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Artigo Original

Efeitos de um programa educativo ambulatorial em pacientes com asma não controlada

Effects of an outpatient education program in patients with uncontrolled asthma

Carmen Denise Borba Rodrigues, Rosemary Petrik Pereira, Paulo de Tarso Roth Dalcin

ABSTRACT

Objective: To evaluate the effects of an outpatient education program in patients with uncontrolled asthma. Methods: This was an uncontrolled study evaluating an educational intervention and involving patients with uncontrolled asthma ≥ 14 years of age. The participants completed a questionnaire designed to assess the level of asthma control, the inhalation technique, and quality of life. All of the patients underwent pulmonary function testing, after which they participated in an education program consisting of one 45-min face-to-face session, followed by phone interviews at two, four, and eight weeks. The participants were reevaluated after three months. Results: Sixty-three patients completed the study. There was a significant improvement in the level of asthma control (p < 0.001). Of the 63 patients, 28 (44.4%) and 6 (9.5%) were classified as having partially controlled asthma and controlled asthma, respectively. The mean FEV1 was 63.0 ± 20.0% and 68.5 ± 21.2% of the predicted value prior to and after the educational intervention, respectively (p = 0.002), and all of the quality of life scores improved (p < 0.05 for all). The same was true for the proportion of patients prior to and after the educational intervention using the proper inhalation technique when using metered dose inhalers (15.4% vs. 46.2%; p = 0.02) and dry powder inhalers (21.3% vs. 76.6%; p < 0.001). The logistic regression analysis revealed that an incorrect inhalation technique identified during the first evaluation was independently associated with a favorable response to the educational intervention. Conclusions: This study suggests that an outpatient education program for asthma patients improves the level of asthma control, lung function parameters, and quality of life. An incorrect inhalation technique identified during the first evaluation was predictive of a favorable response to the educational intervention.

Keywords: Asthma/prevention and control; Quality of life; Respiratory function tests; Ambulatory care; Health education.

RESUMO

Objetivo: Avaliar os efeitos de um programa educativo ambulatorial em pacientes com asma não controlada. Métodos: Estudo não controlado, avaliando uma intervenção educacional e envolvendo pacientes com idade ≥ 14 anos com asma não controlada. Os participantes responderam a um questionário para avaliar o grau de controle da asma, a qualidade de vida e a técnica inalatória e foram submetidos a testes de função pulmonar. A seguir, participaram do programa educativo, que consistia de uma sessão inicial de 45 min e de entrevistas telefônicas em duas, quatro e oito semanas. Os participantes foram reavaliados após três meses. Resultados: Completaram o estudo 63 pacientes. Houve melhora significativa no grau de controle da asma (p < 0,001). Dos 63 pacientes, 28 (44,4%) e 6 (9,5%) passaram a apresentar asma parcialmente controlada e controlada, respectivamente. Antes e depois a intervenção educacional, a média de VEF1 foi, respectivamente, 63,0 ± 20,0% do previsto e 68,5 ± 21,2% do previsto (p = 0,002), e todos os escores de qualidade de vida melhoraram (p < 0,05 para todos). O mesmo ocorreu com a proporção de pacientes com técnica inalatória adequada no uso de inalador pressurizado (15,4% vs. 46,2%; p = 0,02) e de dispositivo de pó (21,3% vs. 76,6%; p < 0,001). A análise de regressão logística identificou que a técnica inalatória incorreta na primeira avaliação estava independentemente associada com a resposta favorável à intervenção educativa. Conclusões: Este estudo sugere que um programa educativo ambulatorial resultou em uma melhora no grau de controle da asma, na função pulmonar e na qualidade de vida. A técnica inalatória incorreta na avaliação inicial foi preditora da resposta favorável à intervenção educativa.

Palavras-chave: Asma/prevenção e controle; Qualidade de vida; Testes de função respiratória; Assistência ambulatorial; Educação em saúde.

