ABSTRACT
Objective: To analyze hospitalizations for respiratory diseases among children under 15 years of age in an area with high levels of environmental pollution. Methods: A cross-sectional study of hospitalizations due to respiratory diseases of patients residing in the city of Tangará da Serra, located in the state of Mato Grosso (Brazilian Amazon region), from 2000 to 2005. Data on hospital admissions were obtained from the Brazilian Unified Health Care System and from Brazilian Institute of Geography and Statistics population estimates. Results: In 2005, the rate of hospitalization for respiratory diseases among children under 15 years of age in the microregion of Tangará da Serra was 70.1/1,000 children. Between 2000 and 2005, there were 12,777 such admissions, of which 8,142 (63.7%) were for respiratory diseases. During the dry season (May to October), the rate of admissions for respiratory diseases was 10% higher than during the rainy season (November to April). The principal causes of admission included pneumonia (90.7%) and respiratory insufficiency (8.5%). Admissions of children under 5 years of age for pneumonia were 4 times the expected number for the city. Children under 12 months of age were the most frequently hospitalized, with an average increase of 32.4 admissions per 1,000 children per year. Conclusions: Tangará da Serra presented a high number of pediatric admissions for respiratory diseases. Therefore, it is logical to consider it a priority area for investigation and monitoring of the environmental risk factors for such diseases.
Keywords:
Respiratory tract diseases; Pneumonia; Hospitalization; Climate; Air pollution/Brazil.
RESUMO
Objetivo: Analisar as internações hospitalares por doenças respiratórias em menores de 15 anos de idade em uma área com elevados níveis de
poluição ambiental. Métodos: Estudo transversal da morbidade hospitalar por doenças respiratórias de residentes no município de Tangará
da Serra (MT) na Amazônia brasileira, no período de 2000 a 2005, através de dados de internações hospitalares do Sistema Único de Saúde
brasileiro e de estimativas populacionais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Resultados: Em 2005, a taxa de internações por
doenças respiratórias em menores de 15 anos foi de 70,1/1.000 crianças na microrregião de Tangará da Serra. Entre 2000 a 2005 ocorreram,
no município de Tangará da Serra, 12.777 internações de crianças, das quais 8.142 (63,7%) por doenças respiratórias. No período da seca
(maio a outubro) houve 10% mais internações por doenças respiratórias que no período da chuva (novembro a abril). As principais causas
de internação foram: pneumonias (90,7%) e insuficiência respiratória (8,5%). Em menores de 5 anos de idade, as internações por pneumonia
foram mais de 4 vezes o esperado para o município. Os menores de 12 meses de idade foram mais frequentemente internados, com
incremento médio de 32,4 internações por 1.000 crianças a cada ano. Conclusões: Tangará da Serra tem apresentado elevado número de
internações por doenças respiratórias, portanto, é coerente considerá-lo como área prioritária para investigação e monitoramento dos fatores
de risco ambientais para tais doenças.
Palavras-chave:
Doenças respiratórias; Pneumonia; Hospitalização; Clima; Poluição do ar/Brasil.
IntroduçãoAs doenças respiratórias, tanto as agudas quanto as crônicas, são importante causa de morbimortalidade. No mundo, crianças menores de 5 anos moradoras em áreas urbanas, apresentam 4 a 6 episódios de infecção respiratória aguda (IRA) por ano; enquanto em áreas rurais a freqüência é de 2 a 4 episódios por criança/ano, independente do nível de desenvolvimento da região.(1)
A maior parte desses casos são infecções autolimitadas do trato respiratório superior. Porém, os casos que culminam com internação afetam mais frequentemente crianças de países em desenvolvimento, principalmente por pneumonia.(2)
Estima-se que nesses países ocorram cerca de 0,28 episódios de pneumonia por criança/ano em menores de 5 anos. Entre 7 e 13% desses episódios requerem hospitalização.(3) No entanto, países de uma mesma região podem apresentar contrastes importantes na morbimortalidade por IRA.(2)
No Brasil as doenças respiratórias são responsáveis por aproximadamente 16% de todas as internações, sendo 50% delas devido à pneumonia.(4) Porém, em grupos mais vulneráveis como as crianças, as doenças respiratórias compreendem mais de 50% das internações hospitalares.(5)
Além das doenças agudas, as crônicas têm apresentado relevância pelo aumento da prevalência no Brasil e no mundo. Nesse grupo, destaca-se a asma, cuja prevalência média no Brasil é de 20%,(6) acima da média de outros países da América Latina e um dos mais altos do mundo. Entre 5 e 10% dos casos de asma são considerados graves,(7) podendo requerer internação.
