Continuous and bimonthly publication
ISSN (on-line): 1806-3756

Licença Creative Commons
5651
Views
Back to summary
Open Access Peer-Reviewed
Artigo Original

Estudo descritivo sobre a implantação da estratégia de tratamento de curta duração diretamente observado no controle da tuberculose em São José do Rio Preto e seus impactos (1998-2003)

Descriptive study of the implementation and impact of the directly observed treatment, short-course strategy in the São José do Rio Preto municipal tuberculosis control program (1998-2003)

Cláudia Eli Gazetta, Silvia Helena Fiqueiredo Vendramini, Antônio Ruffino-Netto, Maria Rita de Cássia Oliveira, Tereza Cristina Scatena Villa

ABSTRACT

Objective: To describe treatment outcomes (cure, noncompliance or death) after the implementation of the Directly Observed Treatment, Short-course (DOTS) strategy for tuberculosis control in the city of São José do Rio Preto, Brazil, between 1998 and 2003. Methods: A descriptive study, based on secondary data (National Case Registry database, Tuberculosis Epidemiology database, and the 'Black Book' Registry), was conducted using a specific instrument. The data were analyzed using descriptive statistics. Results: After the implementation of the DOTS strategy, there was a decrease in noncompliance and case detection rates as well as an increase in cure and death rates. The increase in the number of tuberculosis-related deaths might be attributable to three factors: the predominance of the disease in individuals over 50 years of age, tuberculosis/HIV co-infection, and the presence of accompanying diseases. Conclusion: The implementation of the DOTS strategy strengthened the decentralization of the tuberculosis control plans as well as the integration of the Basic Health Care Clinic teams with the Tuberculosis Control Program team. Political commitment of the administrator to tuberculosis control, in conjunction with the policy of benefits and incentives, is essential for the sustainability of the DOTS strategy.

Keywords: Tuberculosis; Epidemiology; Health services; Politics; Directly observed therapy.

RESUMO

Objetivo: Descrever os resultados de tratamento (cura, abandono ou óbito) após a implantação da estratégia de tratamento de curta duração diretamente observado (Directly Observed Treatment, Short-course - DOTS) no controle da tuberculose em São José do Rio Preto, São Paulo, no período de 1998 a 2003. Métodos: Estudo descritivo que utilizou fontes secundárias de informações (Sistema Nacional de Agravos de Notificação, Sistema de Notificação de Tuberculose, Livro de Registro/Livro Preto) por meio de um instrumento específico. Os dados foram analisados por estatística descritiva. Resultados: Após a implantação da estratégia DOTS houve uma diminuição das taxas de abandono e detecção de casos e um aumento das taxas de cura e óbito. O aumento do número de óbitos por tuberculose pode ter ocorrido devido a três fatores: o predomínio da doença em indivíduos acima de 50 anos; a co-infecção tuberculose/HIV e a presença de doenças associadas. Conclusões: A implantação da estratégia DOTS fortaleceu a descentralização das ações de controle da tuberculose e a integração das equipes das Unidades Básicas de Saúde com a equipe do Programa de Controle da Tuberculose. O compromisso político do gestor com o combate à tuberculose, aliado à política de benefícios e incentivos, é fundamental para a sustentabilidade da estratégia DOTS.

Palavras-chave: Tuberculose; Epidemiologia; Serviços de saúde; Descentralização; Terapia diretamente observada.

