ABSTRACT
Objective: To determine the efficacy of using forced expiratory volume in six seconds (FEV6) as a surrogate for forced vital capacity (FVC) in the diagnostic screening for chronic obstructive pulmonary disease (COPD) by comparing FEV1/FVC ratios with FEV1/FEV6 ratios. Methods: In November of 2003, on World COPD Day, we conducted a campaign of diagnostic screening for COPD. The participants completed the clinical questionnaire of the Global Initiative for Obstructive Lung Disease, and those who responded affirmatively to at least three questions underwent spirometry. Results: A total of 134 individuals responded to three questions affirmatively and underwent spirometry. Of those, 59 were excluded: 45 for being non-smokers and 14 due to the fact that their tests did not meet the American Thoracic Society criteria for satisfactory spirometry. The number of tests in which the FEV1/FEV6 ratio was below 70% was similar to that found for the FEV1/FVC ratio. The sensitivity of FEV1/FEV6 in diagnosing airway obstruction (defined as FEV1/FVC below 70%) was 92%, and its specificity was 99%. The positive predictive value was 100%, and the negative predictive value was 98%. The Kendall correlation test revealed r = 0.99 (p < 0.0001). The t-test for paired samples revealed a negative correlation: t = −5.93 (p < 0.0001). Conclusion: The FEV1/FEV6 proved efficient for use in the diagnostic screening for COPD. There is a strong correlation between FEV1/FVC and FEV1/FEV6.
Keywords:
Pulmonary disease, Chronic obstructive; Diagnosis; Spirometry; Forced expiratory volume; Vital capacity.
RESUMO
Objetivo: Determinar a eficácia do uso do volume expiratório forçado nos primeiros seis segundos (VEF6) como substituto da capacidade vital forçada (CVF) na triagem diagnóstica da doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) através da comparação entre as medidas da relação VEF1/CVF e as medidas da relação VEF1/VEF6. Métodos: No ano de 2003, durante o Dia Mundial da DPOC, realizamos uma campanha de triagem diagnóstica da DPOC. Os participantes da campanha respondiam ao questionário clínico do projeto Global Initiative for Obstructive Lung Disease e aqueles que apresentavam pelo menos três respostas positivas submetiam-se a espirometria. Resultados: Um total de 134 indivíduos respondeu positivamente a três questões e realizou espirometria. Destes, 59 foram excluídos: 45 por serem não fumantes e 14 pelo fato de seus exames não obedecerem aos critérios da American Thoracic Society para espirometria de qualidade. O número de resultados abaixo de 70% foi similar para VEF1/CVF e para VEF1/VEF6. A sensibilidade de VEF1/VEF6 para o diagnóstico de obstrução de vias aéreas definida por VEF1/CVF abaixo de 70% foi de 92% e a especificidade foi de 99%. O valor preditivo positivo foi de 100% e o valor preditivo negativo foi de 98%. O teste de correlação de Kendall mostrou r = 0,99 (p < 0,0001). O teste t para amostras pareadas mostrou correlação negativa: t = −5,93 (p < 0,0001). Conclusão: A relação VEF1/VEF6 se mostrou eficaz para uso na triagem diagnóstica da DPOC. Existe uma forte relação entre VEF1/CVF e VEF1/VEF6.
Palavras-chave:
Doença pulmonar obstrutiva crônica; Diagnóstico; Espirometria; Volume expiratório forçado; Capacidade vital.
IntroduçãoA doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) é responsável por um grande número de internações hospitalares, consultas médicas, gastos públicos e elevada taxa de mortalidade. No Brasil, o Projeto Latino-Americano de Investigação em Obstrução Pulmonar(1) mostrou que a prevalência da DPOC na população adulta varia entre 6 e 16% (3 a 7 milhões de pacientes).
