ABSTRACT
Objective: To evaluate the efficacy and safety of a fixed-dose, single-capsule budesonide-formoterol combination, in comparison with budesonide alone, in patients with uncontrolled asthma. Methods: This was a randomized, double-blind, multicenter, phase III, parallel clinical trial, comparing the short-term efficacy and safety of the combination of budesonide (400 μg) and formoterol (12 μg), with those of budesonide alone (400 μg), both delivered via a dry powder inhaler, in 181 patients with uncontrolled asthma. The age of the patients ranged from 18 to 77 years. After a run-in period of 4 weeks, during which all of the patients received budesonide twice a day, they were randomized into one of the treatment groups. The treatment consisted of the administration of the medications twice a day for 12 weeks. The primary outcome measures were FEV1, FVC, and morning PEF. We performed an intention-to-treat analysis of the data. Results: In comparison with the budesonide-only group patients, those treated with the budesonide-formoterol combination showed a significant improvement in FEV1 (0.12 L vs. 0.02 L; p = 0.0129) and morning PEF (30.2 L/min vs. 6.3 L/min; p = 0.0004). These effects were accompanied by good tolerability and safety, as demonstrated by the low frequency of adverse events, only minor adverse events having occurred. Conclusions: The single-capsule combination of budesonide-formoterol appears to be efficacious and safe. Our results indicate that this formulation is a valid therapeutic option for obtaining and maintaining asthma control. (ClinicalTrials.gov Identifier: NCT01676987 [http://www.clinicaltrials.gov/])
Keywords:
Asthma; Budesonide; Adrenergic beta-2 receptor agonists.
RESUMO
Objetivo: Avaliar a eficácia e a segurança da associação de budesonida e formoterol em dose fixa e cápsula única, em comparação ao uso de budesonida isolada em pacientes com asma não controlada. Métodos: Ensaio clínico randomizado, duplo-cego, multicêntrico, de fase III, com grupos paralelos, comparando a eficácia de curto prazo e a segurança da formulação em pó de budesonida (400 μg) e formoterol (12 μg) com a formulação em pó de budesonida (400 μg) em 181 participantes com asma não totalmente controlada. A idade dos participantes variou de 18-77 anos. Após um período de run-in de 4 semanas, durante o qual todos os participantes receberam budesonida duas vezes por dia, houve a randomização para um dos tratamentos do estudo. O tratamento foi administrado duas vezes ao dia por 12 semanas. Os principais desfechos foram VEF1, CVF e PFE matinal. Os dados foram analisados por intenção de tratar. Resultados: O grupo tratado com a associação, quando comparado ao grupo budesonida isolado, teve uma melhora significativa no VEF1 (0,12 L vs. 0,02 L; p = 0.0129) e no PFE matinal (30,2 L/min vs. 6,3 L/min; p = 0,0004). Esses efeitos foram acompanhados por boa tolerabilidade e segurança, como demonstrado pela baixa frequência de eventos adversos menores. Conclusões: A associação em cápsula única de budesonida e formoterol mostrou ser eficaz e segura. Os resultados demonstram que essa formulação é uma opção terapêutica válida para a obtenção e manutenção do controle da asma.
(ClinicalTrials.gov Identifier: NCT01676987 [http://www.clinicaltrials.gov/])
Palavras-chave:
Asma; Budesonida; Agonistas de receptores adrenérgicos beta 2.
IntroduçãoO tratamento da asma persistente implica o uso contínuo de medicações controladoras.(1-3) As evidências atuais mostram que o uso da associação de um corticoide inalatório (CI) e um long-acting β2 agonist (LABA, β2-agonista de ação prolongada), quando comparado ao uso de CI isolado, resulta em melhor controle da doença, com redução dos riscos futuros.(4,5) Adicionalmente, esses efeitos são obtidos com menores doses de CI, além de facilitar o tratamento da asma ao reduzir o número de inalações diárias.(6)
Diversas associações de CI e LABA, administrados por diferentes dispositivos inalatórios, estão aprovadas e disponíveis no Brasil para o tratamento da asma. A associação de budesonida e formoterol em pó para inalação pode ser dispensada em dispositivos com múltiplas doses (Turbuhaler®) ou em dispositivos de dose única com cápsulas separadas contendo budesonida e formoterol (Aerolizer®) ou com cápsula única contendo a associação budesonida e formoterol (Aerocaps®). A literatura médica ainda não trouxe evidências suficientes com relação ao uso da associação em dose fixa de CI e LABA em cápsula única dispensada por Aerocaps®.
