veia cava superior e retiramos o "tampão" pericárdico para que a operação pudesse ser oncologicamente curativa. Alguns autores(15) descrevem uma série de 95 ressecções de teratomas mediastinais em 50 anos. Nessa longa série, três pacientes foram submetidos à lobectomia, cinco pacientes foram submetidos a ressecções pulmonares parciais, e sete pacientes foram submetidos à pericardiectomia.

A videotoracoscopia tem sido introduzida na ressecção de teratomas mediastinais com resultados promissores.(16) No caso aqui relatado, porém, a degeneração maligna, com infiltração de tecidos e órgãos adjacentes, tornaria difícil a utilização de tal via de acesso.

Em razão da presença de degeneração carcinóide, houve necessidade de complementação com tratamento adjuvante. Os efeitos terapêuticos da irradiação são desconhecidos no tumor carcinóide. A radioterapia apresenta efeito paliativo na presença de metástases ósseas sintomáticas e no controle da doença local. Os análogos da ­somatostatina de longa duração devem ser considerados quando o paciente apresenta síndrome carcinóide e elevados níveis de marcadores bioquímicos. Um grupo de autores(17) utilizou terapia de rotina com octreotídeo intravenoso no pré-, intra- e pós-operatório em 82 pacientes com tumores carcinóides avançados submetidos a cirurgia. Nenhum paciente apresentou síndrome carcinóide. O tumor carcinóide com metástase linfonodal apresenta taxa maior de recidiva. A eficácia da quimioterapia é motivo de controvérsia; entretanto, há relatos de que a quimioterapia, utilizada na presença de doença locorregional e à distância, interfere na sobrevida.(16,17) A causa mais comum de morte nesses doentes é a progressão para doença metastática avançada. Pacientes tratados com terapêutica cirúrgica ­agressiva apresentam sobrevida de 50 a 80%. Entretanto a sobrevida em cinco anos varia de 18 a 30% na presença de metástase.(17,18)

Referências

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2. Castro Jr MA, Rosemberg NP, Castro MA, Castro AP, Wietzycoscki C, Mespaque C. Mediastinal teratoma mimicking pleural effusion on chest X-rays. J Bras Pneumol. 2007;33(1):113-5.

3. Lancaster KJ, Liang CY, Myers JC, McCabe KM. Goblet cell carcinoid arising in a mature teratoma of the mediastinum. Am J Surg Pathol. 1997;21(1):109-13.

4. Lancaster KJ, Liang CY, Myers JC, McCabe KM. Goblet cell carcinoid arising in a mature teratoma of the mediastinum. Am J Surg Pathol. 1997;21(1):109-13.

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18. Maggard MA, O'Connell JB, Ko CY. Updated population-based review of carcinoid tumors. Ann Surg. 2004;240(1):117-22.


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Trabalho realizado na Disciplina de Cirurgia Torácica da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo - FCMSCSP - São Paulo (SP) Brasil.
1. Ex Residente da Disciplina de Cirurgia Torácica. Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo - FCMSCSP - São Paulo (SP) Brasil.
2. Residente do 4º ano da Disciplina de Cirurgia Torácica. Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo - FCMSCSP - São Paulo (SP) Brasil.
3. Professor Titular da Disciplina de Cirurgia Torácica. Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo - FCMSCSP - São Paulo (SP) Brasil .
4. Professor Instrutor da Disciplina de Cirurgia Torácica. Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo - FCMSCSP - São Paulo (SP) Brasil.
5. Pós-graduando do Departamento de Cirurgia. Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo - FCMSCSP - São Paulo (SP) Brasil.
6. Médica Residente do Departamento de Patologia. Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo - FCMSCSP - São Paulo (SP) Brasil.
Endereço para correspondência: Fabiano Alves Squeff. Rua Senador Olegário Pinto, Q.16/L.12, Jundiaí, CEP 75110-630, Anápolis, GO, Brasil.
Tel 55 62 3324-7614. E-mail: fasqueff@bol.com.br
Recebido para publicação em 14/11/2007. Aprovado, após revisão, em 30/11/2007.

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