Introdução

A asma é uma das condições crônicas mais comuns, sendo um problema mundial de saúde.(1) Estima-se que, no Brasil, existam aproximadamente 20 milhões de asmáticos.(2)

A meta do manejo da asma é atingir e manter o controle da doença.(3) Entretanto, a despeito da implementação de diretrizes para o manejo da asma ao redor do mundo e da disponibilidade de medicações altamente eficazes para o controle dos sintomas e para o tratamento do processo inflamatório de base, a asma permanece uma doença pouco controlada.(4) A falta de controle pode ser devida ao fato de que os pacientes não estão recebendo a prescrição adequada ou de que não estão utilizando a medicação prescrita de forma correta. Também, a gravidade da asma e a presença de comorbidades, como refluxo gastroesofágico, obesidade e tabagismo, podem influenciar no grau de controle da asma.(5)

Além da prescrição e da disponibilização do tratamento farmacológico de acordo com a gravidade da asma, a educação e a orientação sobre o automanejo da doença passaram a ser aspectos indispensáveis a serem abordados no contexto clínico.(1) Vários tipos de programas educativos para asma têm sido desenvolvidos, diferenciando-se quanto à forma de abordagem, à situação em que a doença é atendida e aos desfechos considerados.(6-17) A necessidade de adaptar esse conhecimento sobre a asma e torná-lo acessível na prática clínica de um ambulatório especializado em asma, vinculado ao sistema público de saúde, motivou um estudo para avaliar o impacto de uma intervenção educativa individualizada sobre o manejo da doença.

O objetivo do presente estudo foi avaliar o efeito de um programa educativo ambulatorial individualizado em pacientes com asma não controlada.

Métodos

O delineamento constituiu-se em um estudo prospectivo não controlado, comparando as variáveis antes e depois da intervenção educativa. Foram estudados de forma consecutiva todos os pacientes que preencheram os critérios para o estudo e aceitaram participar da pesquisa.

O protocolo foi aprovado pela Comissão de Ética e Pesquisa do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA), sob o processo no. 08553. O termo de consentimento livre e esclarecido foi obtido de todos os pacientes ou de seus responsáveis, no caso de menores de 18 anos.

A população do estudo foi constituída por pacientes atendidos nos ambulatórios do Serviço de Pneumologia do HCPA, localizado na cidade de Porto Alegre (RS). Foram incluídos pacientes com idade igual ou superior a 14 anos, com diagnóstico de asma de acordo com critérios de consenso,(18,19) com asma classificada como não controlada de acordo com os critérios da Global Initiative for Asthma (GINA),(19) com pelo menos duas consultas prévias nos referidos ambulatórios.

Para avaliar o grau de controle da asma, foi utilizada a classificação proposta pelas diretrizes da GINA em 2007.(19) A asma foi considerada controlada se todas as seguintes características estivessem presentes: sintomas diurnos presentes duas vezes ou menos por semana e ausência de crise de asma nos últimos 3 meses; nenhuma limitação nas atividades diárias; nenhum sintoma noturno ou despertar por asma; necessidade de usar tratamento de alívio ou de resgate duas vezes ou menos por semana; fluxo aéreo normal (VEF1 e PFE iguais ou maiores que 80% do previsto). A asma foi considerada parcialmente controlada se uma ou duas das características acima descritas estivessem ausentes e foi considerada não controlada se mais do que duas das características acima estivessem ausentes ou se tivesse ocorrido hospitalização/admissão em serviço de emergência por asma nos últimos 12 meses. Foi definida como crise asmática a exacerbação que exigiu uso de corticoide sistêmico.

Foram excluídos do estudo pacientes com diagnóstico de outras doenças pulmonares crônicas, pacientes que não completaram as etapas preconizadas pelo estudo e aqueles que não aceitaram assinar o termo de consentimento livre e esclarecido.

Os voluntários foram entrevistados utilizando-se um questionário que avaliava as seguintes variáveis: idade, sexo, raça, estado civil, nível educacional, renda familiar, tabagismo, comorbidades, forma de aquisição e regularidade de uso das medicações para asma, tipo de dispositivo inalatório utilizado, qualidade da técnica inalatória e classificação da gravidade da asma.

A entrevista inicial, bem como as avaliações iniciais e em 3 meses do estudo, foi realizada pelo mesmo avaliador.