Em decorrência, delineou-se o presente estudo com o objetivo de se avaliar a eficácia e a segurança da associação de budesonida e formoterol em cápsula única, em comparação com o uso de budesonida isolada, em pacientes com asma persistente não totalmente controlada.
MétodosO presente estudo foi um ensaio clínico multicêntrico nacional (quatro centros) de fase III, randomizado, duplo-cego, de grupos paralelos, para avaliar a eficácia e segurança da associação fixa em cápsula única de budesonida 400 µg e formoterol 12 µg (Alenia®; Biosintética Farmacêutica Ltda., São Paulo, Brasil) com budesonida 400 µg (Busonid Caps®; Aché Lab Farm S.A., Guarulhos, Brasil), em adultos portadores de asma parcialmente controlada, considerando-se a classificação da Global Strategy for Asthma Management and Prevention e das IV Diretrizes Brasileiras para o Manejo da Asma.(1,3) Após um período de uniformização, durante o qual todos os participantes receberam budesonida 400 µg por via inalatória duas vezes ao dia por 4 semanas, realizou-se a randomização para uma das intervenções do estudo. O esquema de randomização, permutação de blocos de tamanho 4 na proporção 1:1, foi reproduzido através do programa Statistical Analysis System, versão 9.1.3 (SAS Institute, Gary, NC, EUA).
Ambos os tratamentos foram administrados por 12 semanas, por via inalatória, duas vezes ao dia, sob forma de cápsulas idênticas de pó. Os desfechos primários foram as variações de VEF1, CVF e PFE matutino. Desfechos secundários incluíram o efeito do tratamento no PFE vespertino, na relação VEF1/CVF, no percentual de dias livres de sintomas, assim como na frequência de despertares noturnos devido à asma e do uso de medicação de resgate.
Exceto pelo uso de salbutamol de resgate e pelo uso de corticoide oral na exacerbação (ciclos de corticoterapia oral de 40 mg por 3 dias, de 20 mg por 3 dias e de 10 mg por mais 3 dias de prednisona), não foi permitido o uso concomitante de outros tratamentos para a asma.
Todos os participantes tinham diagnóstico de asma há pelo menos um ano, nunca haviam fumado ou eram ex-fumantes há mais do que um ano, com carga tabágica inferior a 20 maços-ano, e não possuíam outras doenças respiratórias ou comorbidades que pudessem influenciar os resultados do estudo. Nenhum dos participantes recebera corticoide oral ou fora internado no mês anterior. O estudo foi aprovado pelos comitês de ética e pesquisa com seres humanos de cada centro envolvido, e todos os participantes leram e assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.
O estudo consistiu em seis visitas consecutivas, realizadas no período da manhã (Figura 1). Na primeira visita (V-2), os pacientes elegíveis para o estudo receberam e assinaram o consentimento informado, realizaram espirometria e receberam orientações sobre o estudo. Na semana seguinte (V-1), os participantes retornaram para receber a medicação de uniformização (budesonida 400 µg, duas vezes ao dia por 4 semanas); na visita subsequente (V0), os pacientes foram randomizados para uma das medicações do estudo. As visitas V1, V2 e V3 foram realizadas a cada 4 semanas. Os resultados da espirometria na V0 foram considerados como basais. A primeira espirometria foi realizada até as 10 h da manhã, e as próximas obedeceram a uma janela de ± 2 h em relação à hora da primeira espirometria, não ultrapassando as 11 h da manhã. Coletas de sangue para a avaliação da segurança foram realizadas nas V-2, V0 e V3. Sintomas, uso de medicação de resgate e medidas diárias de PFE com o dispositivo mini-Wright® (Clement Clarke International, Essex, Inglaterra) antes da utilização dos medicamentos do estudo foram registrados pelos participantes em um diário.