Os fatores de risco para internação hospitalar por doenças respiratórias incluem: exposição a poluentes ambientais,(8-11) especialmente o tabagismo(12); a aglomeração domiciliar; déficit no estado nutricional(13); sazonalidade climática(14); esquemas de imunização incompletos(15); baixa condição sócio-econômica(16); e exposição a agentes biológicos, como o pólen.(6) Tais fatores atingem principalmente os indivíduos nos extremos de idade, como crianças menores de 5 anos ou idosos maiores de 65 anos.
A exposição a poluentes ambientais é uma situação particularmente problemática em alguns municípios do Estado de Mato Grosso. Estudo realizado em Cuiabá, capital do Estado, mostrou maior proporção de internações por doenças respiratórias no período da seca, quando há maior número de queimadas na região.(14)
O município de Tangará da Serra, área do presente estudo, está situado no trajeto de dispersão dos poluentes gerados tanto em países vizinhos quanto na área do arco do desmatamento, além de possuir uma área crescente de cultivo de cana-de-açúcar para abastecer três usinas de processamento na região. A queima de cana-de-açúcar no período da seca é uma prática que tem aumentado as concentrações de gases e partículas de aerossol na atmosfera da região. Além disso, o município está incluído numa área de bioma amazônico, com ciclos bem definidos de seca e chuva.
Em razão desse importante cenário sócio-ambiental e das perspectivas de crescimento do agronegócio para a região, este estudo tem por objetivo analisar as internações hospitalares por doenças respiratórias em menores de 15 anos segundo faixa etária, sexo, diagnóstico, assim como a tendência e sazonalidade climática destas internações no município de Tangará da Serra, Mato Grosso.
MétodosDesenho do estudoEstudo transversal da morbidade hospitalar por doenças respiratórias (capítulo X da Décima Revisão da Classificação Internacional de Doenças-CID-10-códigos J00 a J99) de residentes no município de Tangará da Serra, no período de 2000 a 2005. Utilizou-se a base de dados das autorizações de internações hospitalares (AIHs) do Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde (SUS) do Ministério da Saúde. As informações populacionais por idade foram obtidas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Para o ano 2000 considerou-se o censo; para os demais, as estimativas populacionais. Dados de umidade relativa do ar foram obtidos do Instituto Nacional de Meteorologia(17) disponíveis somente a partir de 2003. Selecionou-se as AIHs pagas, não-eletivas, de curta permanência (tipo 1) segundo o ano de ocorrência da internação e local de residência do paciente. A tabela de valores pagos por procedimentos foi fornecida pelo Escritório Regional de Saúde para comparação de valores. A sazonalidade foi definida para efeitos desse estudo em períodos de seca (maio a outubro) e chuva (novembro a abril). Os indivíduos menores de 15 anos foram definidos como aqueles que possuíam, até a data da internação, ao menos 14 anos, 11 meses e 29 dias.
População e área do estudoTangará da Serra é município-sede assistencial da microrregião de Tangará da Serra, que congrega os municípios de Barra do Bugres, Tangará da Serra, Nova Olímpia, Denise e Porto Estrela. A rede hospitalar é composta por quatro hospitais privados num total de 180 leitos. Desse total, dois hospitais, com 79 leitos são conveniados ao SUS, além de 32 leitos da Unidade Mista de Saúde.(18) A opção por pesquisar o grupo de crianças menores de 15 anos deve-se ao maior volume de atendimentos hospitalares que elas representam nos serviços e à maior vulnerabilidade desse grupo etário.
