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Comunicação Breve

Prevalência da infecção pelo HIV em pacientes com tuberculose na atenção básica em Fortaleza, Ceará

Prevalence of HIV infection in tuberculosis patients treated at primary health care clinics in the city of Fortaleza, Brazil

Helder Oliveira e Silva, Marcelo Luiz Carvalho Gonçalves

ABSTRACT

The objective of this study was to determine the prevalence of HIV infection among individuals ≥ 15 years of age with a confirmed diagnosis of tuberculosis and treated at family health care clinics in the city of Fortaleza, Brazil. We evaluated a random sample of 110 patients with tuberculosis, treated at a total of 26 family health care clinics between January and May of 2009. All of the participants completed a questionnaire regarding sociodemographic and clinical data, and all underwent HIV testing. In this sample, the prevalence of tuberculosis/HIV co-infection was 3.6% (95% CI: 0.2-7.0).

Keywords: Tuberculosis; HIV seroprevalence; Primary health care.

RESUMO

O objetivo deste trabalho foi determinar a prevalência da infecção pelo HIV em indivíduos com ≥ 15 anos de idade e diagnóstico confirmado de tuberculose, acompanhados em Centros de Saúde da Família de Fortaleza (CE). Uma amostra aleatória de 110 pacientes com diagnóstico de tuberculose de 26 Centros de Saúde da Família foi incluída no estudo, realizado entre os meses de janeiro e maio de 2009. Todos os participantes responderam a um questionário com dados sociodemográficos e clínicos e realizaram sorologia para o HIV. Nesta amostra, a prevalência de coinfecção tuberculose/HIV foi de 3,6% (IC95%: 0,2-7,0).

Palavras-chave: Tuberculose; Soroprevalência de HIV; Atenção primária à saúde.

A tuberculose permanece sendo um agravo com forte impacto no perfil de morbidade e mortalidade no Brasil. É mais frequente nos grandes centros urbanos, atingindo principalmente os indivíduos com maior vulnerabilidade social. O surgimento do HIV, no início dos anos 80, trouxe uma mudança no perfil clínico e epidemiológico da tuberculose.(1) A infecção pelo HIV tornou-se um importante fator de risco para o desenvolvimento da tuberculose.(1,2) Na presença da coinfecção, a progressão para a doença é estimada em 10% ao ano.(3)

Estima-se que, no mundo, 9% dos pacientes com diagnóstico de tuberculose estejam infectados pelo HIV(4) e que o número de coinfectados atinja globalmente seis milhões de pessoas.(5) O Brasil notifica, em média, 85.000 casos de tuberculose por ano, sendo que aproximadamente 8% dos portadores de tuberculose são também infectados pelo HIV.(6)

O Ministério da Saúde recomenda que todos os pacientes com tuberculose sejam submetidos à testagem sorológica para o HIV.(7) Tal procedimento possibilita um diagnóstico precoce da infecção pelo HIV, permitindo, quando indicado, o início da terapia antirretroviral, gerando uma consequente diminuição de sua morbidade e mortalidade e constituindo-se em uma importante ferramenta para a elaboração e execução de políticas públicas.

O propósito do presente estudo transversal foi calcular a prevalência da infecção pelo HIV em indivíduos com tuberculose atendidos nos Centros de Saúde da Família (CSF) de Fortaleza, CE, unidades responsáveis pela atenção básica no município. Em 2008, aproximadamente 81% dos casos de tuberculose de Fortaleza foram notificados na atenção básica.(8) O município possui 114 bairros, distribuídos em seis regiões administrativas. A amostragem dos CSF foi realizada de forma aleatória, sendo sorteados 30 unidades dentro do universo dos 90 CSF existentes na ocasião. O sorteio desses CSF ocorreu de forma estratificada, levando em consideração o número de unidades de saúde em cada uma das seis regiões administrativas.

O cálculo amostral foi realizado com o auxílio do programa Epi Info, versão 3.5.1. Para um total de 2.038 casos de tuberculose notificados em 2008, e considerando-se uma prevalência esperada de infecção pelo HIV nos casos de tuberculose de 8,0%,(6) com uma precisão de 5,0%, a amostra mínima necessária para o cálculo da proporção de pacientes com a coinfecção tuberculose/HIV, com um nível de confiança de 95%, foi de 107 pacientes.