A espirometria foi realizada de acordo com as especificações da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia,(7) através de um espirômetro computadorizado (Koko®; PDS Instrumentation, Louisville, CO, EUA). Os valores da normalidade previstos foram aqueles propostos por Knudson et al. em 1976(8) e em 1983.(9)
A aderência ao tratamento foi aferida em cada visita pela contabilização das cápsulas não utilizadas. Participantes com aderência inferior a 70% foram descontinuados do estudo.
Com relação à análise estatística, o estudo foi delineado para incluir 100 participantes em cada grupo, número suficiente para identificar uma diferença, entre os tratamentos, no PFE matutino da ordem de 20 L/min, com poder de 80% e nível de significância de 5%, assumindo-se um desvio-padrão de 50 L/min. Uma análise interina foi planejada e realizada quando 40% dos participantes incluídos completaram o estudo, na qual foi possível observar o efeito significativo da intervenção e, então, interromperam-se novas inclusões. O estudo foi finalizado com 181 participantes.
Todas as variáveis de eficácia foram avaliadas para os participantes que receberam pelo menos uma dose do medicamento e que realizaram pelo menos uma avaliação de eficácia pós-basal (população com intenção de tratar).
O PFE foi registrado no diário do participante. A medida basal foi representada pela média dos 10 últimos valores registrados no período de uniformização (entre V-1 e V0), e a medida final foi representada pela média dos 10 últimos valores registrados no período de tratamento (entre V0 e V3).
A variação de cada parâmetro espirométrico e do PFE, do final para o início do tratamento, foi avaliada empregando-se um modelo de covariância. O modelo inicial ajustado contou com o tratamento como fator fixo; valores basais, sexo, idade e centro foram considerados como covariáveis, bem como as interações sexo/tipo de tratamento e centro/tipo de tratamento. As estimativas das médias ajustadas e o IC95% foram obtidos para o modelo final ajustado, excluindo-se interações e covariáveis que não foram significantes. O método de imputação de dados last observation carried forward foi empregado.
As variáveis de eficácia que representavam contagem foram avaliadas por meio de um modelo linear generalizado, considerando-se a distribuição binomial negativa e o centro como covariável.
Todos os cálculos foram realizados com o sistema Statistical Analysis System, versão 9.1.3.
ResultadosEntre abril de 2009 e junho de 2010, 304 asmáticos adultos foram recrutados em quatro centros de pesquisas brasileiros. Desses, 181 foram incluídos e randomizados para uma das intervenções do estudo; 175 participantes utilizaram pelo menos uma dose do medicamento (90 no grupo budesonida e 85 no grupo budesonida+formoterol [BF]), tendo sido considerados na análise por intenção de tratamento (Figura 2). As características demográficas e os parâmetros espirométricos basais estão resumidos na Tabela 1 e foram semelhantes entre os grupos de tratamento.
Com relação aos desfechos primários, o tratamento de 12 semanas no grupo BF, quando comparado com grupo budesonida, resultou em um aumento médio, estatisticamente significante, do VEF1 e do PFE matutino de 104 mL (IC95%: 22-186 mL) e de 23,93 L/min (IC95%: 10,89-36,93 L/min), respectivamente. Esses resultados representam uma estimativa da diferença da variação (final − basal) do VEF1 na comparação dos dois grupos, calculada com a seguinte equação:
(VEF1 final − VEF1 basal [grupo BF]) −
(VEF1 final − VEF1 basal [grupo budesonida])
Em outras palavras, esses resultados refletem o efeito adicional do formoterol, quando associado à budesonida.
A CVF teve um aumento médio de 80,93 mL (IC95%: −1,28 a 163,14 mL), que não foi estatisticamente significativo (Tabela 1 e Figura 3).
Na análise dos desfechos secundários, observou-se um aumento médio, estatisticamente significante, do PFE vespertino de 29,02 L/min (IC95%: 16,03-42,02 L/min) nos participantes do grupo BF. Nos demais desfechos secundários, não houve diferenças estatisticamente significantes entre os grupos (Tabela 1 e Figura 4).
Em relação aos eventos adversos, foram analisados os dados de todos os participantes randomizados e que receberam pelo menos uma dose do medicamento do estudo. A utilização dos dois tratamentos foi bem tolerada, e a proporção de pacientes que relataram eventos adversos foi semelhante nas duas intervenções.