Introdução

O Brasil ocupa o 15º lugar entre os 22 países responsáveis por 80% do total de casos de tuberculose (TB) no mundo, com uma prevalência de 58 casos por 100 mil habitantes. A TB, uma doença que tem cura, ainda mata pelo menos 6 mil pessoas/ano no Brasil. O percentual de cura é de 72,2% e o percentual de abandono é de 11,7%, alcançando, em algumas capitais, valores de 30 a 40%. A cada ano, 111 mil novos casos são estimados. Esses dados representam um grande desafio para o Brasil em relação às metas pactuadas junto à Organização Mundial de Saúde (OMS), que declara a TB uma emergência mundial e propõe a estratégia de tratamento de curta duração diretamente observado (Directly Observed Treatment, Short-course - DOTS) para atingir 85% de sucesso de tratamento, 70% de detecção de casos e reduzir o abandono do tratamento em 5%.(1)

A estratégia DOTS é constituída por 5 pilares: "Detecção de casos por baciloscopia entre sintomáticos respiratórios que demandam os serviços gerais de saúde; tratamento padronizado de curta duração, diretamente observável e monitorado em sua evolução; fornecimento regular de drogas; sistema de registro e informação que assegure a avaliação do tratamento; e compromisso do governo colocando o controle da tuberculose como prioridade entre as políticas de saúde."(2)

A estratégia DOTS propõe "a integração do cuidado de saúde primária e adaptação contínua de reformas dentro do setor de saúde."(3) Em 1998, a estratégia DOTS é proposta, incorporada ao Plano Nacional de Controle da TB,(4) e implantada gradativamente nos municípios como estratégia inserida no Sistema Único de Saúde, estimulando a busca de casos e o tratamento por meio de benefícios concedidos mediante um termo de adesão.(5)

São José do Rio Preto (SJRP), com uma população de 406.827 mil habitantes,(6) está localizada na região noroeste do Estado de São Paulo, caracterizando-se como pólo regional, sede da 8ª Região Administrativa (que compreende 96 municípios) e área de influência que atinge parte dos estados de Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.

De acordo com o Índice Paulista de Respon-sabilidade Social, nas edições de 2000 e 2002, o município está classificado no grupo 1 do Estado de São Paulo (grupo de elite) com bons níveis de riqueza, longevidade e escolaridade. No entanto, observa-se a existência de uma Rio Preto oficial, comparada aos municípios de países do Primeiro Mundo, e uma Rio Preto real, ilegal, representada pelos loteamentos clandestinos (5% da população) onde os habitantes não têm escrituras das propriedades, não contam com escolas, praças, ou Serviços de Saúde e bebem água contaminada pelo esgoto das fossas negras.(7) A estrutura populacional da cidade assemelha-se à de municípios de países desenvolvidos, com diminuição da faixa etária de 0 a 4 anos e notável aumento na população economicamente ativa (14 a 49 anos) e na faixa etária de 50 anos ou mais, principalmente na acima de 75 anos.(6,7)

Além do aumento da necessidade de equipamentos e serviços de uso coletivo; a construção dos conjuntos habitacionais para migrantes, incentivada pelo Banco Nacional de Habitação através do Programa de Cidades de Porte Médio, criado para aliviar a situação demográfica dos grandes centros metropolitanos; aliada às mudanças na política de saúde do país, a partir da década de 80, levou a um desenvolvimento e crescimento dos serviços públicos de saúde em SJRP.

O município tornou-se um centro de referência na prestação de serviços de saúde, recebendo pacientes da região e de outros estados do Brasil. Conta com a média de 4,4 médicos para cada mil habitantes, coeficiente duas vezes maior que o do estado de São Paulo.(7)

O risco de adoecer por TB em 2003 foi, aproximadamente, três vezes maior na população da área com piores níveis sócio-econômicos (Classe C) do que na população da área com melhores níveis (Classe A).(8)

A implantação do Sistema Único de Saúde em 1988 promoveu mudanças no sistema de saúde em SJRP, sendo que, em maio de 1998, o município foi habilitado na condição de Gestão Plena da Atenção Básica.(9,10)

No período anterior a 1998, o atendimento ao doente de TB era coordenado pela Secretaria Estadual de Saúde e centralizado no Centro de Saúde I. Porém, com a municipalização dos serviços estaduais de saúde, o atendimento do Programa de Controle da Tuberculose (PCT) passou a ser realizado no Ambulatório Regional de Especialidades no Núcleo de Gestão Assistencial 60, considerado especialidade em nível secundário na qualidade de referência regional.