Análise dos dadosForam construídas taxas de internação por doenças respiratórias em menores de 15 anos segundo microrregiões do Estado de Mato Grosso para o ano 2005. Das internações de residentes no município de Tangará da Serra, de todas as idades, calculou-se a proporção de internação por capítulo por ano. Compararam-se as internações por doenças respiratórias com as internações por gravidez, parto e puerpério em razão desta ser a principal causa de internações registrada no Brasil.(19) Foram calculadas proporções e taxas de internação em menores de 15 anos, bem como a tendência linear dessa taxa. A média de internações mensais para esse período foi calculada e apresentada em gráfico juntamente com a média da umidade em 2005. As variáveis selecionadas para o estudo foram: sexo, idade, mês de internação, ano de internação, capítulos CID-10, grupos de causas e evolução. O período neonatal foi excluído de algumas análises ou analisado separadamente, em razão da importância do componente da atenção ao pré-natal e parto na morbimortalidade desse grupo etário. Foi utilizado o software TabWin (http://www.datasus.gov.br) para a conversão e análise dos dados provenientes do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS). O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Júlio Muller do Estado de Mato Grosso em 24 de janeiro de 2007.
ResultadosNo ano de 2005, a microrregião de Tangará da Serra apresentou a maior taxa de internações por doenças respiratórias do Estado de Mato Grosso em menores de 15 anos (70,1/1.000 crianças) seguida da microrregião de Canarana, com taxa de 64,6 por 1.000 crianças (Figura 1). Quando agrupadas em quartis, 75% das microrregiões do Estado apresentaram taxas menores que 54,1/1.000 crianças.
No período de seis anos da série em estudo, houve 29.619 internações pelo SUS de residentes no município de Tangará da Serra, das quais 10.662 (36%) foram decorrentes de doenças respiratórias.
As internações por doenças respiratórias foram a primeira causa de internação em todo o período estudado, sendo verificados valores de 10 a 50% acima da proporção de internações por gravidez, parto e puerpério. A proporção de internações por doenças respiratórias variou de 33,2% (2002) a 41% (2004) seguida da proporção de internações por gravidez, parto e puerpério, com variação de 18,3% (2002) a 22,3% (2004).
Em menores de 15 anos ocorreram 12.777 internações por todas as causas, das quais 8.142 (63,7%) por doenças respiratórias. Quando excluído o período neonatal, as internações por todas as causas nessa faixa etária somaram 11.713, sendo 7.733 (66%) por doenças respiratórias. Destas, 4.275 (52,3%) eram do sexo masculino e 3.458 (44,7%) do sexo feminino.
Dentre as 8.142 crianças internadas por doenças respiratórias no período, 15 foram a óbito, dos quais 11 (73,3%) do sexo feminino e 4 (26,7%) do sexo masculino, com taxa de letalidade hospitalar de 1,8/1.000 internações e 0,9/1.000 internações se excluído o período neonatal.
A taxa de internações por doenças respiratórias em menores de 15 anos apresentou incremento médio estimado em 2,6/1.000 criança por ano. Em menores de 12 meses, entretanto, esse incremento médio foi da ordem de 32,4/1.000 criança por ano. Esse grupo etário apresentou as maiores taxas de internações por doenças respiratórias em todo o período estudado (Figura 2).
Em menores de 15 anos, as internações por doenças do trato respiratório superior corresponderam a 1,5% de todas as internações por doenças respiratórias, enquanto as do trato inferior corresponderam a 98,5%; principalmente aquelas devido a condições agudas, que representaram 99,5% das internações por doenças do trato respiratório inferior.
As pneumonias foram a principal causa de internação (90,7%), seguidas de insuficiência respiratória, que respondeu por 8,5% das internações. As doenças respiratórias crônicas, entretanto, representaram 0,5% das internações, em decorrência de asma, estado de mal asmático e bronquiectasia.
A distribuição de casos de internação por pneumonia em menores de 5 anos durante todo o período do estudo foi mais de 4 vezes o esperado para o município (Tabela 1).
Excluído o período neonatal, as crianças do sexo masculino apresentaram taxa de internação por doenças respiratórias em média 20% maior que aquelas do sexo feminino, com variação de 63,6/1.000 crianças em 2000 até 72,7/1.000 crianças em 2005. As crianças do sexo feminino apresentaram variação da taxa de 47,4/1.000 crianças em 2000 a 76,3/1.000 crianças em 2003.
As internações por doenças respiratórias apresentam redução nos meses de dezembro, janeiro e fevereiro. Há aumento dos casos de internação por doenças respiratórias no mês de março e nos meses de seca extrema (julho, agosto e setembro), enquanto as internações pelos demais capítulos apresentam variações mais suaves ao longo dos meses do ano (Figura 3a).