O questionário incluía uma lista de verificação para avaliar o manejo do dispositivo utilizado para inalar o corticoide, sendo solicitada ao paciente uma demonstração da técnica inalatória, utilizando placebo. Para o uso do inalador pressurizado, as seguintes etapas eram avaliadas: a) agita o aerossol antes do uso; b) realiza expiração normal antes do uso; c) mantém distância adequada de 3-5 cm do dispositivo até a boca, na ausência de uso de espaçador ou, se em uso de espaçador, se o coloca na boca e fecha os lábios adequadamente; d) realiza inspiração lenta e profunda após disparar o inalador; e e) faz pausa pós-inspiratória de, no mínimo, 10 segundos. Para a utilização do dispositivo de pó, as seguintes etapas eram avaliadas: a) realiza expiração normal antes do uso; b) coloca o dispositivo na boca e fecha os lábios adequadamente; c) inspira o mais vigorosa e profundamente possível; e d) faz pausa pós-inspiratória de, no mínimo, 10 s. Para a técnica ser considerada correta com cada dispositivo, todas as etapas deveriam ter sido executadas adequadamente.

Para avaliar a gravidade da asma, foi utilizada a classificação de gravidade conforme o regime medicamentoso diário usado, proposta pela GINA em 2002.(20)

A função pulmonar foi avaliada na entrevista inicial e 3 meses após, utilizando-se um espirômetro computadorizado (Jaeger-v4.31; Jaeger, Würzburg, Alemanha). Foram registrados CVF, VEF1 e relação VEF1/CVF. Todos os parâmetros foram expressos em valores absolutos e em percentagem do previsto para a idade, sexo e altura.(21)

A medida do PFE foi realizada utilizando-se um aparelho portátil (Peak Flow Monitor Vitalograph; Boehringer Ingelheim, Ingelheim am Rhein, Alemanha). Os resultados foram expressos em valores absolutos ou em percentagem do previsto para a idade, sexo e altura.(22)

A avaliação da qualidade de vida foi realizada através de um questionário específico - asthma quality of life questionnaire (AQLQ) (23-26) - traduzido e validado para o português.(27) Esse questionário apresenta 32 perguntas, agrupadas em quatro domínios: limitação de atividades, sintomas, função emocional e estímulos ambientais. O AQLQ pode ser administrado por um entrevistador ou ser autoadministrado. O escore global do questionário é a média aritmética de todos os itens, sendo o escore mínimo de 1 e o máximo de 7. Escores mais altos significam melhor qualidade de vida em relação à asma. A variação mínima significativa no escore é de 0,5, sendo que a variação de 1 é considerada moderada e a de 1,5, acentuada. No presente estudo, foi aplicada a forma autoadministrada do questionário.

A intervenção educativa consistia nas etapas de abordagem inicial e em contatos telefônicos em 2, 4 e 8 semanas.

A abordagem educativa iniciava-se após a consulta ambulatorial, com uma sessão individual de duração aproximada de 45 min, ministrada pela fisioterapeuta da equipe. O processo seguia um cronograma estruturado com orientação verbal e escrita que consistia nas seguintes etapas: o que é asma e quais são os seus sintomas; controle ambiental e como evitar fatores desencadeantes; importância do corticoide inalatório e da composição corticoide inalatório e 2-agonista de longa ação no manejo preventivo da doença; formas de aquisição da medicação no sistema público e como solucionar as limitações; revisão da técnica inalatória e correção de eventuais erros encontrados; orientação para o uso do espaçador se a administração do corticoide inalatório fosse através de inalador pressurizado; e esclarecimento de dúvidas com orientação adicional de acordo com a necessidade do paciente.

A abordagem educativa prosseguia através de contatos telefônicos, com aproximadamente 30 min de duração, realizados em 2, 4 e 8 semanas após a inclusão no estudo. Em cada contato, o paciente era questionado quanto ao controle da doença; era revisada e reforçada a importância do uso do corticoide inalatório, lembrando as etapas necessárias para a sua correta utilização; era revisada e estimulada a utilização do espaçador se em uso de inalador pressurizado; era questionado sobre o controle ambiental; eram esclarecidas dúvidas; e buscava-se solucionar possíveis problemas.