O diagnóstico precoce da DPOC permite a instalação de medidas que podem interferir na progressão da doença.(2) A espirometria é o método aceito como imprescindível para o diagnóstico da DPOC. A relação entre volume expiratório forçado no primeiro segundo e capacidade vital forçada (VEF1/CVF) inferior a 70% confirma o diagnóstico de DPOC quando na presença de história e fator de risco compatíveis.(3) Infelizmente, o uso da espirometria em toda a população em risco de desenvolver DPOC é de difícil realização no momento. O alto preço dos aparelhos de espirometria e o pequeno número de aparelhos portáteis em consultórios médicos dificultam o acesso à espirometria. A sofisticação dos espirômetros existentes se traduz na necessidade de técnicos especializados para a execução do exame.(4)
A existência de novos índices espirométricos confiáveis, derivados de manobra de mais fácil execução, permite a produção de aparelhos mais simples, possibilitando a redução de custos e maior acesso de pacientes ao exame, e, portanto, a triagem diagnóstica da DPOC.(4) A redução da relação VEF1/VEF6 mostra ser confiável, com boa reprodutibilidade e sensibilidade demonstrada em estudos recentes.(5-7,16) Seu uso é proposto como uma alternativa à espirometria convencional na triagem diagnóstica da DPOC.(5,7,8) A sua medida é menos desconfortável para o paciente, que não necessita realizar esforço expiratório por mais de seis segundos, e possibilita programas de algoritmo de interpretação mais simples. Valores de referência do VEF6 já foram descritos pela American Thoracic Society(9) e European Respiratory Society.(10)
O objetivo deste estudo foi determinar a eficácia do uso do VEF6 como substituto da CVF na triagem diagnóstica da DPOC através da comparação entre as medidas da relação VEF1/CVF e as medidas da relação VEF1/VEF6.
MétodosNo Dia Mundial da DPOC em 2003, na cidade de Recife, realizamos uma campanha de alerta sobre o diagnóstico da DPOC, após propaganda publicitária com um dia de antecedência. Durante o período de funcionamento de um Shopping Center da cidade, aplicamos um questionário clínico e realizamos espirometria em pessoas sintomáticas respiratórias e/ou tabagistas que procuravam espontaneamente o local do evento.
Os participantes responderam ao questionário clínico do Global Initiative for Obstructive Lung Disease (Quadro 1), um projeto mundial que visa a aumentar a conscientização sobre a DPOC e a melhorar a prevenção e o tratamento dessa doença, e aqueles que apresentaram três ou mais respostas positivas foram submetidos a espirometria. A associação de três ou mais respostas positivas e alteração da espirometria (VEF1/CVF < 70%) foi utilizada na triagem diagnóstica da DPOC.
A espirometria foi executada seguindo as normas da American Thoracic Society,(11) e do Consenso Brasileiro sobre Espirometria.(1) Foram realizadas pelo menos duas manobras aceitáveis e reprodutíveis em cada teste. Não se fez uso de teste após broncodilatador. Os testes foram efetuados mediante a utilização do espirômetro portátil Microloop (ML3535, Micro Medical, Kent, UK), que permitiu, através do software SPIDA 5, a coleta do VEF6 e da relação VEF1/VEF6.
Foram selecionados para o estudo os participantes tabagistas e/ou sintomáticos respiratórios cujas espirometrias estavam de acordo com as normas da American Thoracic Society. Os participantes com teste alterado foram orientados a procurar assistência médica.
O projeto de pesquisa foi aprovado pelo comitê de ética e pesquisa do Hospital Geral Otávio de Freitas. Os dados foram analisados através do programa estatístico Epi Info 2002 e a correlação estatística entre as duas variáveis estudadas (VEF1/CVF e VEF1/VEF6) foi calculada através do teste de Kendall e do teste t para amostras pareadas, utilizando o software Analyse-It. A sensibilidade e especificidade foram calculadas em tabela 2 x 2 usando modelo Bayesiano de análise.
ResultadosOs dados sobre o número total de espirometrias realizadas, excluídas e selecionadas para o estudo estão apresentados na Tabela 1.
Os dados da população selecionada para o estudo (n = 75) estão apresentados na Tabela 2.
As análises das 75 espirometrias selecionadas para o estudo evidenciaram que 12 apresentavam VEF1/CVF menor que 70%, servindo como referência para o diagnóstico de DPOC. Os dados referentes aos valores de VEF1/CVF e VEF1/VEF6 estão apresentados na Tabela 3 e na Figura 1, respectivamente.
A relação VEF1/VEF6 foi menor que 70% em 11 dos 12 pacientes com DPOC, e no único paciente em que a relação VEF1/VEF6 diferiu da relação VEF1/CVF, os resultados foram VEF1/CVF de 66% e relação VEF1/VEF6 de 70%. Neste paciente, o valor da CVF foi de 3,49 L e o valor do VEF6 foi de 3,25 L, com uma diferença de 240 mL.