Os pesquisadores contataram pessoalmente os enfermeiros responsáveis pelo programa de tuberculose dos CSF sorteados para o estudo, explicando os procedimentos da pesquisa. Esses fizeram o recrutamento dos pacientes e o preenchimento do instrumento de coleta de dados. A coleta de dados nos CSF ocorreu no período entre janeiro e maio de 2009. Todos os pacientes com diagnóstico de tuberculose atendidos sequencialmente nas unidades de saúde e que preencheram os critérios de inclusão foram convidados a participar do estudo, até o preenchimento do número amostral mínimo. Foram considerados os seguintes critérios de inclusão: residência no município; idade ≥ 15 anos; início de acompanhamento da tuberculose na atenção básica a partir de setembro de 2008; e diagnóstico de tuberculose confirmado de acordo com os seguintes critérios estabelecidos pelo Ministério da Saúde(7): duas baciloscopias positivas, ou uma baciloscopia positiva e uma radiografia de tórax sugestiva de tuberculose, ou um exame de cultura positiva para Mycobacterium tuberculosis, ou um resultado de biópsia compatível com tuberculose.

A coleta de dados foi realizada por meio de um questionário, avaliando as variáveis sexo, idade, estado civil, escolaridade em anos, forma clínica da tuberculose e sorologia para o HIV. A sorologia para o HIV foi realizada no laboratório público de referência do município, seguindo o fluxo regular de exames das unidades de saúde. Os dados foram analisados no programa Statistical Package for the Social Sciences, versão 11.5 (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA). Para a variável sorologia para o HIV, foi considerado o intervalo de confiança de 95%. O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade de Fortaleza, parecer nº 356/2008. Os pacientes que aceitaram participar foram informados dos objetivos da pesquisa e, após a assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido, foram incluídos no estudo.

Dos 30 CSF sorteados e contatados, 26 devolveram os instrumentos de coleta devidamente preenchidos. Todos os pacientes consecutivamente atendidos nessas 26 unidades e com diagnóstico confirmado de tuberculose foram convidados a participar do estudo. Do total de 114 pacientes convidados, 4 (3,5%) não desejaram participar. Os 110 pacientes incluídos na pesquisa tiveram início de tratamento da tuberculose entre os meses de setembro de 2008 e maio de 2009. A média de idade dos pacientes foi de 40,3 ± 16,7 anos (variação: 16-90 anos). A Tabela 1 apresenta o perfil sociodemográfico dos 110 pacientes incluídos no estudo.



A prevalência da infecção pelo HIV nos pacientes com tuberculose avaliados foi de 3,6% (IC95%: 0,2-7,0). Dentre os 106 pacientes com tuberculose e com sorologia negativa para o HIV, 98 (92,5%) apresentaram a forma pulmonar da doença. Desses 98 pacientes, 93 (94,9%) apresentaram baciloscopia positiva. Dos 4 pacientes infectados pelo HIV, 2 (50,0%) apresentaram a forma pulmonar, ambos com baciloscopia positiva.

Os pacientes com tuberculose extrapulmonar tiveram a confirmação do diagnóstico em unidades de atenção secundária, sendo encaminhados para tratamento nas unidades básicas de saúde. Não houve registro sobre a realização de cultura para micobactérias nos pacientes com tuberculose extrapulmonar. A confirmação do diagnóstico nesses pacientes ocorreu por meio de exame histopatológico. Nas últimas décadas, houve um aumento na incidência das formas extrapulmonares, principalmente devido à expansão da AIDS. Em indivíduos com imunodeficiência, as formas extrapulmonares são mais frequentes do que entre os imunocompetentes.(9)

A prevalência da infecção pelo HIV em indivíduos com tuberculose no Brasil é estimada em 8% pelo Ministério da Saúde. Estudos em diversas regiões do país têm apresentado uma grande amplitude de variação dessa prevalência, de 0,8% a 30%, em função do local estudado e da metodologia utilizada.(10-13)

A solicitação da pesquisa de anticorpos para a detecção da infecção pelo HIV em pacientes com diagnóstico de tuberculose no Brasil ainda é baixa. Em aproximadamente 50% dos pacientes, o resultado sorológico é conhecido em momento oportuno.(14) A detecção precoce da coinfecção tuberculose/HIV permite a adoção de medidas terapêuticas adequadas, como o início da terapia antiretroviral e a profilaxia de infecções oportunistas, reduzindo os custos com internações e melhorando a qualidade de vida dos pacientes. Uma estratégia viável e de fácil operacionalização com o objetivo de melhorar a cobertura do teste sorológico para o HIV nos pacientes com diagnóstico de tuberculose é a utilização de testes rápidos nas unidades de saúde da rede de atenção básica.