A reavaliação foi realizada em uma consulta de rotina 3 meses após a entrevista inicial.

O desfecho principal do estudo foi a proporção de pacientes que, após a intervenção educativa, atingiu a classificação de asma controlada ou parcialmente controlada. Os desfechos secundários foram os escores de qualidade de vida e a função pulmonar (medidas de PFE e VEF1).

O uso efetivo do corticoide inalatório e do 2-agonista de longa ação foi definido como a adesão relatada igual ou maior que cinco dias na semana.

Os dados foram analisados com auxílio do programa Statistical Package for the Social Sciences, versão 18.0 (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA). Os dados quantitativos foram apresentados como média e desvio-padrão ou como mediana e amplitude interquartílica, e os dados qualitativos foram expressos como número total e proporção. A análise comparativa dos dados quantitativos foi realizada pelo teste t para amostras pareadas ou pelo teste da ordenação sinalizada de pares combinados de Wilcoxon. Os dados qualitativos foram analisados através do teste do qui-quadrado ou do teste de McNemar.

As variáveis sexo, cor, idade, idade no diagnóstico de asma, grau de instrução (dicotomizado em até ensino fundamental e maior que ensino fundamental), renda familiar (dicotomizada em ≤ 3 salários mínimos e > 3 salários mínimos), estado civil (dicotomizado em casado e solteiro/viúvo/separado), gravidade da asma (dicotomizada em grave e leve/moderada), VEF1, técnica inalatória (correta em todas as etapas ou incorreta em qualquer das etapas), dispositivo inalatório (inalador pressurizado ou dispositivo de pó) e forma de aquisição da medicação (recurso próprio ou recurso público) foram incluídas individualmente em um modelo de regressão logística binária pelo método enter para identificar características preditivas de resposta favorável à intervenção educativa. A resposta favorável foi definida como a mudança para a classificação de asma controlada ou parcialmente controlada após a intervenção educativa. A resposta não favorável foi definida como a permanência da classificação como asma não controlada após a intervenção educativa. As variáveis com significância até 0,1, controladas por sexo e idade, foram incluídas no modelo de regressão logística binária multivariada pelo método enter para a resposta favorável.

Os testes estatísticos utilizados foram bicaudais. Foi estabelecida uma significância de 5%.

O cálculo de tamanho amostral foi realizado utilizando o programa PASS 2005: Power Analysis & Sample Size (NCSS, Kaysville, UT, EUA), considerando a proporção de pacientes que, após o programa educativo, poderia atingir a classificação de asma controlada ou parcialmente controlada. O valor da proporção para a hipótese alternativa foi estipulado em 0,25, e o valor da proporção para a hipótese nula foi estipulado em 0,05. Foi estabelecido um valor alfa de 0,05 e um poder de 80%. Dessa forma, seria necessário estudar pelo menos 63 pacientes.

Resultados

No período entre março de 2009 e março de 2011, foram avaliados 79 pacientes com asma não controlada. Destes, 5 não aceitaram participar do estudo, 10 abandonaram o estudo após a avaliação inicial (não retornaram para a reavaliação em 3 meses) e 1 foi excluído por apresentar DPOC. Assim, 63 pacientes completaram o estudo.

A Tabela 1 apresenta as características gerais dos pacientes. Dos 63 pacientes, 53 (84,1%) eram do sexo feminino e 48 (76,2%) eram de cor branca. A média da idade dos indivíduos foi de 49,3 ± 14,1 anos e a mediana de idade por ocasião do diagnóstico de asma foi de 20,0 anos.



Apresentavam pelo menos uma comorbidade 55 pacientes (87,3%), enquanto 31 pacientes (49,2%) eram obesos (índice de massa corpórea ≥ 30 kg/m2), 21 (33,3%) tinham doenças cardiovasculares, e 19 (30,2%) tinham refluxo gastroesofágico.

