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Artigo Original

Avaliação de uma sonda genética (Sistema Accuprobe, Gen Probe®) para identificação de organismos do complexo Mycobacterium tuberculosis, em comparação com métodos tradicionais de caracterização

Evaluation of a genetic probe (Gen-Probe Accuprobe® system) in comparison to traditional methods for identifying members of the Mycobacterium tuberculosis complex

Delurce Tadeu de Araujo Spada, Manoel Armando Azevedo dos Santos, Elisabete A. Almeida, Marcos Augusto, Maria Idemar Pedrosa Albarral, Fernando Augusto Fiuza de Melo

ABSTRACT

Background: The appearance of tuberculosis/human immunodeficiency virus co-infection and the growing number of diseases caused by nontuberculous mycobacteria, as well as the confusion that these can cause in relation to emerging multidrug-resistant strains, require more accurate and rapid laboratory results, not only in the isolation of strains but also in their identification. Objective: A comparative study evaluating a new tool of molecular identification, which uses a genetic probe based on the 16S rDNA sequence of the Mycobacterium tuberculosis gene (Gen-Probe Accuprobe® Gen Probe, Inc.), and the classic methodology. Method: Fifty-five Mycobacterium strains, isolated from the sputum of patients treated at a tuberculosis reference clinic, were selected for study. Subcultures were performed in three tubes: one submitted to genetic identification, one analyzed through classical tests (production and accumulation of niacin; growth in the Lowenstein-Jensen medium with the inhibitor agents p-nitrobenzoic acid and thiophene-2-carboxylic acid hydrazide added), and one held in reserve. Results: The probe identified 51 cases as belonging to the M. tuberculosis complex (one associated with M. kansasii) and the other 4 as nontuberculous mycobacteria, later identified as M. kansasii (3) and M. avium (1). Using traditional methods, 47 samples were identified as belonging to the M. tuberculosis complex, 4 were classified as fitting the profile of nontuberculous mycobacteria (in agreement with the genetic probe results), and 4 were unidentified, 1 of which presented the exact characteristics that 2 mycobacterium species have in common. Conclusion: The benefits of the molecular biology technique justify its implementation and routine use, in combination with classical methods, in a high-traffic clinic where complex cases of tuberculosis are treated.

Keywords: Mycobacterium tuberculosis. Molecular probe techniques.

RESUMO

Introdução: O aparecimento da co-infecção tuberculose/síndrome da imunodeficiência adquirida, o aumento de doenças por micobactérias não tuberculosas e as confusões que estas podem ter com as emergentes cepas multirresistentes exigem respostas laboratoriais mais rápidas e de melhor rendimento, não só com isolamento das micobactérias, mas também com a sua identificação. Objetivo: Estudo comparativo entre uma nova ferramenta de identificação molecular com sonda genética baseada na unidade 16S do gene rDNA do Mycobacterium tuberculosis (Accuprobe Gen Probe®, Gen Probe Inc.) e a metodologia clássica. Método: Foram selecionados 55 isolados do gênero Mycobacterium, mantidos em bacterioteca, obtidos de escarros de pacientes de uma unidade de referência para tuberculose. Foram feitos repiques em três tubos: um destinado à identificação genética, outro para realização dos testes clássicos (produção e acumulação da niacina, e crescimento em meio de Lowenstein-Jensen com agentes inibidores - ácido p-nitrobenzóico e hidrazida do ácido tiofeno-2-carboxílico), e outro reserva. Resultados: A sonda identificou 51 amostras do complexo M. tuberculosis (uma associada ao M. kansasii) e 4 como micobactérias não tuberculosas, posteriormente identificadas como M. kansasii (3) e M. avium (1). Os métodos tradicionais identificaram 47 amostras como do complexo M. tuberculosis, 4 com perfil de micobactérias não tuberculosas (concordante com o obtido pela sondagem genética) e 4 provas inconclusivas, uma delas exatamente a que associava duas espécies de micobactérias. Conclusão: Os benefícios da técnica de biologia molecular justificam sua implantação e uso rotineiro, associado aos métodos clássicos, numa unidade com alta demanda e que atenda casos de tuberculose de alta complexidade.

Palavras-chave: Mycobacterium tuberculosis. Técnicas de sonda molecular.