No período da seca verificou-se em média 10% mais internações por doenças respiratórias que no período da chuva. Destaca-se o ano 2001, em que houve 50% mais internações no período da seca quando comparado ao da chuva (Tabela 2).
Analisando a média mensal de internações agregadas de 2003 a 2005 e a média mensal da umidade relativa do ar em 2005, observa-se que há um pico de internações em agosto, quando a umidade relativa do ar atinge níveis mais baixos (Figura 3b). Nesse período, a temperatura média mensal apresentou variação discreta de 21,8 a 25,4 °C.
DiscussãoOs registros do DATASUS sobre as internações hospitalares no Mato Grosso, Centro-Oeste e Brasil mostram que a maior parte das AIHs pagas referem-se àquelas por gravidez, parto e puerpério.(4,19) No município de Tangará da Serra, no entanto, as internações por doenças respiratórias representaram a maior proporção em todo o período.
Por outro lado, verifica-se coerência com a literatura no que se refere à faixa etária, apresentando as maiores taxas de internações por doenças respiratórias em crianças de até 12 meses. Sabe-se que o risco de contrair IRA não é diferente para crianças menores de 12 meses e para aquelas de 12 meses a 4 anos, porém o risco de hospitalização é maior entre os primeiros, possivelmente devido à maior vulnerabilidade.(20)
No período neonatal, a letalidade hospitalar por doenças respiratórias foi maior: além dos muitos fatores de risco para maior morbimortalidade nesse grupo etário, o componente da atenção ao pré-natal, parto e puerpério deve ser levado em consideração nessa letalidade.(21)
Observou-se que crianças do sexo masculino foram mais frequentemente internadas por doenças respiratórias que aquelas do sexo feminino. Um relato na literatura mostra que indivíduos do sexo masculino apresentam risco 1,5 vezes maior de internação por doenças respiratórias quando comparados aos do sexo feminino.(22) Entre outros fatores, diferenças anatômicas e maior exposição a fatores de risco são explicações aventadas.
A distribuição de casos de internação por IRA foi mais freqüente neste e em outros estudos.(1-3) Contudo, os casos de pneumonia foram superiores aos estimados para o município segundo método proposto por Rudan et al.,(3) com acréscimo discreto mas constante das taxas de internações por essa causa em menores de 15 anos ao longo da série.
As elevadas proporções de internações por pneumonia podem ser decorrentes de alterações no mecanismo de remuneração dos procedimentos durante o período: o valor da remuneração da internação por pneumonia apresentou um incremento de 124,8% a partir de 2002, atingindo um valor final maior que a remuneração da internação por asma, cujo incremento foi de 51,9%.
Também no caso da insuficiência respiratória aguda, não se pode descartar a influência de mecanismos de remuneração: o valor final da remuneração por insuficiência respiratória foi abaixo do valor pago para internações por pneumonia, porém acima daqueles pagos por asma.
É relevante considerar que as pneumonias fazem parte do rol de condições sensíveis à atenção ambulatorial: adequadamente tratadas nos serviços de atenção primária, não deveriam evoluir para internação.(23) Entretanto, a baixa cobertura do Programa de Saúde da Família no município até 2005 pode ter contribuído para as elevadas proporções de internação por doenças respiratórias: apenas 15,5% da população, de acordo com dados do Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB).
No que se refere às internações por asma, verificou-se o oposto do observado para as internações por pneumonia: considerando a prevalência média de asma no Brasil,(6) além da proporção desses casos que poderiam necessitar de hospitalização,(7) parece haver subregistro dos casos dessa doença.
Sabe-se que quadros infecciosos do trato respiratório superior ou inferior, especialmente os virais, podem ser responsáveis por exacerbação de asma.(7,24,25) No entanto, ao que parece, mesmo em casos de manifestação de asma, o diagnóstico mais valorizado como causa principal da internação é a pneumonia.
Além disso, há dificuldade no diagnóstico clínico da asma,(7) bem como preconceito e resistência dos pais em aceitarem que o filho é portador da doença. Esses fatores, isolados ou não, podem contribuir para o subregistro de asma e influenciar a forma como as equipes organizam os serviços de saúde.