A Tabela 2 mostra o grau de controle da asma e resultados de função pulmonar antes e depois da intervenção educativa. Após a intervenção, houve uma significativa melhora no grau de controle da asma (p < 0,001), sendo que 28 pacientes (44,4%) passaram a apresentar asma parcialmente controlada e 6 (9,5%) passaram a ter asma controlada, enquanto 29 (46%) permaneceram com asma não controlada. Houve uma significativa redução na proporção de pacientes que foram atendidos em serviço de emergência por exacerbação de asma antes e depois da intervenção (50,8% vs. 25,4%; p = 0,007). Houve uma significativa melhora para as seguintes variáveis: PFE, em % do previsto (p = 0,019); CVF, em L (p = 0,031); CVF, em % previsto (p = 0,024); VEF1, em L (p = 0,003); VEF1, em % previsto (p = 0,002); e relação VEF1/CVF, em % do previsto (p = 0,07). Entretanto, a variação de VEF1 foi menor que 200 mL e que 12%.



A Tabela 3 apresenta a forma de aquisição, o uso das medicações e a técnica inalatória antes e depois da intervenção educativa. Não foram observadas diferenças significativas para a proporção de pacientes que adquiria a medicação com recurso próprio (p = 1,00), para a proporção de pacientes que adquiria a medicação na unidade de saúde (p = 0,549) e para a proporção de pacientes que adquiria a medicação na Secretaria Estadual de Saúde (p = 1,00). Também não houve variação significativa no uso efetivo das medicações com corticoide inalatório (p = 0,18), nem para as medicações com 2-agonista de longa ação (p = 1,00). A proporção de pacientes que realizou corretamente a técnica inalatória em todas as suas etapas aumentou significativamente de 15,4% para 46,2% (p = 0,021) nos que usavam o inalador pressurizado e de 21,3% para 76,6% (p < 0,001) nos que usavam os dispositivos de pó. A proporção de pacientes em uso de espaçador para a administração do inalador pressurizado aumentou significativamente de 36% para 68% (p = 0,021).



A Tabela 4 mostra a avaliação da qualidade de vida antes e depois da intervenção educativa. Tanto o escore total quanto os dos domínios do AQLQ melhoraram significativamente (p < 0,001 para todos)



Na regressão logística binária para prever a resposta favorável à intervenção educativa, as variáveis que individualmente atingiram a significância de p < 0,1 foram idade, VEF1 em % previsto e técnica inalatória. Essas variáveis foram incluídas no modelo de regressão logística binária multivariado, controladas por sexo e idade. A Tabela 5 apresenta os resultados dessa análise. A variável que se associou de forma independente com a resposta favorável à intervenção educativa foi a técnica inalatória incorreta (p = 0,005).



Discussão

No presente estudo, foi observado que a realização de um programa educativo individualizado de natureza ambulatorial para pacientes com asma não controlada teve um efeito positivo sobre o grau de controle da doença em um seguimento clínico de 3 meses. Dos 63 pacientes estudados com asma não controlada, 28 (44,4%) mudaram o grau de controle da doença para parcialmente controlada e 6 (9,5%) o mudaram para asma controlada. Secundariamente, houve melhora na função pulmonar (embora não tenha atingido a variação mínima clinicamente significativa) e melhora em todos os domínios do AQLQ.(23,24) A proporção de pacientes que realizava corretamente todas as etapas da técnica inalatória aumentou de 15,4% para 46,2% nos pacientes em uso de inalador pressurizado e de 21,3% para 76,6% nos pacientes em uso do dispositivo de pó. Nos pacientes em uso do inalador pressurizado, a intervenção educativa resultou no aumento da proporção do uso do espaçador de 36% para 68%. A técnica inalatória incorreta na avaliação inicial se associou de forma independente com a resposta favorável ao processo educativo.

Um dos enfoques educativos do presente trabalho foi valorizar a importância do corticoide inalatório e da composição corticoide inalatório e 2-agonista de longa ação no manejo preventivo da doença, reforçando a sua adesão. Entretanto, a proporção de pacientes que relataram uso efetivo (≥ cinco dias na semana) do corticoide inalatório e do 2-agonista de longa ação não aumentou. Em contraste, um estudo prévio(10) mostrou que uma intervenção educativa de curta duração em 174 pacientes com asma teve um aumento significativo no uso do corticoide inalatório. Provavelmente, a diferença decorre da seleção de pacientes com maior gravidade da doença, todos com asma não controlada, no presente estudo.