INTRODUÇÃO

A associação com a pandemia provocada pelo vírus da imunodeficiência humana modificou a epidemiologia, complicou o diagnóstico e dificultou o tratamento e o controle da tuberculose (TB) em diversas regiões do mundo(1-3). Acarretou também um aumento de casos de doenças provocadas por micobactérias não tuberculosas (MNT), com muitas confusões no diagnóstico, especialmente no diferencial entre estas e as cepas multirresistentes(4). A reemergência da TB e dos problemas acima, levantados no primeiro mundo, detentor de tecnologia de ponta, provocou o desenvolvimento de processos laboratoriais automatizados e técnicas de biologia molecular no diagnóstico da TB, não só para isolar e identificar como para estabelecer o perfil de resistência das micobactérias, de forma mais rápida e com rendimento bem mais acurado que os métodos tradicionais.

A introdução dessa metodologia nos países de maior prevalência da TB, porém com menores recursos econômicos, passa pela capacidade de investimento e decisão que considere estudos sobre a aplicabilidade comparativa dessas novas tecnologias em relação às existentes e as relações custo-benefício envolvidas(5).

Foi este o motivo do presente trabalho, desenvolvido em uma unidade de referência ambulatorial para TB em São Paulo - SP (Instituto Clemente Ferreira), que tem uma demanda de formas de tuberculose multirresistente (assim considerada, quando resistente a rifampicina, isoniazida e a mais outra droga usual) e de portadores da co-infecção TB/vírus da imunodeficiência humana, estimada entre 60 a 70 e 30 a 35 casos por ano, respectivamente(6).

Este trabalho tem como objetivo avaliar a implantação de um recurso técnico diagnóstico avançado para a caracterização do complexo Mycobacterium tuberculosis, pela sonda genética Accuprobe Gen Probe® (SAGP), em relação aos métodos tradicionais de tipificação bioquímica de produção e acumulação de niacina, e crescimento em culturas com presença de inibidores como o ácido p-nitrobenzóico (PNB) e a hidrazida do ácido tiofeno-2-carboxílico (TCH), usados no laboratório do Instituto Clemente Ferreira.

MÉTODO

Para padronização dos testes comparativos, foram feitos repiques de isolados selecionados pela viabilidade entre os de maior número de colônias em culturas de Lowenstein-Jensen, provenientes de amostras de escarro identificadas por paciente, disponíveis na bacterioteca do laboratório do Instituto Clemente Ferreira, no período de outubro a dezembro de 2001. Todos os pacientes apresentavam resultado negativo na sorologia para o vírus da imunodeficiência humana nos prontuários.

As amostras pertenciam a pacientes virgens de tratamento e em controle de tratamento (este dado foi relatado nos casos que apresentaram alguma discordância nas metodologias empregadas e nos casos em que foi determinada a presença de MNT). Como as metodologias foram realizadas a partir do repique do primo-isolamento, o uso prévio de tuberculostáticos não interferiu nos resultados. A SAGP só pode ser utilizada a partir de cultivo em meio líquido ou sólido, ou após métodos de amplificação gênica, segundo orientações do kit (bula do kit disponível em http://www.genprobe.com). Os procedimentos de coleta dos isolados, a descontaminação das amostras e as técnicas laboratoriais para a cultura em meio de Lowenstein-Jensen seguiram as orientações do Manual de Bacteriologia da Tuberculose(6).

Os repiques foram feitos em três tubos: um destinado à identificação genética pela SAGP com base na unidade 16S do gene rDNA específica para o complexo M. tuberculosis; outro para realização dos testes clássicos fenotípicos (produção e acumulação da niacina, e crescimento em meio Lowenstein-Jensen com agentes inibidores, PNB e TCH); e um terceiro reserva para, se necessário, repetir os testes que apresentassem discordâncias e identificar por sondas as MNT. O meio de Lowenstein-Jensen sem e com os agentes inibidores foi confeccionado no laboratório do Instituto Clemente Ferreira, segundo orientações do Manual de Bacteriologia da Tuberculose(6).