Referências

1. Lemos AC. Tuberculosis/HIV co-infection. J Bras Pneumol. 2008;34(10):753-5. http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132008001000001

2. Muniz JN, Ruffino-Netto A, Villa TC, Yamamura M, Arcencio R, Cardozo-Gonzales RI. Epidemiological aspects of human immunodeficiency virus/tuberculosis co-infection in Ribeirão Preto, Brazil from 1998 to 2003. J Bras Pneumol. 2006;32(6):529-34. PMid:17435903. http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132006000600010

3. Dolin PJ, Raviglione MC, Kochi A. Global tuberculosis incidence and mortality during 1990-2000. Bull World Health Organ. 1994;72(2):213-20. PMid:8205640 PMCid:2486541.

4. World Health Organization [homepage on the Internet]. Geneva: World Health Organization. [cited 2008 Aug 20]. WHO report 2008: Global tuberculosis control: surveillance, planning, financing [Adobe Acrobat document, 304p.]. Available from: http://www.who.int/tb/publications/global_report/2008/pdf/fullreport.pdf

5. Post JJ, Emerson CR. To routinely offer testing for HIV infection in all cases of tuberculosis: a rational clinical approach? Med J Aust. 2008;188(3):162-3. PMid:18241175.

6. Jamal LF, Moherdaui F. Tuberculosis and HIV infection in Brazil: magnitude of the problem and strategies for control [Article in Portuguese]. Rev Saude Publica. 2007;41 Suppl 1:104-10. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102007000800014

7. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Guia de vigilância epidemiológica. Brasília: Ministério da Saúde; 2009.

8. Secretaria Municipal da Saúde de Fortaleza [homepage on the Internet]. Fortaleza: prefeitura de Fortaleza. [cited 2011 Nov 27]. Boletim de Saúde de Fortaleza: Tuberculose [Adobe Acrobat document, 78p.]. Available from: http://www.sms.fortaleza.ce.gov.br/images/boletins/2010-tuberculose.pdf

9. World Health Organization. TB/HIV A Clinical Manual. Geneva: World Health Organization, 2004.

10. Matos ED, Lemos AC, Bittencourt C, Mesquita CL, Kuhn PC. Prevalence of HIV infection in patients hospitalized for tuberculosis in Bahia, Brazil. Braz J Infect Dis. 2007;11(2):208-11. PMid:17625762. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-86702007000200007

11. Silveira MP, de Adorno RF, Fontana T. Profile of patients with tuberculosis: evaluation of the Brazilian national tuberculosis control program in Bagé, Brazil. J Bras Pneumol. 2007;33(2):199-205. PMid:17724540. http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132007000200015

12. Muniz JN, Ruffino-Netto A, Villa TC, Yamamura M, Arcencio R, Cardozo-Gonzales RI. Epidemiological aspects of human immunodeficiency virus/tuberculosis co-infection in Ribeirão Preto, Brazil from 1998 to 2003. J Bras Pneumol. 2006;32(6):529-34. PMid:17435903. http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132006000600010

13. Coelho AG, Zamarioli LA, Perandones CA, Cuntiere I, Waldman EA. Characteristics of pulmonary tuberculosis in a hyperendemic area: the city of Santos, Brasil. J Bras Pneumol. 2009;35(10):998-1007. PMid:19918633.

14. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Vigilância Epidemiológica. Manual de recomendações para o controle da tuberculose no Brasil. Brasília: Ministério da Saúde; 2011.


Trabalho realizado na Secretaria Municipal de Saúde de Fortaleza e na Secretaria da Saúde do Estado do Ceará, Fortaleza (CE) Brasil.
Endereço para correspondência: Marcelo Luiz Carvalho Gonçalves. IPEC/Fiocruz, Avenida Brasil, 4365, Manguinhos, CEP 21040-360, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
Tel. 55 21 8585-2408. E-mail: mlcg@ig.com.br
Apoio financeiro: Este estudo recebeu apoio financeiro do Fundo Global Tuberculose Brasil.
Recebido para publicação em 10/10/2011. Aprovado, após revisão, em 29/2/2012.



Sobre os autores

Helder Oliveira e Silva
Enfermeiro. Secretaria Municipal de Saúde de Fortaleza e Secretaria da Saúde do Estado do Ceará, Fortaleza (CE) Brasil.

Marcelo Luiz Carvalho Gonçalves
Médico Assistente. Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas, Fundação Oswaldo Cruz; e Professor. Universidade Gama Filho, Rio de Janeiro (RJ) Brasil.

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