Em 1998, SJRP foi selecionado como município prioritário para o controle da TB devido à elevada co-infecção TB/HIV, que apresentou a taxa de 35% em 1998 e 51% em 2004.(8) A implantação do Tratamento Supervisionado (TS) foi direcionada, em 1998, para os doentes co-infectados TB/HIV.

O objetivo deste estudo foi descrever os resultados de tratamento (cura, abandono ou óbito) após a implantação da estratégia DOTS no controle da TB em SJRP, no período de 1998 a 2005.

Métodos

Este artigo é resultado do Projeto intitulado: "Situação da implantação do DOTS para o controle da TB em algumas regiões do Brasil: histórico e peculiaridades de acordo com as características regionais 2005."

Trata-se de um estudo descritivo, envolvendo levantamento de dados operacionais e epidemiológicos após a implantação da estratégia DOTS.

Foram utilizados indicadores epidemiológicos e operacionais, tais como baciloscopia de diagnóstico, casos de TB com baciloscopia positiva, e também percentuais de cura, abandono e óbito. Os dados foram coletados de fontes secundárias de informações - Sistema de Notificação de Tuberculose (EPI-TB), Sistema de Vigilância Laboratorial de Tuberculose, Livro de Registro e Controle da Tuberculose/Livro Preto, dentre outros - por meio de um instrumento específico.

Como critérios de inclusão foram considerados apenas os casos novos de TB pulmonar com baciloscopia positiva ao diagnóstico. Os dados foram analisados pela estatística descritiva.

O referido projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo.

Resultados

O ano de 2001 representou, para SJRP, o início da reestruturação e reorganização do sistema de saúde. O município foi dividido em pólos de saúde, com definição das áreas de abrangência e territórios de cada serviço de saúde, e houve expressivos investimentos na reformulação e expansão da Vigilância Epidemiológica, atualmente informatizada. A utilização da Tecnologia de Geoprocessamento(11) permitiu instrumentalizar, planejar e avaliar todas as ações, principalmente as relativas às doenças de notificação compulsória, entre elas a TB, agilizando os serviços.

A legislação vigente, o apoio da Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo e o interesse no recebimento do bônus foram alguns dos motivos que impulsionaram o gestor a implantar a estratégia DOTS. A partir de 2000, o Programa Doenças Sexualmente Transmissíveis/AIDS assume o tratamento da TB/HIV no Serviço de Atendimento Especializado. Foi contratado um funcionário, por meio de convênio com a Organização Pan-Americana da Saúde, para realizar em domicílio o TS em co-infectados.

Situação operacional
O TS, inicialmente, era realizado no ambulatório de referência com a presença do doente e sob a supervisão da enfermeira (ingestão da medicação). A partir de 2001, o município passa a contar com um agente de saúde, contratado com apoio financeiro do Ministério da Saúde por meio da Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo, para atuar no TS do ambulatório e, principalmente, no domicílio do doente. Em 2002, o atendimento aos doentes ainda priorizava os que apresentavam maiores riscos de abandono do tratamento como os drogaditos, alcoólatras, andarilhos, os excluídos da comunidade familiar e os co-infectados.

Nessa época, a estratégia utilizada para iniciar a descentralização do TS para as unidades básicas de saúde (UBS) foi a aproximação entre a equipe do PCT e os gerentes das UBS a fim de que as equipes das UBS acolhessem seus doentes realizando a supervisão da tomada de medicamento.

Nos anos de 2000 e 2001, o trabalho de sensibilização quanto à descentralização do TS sofreu influência marcante do Treinamento Básico em Vigilância Epidemiológica da Tuberculose oferecido aos técnicos da rede básica (médicos, enfermeiros e auxiliares/técnicos de enfermagem). A partir de então, algumas UBS, principalmente na figura do enfermeiro, aderiram à proposta de iniciar o TS com os doentes da sua área de abrangência.