Ainda que tenham sido verificadas diferenças no número de internações entre os meses, observa-se sazonalidade operacional com importante queda das internações nos meses de dezembro, janeiro e fevereiro, períodos de férias dos profissionais de saúde, especialmente dos médicos.
Nos meses de fevereiro e março, os profissionais voltam das férias, podendo influenciar o pico observado em março. Entretanto, é também nesse período que as crianças retornam às escolas e creches. Nesse caso, o contato de crianças com baixa imunidade com colegas portadores de microorganismos trazidos dos vários núcleos familiares,(26) influenciado pela aglomeração domiciliar,(13) pode ser um agravante na disseminação de infecções e aumento das taxas de internação.
As internações por doenças respiratórias tenderam a aumento a partir de julho. Sabe-se que meses de seca extrema representam risco de irritação do sistema respiratório e exacerbação dos agravos crônicos, devido à redução da umidade relativa do ar e ao aumento de poluentes atmosféricos.
Quando a umidade relativa se eleva, no final de setembro, a presença de fungos no ambiente intra-domiciliar pode também justificar o pico observado em outubro, uma vez que esses microorganismos são importantes alérgenos especialmente em indivíduos predispostos, estando associados à asma.(7)
Foi relatado na literatura um aumento nas consultas de emergência por asma nos meses chuvosos. No entanto, semelhante a achado observado no presente estudo, houve maior proporção de internações por essa causa no período de seca.(27)
Estudo realizado em Piracicaba identificou aumento de 21,4% nas internações em menores de 13 anos de idade com o incremento dos níveis de poluição do ar.(9) Entretanto, os estudos realizados até o momento referem-se a doença respiratória em situação de exposição à poluição em centros urbanos mais industrializados, com maior densidade populacional e frota de veículos, onde não se observa de forma tão marcante a sazonalidade climática polarizada em duas estações, características diferentes das encontradas em Tangará da Serra. Questiona-se se essa associação seria semelhante em região Amazônica com ciclos de seca e chuva típicos que modificam os níveis de poluição e, possivelmente, a interação dos mesmos com a saúde humana.
Poluentes gerados a partir da queima de biomassa, especialmente da queima da cana-de-açúcar, principal cultura da região, são compostos de partículas muito finas que podem ficar mais tempo em suspensão no ar e atingir porções mais profundas do trato respiratório, causando efeitos adversos à saúde com aumento de internações por doenças respiratórias.(9)
Além do aumento da poluição do ar no período da seca, pode ocorrer redução da dispersão dos poluentes devido às barreiras geográficas do município, ladeado pela Chapada dos Parecis e Serra Tapirapuã, fatores que possivelmente sejam contribuintes para o aumento de internações observadas nesse período.
Analisando as internações de acordo com períodos de seca e chuva, observa-se que todos os anos anteriores a 2004, exceto 2003 apresentaram maior proporção de internações no período da seca, assim como o agregado do período. Ainda que em 2005 tenha ocorrido maior proporção de internações no período chuvoso, esse é um dado isolado para compor uma análise.
Fatores antropogênicos, como a atividade econômica do município e da região, políticas públicas de controle da qualidade do ar e incorporação ou não de tecnologias no processo produtivo, são relevantes para melhor compreensão da situação de saúde local.(28)
Diante do exposto, o município atende aos critérios do programa de Vigilância do Ar (VIGIAR) do Ministério da Saúde para inclusão como "Área de Atenção Ambiental Atmosférica (AAAA) de interesse para a saúde." Portanto, considera-se relevante estabelecer uma unidade sentinela no local.
Deve-se considerar que a população estudada refere-se à parcela dos residentes no município que são usuários do SUS. Além disso, aqueles que evoluíram para hospitalização representam casos mais graves da doença. No entanto, o sistema público de saúde responde pela maioria das internações no país.(29) Os dados de morbidade hospitalar têm apresentado melhora crescente na confiabilidade,(30) sendo facilmente disponibilizados através do meio eletrônico, com pouca defasagem de tempo.
Conclui-se que tanto a microrregião quanto o município de Tangará da Serra têm apresentado as mais altas proporções de internação por doenças respiratórias do Estado de Mato Grosso. Portanto, é coerente considerá-lo como área prioritária para investigação e monitoramento dos fatores de risco para a saúde humana, especialmente os ambientais.