Testes com uma cepa do M. tuberculosis HV37Ra ATCC, uma de M. bovis ATCC e uma terceira de M. smegmatis ATCC serviram de controle. Conforme exigência da técnica, não foi ultrapassado o tempo de trinta dias do repique até a realização de todas as provas. Os resultados discordantes foram repetidos para excluir qualquer erro de técnica e todos confirmaram os resultados obtidos.

As provas de identificação pela sonda genética foram realizadas a partir da amostra do segundo tubo do repique do isolado, colhida com auxilio de uma alça de platina descartável conforme a indicação do kit para o complexo M. tuberculosis. Os tempos e as temperaturas estipuladas foram seguidos rigorosamente, pois são críticos na técnica.

Para a execução da técnica, em cada exame, era colhida uma quantidade boa de colônias (cerca de três alças), e a amostra era exposta a um processo de lise com reagentes específicos contidos no kit para extração do material genético. Juntamente com os reagentes de lise a amostra era homogeneizada e colocada em um aparelho chamado sonicador (emissor de ondas sonoras) por quinze minutos, para que a extração fosse realizada. Após este período, era retirada do sonicador, evitando agitações, e por dez minutos ficava exposta a uma temperatura de 95 ºC ± 5 ºC. Todo o processo especificado acima tem como objetivo a extração dos ácidos nucléicos. Após essa extração, procedia-se à hibridização de 100 µl do lisado com a sonda genética SAGP (que já é marcada com éster de acridina e vem incorporada às paredes de um tubo específico no kit). Essa hibridização é realizada em uma temperatura de 59,5 ºC a 61 ºC, por quinze minutos, no termobloco.

Através de reagente de seleção (300 µl) específico e homogeneização, o material que não havia sido hibridizado era eliminado da reação (caso de amostras negativas para a sonda). Esta seleção era realizada no termobloco entre 59,5 ºC e 61 ºC, por dez minutos (no caso da sonda para o complexo M. tuberculosis, observa-se o tempo específico estipulado no kit).

A leitura e interpretação eram realizadas logo a seguir, em um aparelho chamado luminômetro, após repouso de cinco minutos, à temperatura ambiente. A leitura é expressa em RLU (unidade relativa de luz) e interpretada como se segue: RLU 20.000 = negativo; RLU 20.000 a 29.999 = duvidoso; RLU acima de 30.000 = positivo.

Procedimento similar para identificação de MNT foi feito usando-se amostras do tubo de reserva.

Para os testes de identificação por crescimento em meio Lowenstein-Jensen com presença de inibidores, foi semeado 0,1 ml de uma diluição a 10-3 das colônias, a partir da escala I de Mac Farland, em três outros tubos com o mesmo meio, um primeiro contendo PNB (500 µg/ml), um segundo com TCH (2 µg/ml) e um terceiro sem a presença dos inibidores.

A produção e acumulação de niacina pelo isolado foram demonstradas por fita reagente (TB niacin test strips BBL taxo - Becton Dickinson®), sendo a metodologia processada de acordo com as orientações do kit.

O teste de produção e acumulação de niacina foi realizado no mesmo dia da leitura dos repiques e da realização das outras provas, ou seja, com 30 dias (culturas entre 3 a 4 semanas, com no mínimo 50 colônias, conforme o exigido pela técnica). O meio era rasgado com alça descartável, acrescentava-se a ele 1,5ml de água destilada estéril e reclinava-se-o para que o líquido cobrisse a superfície por quinze a vinte minutos. Ao término deste tempo, 0,6ml deste líquido era retirado e colocado em um tubo estéril com tampa de rosca. Uma tira (TB niacin test strips BBL taxo - Becton Dickinson) era colocada, com ajuda de uma pinça, neste tubo. O aparecimento da cor amarela na água indicava o exame como positivo e seu não aparecimento, como negativo.

A identificação do complexo M. tuberculosis nesses testes acontece quando os resultados apresentam sensibilidade ao PNB, resistência à TCH e positividade à acumulação de niacina.

Todos esses procedimentos foram realizados dentro de capela de fluxo laminar segundo as nor-mas de biossegurança do Manual de
Bacteriologia da Tuberculose(6).

Por fim, foi realizada uma revisão dos prontuários dos pacientes, avaliando os aspectos clínicos, exames complementares que colaboraram para o diagnóstico e a evolução terapêutica, comparando-se os achados com os resultados dos testes diagnósticos estudados.