Os eventos adversos mais frequentes foram cefaleia, em 29,8%; infecção por influenza, em 13,8%; infecção de vias aéreas superiores, em 9,4%; dor laringofaríngea, em 7,2%; tontura, em 7,2%; tremores, em 5,5%; nasofaringite, em 5,5%; náusea, em 5,0%; e dor em abdômen superior, em 5,0%.
Na avaliação dos investigadores, 80% dos eventos no grupo BF e 87% desses no grupo budesonida foram considerados como não relacionados aos medicamentos do estudo. Houve necessidade de mudanças nos tratamentos utilizados em apenas 2% dos eventos.
DiscussãoEste é o primeiro estudo brasileiro que avaliou a eficácia e a segurança da associação de budesonida e formoterol com o dispositivo Aerocaps® em cápsula única. Demonstrou-se a superioridade dos efeitos da associação em relação ao uso da budesonida isolada, mantendo-se o mesmo padrão de tolerabilidade e segurança. Esses resultados são importantes porque confirmam a eficácia de uma associação amplamente prescrita para o tratamento da asma no Brasil.
O aumento de VEF1, observado nos participantes que utilizaram essa associação, comprova o efeito controlador adicional do formoterol promovido pelo dispositivo Aerocaps®, provavelmente indicando um efeito sinérgico dessa associação.(10,11) A diferença média do VEF1 de 100 mL a favor do grupo BF se reveste de importância maior quando se considera que os participantes incluídos no presente estudo tinham resultados de espirometria próximos ao normal.
A tendência de melhora da CVF, ainda que sem significância estatística, no grupo BF pode ser interpretada como uma medida indireta da desinsuflação, possivelmente por deposição e consequente efeito terapêutico nas pequenas vias aéreas.(11,12) Isso sugere que as características técnicas dessa apresentação propiciam tal desfecho favorável. Adicionalmente, o incremento do PEF matinal mostra que o medicamento mantém seu efeito durante o período a que se propõe, tendo em vista que a medida desse parâmetro foi realizada antes da dose diária matutina.
O rigor científico do presente estudo é demonstrado pelo seu delineamento randomizado e duplo-cego, assim como pelo tipo de análise rigorosa dos desfechos na população por intenção de tratamento. Além disso, os resultados observados no presente estudo estão em consonância com aqueles publicados anteriormente,(4,5) nos quais se comparou a associação CI + LABA com o uso de CI isolado, através de outros dispositivos inalatórios.
De acordo com os dados de segurança evidenciados, a associação de budesonida e formoterol em cápsula única foi bem tolerada e segura, mantendo as mesmas taxas de ocorrência de eventos adversos sérios e não sérios, quando comparada ao uso de corticoide isolado após 12 semanas de tratamento.
A falta de significância nos resultados das variáveis secundárias (despertares noturnos e dias livres de sintomas) possivelmente decorre do fato de que o tamanho amostral foi calculado para a significância estatística dos desfechos primários. No entanto, a tendência de melhora naqueles parâmetros indica a eficácia da associação na obtenção do controle da asma. Estudos futuros devem ser delineados avaliando outros desfechos (incluindo os resultados de questionários de controle da asma), outras associações e concentrações presentes no mercado.
Os resultados do presente estudo dão apoio à utilização da associação de budesonida e formoterol em cápsula única com o dispositivo Aerocaps® no tratamento de manutenção da asma não controlada, tendo em vista a comprovação de sua eficácia e segurança.
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Trabalho realizado na Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.
Endereço para correspondência: Roberto Stirbulov. Rua Baronesa de Itu, 610, conjunto 93, Santa Cecília, CEP 01231-000,
São Paulo, SP, Brasil.
Tel. 55 11 3663-3604. E-mail: stirbul@uol.com.br
Apoio financeiro: Nenhum.
Recebido para publicação em 6/12/2011. Aprovado, após revisão, em 7/5/2012.
Sobre os autoresRoberto Stirbulov
Professor Adjunto. Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.
Carlos Cezar Fritscher
Professor Titular de Pneumologia. Departamento de Medicina Interna, Faculdade de Medicina, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre (RS) Brasil.
Emilio Pizzichini
Chefe da Disciplina e do Serviço de Pneumologia. Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis (SC) Brasil.
Márcia Margaret Menezes Pizzichini
Professora Adjunta. Departamento de Clínica Médica, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis (SC) Brasil.