RÉPLICA
Lemos com interesse e atenção a carta enviada pelos professores Lorenzi, Assis Viegas e Flávio Magalhães, a qual contém uma série de importantes considerações a respeito de nosso artigo "Manifestações extra-esofágicas da doença do refluxo gastresofágico", recentemente publicado.(1)
Afora as gentis considerações quanto à clareza e qualidade de nosso texto, as quais muito nos lisonjeiam, a essência da correspondência está centrada na pouca atenção que teríamos dado à síndrome da apnéia obstrutiva do sono (SAOS).
A discussão sobre a existência de relação entre SAOS e doença do refluxo gastresofágico (DRGE) é antiga. Samelson,(2) em 1989, sugeriu que as pressões negativas intratorácicas geradas durante a SAOS poderiam desencadear episódios de refluxo gastresofágico.
Posteriormente, na década de 1990, diversos artigos publicados demonstraram que tanto a SAOS quanto a DRGE apresentavam melhora com o uso do CPAP nasal, dando suporte à hipótese da presença de uma relação de causa e efeito entre essas duas patologias.
Estudos mais recentes demonstraram que pacientes com SAOS são freqüentemente acometidos pela DRGE, porém, até o momento, não se conseguiu estabelecer relação de causa e efeito entre essas situações clínicas.
Valipour et al,(3) em 2002, analisaram 228 pacientes utilizando polissonografia e um questionário específico e validado e não conseguiram estabelecer relação causal entre SAOS e DRGE. De forma semelhante, Morse et al,(4) em 2004, avaliando 136 pacientes e igualmente utilizando polissonografia e um questionário validado, tampouco obtiveram resultados estatisticamente significativos que estabelecessem essa relação.
Finalmente, em 2005, Kim et al,(5) em um estudo bem conduzido, no qual foram analisados mais de 1.000 pacientes, não puderam concluir pela existência de relação definida entre a presença ou ausência de DRGE e SAOS. Um dos aspectos importantes deste estudo foi que o aumento da gravidade do índice de apnéia-hipopnéia não aumentou a probabilidade de ocorrência de DRGE.
Os dados disponíveis na literatura parecem apontar para o fato de que a concomitância dessas duas entidades, ambas bastante prevalentes, pode dever-se à presença de riscos compartilhados (por exemplo, obesidade) e dificilmente ser decorrente de uma situação direta de causa e efeito. Evidentemente a concomitância de SAOS e DRGE é um fato de relevância inegável. Neste sentido, agradecemos a atenção especial dada ao problema através da carta dos professores Lorenzi, Viegas e Magalhães, os quais sabidamente têm grande conhecimento e interesse na área, complementando nossa extensa revisão em um tema tão amplo e multidisciplinar como são as manifestações extra-esofágicas da DRGE.
Para concluir, o fato de a DRGE não estar associada à SAOS não significa que as patologias relacionadas ao sono devam ser menosprezadas. Considerando sua elevada prevalência e impacto na qualidade de vida dos pacientes, devemos suspeitar de sua existência na rotina de nossa prática médica, adotando as condutas adequadas para o seu diagnóstico e gravidade. Somente desta forma poderemos indicar o tratamento mais adequado a esses complexos problemas que tanto afetam nossos pacientes.
REFERÊNCIAS
1. Gurski RR, Rosa ARP, Valle E, Borba MA, Valiatti AA. Manifestações extra-esofágicas da doença do refluxo gastroesofágico. J Bras Pneumol 2006;32(2)150-6
2. Samelson CF. Gastro-oesophageal reflux and obstructive sleep apnea. Sleep 1989;(21)12:475-6.
3. Valipour A, Makker HK, Hardy R, Emegbo S, Toma T, Spiro SG. Symptomatic gastro-oesophageal reflux in subjects with a breathing sleep disorder. Chest 2002; 121:(6)1748-53
4. Morse CA, Quan SF, Mays MZ, Green C, Stephen G, Fass R. Is there a relationship between obstructive sleep apnea and gastro-oesophageal reflux disease? Clin Gastroenterol Hepatol 2004;2:(9)761-8.
5. Kim HN, Vorona RD, Winn MP, Doviak M, Johnson DA, Ware JC. Symptoms of gastro-oesophageal reflux disease and the severity of obstructive sleep apnoea syndrome are not related in sleep desorders center patients. Aliment Pharmacol Ther 2005;21:1127-33.
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1. Doutor pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS; Pós-Doutor pela Universidade do Sul da Califórnia - USC. Professor de Pós-graduação de Cirurgia - UFRGS - Porto Alegre (RS) Brasil.
2. Doutor em Cirurgia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS. Cirurgião do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (RS) Brasil.
3. Pneumologista do Hospital Moinhos de Vento - Porto Alegre (RS) Brasil; Fellow do American College of Chest Physicians, Northbrook, Illinois.
4. Acadêmico da Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS - Porto Alegre (RS) Brasil.