O estudo foi aprovado pela Comissão de Ética em Pesquisas com Seres Humanos do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo. Não houve conflito de interesse, pois o estudo foi financiado com recursos próprios do Instituto Clemente Ferreira.

RESULTADOS

Foram testados os isolados provenientes de escarros de 55 pacientes. A leitura da SAGP para o complexo M. tuberculosis foi positiva em 51 pacientes (um deles com associação do M. tuberculosis e do M. kansasii) e 4 apresentaram perfil de MNT e foram identificadas por sondas específicas (3 M. kansasii e 1 M. avium). Já os métodos tradicionais identificaram 47 pacientes como portadores do complexo M. tuberculosis, 4 com perfil de MNT (resultados concordantes com os obtidos pela sondagem genética) e 4 provas inconclusivas (discordantes), uma delas exatamente a que associava duas espécies de micobactérias (Tabela 1).





Avaliando-se as quatro amostras inconclusivas pelos métodos tradicionais e identificadas como cepas do complexo M. tuberculosis pela SAGP, observou-se que uma apresentou discordância da acumulação de niacina, outra apresentou discordância do TCH e duas do PNB. Em um caso que foi identificado pela sonda e teste de acumulação de niacina como do complexo M. tuberculosis houve crescimento em Lowenstein-Jensen com PNB. Ao serem testadas outras sondas no espécime em questão foi identificado M. kansasii, o que provou tratar-se de uma cultura associando as duas espécies (Tabela 2).





Todos os casos discordantes foram repetidos para que fossem eliminados quaisquer possíveis erros de técnica e todos confirmaram os resultados obtidos.

Avaliando-se os prontuários dos 51 pacientes identificados como portadores do complexo M. tuberculosis pela SAGP, todos foram considerados casos de tuberculose com diagnóstico clínico-radiológico compatível e em sua maioria foram curados com a evolução do tratamento, inclusive o caso que apresentava associação de duas diferentes espécies, sem que na evolução se tenham manifestado sintomas relacionados a MNT. Alguns poucos foram considerados multirresistentes, em tratamento com evolução favorável. Os quatro pacientes identificados como portadores de cepas de MNT apresentavam os seguintes diagnósticos: um apresentava tuberculose mulirresistente, curado, colonizado com o M. avium; dois eram portadores de micobacteriose pelo M. kansasii, curados com esquemas alternativos; e um curado da tuberculose pulmonar com seqüelas extensas e sintomas a elas relacionados, considerado como colonizado pelo M. kansasii (Tabela 3).





DISCUSSÃO

Há muitos anos a baciloscopia vem sendo indicada como base e principal forma de diagnóstico da tuberculose(3,7), constituindo para alguns uma forma quase exclusiva de rastreamento entre os sintomáticos respiratórios. O atual Manual Técnico para o Controle da
Tuberculose, publicado em 2002(8), admite desde a sua terceira edição, de 1988, que se pode denominar como caso de TB, além daqueles com baciloscopia e cultura positivas, "aquele em que o médico, com base em dados clínico-epidemiológicos e no resultado de exames complementares, firma o diagnóstico", recuperando antigas e novas opiniões que igualam a bacteriologia ao diagnóstico por imagem, abreugrafias(9,10) e radiologia de tórax conven-cional(5,11), respectivamente, na descoberta de casos de TB nos grupos de risco.

A bacteriologia tradicional permanece com validade em regiões de parcos recursos, mas também onde são escassos os casos. Nos grandes centros urbanos, onde de fato se avoluma a incidência e prevalência da TB e, especialmente, nas unidades de referência, onde se concentram as complicações, os diagnósticos mais difíceis, as condutas terapêuticas diferenciadas, sejam pelo perfil de resistência ou adversidades medicamen-tosas, as associações de risco e tanto outros problemas, a baciloscopia isolada não basta. Há a necessidade de recursos laboratoriais mais confiáveis e mais rápidos, que respondam à demanda.
Pode-se acreditar, assim, que no país há uma clara tendência para a aceitação e uma evidente necessidade de utilização de modernas metodologias diagnósticas para a TB, as quais vêm sendo introduzidas de forma rápida e progressiva nas universidades, nos centros de referência e nos serviços privados. A política de implantação de recursos mais complexos, para os serviços públicos, deve associar necessidades e possibilidades. É preciso testar o rendimento, o custo-benefício e a adequação das novas tecnologias às exigências do atendimento com a disponibilidade dos investimentos locais, como bem aconselham Kritski et al(5). nas orientações para a abordagem da TB na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Foi esta a razão do presente estudo, que compara uma tecnologia diagnóstica avançada, a SAGP, para a identificação do complexo M. tuberculosis, com os métodos usados na rotina em uma unidade de referência.