O cálculo da sensibilidade e especificidade para a relação VEF1/VEF6 mostrou sensibilidade de 92% e especificidade de 99%, com valor preditivo positivo de 100% e valor preditivo negativo de 98%. A correlação entre as duas medidas foi realizada através do teste de Kendall (comparação de relação entre duas medidas pareadas) que mostrou resultados de r = 0,98 com p < 0,0001 para um intervalo de confiança de 0,97 (Figura 1). No teste t, as amostras pareadas não mostraram diferenças estatisticamente significantes entre os valores médios de VEF1/CVF e VEF1/VEF6.
DiscussãoO uso da espirometria precisa ser estimulado em nosso país. Aparelhos de menor preço, que meçam o VEF1 e o VEF6, podem permitir um maior acesso da população com suspeita de DPOC a esse exame, de forma que a maioria dos casos possa ser confirmada no consultório do clínico geral. Os pacientes com suspeita de DPOC, nos quais a espirometria com o VEF1/VEF6 não demonstre obstrução, devem ser encaminhados para um especialista, reduzindo o número de consultas e o uso do laboratório de função pulmonar. A utilização destes aparelhos em campanhas de triagem tem apresentado resultados satisfatórios.(12) No nosso trabalho utilizamos um aparelho com capacidade para medir a CVF e VEF6, com intuito de confirmar dados de literatura, permitindo o uso de aparelho mais simples para triagem de alterações espirométricas.
A análise dos dados obtidos de uma população através de campanha publicitária, na qual explicávamos que realizaríamos espirometrias em pacientes com resposta positiva ao questionário do projeto Global Obstructive Lung Disease, selecionou para o estudo pacientes com suspeita de DPOC. Em campanhas de triagem da DPOC, a não realização do teste pós-broncodilatador é aceita.(2) Os casos suspeitos eram orientados a procurar serviço médico para confirmação do diagnóstico.
Em nossa amostra, os valores de VEF1/VEF6 usados para separação de pacientes com DPOC mostraram alta especificidade e alta sensibilidade, permitindo confirmar o diagnóstico de DPOC (valor preditivo positivo de 100%), ou afastá-lo (valor preditivo negativo de 98%) em mais de 95% dos casos. No único caso da amostra estudada em que as medidas de VEF6 e CVF diferiram, a variação foi de apenas 240 mL.
A correlação entre as medidas de VEF6 e CVF foi linear com valores próximos a 1 (r = 0,97), mostrando serem as mesmas praticamente iguais e intercambiáveis.
Os dados do nosso trabalho são semelhantes aos relatados por outros autores.(13-16) Alguns autores(13) encontraram sensibilidade e especificida, respectivamente, de 95% e de 97% (IC95%). Em outro estudo comparando os valores de CVF e VEF6,(14) com o objetivo de predição da capacidade pulmonar total utilizando espirometria, não foi encontrada diferença de resultados entre as duas medidas.
Concluímos que os dados obtidos mostraram que a medida da relação VEF1/VEF6 é eficaz para uso na triagem diagnóstica da DPOC.
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* Trabalho realizado no Hospital Geral Otávio de Freitas, Recife (PE) Brasil.
1. Coordenador da Residência Médica do Hospital Geral Otávio de Freitas, Recife (PE) Brasil.
2. Doutora em Pneumologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP - São Paulo (SP) Brasil.
3. Supervisora do Programa de Residência Médica em Pneumologia do Hospital Geral Otávio de Freitas, Recife (PE) Brasil.
4. Preceptora da Residência Médica em Pneumologia do Hospital Geral Otávio de Freitas, Recife (PE) Brasil.
5. Residente do terceiro ano em Pneumologia (Broncoscopia) do Hospital Geral Otávio de Freitas, Recife (PE) Brasil.
Endereço para correspondência: Fernando Luiz Cavalcanti Lundgren. Av. Visconde de Jequitinhonha, 2544, apto. 2601, Boa Viagem, CEP 51130-120,
Recife, PE, Brasil. Tel 55 81 3326-7098. E-mail: lundgrenf@gmail.com
Recebido para publicação em 1/8/5. Aprovado, após revisão, em 7/6/6.