No estado do Rio Grande do Sul, por ocasião do estudo, nem todas as medicações para o tratamento de manutenção da asma estavam disponíveis no sistema público de saúde. O dipropionato de beclometasona e os broncodilatadores 2-agonistas de curta ação na forma de inalador pressurizado estavam disponíveis na rede de atenção primária de saúde da maioria das cidades. Mas os broncodilatadores 2-agonistas de longa ação (formoterol e salmeterol) e a combinação de corticosteroides inalatórios com 2-agonistas de longa ação estavam disponíveis gratuitamente apenas para uma pequena proporção desses pacientes. No presente estudo, o processo educativo incorporava orientações sobre o trâmite administrativo para a obtenção de medicações dentro do sistema público de saúde. Entretanto, a intervenção não resultou em uma maior obtenção das medicações no sistema público.

A eficácia do tratamento da asma depende também do desempenho da técnica inalatória pelo paciente. Outros trabalhos também demonstraram que a educação teve um impacto importante na proporção de pacientes que utilizavam corretamente os dispositivos inalatórios.(6,11,15) O presente estudo contribuiu com um achado importante ao demonstrar que a técnica inalatória inadequada constituiu-se em um preditor independente de resposta ao processo educativo.

Em nosso meio, outros trabalhos abordaram a intervenção educativa em asma. Um grupo de autores(28) avaliou o impacto de um programa de acampamento educacional para crianças asmáticas, com duração de cinco dias, mostrando um impacto positivo no conhecimento e uma maior habilidade das crianças no manejo da asma. Outros autores(10) avaliaram o efeito de um programa educativo individualizado de curta duração para asma sobre a adesão ao tratamento, técnicas inalatórias e controle da doença, evidenciando uma maior utilização das medicações de controle da asma e redução das visitas a emergência. Em outro estudo,(6) mostrou-se uma melhora do conhecimento da doença e melhora clínica em portadores de asma persistente moderada e grave após a sua participação em um programa educativo realizado durante visitas ambulatoriais de rotina, durante 2 anos.

A principal limitação do presente estudo advém de seu delineamento não controlado. O fato de esse não se constituir em um ensaio clínico randomizado, sem o acompanhamento em paralelo de um grupo controle não submetido à intervenção, impede que se afirme definitivamente que o impacto observado sobre os fatores estudados seja atribuível exclusivamente ao processo educativo e não ao restante do tratamento aplicado. Outro aspecto é que a medicação para o tratamento da asma não foi disponibilizada ampla e gratuitamente a todos os pacientes, de forma que dificuldades na obtenção da medicação poderiam ter interferido no impacto da intervenção.

Concluindo, o presente estudo sugere que um programa educativo individualizado ambulatorial teve efeitos positivos sobre o grau de controle da asma, com melhora na função pulmonar e melhora nos escores de qualidade de vida. A técnica inalatória incorreta na avaliação inicial foi preditora da resposta favorável à intervenção educativa.


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* Trabalho realizado no Serviço de Pneumologia, Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Faculdade de Medicina, Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre (RS) Brasil.
Endereço para correspondência: Paulo de Tarso Roth Dalcin. Rua Honório Silveira Dias, 1529/901, São João, CEP 90540-070,Porto
Alegre, RS, Brasil.
Tel. 55 51 3330-0521. E-mail: pdalcin@terra.com.br
Apoio financeiro: Este estudo recebeu apoio financeiro do Fundo de Incentivo à Pesquisa do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (FIPE-HCPA).
Recebido para publicação em 16/11/2012. Aprovado, após revisão, em 14/2/2013.


Sobre os autores

Carmen Denise Borba Rodrigues
Pós-Graduanda. Programa de Pós-Graduação em Ciências Pneumológicas, Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Rio
Grande do Sul, Porto Alegre (RS) Brasil.

Rosemary Petrik Pereira
Professora Adjunta. Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre (RS) Brasil.

Paulo de Tarso Roth Dalcin
Professor Associado. Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre (RS) Brasil.

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