AgradecimentosEste estudo foi desenvolvido como produto do projeto de pesquisa "Avaliação dos efeitos da queima de biomassa na Amazônia Legal à saúde humana", vinculado ao Instituto Milênio, inserido à rede de Experimento de Grande Escala da Biosfera-Atmosfera na Amazônia (LBA). Teve como financiamento recursos do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Referências 1. Pio A, Leowski J, Luelmo F. Epidemiological magnitude of the problem of acute respiratory infections in developing countries. Bull Int Against Tuber. 1983;58:199-208.
2. Benguigui Y. Controle das infecções respiratórias agudas no contexto da estratégia AIDPI nas Américas. Rev Bras Saúde Mater Infant. 2003;3(1):25-36.
3. Rudan I, Tomaskovic L, Boschi-Pinto C, Campbell H; WHO Child Health Epidemiology Reference Group. Global estimate of the incidence of clinical pneumonia among children under five years of age. Bull World Health Organ. 2004;82(12):895-903.
4. Carmo EH, Barreto ML, Silva Jr., JB. Mudanças nos padrões de morbimortalidade da população brasileira: os desafios para um novo século. Epidemiol Serv Saúde. 2003;12(2):63-75.
5. Cesar JA, Horta BL, Gomes G, Shehadeh I, Chitolina J, Rangel L, et al. Utilização de serviços de saúde por menores de cinco anos no extremo sul do Brasil. Cad. Saúde Pública, Rio de Janeiro. 2002;18(1):299-305.
6. Global Initiative for Asthma (GINA). [homepage on the Internet]. Bethesda: National Heart, Lung and Blood Institute. National Institutes of Health, US Department of Health and Human Services; c2000. [cited 2007 may 20] Available from: www.ginasthma.com
7. Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma. J Bras Pneumol. 2006;32(Supl 7):S447-S474.
8. Farhat SC, Paulo RL, Shimoda TM, Conceição GM, Lin CA, Braga AL, et al. Effect of air pollution on pediatric respiratory emergency room visits and hospital admissions. Braz J Med Biol Res. 2005;38(2):227-35.
9. Cançado JE, Saldiva PH, Pereira LA, Lara LB, Artaxo P, Martinelli LA, et al. The impact of sugar cane-burning emissions on the respiratory system of children and the elderly. Environ Health Perspect. 2006;114(5):725-9.
10. Schwartz J. Air pollution and children's health. Pediatrics. 2004;103:S1037-S1043.
11. Cançado JE, Braga A, Pereira LA, Arbex MA, Saldiva PH, Santos UP. Clinical repercussions of exposure to atmospheric pollution. J Bras Pneumol. 2006;32(Supl 2):S5-S11.
12. Blizzard L, Ponsonby AL, Dwyer T, Venn A, Cochrane JA. Parental smoking and infant respiratory infection: how important is not smoking in the same room with the baby? Am J Public Health. 2003;93(3):482-8.
13. Nascimento LF, Marcitelli R, Agostinho FS, Gimenes CS. Análise hierarquizada dos fatores de risco para pneumonia em crianças. J Bras Pneumol. 2004;30(5):445-51.
14. Botelho C, Correia AL, Silva AMC, M AG, Silva COS. Fatores ambientais e hospitalizações em crianças menores de cinco anos com infecção respiratória aguda. Cad. Saúde Públ.2003;19(6):1771-1780
15. Ostapchuk M, Roberts DM, Haddy R. Community-acquired pneumonia in infants and children. Am Fam Physician. 2004;70(5):899-908.
16. Margolis PA, Greenberg RA, Keyes LL, LaVange LM, Chapman RS, Denny FW, et al. Lower respiratory illness in infants and low socioeconomic status. Am J Public Health. 1992;82(8):1119-26.