Um problema inicial foi a impossibilidade de se estabelecer um padrão ouro, considerando-se a expectativa de que a sonda genética a ser testada, pela sua natureza, deveria ter uma acurácia bem superior à dos métodos clássicos, sendo impossível determinar seus valores preditivos, tomando-os como base. Foi abandonada, também, a idéia inicial de um estudo mais detalhado do custo-benefício, por ser o aparelho e os insumos importados e pelas dificuldades de cálculos cambiais dos custos de implantação e reprodução continuada.

O estudo avaliou somente o rendimento comparativo e a qualidade de realização entre a SAGP e os métodos tradicionais realizados no laboratório do Instituto Clemente Ferreira.

Selecionaram-se isolados de culturas mais significativas e numerosas para repique, igualando-se o ponto de partida para as metodologias a serem comparadas. Foram obedecidas criteriosamente as orientações do kit para a nova tecnologia e, para os métodos rotineiros, as determinações do Manual do Ministério da Saúde(6).

Os resultados confirmaram a expectativa, revelando a superioridade da SAGP sobre os métodos tradicionais, com um diagnóstico conclusivo nos 55 isolados, sendo 51 do complexo M. tuberculosis (rendimento de 100%). Dentre estes, 1 associado com M. kansasii e 4 MNT, tipificadas por sondas próprias, 2 micobacterioses (por M. kansasii) e 2 colonizações em curados de TB (um por M. avium e outro por M. kansasii).

Os testes clássicos aplicados rotineiramente não conseguiram chegar ao diagnóstico conclusivo em 4 isolados (rendimento de 92,7%), apresentando resultados discordantes. O quadro clínico dos pacientes foi compatível com a identificação estabelecida pela SAGP.

Nos casos de MNT, a SAGP para o M. tuberculosis não foi suficiente para o diagnóstico, tendo sido ele confirmado por outras sondas específicas após indicação de sua ocorrência pela metodologia fenotípica tradicional.

Este fato sugere que as duas metodologias devem ser associadas, favorecendo a economia e a racionalização dos recursos mais avançados.
A SAGP pode ainda ser útil na definição da cura e no controle do tratamento da TB, evitando prolongamentos e gastos desnecessários, como ilustram os casos de isolamento de MNT em pacientes clinicamente curado de TB que devido a este isolamento, se não fosse feita a identificação como MNT, poderiam continuar a ser tratados como TB.

Apesar de ser muitas vezes mais caro do que as técnicas rotineiras, a SAGP é mais rápida: necessita de cerca de três horas, contra 28 a 30 dias para os métodos tradicionais articulados. Estes últimos ocupam mais tempo dos funcionários, uso de estufa, vidraria e, no caso da unidade, o preparo de todos os meios. O protocolo laboratorial da SAGP é bastante simples, utiliza reagentes prontos e apenas três aparelhos (Figura 1).





A SAGP foi lançada no mercado norte-americano em 1989, e foi validada pelo Food and Drugs Administration e por algumas publicações internacionais, que confirmaram sua eficácia, como o trabalho de Middleton et al.(12), que investigou a habilidade da SAGP para detectar o complexo M. tuberculosis em cultura mista com Mycobacterium avium complex. O estudo sugeriu que o Mycobacterium avium complex não interferiu na detecção do complexo M. tuberculosis e vice-versa quando do uso da sonda específica para cada um deles. Lebrun et al.(13), analisando 134 isolados clínicos, encontraram uma especificidade de 100% da SAGP para o complexo M. tuberculosis, Mycobacterium avium complex, M. gordonae e M. kansasii. A sensibilidade foi de 100% para o complexo M. tuberculosis e M. gordonae, e de 95,2% para Mycobacterium avium complex. Badak et al.(14), a partir de 2.727 isolados obtidos de cultivos realizados em MB/BacT® (Organon Teknika), comprovaram a sensibilidade e especificidade da SAGP para o complexo M. tuberculosis de 96,4% e 100% respectivamente, e 100% de especificidade e sensibilidade para o M. gordonae, em comparação com os testes bioquímicos clássicos de tipificação.