Vários fatores, como disponibilidade irregular de viatura nas atividades diárias do TS e despreparo dos motoristas da central de transporte, têm interferido no oferecimento do TS de forma ampliada a todos os doentes.

A partir de 2001, com a expansão do número de Equipes de Saúde da Família (ESF) e a capacitação
pelo Treinamento Básico em Vigilância Epidemio-lógica da Tuberculose, a busca ativa, o diagnóstico, o tratamento e o TS foram descentralizados.

No final de 2002, na tentativa de incentivar o TS, adotou-se a prática da doação de cestas básicas, ovos, hortaliças e vales transporte.

No final de 2004, ampliou-se o compromisso político do gestor municipal em relação à estratégia DOTS e a TB foi considerada uma das prioridades no trabalho de Vigilância em Saúde. Foram traçadas as metas e propostas as descentralizações do PCT de maneira gradual para as áreas de abrangência das UBS. Coube à equipe do PCT a responsabilidade de contatar o profissional médico de perfil mais adequado para assumir o tratamento e as ações de controle do doente, supervisionar o TS realizado nas UBS e monitorar o processo de descentralização.

Um estudo realizado em SJRP, utilizando o instrumento do geoprocessamento segundo os setores censitários do município, verificou que o risco de adoecer por TB é aproximadamente três vezes maior na população das áreas com piores níveis socioeconômicos (Classe C) do que na população das áreas com melhores níveis (Classe A).(9)

Após considerarmos a trajetória histórica da implantação da estratégia DOTS no município, faremos, a seguir, uma análise da repercussão da mesma nos índices da TB a partir de 1998.

A Figura 1 apresenta os percentuais de cura, óbito, abandono e detecção de casos novos de TB pulmonar em SJRP durante o período de 1998 a 2003. O ano de 2004 não foi considerado no estudo, pois, no período da coleta de dados, muitos casos ainda não haviam encerrado o tratamento.





Os percentuais de casos novos de TB pulmonar com baciloscopia positiva ao diagnóstico em relação ao abandono, cura, óbito e detecção, no período de 1998 a 2003, apontam para a diminuição da taxa de abandono e detecção de casos e o aumento da taxa de cura e óbito.

A implantação da estratégia DOTS no município causou impacto positivo nos resultados de cura e abandono no período analisado. Houve um contexto de aumento do comprometimento político do gestor na implantação da estratégia devido à contratação de agentes de saúde, treinamentos específicos para os profissionais e início da descentralização do TS para as UBS e as ESF.

Em relação aos óbitos, a tendência foi crescente nos seis anos analisados. Resultados de avaliação no banco de dados EPI-TB da Secretaria Municipal de Saúde e Vigilância apontam que um terço dos óbitos de indivíduos acima de 50 anos ocorreu por tuberculose, outro terço, devido à co-infecção TB/HIV e o restante, por TB associada a outras doenças. Em 1998, o percentual total de óbitos foi de 2,1%, passando a 6,0% em 2003.(12,13)

Para melhor entendimento das taxas de detecção dos casos, estas foram analisadas em dois períodos distintos: de 1996 a 1999 e de 1999 a 2003 (Figuras 2 e 3 , respectivamente).









Em SJRP, no período de 1996 a 1999, ocorreu uma inclinação positiva na linha de regressão, que variou de 2,5 a 13,4% na detecção de casos.

A detecção de casos foi 21% menor no período de 1999 a 2003 do que no período anterior, de 1996 a 1999.

Discussão

O compromisso político do governo municipal, através do gestor da saúde, foi um dos componentes que impulsionaram a implantação da estratégia DOTS em SJRP. Este comprometimento político foi identificado através da contratação de agentes de saúde, treinamentos específicos para os profissionais do PCT e início da descentralização do TS para as UBS e as ESF.

