Continuous and bimonthly publication
ISSN (on-line): 1806-3756

Licença Creative Commons
6167
Views
Back to summary
Open Access Peer-Reviewed
Cartas ao Editor

Controle ambiental e prevenção de alergia respiratória: evidências e obstáculos

Environmental control and prevention of respiratory allergy: evidence and obstacles

Nelson Rosário

Prezado Editor:

O tratamento preventivo da alergia tem vários níveis: primário, secundário e terciário. O emprego de vacinas de alérgenos pode proporcionar melhora permanente do processo alérgico, prevenir novas sensibilizações e impedir o aparecimento de asma nos pacientes com rinite alérgica isolada.

A prevenção primária consiste em atuar sobre aqueles indivíduos de alto risco para evitar a sensibilização alérgica. Na prevenção secundária, o indivíduo já está sensibilizado, e deve-se agir para reduzir os níveis de alérgenos que não incorram em aparecimento de sintomas. Já na prevenção terciária, estratégias para o manejo da rinite ou asma alérgica visam reduzir ou eliminar as limitações da doença a longo prazo com recursos farmacológicos e não-farmacológicos.

Recentemente, foi questionado se as evidências do benefício da higiene ambiental são realmente fortes.(1)

Em uma revisão sistemática das medidas para se evitar alérgenos dos ácaros domésticos, demonstrou-se que, isoladamente, estas não são úteis para reduzir os sintomas de rinite alérgica. Não há benefícios de intervenções físicas ou químicas. Forrar os colchões com material impermeável reduz os níveis de alérgenos de Dermatophagoides pteronyssinus tipo 1 (Der  p 1) em aproximadamente 30%, mas sem interferir nos desfechos clínicos.

Apesar disso, há consenso geral que evitar alérgenos leva à redução de sintomas e pode auxiliar alguns pacientes alérgicos.(2)

Outra meta-análise, agora com resultados negativos para asma, originou um editorial da publicação Lancet, cujo título é "Medidas de controle do ácaro sem nenhuma utilidade".(3,4) Esta revisão sobre o controle do ambiente e as medidas para evitar a exposição aos ácaros da poeira tem sérias deficiências nos critérios de inclusão e de exclusão dos estudos, bem como na maneira como estes foram avaliados.(4,5)

No entanto, diretrizes baseadas em evidências para o tratamento da asma revisadas pelo National Asthma Education and Prevention Program (NAEPP) em 2007 recomendam o afastamento de alérgenos como parte do tratamento da asma em pacientes com sensibilização conhecida.(6) O painel de expertos teve acesso a todos os relatos incluídos na biblioteca Cochrane e revisou milhares de outros artigos sobre o tratamento da asma. É óbvio que há muitas maneiras de se chegar a conclusões incorretas em meta-análises.(7) Por exemplo, pela triagem incompleta da literatura, por seleção inadequada de artigos e por análise estatística inadequada. Aspectos que devem ser observados em revisões sistemáticas incluem o modo como as análises foram conduzidas e escritas, assim como o conhecimento dos autores sobre o assunto.

Platts-Mills faz uma crítica em um editorial do Journal of Allergy and Clinical Immunology a alguns autores que acreditam que a meta-análise lhes confere certo status que os coloca acima do criticismo acadêmico natural.(8)

Protocolos de controle ambiental que obtiveram êxito mostram alta variabilidade nos desfechos, e as intervenções são dificilmente mantidas se não houver um programa paralelo de educação para o paciente.(8)

Além disso, a maioria dos pacientes é polissensibilizada, isto é, alérgica
a vários antígenos. O paciente que foi submetido a testes cutâneos previamente à intervenção no ambiente e que percebeu o resultado positivo do teste já não terá um comportamento natural em estudos clínicos. Outro ponto importante na análise destes estudos é como desenvolver um protocolo controlado nestas circunstâncias. Qual seria o controle, sem intervenção?

Com esta imensa variabilidade nos estudos publicados, Platts-Mills questiona se são válidas as meta-análises, quando, para isso, os estudos deviam ser comparáveis na avaliação de pacientes, na intervenção e nos desfechos. Destaca ainda séries de estudos em que medidas de higiene ambiental para alérgenos se acompanhavam da redução no nível de exposição a aeroalérgenos com resultados clínicos positivos.(8-10) Finaliza enfatizando que as conclusões do NAEPP são corretas e que programas para a redução da exposição a alérgenos devem ser recomendados como parte do tratamento da asma.

Medidas de higiene do ambiente devem ser mantidas continuamente na prevenção da sensibilização alérgica e na redução de manifestações clínicas decorrentes da exposição a fatores alergênicos em pacientes com rinite e asma. O desafio a longo prazo é manter a aderência às instruções do médico.

Nelson Rosário, Professor
Titular de Pediatria,
Universidade Federal do Paraná - UFPR - Curitiba (PR) Brasil


Referências

1. Sheikh A, Hurwitz B, Shehata Y. House dust mite avoidance measures for perennial allergic rhinitis. Cochrane Database Syst Rev. 2007;(1):CD001563.

2. Bousquet J, Khaltaev N, Cruz AA, Denburg J, Fokkens WJ, Togias A, et al. Allergic Rhinitis and its Impact on Asthma (ARIA) 2008 update (in collaboration with the World Health Organization, GA(2)LEN and AllerGen). Allergy. 2008;63 Suppl 86:8-160.

3. Dust-mite control measures of no use. Lancet. 2008;371(9622):1390.

4. Gøtzsche PC. Asthma guidelines on house dust mites are not evidence-based. Lancet. 2007;370(9605):2100-1.

5. Gøtzsche PC, Johansen HK. House dust mite control measures for asthma: systematic review. Allergy. 2008;63(6):646-59.

6. National Heart, Lung, and Blood Institute. Expert panel report 3: guidelines for the diagnosis and management of asthma: full report 2007. Bethesda: National Heart, Lung, and Blood Institute; 2007.

7. Portnoy JM. Immunotherapy for asthma: unfavorable studies. Ann Allergy Asthma Immunol. 2001;87(1 Suppl 1):28-32.

8. Platts-Mills TA. Allergen avoidance in the treatment of asthma: problems with the meta-analyses. J Allergy Clin Immunol. 2008;122(4):694-6.

9. Platts-Mills TA, Vaughan JW, Carter MC, Woodfolk JA. The role of intervention in established allergy: avoidance of indoor allergens in the treatment of chronic allergic disease. J Allergy Clin Immunol. 2000;106(5):787-804.

10. Morgan WJ, Crain EF, Gruchalla RS, O'Connor GT, Kattan M, Evans R 3rd, et al. Results of a home-based environmental intervention among urban children with asthma. N Engl J Med. 2004;351(11):1068-80.




Indexes

Development by:

© All rights reserved 2024 - Jornal Brasileiro de Pneumologia