17. Instituto Nacional de Meteorologia - INMET [homepage on the Internet]. Brasília: Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. [cited 2007 may 20]. Available from: www.inmet.gov.br
18. Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde - CNES [homepage on the Internet]. Brasília: Ministério da Saúde. [cited 2007 may 20]. Available from: http://cnes.datasus.gov.br/Index.asp?Configuracao=1024&bro=Netscape
19. DATASUS. [homepage on the Internet]. Brasília: Ministério da Saúde. [cited 2007 may 20]. Indicadores de Saúde. Cadernos de Informações de Saúde. Distribuição Percentual das Internações por Grupos de Causas, CID-10. Available from: www.datasus.gov.br
20. Uso de la metodología de enfoque de riesgo para la determinación de prioridades em el programa de control de las IRA en Rio Grande do Sul. In: Organização Pan-Americana de Saúde. Investigaciones operativas sobre el control de las infecciones respiratorias agudas en Brasil.1st ed. Washington: OPAS, 1999. p 75-84.
21. Sarinho SW, Filho DA, Silva GA, Lima MC. Fatores de risco para óbitos neonatais em Recife: um estudo de caso-controle. J Pediatr. 2001;77(4):294-8.
22. Macedo SE, Menezes AM, Albernaz E, Post P, Knorst M. Fatores de risco para internação por doença respiratória aguda em crianças até um ano de idade. Rev Saúde Públ. 2007;41(3):351-8.
23. Perpetuo IH, Wong LR. Atenção hospitalar por condições sensíveis à atenção ambulatorial (CSAA) e as mudanças no seu padrão etário: uma análise exploratória dos dados de Minas Gerais. Anais do XII Seminário sobre Economia Mineira [serial on the internet]. 2006 [cited 2007 jun 14];43(6):[about 14p.] Available from: http://www.cedeplar.ufmg.br/seminarios/seminario_diamantina/2006/D06A043.pdf
24. Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. Diretrizes Brasileiras em Pneumonia adquirida na Comunidade - 2007. J Bras Pneumol. 2007;33(Supl 1):S31-S50.
25. Nafstad P, Brunekreef B, Skrondal A, Nystad W. Early respiratory infections, asthma, and allergy: 10-year follow-up of the Oslo Birth Cohort. Pediatrics. 2005;116(2):e255-62.
26. Low AM, Pereira MG. Morbidade em creche de Brasília: estudo longitudinal de incidência de enfermidades no ano de 1977. Rev Saúde Pública. 1980;14(4):454-61.
27. Saldanha CT, Silva AM, Botelho C. Climate variations and health services use for the treatment of asthmatic children under five years of age: an ecological study. J Bras Pneumol. 2005;31(6):492-8.
28. Cohen AJ, Ross Anderson H, Ostro B, Pandey KD, Krzyzanowski M, Künzli N, et al. The global burden of disease due to outdoor air pollution. J Toxicol Environ Health A. 2005;68(13-14):1301-7.
29. IBGE [homepage on the Internet]. Brasília: Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão. [cited 2007 may 20] Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio/PNAD. Available from: http://www.ibge.gov.br/mtexto/pnadcoment.htm
30. Mathias TA, Soboll ML. Confiabilidade de diagnósticos nos formulários de autorização de internação hospitalar. Rev Saúde Pública. 1998;32(6):526-32.
____________________________________________________________________________________________________________________
Trabalho realizado na Universidade do Estado de Mato Grosso - UNEMAT - Cáceres (MT) Brasil, e na Escola Nacional de Saúde Pública/Fundação Oswaldo Cruz - ENSP/FIOCRUZ - Rio de Janeiro (RJ) Brasil.
1. Docente e Coordenadora do Estágio Regional Integrado da Universidade do Estado de Mato Grosso - UNEMAT - Cáceres (MT) Brasil.
2. Docente do Curso de Mestrado em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Mato Grosso - UFMT - Cuiabá (MT) Brasil.
3. Docente do Programa de Mestrado e Doutorado Multidisciplinar da Escola Nacional de Saúde Pública/Fundação Osvaldo Cruz - ENSP/FIOCRUZ - Rio de Janeiro (RJ) Brasil.
Endereço para correspondência: Antonia Maria Rosa. Av. Getúlio Vargas, 2335, Bairro Jardim Aida, CEP 78200-000, Cáceres, MT, Brasil.
Tel 55 65 9601-3465/55 65 3221-0504. Fax 55 65 3221-0500. E-mail: antonia-mr@unemat.br/antonia-mr@hotmail.com
Apoio financeiro: Este trabalho foi financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Recebido para publicação em 3/9/2007. Aprovado, após revisão, em 26/11/2007.