Ressalta-se que um dos pilares da estratégia DOTS reside justamente no compromisso político em colocar o controle da TB como prioridade nas políticas de saúde do município.(2)

A implantação da estratégia DOTS no município causou impacto positivo nos resultados de cura e abandono no período analisado. Em 1998, a cobertura da estratégia foi de 3,1%, passando a 62% em 2004.(6) Os percentuais de casos novos de TB pulmonar com baciloscopia positiva ao diagnóstico em relação ao abandono, cura, óbito e detecção, no período de 1998 a 2003, apontam para a diminuição da taxa de abandono e detecção de casos e o aumento da cura e óbito (Figura 1).

Em relação aos óbitos, a tendência foi crescente nos seis anos analisados. Algumas hipóteses poderiam ser aventadas para explicar esta situação. Uma delas estaria ligada a fatores demográficos relacionados ao envelhecimento da população: diversas pessoas que tiveram a primo-infecção nas primeiras décadas do século XX poder-se-iam tornar susceptíveis na terceira idade. Por apresentarem quadros clínicos atípicos, essas pessoas não são facilmente diagnosticadas, o que aumenta a mortalidade entre os idosos.(14) Outra explicação seria a dificuldade de acesso aos serviços de saúde, apesar da proposta de reorganização do modelo de serviços de saúde em nível de atenção básica. Um outro fator explicativo pode estar relacionado à formação dos recursos humanos, haja vista a dificuldade dos profissionais nos diferentes níveis do sistema de saúde em incorporar a busca de sintomáticos respiratórios à rotina de atendimento dos serviços de saúde. Outra possível explicação para o aumento do número de óbitos é o diagnóstico tardio, com o doente em condições clínicas precárias.(15)

Os resultados mostram que houve uma inclinação negativa na detecção de casos, o que sugere que, apesar de o município assumir a Gestão Plena do Sistema Municipal em 1998 e iniciar o processo de descentralização dos serviços de saúde, a prioridade da Secretaria de Saúde era o combate à dengue, ficando as ações de busca de sintomáticos respiratórios num plano secundário na rotina dos serviços de saúde.

Essa situação também foi identificada em vários países que implantaram a estratégia DOTS na década passada. Houve um crescimento rápido da cobertura de TS em mais de 10 milhões de pacientes, e, em contrapartida, houve um aumento discreto das taxas de detecção em torno de 35 a 40% entre 1995 e 2000.(16)

O compromisso político de implantar a estratégia DOTS no final da década de 90 foi assumido pela equipe do PCT no ambulatório de referência secundária de forma centralizada, conseguindo atingir melhora nas taxas de cura e de abandono e ampliando a cobertura do TS nos últimos anos, fato este que, possivelmente, reforçou a idéia de TB como doença a ser tratada em nível secundário, diminuindo a busca ativa da TB nas UBS, em fase inicial.

Esta opção pela forma de abordagem gerencial centralizada do controle da TB neste município está de acordo com as idéias propostas no estudo sobre a situação da TB global e da nova estratégia que focalizou, primeiramente, a melhoria das taxas de cura através do TS, da oferta de medicamentos e da análise dos resultados de tratamento, sendo a expansão da detecção de casos uma ação a ser perseguida após a melhoria das taxas de cura.(17)

Alguns fatores operacionais, como disponibilidade irregular de viaturas para as atividades diárias do TS e o despreparo dos motoristas da central de transporte para realizar um trabalho dessa natureza, funcionaram como barreiras ao oferecimento do TS de forma ampliada a todos os doentes. Outros fatores, como o estabelecimento de vínculo entre o doente/familiares e os profissionais da equipe, apoiado pelo fornecimento regular de incentivos e benefícios (alimentos, vale transporte e outros) e também de orientações gerais a respeito de auxílio-doença e seguro-desemprego, atuaram como fortalezas para o TS.