A identificação da espécie da micobactéria isolada através da SAGP foi recomendada para laboratórios de referência em consenso nacional através das "II Diretrizes Brasileiras para Tuberculose", por ser um método simples, disponível no mercado e validado(15).

A sonda SAGP para a tipificação do complexo M. tuberculosis é altamente específica, sensível, rápida e resolutiva, e permite uma pronta resposta para a intervenção clínica, facilitando o diagnóstico. As falhas evidenciadas neste estudo, pelo processo laboratorial envolvido na metodologia clássica, enfatizam que os métodos moleculares para o diagnóstico de micobactérias não se constituem em recursos alternativos, mas metodologias fundamentais para o diagnóstico da TB. Os benefícios da técnica de biologia molecular justificam sua implantação e uso rotineiro, associada aos métodos clássicos, em unidade com alta demanda e que atenda casos de tuberculose de alta complexidade.

REFERÊNCIAS

1. Sudre P, Ten Dam G, Kochi A. Tuberculosis: a global overview of the situation today. Bull WHO 1992;70:149-59.
2. Hiijar MA, Oliveira MJPR, Teixeira GM. A tuberculose no Brasil e no mundo. Bol Pneumol Sanit 2001;9:9-16.
3. Ministério da Saúde. Centro de Referência Prof. Hélio Fraga. Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. Controle da tuberculose: uma proposta de integração ensino-serviço, 5a. ed., Rio de Janeiro; 2002.
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5. Kritski AL, Conde MB, Souza GRM. Tuberculose: do ambulatório à enfermaria. São Paulo: Atheneu; 1999.
6. Ministério da Saúde. Centro de Referência Prof. Hélio Fraga. Fundação Nacional da Saúde. Manual de bacteriologia da tuberculose: 2a. ed., Rio de Janeiro, 1994.
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8. Ministério da Saúde. Secretaria de Políticas de Saúde. Departamento de Atenção Básica. Manual técnico para o controle da tuberculose. Brasília; 2002.
9. Abreu M. Recensseamento torácico coletivo pela Roentgen-fotografia. Porto Alegre: Livraria Globo; 1938.
10. Ministério da Saúde. Fundação Nacional de Saúde. Comitê Técnico-Científico de Assessoramento à Tuberculose. Comitê Assessor para Co-infecção HIV-Tuberculose. Tuberculose: guia de vigilância epidemiológica. Brasília; 2003.
11. Machado AS. Abreugrafia na luta antituberculosa. J Pneumol 1977;3:5-6.
12. Middleton AM, Chadwick MV, Gaya H. Detection of mycobacterium tuberculosis in mixed broth cultures using DNA probes. Clin Microbiol Infect 1997; 3:668-71.
13. Lebrun L, Espinasse F, Poveda JD, Freebault VL. Evaluation of nonradioactive DNA probes for identification of mycobacteria. J Clin Microbiol 1992; 30: 2476-8..
14. Badak FZ, Goksel S, Sertaz R, Nafile B, Ermertan S, Carisoglu C, et al. Use of nucleic acid probes for identification of Mycobacterium tuberculosis directly from MB/BacT. J Clin Microbiol 1999; 37: 1602-5.
15. II Diretrizes Brasileiras para Tuberculose. J Bras Pneumol 2004; 30:8-9.

* Trabalho realizado no Instituto Clemente Ferreira - Coordenadoria de Controle de Doenças- Secretaria de Estado da Saúde - São Paulo , SP
Endereço para correspondência: Delurce Tadeu de Araujo Spada. Rua da Consolação, 717. CEP: 01301-000, São Paulo, SP.
Tel: 55 11 3258 7644. E-mail: spadade@terra.com.br
Recebido para publicação, em 7/5/04. Aprovado, após revisão em 10/12/04.

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