Ao Editor:
Paciente do sexo feminino, 33 anos, raça branca, sem antecedentes pessoais relevantes, apresentava disfagia progressiva há três meses associada a vômitos pós-alimentares, perda ponderal de 8 kg e astenia. O exame físico não evidenciou alterações. Os exames laboratoriais indicavam anemia microcítica hipocrômica (hemoglobina, 10,2 g/dL; volume corpuscular médio, 69 fl; e hemoglobina corpuscular média, 22 pg), sem outras alterações.
A endoscopia digestiva alta revelou estenose puntiforme a 23 cm da arcada dentária superior, na transição do terço superior com o terço médio do esôfago, com discreta nodosidade e rigidez da mucosa a montante, porém sem apresentar sinais típicos de infiltração neoplásica até a área da estenose. A estenose não permitiu a progressão do endoscópio. Biópsias da mucosa esofagiana indicaram esofagite edematosa.
O esofagograma indicou área de estenose na transição cervicotorácica do esôfago e dilatação do esôfago a montante da estenose, com prováveis resíduos alimentares (Figura 1).
A TC de tórax mostrou tecido sólido no mediastino posterosuperior, produzindo envolvimento circunferencial de traqueia e esôfago, sendo que, no esôfago, produzia importante redução da luz e dilatação a montante (Figura 2). Doença linfoproliferativa e tumor estromal gastrointestinal foram as hipóteses diagnósticas consideradas.
A fibrobroncoscopia indicou ausência de lesão endotraqueal, e a toracoscopia mostrou lesão na transição traqueoesofágica, sem limites bem definidos, de aspecto fibroso, endurecido, brancacenta e com diâmetro de aproximadamente 5 cm. Biópsias da lesão indicaram ausência de malignidade.
Perante a dúvida diagnóstica e a persistência de sintomatologia na paciente, realizou-se toracotomia, com ressecção de toda a lesão e liberação do esôfago torácico. O exame de congelação foi sugestivo de tumor estromal gastrointestinal. O resultado histopatológico foi compatível com processo inflamatório crônico inespecífico. O estudo imuno-histoquímico foi positivo para CD20, CD3 (SP7) e actina de músculo liso, sendo negativo para -catenina, CD30, CD15 e CD245, correspondendo a pseudotumor inflamatório.
Após a cirurgia, a paciente evoluiu favoravelmente, com desaparecimento da sintomatologia. Até o presente momento, a paciente mantinha-se em controle oncológico há 1 ano.
O pseudotumor inflamatório foi descrito pela primeira vez por Brunn em 1932, tendo recebido esse nome por Umiker et al. em 1954, devido a sua capacidade de mimetizar clínica e radiologicamente uma patologia maligna.(1) Desde aquela época, o pseudotumor inflamatório vem sendo descrito na literatura por diferentes nomes, como histiocitoma, granuloma de células plasmáticas, xantoma, tumor inflamatório miofibroblástico, entre outros.(2,3)
O pseudotumor inflamatório é um tipo raro de tumor, de origem desconhecida, que acomete mais frequentemente o pulmão e a órbita. Há casos descritos de acometimento de variados locais anatômicos, como o aparelho gastrointestinal e o sistema nervoso central.(3,4) O acometimento mediastinal é raro.(5)
A etiopatogenia do pseudotumor inflamatório é desconhecida, e existem diversas hipóteses que propõem origem autoimune ou infecciosa.(6,7) Embora a localização pulmonar seja a mais frequente, o pseudotumor inflamatório pode se originar em qualquer órgão.(3,8) Não há predomínio de sexo ou raça, e a idade de acometimento varia de 1 a 73 anos.(2,9) Na grande maioria das vezes, trata-se de um tumor benigno, que, em escassas ocasiões, infiltra estruturas vizinhas ou apresenta desenvolvimento multifocal.(8)
As manifestações clínicas variam de acordo com o local de origem.(8) Radiologicamente, geralmente é visualizado como uma lesão bem delimitada.(4,10) Seu diagnóstico baseia-se no estudo histopatológico, sendo que histologicamente são verificadas células inflamatórias agudas e crônicas, com grau de fibrose variável.(4,11)
O tratamento de escolha, quando possível, é a ressecção cirúrgica completa, com exceção para os tumores de órbita.(3,4,8,12,13) A ressecção cirúrgica ainda é o método de escolha em casos de recorrência.(3,4)
Há relatos de regressão espontânea do tumor e de metástases à distância.(4,8) A radioterapia e a quimioterapia vêm sendo tentadas nos casos irressecáveis. Os esteroides são a primeira escolha nos tumores orbitais, mas a resposta terapêutica é imprevisível.(4,5)
Em conclusão, a apresentação do pseudotumor inflamatório em mediastino posterior é rara, o que dificultou o seu diagnóstico. Os aspectos clínicos e radiológicos sugerem outras neoplasias, e os exames pré-operatórios normalmente não são conclusivos, sendo necessária a ressecção completa da lesão, tanto para um tratamento adequado, quanto para um diagnóstico definitivo.
Izabella Nobre Queiroz
Acadêmica de Medicina, Universidade Estadual de Montes Claros - Unimontes -
Montes Claros (MG) Brasil
Renata Mendonça Moreira Penna
Acadêmica de Medicina, Universidade Estadual de Montes Claros - Unimontes -
Montes Claros (MG) Brasil
Emanuelly Botelho Rocha Mota
Residente de Clínica Médica,
Hospital Universitário
Clemente de Faria,
Montes Claros (MG) Brasil
Rafael Turano Mota
Cirurgião Torácico,
Santa Casa de Montes Claros,
Montes Claros (MG) Brasil
Vinícius Turano Mota
Cirurgião Torácico,
Santa Casa de Montes Claros,
Montes Claros (MG) Brasil
Referências
1. Umiker WO, Iverson L. Postinflammatory tumors of the lung; report of four cases simulating xanthoma, fibroma, or plasma cell tumor. J Thorac Surg. 1954;28(1):55-63. PMid:13175281.
2. Gorospe L, Fernández-Gil MA, Torres I, Tovar J, García-Miguel P, Tejerina E. Misleading lead: inflammatory pseudotumor of the mediastinum with digital clubbing. Med Pediatr Oncol. 2000;35(5):484-7. http://dx.doi.org/10.1002/1096-911X(20001101)35:5<484::AID-MPO7>3.0.CO;2-T
3. Kim JH, Cho JH, Park MS, Chung JH, Lee JG, Kim YS, et al. Pulmonary inflammatory pseudotumor--a report of 28 cases. Korean J Intern Med. 2002;17(4):252-8. PMid:12647641.
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