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Cartas ao Editor

Ressonância magnética de corpo inteiro na avaliação do comprometimento torácico na paracoccidioidomicose disseminada

Whole-body magnetic resonance imaging for the evaluation of thoracic involvement in disseminated paracoccidioidomycosis

Edson Marchiori, Elisa Carvalho Ferreira, Gláucia Zanetti, Bruno Hochhegger

Ao Editor:

A ressonância magnética (RM) de corpo inteiro é uma ferramenta diagnóstica que permite a visualização de todo o corpo e combina tempo de aquisição rápido com resolução de alto contraste. Uma importante vantagem dessa técnica é a ausência de radiação ionizante. Assim, para o diagnóstico, estadiamento e monitoramento de pacientes jovens que necessitam de exames de seguimento frequentes, a RM de corpo inteiro é uma alternativa, sem radiação, à cintilografia e à TC. Como a RM é o melhor método para avaliar a medula óssea e os tecidos moles, é uma ferramenta ideal para a avaliação de muitas doenças sistêmicas, em especial as que afetam o sistema esquelético.(1)

A paracoccidioidomicose, uma doença fúngica sistêmica causada pelo fungo Paracoccidioides brasiliensis, é endêmica na América Central e na América do Sul.(2,3) Na Europa e na América do Norte, é considerada uma doença rara, importada; espera-se que sua incidência continue a aumentar devido ao aumento da migração e das viagens internacionais.(4) Já que a doença pode afetar praticamente qualquer órgão, a RM de corpo inteiro parece ser uma ferramenta diagnóstica adequada para avaliar manifestações sistêmicas da paracoccidioidomicose disseminada, pois fornece uma visão global. O objetivo do presente relato foi apresentar os achados da RM de corpo inteiro em um paciente com manifestações sistêmicas de paracoccidioidomicose, com ênfase no envolvimento linfático, esquelético e pleural. Até onde sabemos, achados torácicos de paracoccidioidomicose disseminada em RM de corpo inteiro não foram descritos previamente.

Um homem de 24 anos foi encaminhado a nosso serviço para a investigação diagnóstica de múltiplas queixas. Os sintomas surgiram aproximadamente 15 meses antes da hospitalização e consistiam principalmente em emagrecimento, febre, linfadenopatia dolorosa, e lesões cutâneas ulceradas e com crostas. A história epidemiológica do paciente revelou que, durante os últimos dois anos, ele havia trabalhado em uma fazenda, onde cuidava de animais.

O exame físico revelou febre, múltiplas escaras cor de mel, e lesões ulceradas na face, tronco, membros superiores e região perianal. Os achados da ausculta pulmonar foram normais, assim como o foram os do exame cardíaco, e não havia organomegalia abdominal.

Um linfonodo cervical esquerdo foi aspirado, e a pesquisa direta de fungos revelou blastoconídios refringentes com múltiplos brotamentos que sugeriam a presença de P. brasiliensis no espécime. A cultura em ágar sangue também foi positiva para P. brasiliensis. Uma amostra de pele obtida por meio de biópsia e corada tanto com Grocott como com ácido periódico de Schiff revelou células de levedura com múltiplos brotamentos em forma de timão, um achado típico de P. brasiliensis. A sorologia por meio de técnicas de imunodifusão dupla foi positiva para paracoccidioidomicose. O exame de sangue foi negativo para HIV. Estabeleceu-se um diagnóstico de paracoccidioidomicose disseminada aguda ou subaguda (chamada de "juvenil"), e o paciente foi hospitalizado para tratamento.

Antes do início do tratamento necessário, obtivemos a assinatura de um termo de consentimento livre e esclarecido e o paciente foi submetido a RM de corpo inteiro a fim de investigar minuciosamente o envolvimento sistêmico da doença disseminada. O exame revelou extenso envolvimento em múltiplos locais em todo o corpo, incluindo o tecido subcutâneo, linfonodos, sistema esquelético, cavidade pleural, e cavidade peritoneal. A RM de corpo inteiro também revelou linfonodomegalia em múltiplas cadeias ganglionares. Em uma sequência de volumetric interpolated breath-hold examination (VIBE) com gadolínio, os linfonodos apresentaram realce periférico (Figura 1A). Em uma sequência short-tau inversion-recovery (STIR), as porções centrais desses linfonodos exibiram sinais hiperintensos, dando-lhes uma aparência necrótica.



Em T1, as lesões ósseas variaram de hipointensa a isointensa, exibindo, em alguns locais, destruição do osso cortical e um extenso componente de partes moles. Em uma sequência de VIBE com gadolínio e supressão de gordura, as lesões exibiram um padrão de insuflação, com realce predominantemente nas regiões periféricas (Figuras 1B e 2A). Em uma sequência STIR, as porções centrais das lesões apresentaram sinais hiperintensos, sugerindo a presença de tecido necrótico.