Outra hipótese para explicar o aumento do número de óbitos poderia estar relacionada à relação entre os casos de TB de forma pulmonar (P) e extrapulmonar (E) - P/E, uma vez que a forma pulmonar alimenta a cadeia de transmissibilidade da doença. Porém a forma extrapulmonar da doença indica quadros de imunossupressão do organismo, causados, principalmente, pela presença da co-infecção TB/HIV. A diminuição da relação P/E pode ser devida a um aumento da forma extrapulmonar, o que poderia indicar um possível aumento das doenças imunossupressoras, apesar de a forma pulmonar também ser sensível a situações de imunossupressão do organismo.(18) Esta última hipótese corrobora os dados encontrados em SJRP, que a partir do ano 2000 apresentou uma diminuição na razão P/E em função do aumento da forma extrapulmonar, provavelmente devida à alta taxa de co-infecção TB/HIV. Outra possível explicação seria o maior uso de tecnologia apropriada pelo programa nas investigações diagnósticas, uma vez que, no município, os hospitais realizam a maioria dos diagnósticos da doença.(7)

Outro fato observado, segundo dados levantados no EPI-TB(7) do município, é que a TB pulmonar tem apresentado diminuição do número de casos diagnosticados por meio de exames de baciloscopias com resultados positivos (BAAR+), o que poderia, epidemiologicamente, sugerir diminuição da transmissão.

Em SJRP, a estratégia DOTS serviu principalmente para a reorganização do PCT, que, a partir da sua implantação, apresentou melhora significativa nos indicadores de cura e abandono, e contribuiu para o processo de descentralização das ações de controle e acompanhamento do maior número possível de doentes, além de contribuir, em conjunto com o PCT, para o envolvimento e a integração das UBS com a equipe do PCT.

Aliado às questões relacionadas à vontade política do gestor e à reorganização do serviço, a equipe responsável pela coordenação do PCT no município considera que, além do acompanhamento da dose supervisionada, o TS compreende um conjunto de atividades de apoio da equipe e a manutenção de incentivos e benefícios que permitem uma maior aproximação entre trabalhadores da saúde e doentes, favorecendo os resultados obtidos em SJRP, possibilitando maior adesão ao tratamento e aumentando o número de casos curados.

As questões de controle da TB, sendo repensadas em termos de macro política, requerem indiscutivelmente a melhoria progressiva das condições de vida da população da cidade, apontando, também, para a necessidade de implementação de políticas de saúde voltadas para populações residentes em áreas de maior risco de ocorrência de TB em SJRP.

É de fundamental importância adotar medidas intersetoriais de promoção e vigilância da saúde e atuar nos fatores condicionantes de forma articulada, não apenas monitorando casos, surtos e comunicantes, mas também aliando a estratégia DOTS com vistas a eliminar, principalmente, a baixa adesão ao tratamento e o surgimento de cepas resistentes.

Vale ressaltar a necessidade de maior participação da sociedade civil organizada por meio de movimentos sociais atuantes, haja vista os avanços observados na reformulação do Conselho Municipal de Saúde com a participação mais efetiva do segmento dos usuários representados principalmente pelos grupos menos favorecidos da sociedade, em especial o segmento dos representantes ligados a organizações não-governamentais vinculadas à AIDS, favorecendo assim não só o PCT, mas, também, outros programas não prioritários na agenda municipal de saúde.

Referências

1. World Health Organization. Global tuberculosis control: surveillance, planning, financing. Geneva: WHO; 2005.

2. Organización Panamericana de la Salud, Organización Mundial de la Salud. Reunión regional de directores nacionales de programas de control de la tuberculoses: informe final. Ecuador: Opas; 1997.

3. World Health Organization. An expanded DOTS framework for effective tuberculosis control: Stop TB Communicable Disease. Geneva: WHO; 2002.

4. Fundação Nacional de Saúde. Plano nacional de controle da tuberculose. Brasília: Ministério da Saúde, 1999.

5. Ruffino-Netto A. Tuberculose: a calamidade negligenciada. Rev Soc Bras Med Trop. 2002;35(1):51-8.

6. Vendramini SHF, Gazetta CE, Chiaravalloti Netto F, Cury MR, Meirelles EB, Kuyumijan FG, et al. Tuberculose em município de médio porte do sudeste do Brasil: indicadores de morbidade e mortalidade, de 1985 a 2003. J Bras Pneumol. 2005;31(3):237-43.