A RM de corpo inteiro com sequências STIR também revelou envolvimento pleural e peritoneal, manifestando-se na forma de derrame pleural e ascite, evidenciados por um típico sinal hiperintenso (Figura 2B). Não houve outros locais de envolvimento.



A paracoccidioidomicose é dividida em duas formas polares, dependendo de seus aspectos epidemiológicos, imunopatológicos e clínicos.(5) A forma aguda ou subaguda mais frequentemente afeta crianças, adolescentes e jovens adultos e é conhecida como tipo juvenil. Manifesta-se na forma de extenso envolvimento do sistema mononuclear fagocitário, principalmente no baço, fígado, linfonodos e trato intestinal. Lesões pulmonares e das mucosas são raras.(5) A forma crônica, conhecida como tipo adulto, é mais comum, respondendo por 90% de todos os casos, e afeta predominantemente adultos com mais de 30 anos de idade. A forma crônica é mais propensa a ser localizada do que o é a forma aguda. Inicialmente, a doença localiza-se nos pulmões e, menos frequentemente, na mucosa ou na pele.(5) Nosso caso pode ser considerado, portanto, um caso de forma aguda da paracoccidioidomicose.(3)

No caso apresentado aqui, a RM de corpo inteiro mostrou envolvimento em múltiplos locais em todo o corpo, incluindo o tecido subcutâneo, linfonodos, sistema esquelético, cavidade pleural, e cavidade peritoneal. Dentre as manifestações sistêmicas, concentramo-nos no extenso envolvimento torácico e esquelético. Infecções ósseas e articulares são relativamente raras em pacientes com paracoccidioidomicose. As lesões são descritas como áreas circunscritas e bem delineadas de lise, com ou sem borda de esclerose, que podem ocorrer em qualquer osso, embora tais lesões sejam geralmente vistas em clavículas, costelas e escápulas.(6)

Embora o paciente não apresentasse sintomas de envolvimento esquelético, decidimos realizar uma RM de corpo inteiro a fim de conduzir uma investigação detalhada. A RM de corpo inteiro pareceu-nos adequada para o caso apresentado aqui, uma vez que, além de sua resolução de alto contraste e excelente capacidade de visualizar componentes da medula óssea, o método tem a vantagem de não usar radiação ionizante, o que o torna uma ferramenta ideal para a avaliação inicial e o seguimento de crianças e jovens adultos como nosso paciente.(7)

Em suma, o caso apresentado aqui ilustra o potencial da RM de corpo inteiro como uma ferramenta diagnóstica para avaliar doenças sistêmicas, tais como a micose profunda. Esse método de avaliação sem radiação cria imagens que podem ser usadas como avaliações basais para monitoramento longitudinal.




Edson Marchiori
Professor Associado de Radiologia, Universidade Federal do Rio de
Janeiro, Rio de Janeiro (RJ) Brasil

Elisa Carvalho Ferreira
Médica Radiologista, Hospital de Ipanema, Rio de Janeiro (RJ) Brasil

Gláucia Zanetti
Professora de Clínica Médica, Faculdade de Medicina de Petrópolis, Petrópolis (RJ) Brasil

Bruno Hochhegger
Radiologista Torácico, Complexo Hospitalar Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, Porto Alegre (RS) Brasil



Referências


1. Ferreira EC, Brito CC, Domingues RC, Bernardes M, Marchiori E, Gasparetto EL. Whole-body MR imaging for the evaluation of McCune-albright syndrome. J Magn Reson Imaging. 2010;31(3):706-10.

2. Martinez R. Paracoccidioidomycosis: the dimension of the problem of a neglected disease. Rev Soc Bras Med Trop. 2010;43(4):480.

3. Nogueira SA, Guedes AL, Wanke B, Capella S, Rodrigues K, Abreu TF, et al. Osteomyelitis caused by Paracoccidioides brasiliensis in a child from the metropolitan area of Rio de Janeiro. J Trop Pediatr. 2001;47(5):311-5.

4. Buitrago MJ, Bernal-Martínez L, Castelli MV, Rodríguez-Tudela JL, Cuenca-Estrella M. Histoplasmosis and paracoccidioidomycosis in a non-endemic area: a review of cases and diagnosis. J Travel Med. 2011;18(1):26-33.

5. Valera ET, Mori BM, Engel EE, Costa IS, Brandão DF, Nogueira-Barbosa MH, et al. Fungal infection by Paracoccidioides brasiliensis mimicking bone tumor. Pediatr Blood Cancer. 2008;50(6):1284-6.

6. Nogueira MG, Andrade GM, Tonelli E. Clinical evolution of paracoccidioidomycosis in 38 children and teenagers. Mycopathologia. 2006;161(2):73-81.

7. Ley S, Ley-Zaporozhan J, Schenk JP. Whole-body MRI in the pediatric patient. Eur J Radiol. 2009;70(3):442-51.

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