7. São Paulo. Fundação Seade. Índice Paulista de Vulnerabilidade Social: espaços e dimensões da pobreza nos municípios do Estado de São Paulo. São Paulo; 2004.

8. Secretaria Municipal de Higiene e Saúde. Relatório de Gestão 1998. São José do Rio Preto; 1999.

9. São José do Rio Preto. Secretaria Municipal de Planejamento e Gestão Estratégica. Conjuntura Econômica 2005: São José do Rio Preto. São Paulo; 2005.

10. Brasil. Ministério da Saúde. Norma Operacional Básica do Sistema de Saúde /NOB-SUS 96. Brasília; 1997.

11. Santos CB, Hino P, Cunha TN, Villa TC, Muniz JN. Utilização de um sistema de informação geográfica para descrição dos casos de tuberculose. Bol Pneumol Sanitária. 2004;12(1):7-12.

12. Ruffino-Netto A, Villa TCS. (org). Tuberculose: implantação do DOTS em algumas regiões do Brasil, histórico e peculiaridades regionais. Ribeirão Preto: Instituto do Milênio Rede TB, 2006. p.204.

13. Vendramini SHF, Gazeta CE, Cury MR, Villa TCS, Ruffino-Netto A. Experiência de implantação do DOTS em José do Rio Preto. In: Ruffino-Netto A, Villa TCS. (org). Tuberculose - Implantação do DOTS em algumas regiões do Brasil. histórico e peculiaridades regionais. Ribeirão Preto: Instituto do Milênio Rede TB, 2006. p.122-35.

14. Mota FF, Vieira da Silva LM, Paim JS, Costa MCN. Distribuição espacial da mortalidade por tuberculose em Salvador, Bahia, Brasil. Cad Saúde Pública. 2003;19(4):915-22.

15. Gazetta CE, Takayanagui MM, Costa Júnior ML, Vendramini SHF, Villa TCS. Aspectos epidemiológicos da tuberculose em São José do Rio Preto-SP, a partir das notificações da doença em um hospital-escola (1993-1998). Pulmão RJ. 2003;12(3):155-62.

16. Frieden T, Driver CR. Tuberculosis control: past 10 years and future progress. Tuberculosis (Edinb). 2003;83(1-3):82-5.

17. Kochi A. The global tuberculosis situation and the new control strategy of the World Health Organization. Tubercle. 1991;72(1):1-6.

18. Teixeira IA. Tendência da Incidência de Tuberculose em Belo Horizonte, apresentada na década de 1990 a 1999 e sua projeção para os anos de 2000 a 2009 [Dissertação]. Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais; 2003.
__________________________________________________________________________________________

* Trabalho realizado na Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto - FMSJRP - São José do Rio Preto (SP) Brasil.
1. Professora Doutora do Departamento de Enfermagem em Saúde Coletiva e Orientação Profissional da Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto - FMSJRP - São José do Rio Preto (SP) Brasil.
2. Professor Titular da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo - USP - Ribeirão Preto (SP) Brasil.
3. Mestre; Coordenadora do Programa de Controle da Tuberculose da Secretaria Municipal de Saúde de São José do Rio Preto, São José do Rio Preto (SP) Brasil.
4. Livre Docente da Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo - USP - Ribeirão Preto (SP) Brasil.
Endereço para correspondência: Cláudia Eli Gazetta. Rua Jair Martins Mil Homens, 277, Nova Redentora, CEP 15090-080, São José do Rio Preto, SP, Brasil.
Tel 55 17 227-7167. E-mail: claudiagazetta@yahoo.com.br
Recebido para publicação em 21/12/2005. Aprovado, após revisão, em 12/6/2006.

Indexes

Development by:

© All rights reserved 2024 - Jornal Brasileiro de Pneumologia