ABSTRACT
Objective: To describe a new murine model of cigarette smoke-induced emphysema. Methods: Twenty-four male Wistar rats were divided into two groups: the cigarette smoke group, comprising 12 rats exposed to smoke from 12 commercial filter cigarettes three times a day (a total of 36 cigarettes per day) every day for 30 weeks; and the control group, comprising 12 rats exposed to room air three times a day every day for 30 weeks. Lung function was assessed by mechanical ventilation, and emphysema was morphometrically assessed by measurement of the mean linear intercept (Lm). Results: The mean weight gain was significantly (approximately ten times) lower in the cigarette smoke group than in the control group. The Lm was 25.0% higher in the cigarette smoke group. There was a trend toward worsening of lung function parameters in the cigarette smoke group. Conclusions: The new murine model of cigarette smoke-induced emphysema and the methodology employed in the present study are effective and reproducible, representing a promising and economically viable option for use in studies investigating the pathophysiology of and therapeutic approaches to COPD.
Keywords:
Tobacco smoke pollution; Emphysema; Disease models, animal; Equipment and supplies.
RESUMO
Objetivo: Descrever um novo modelo murino de enfisema induzido pela fumaça de cigarro. Métodos: Vinte e quatro ratos Wistar foram divididos em dois grupos: o grupo fumaça de cigarro, com 12 ratos expostos à fumaça de 12 cigarros comerciais com filtro três vezes ao dia (um total de 36 cigarros por dia), sete dias por semana, durante 30 semanas e o grupo controle, com 12 animais expostos ao ar ambiente três vezes ao dia, sete dias por semana, durante 30 semanas. A função pulmonar foi avaliada por meio de ventilação mecânica, e o enfisema foi morfometricamente avaliado por meio do diâmetro alveolar médio (Lm). Resultados: A média de ganho de peso foi significativamente menor (aproximadamente dez vezes menor) no grupo fumaça de cigarro do que no grupo controle. O Lm foi 25.0% maior no grupo fumaça de cigarro. Os parâmetros de função pulmonar tenderam a ser piores no grupo fumaça de cigarro. Conclusões: O novo modelo murino de enfisema induzido pela fumaça de cigarro e a metodologia empregada neste estudo são eficazes e reproduzíveis; são, portanto, uma opção promissora e economicamente viável para estudos sobre a fisiopatologia e o tratamento da DPOC.
Palavras-chave:
Poluição por fumaça de tabaco; Enfisema; Modelos animais de doenças; Equipamentos e provisões.
IntroduçãoA DPOC é um importante problema de saúde pública em todo o mundo; sua prevalência e custos socioeconômicos são elevados. É atualmente a quarta causa de morte em todo o mundo, e as estimativas indicam que, até 2020, será a terceira.(1,2)
Dentro do espectro da DPOC, o enfisema é definido como o aumento dos espaços aéreos distais aos bronquíolos terminais, acompanhado de destruição das paredes alveolares, sem fibrose significativa. A lesão pulmonar oxidativa e a inflamação em resposta a irritantes (tais como a poluição do ar e a fumaça do cigarro) aceleram alterações funcionais e morfológicas e gradualmente limitam as trocas gasosas.(2-4)
Como o tratamento se resume a cuidados paliativos, os modelos animais são fundamentais para estudos sobre a fisiopatologia e novas formas de tratamento da DPOC. O enfisema pode ser induzido experimentalmente por proteases, por exposição à fumaça do cigarro e por manipulação genética.(3-9)
Embora constituam um método interessante, os modelos animais de enfisema induzido por enzimas não reproduzem de forma precisa os mecanismos da destruição alveolar causada pela inalação de fumaça em seres humanos. A atividade proteolítica gera um aumento significativo do tamanho dos espaços aéreos, sem reproduzir a sequência de eventos patológicos característicos do enfisema em seres humanos.(6,10) Modelos animais de enfisema induzido pela fumaça do cigarro são usados na tentativa de reproduzir a doença humana, especialmente os mecanismos fisiopatológicos envolvidos na história natural do enfisema.(6,11) No entanto, o tempo de exposição à fumaça e o número de cigarros usados variam muito de um modelo para outro. Em geral, os resultados mais eficazes são obtidos com períodos de exposição crônica (> 6 meses).(6,12)
O objetivo do presente estudo foi descrever um novo modelo experimental de enfisema induzido pela fumaça do cigarro. O modelo envolve ratos Wistar e um aparelho criado no Laboratório de Genética e Terapia Celular da Faculdade de Ciências e Letras de Assis, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", em Assis (SP). O modelo pode nos ajudar a compreender os processos fisiopatológicos envolvidos na DPOC e a elaborar novas estratégias de tratamento.
MétodosVinte e quatro ratos Wistar machos (idade: 12 semanas; peso: 400-450 g) foram divididos em dois grupos: o grupo fumaça de cigarro, com 12 ratos expostos à fumaça de 12 cigarros comerciais com filtro (Derby Vibrante; Souza Cruz SA, Rio de Janeiro, Brasil) - contendo 0,8 mg de nicotina, 10 mg de alcatrão e 10 mg de monóxido de carbono (CO) - durante três períodos de 1 h de exposição (das 8h00 às 9h00, das 12h00 às 13h00 e das 18h00 às 19h00) todos os dias durante 30 semanas e o grupo controle, com 12 ratos expostos ao ar ambiente durante três períodos de 1 h de exposição todos os dias durante 30 semanas. Durante cada período de exposição, os ratos do grupo fumaça de cigarro eram expostos à fumaça de 4 cigarros durante 15 min, seguidos de um intervalo de 5 min (durante o qual os animais eram expostos ao ar ambiente para prevenir a hipóxia). Durante cada período de 15 minutos de exposição, o aparelho de fumar estava programado de modo que períodos de 10 s de sucção do cigarro se alternassem com períodos de 15 s de descanso.
O aparelho consiste em um sistema de contenção de animais e um dispositivo de fumar cigarros (Figura 1). O sistema de contenção de animais compreende quatro gaiolas de metal (24 cm × 17 cm × 15 cm) fechadas na parte superior. As quatro gaiolas encontram-se equidistantes dentro de uma caixa acrílica (70 cm × 70 cm × 20 cm) hermeticamente fechada. Quatro ratos grandes ou 16 camundongos podem ser colocados em cada gaiola. Dois aparelhos foram usados no presente estudo: um para os animais do grupo fumaça de cigarro e um para os animais do grupo controle. Cada aparelho foi colocado em uma sala separada. O sistema de liberação de fumaça de cigarro consiste em um suporte externo para o cigarro, conectado a uma bomba de sucção dinâmica por meio de uma mangueira flexível. A bomba pode ser programada de modo que períodos de sucção do cigarro se alternem com períodos de sucção de ar limpo, para prevenir a asfixia. A bomba gera pressão negativa, que força o ar através de um cigarro aceso, gerando fumaça e empurrando-a para dentro da caixa acrílica através da mangueira. A concentração de CO no sistema de contenção foi medida por meio de um medidor de CO (ToxiPro® Single Gas Detector; Honeywell Analytics Distribution Inc., Lincolnshire, IL, EUA). Durante os períodos de exposição, a concentração de CO foi de 350-400 ppm.
Todos os animais foram pesados semanalmente em uma balança analítica. Para fins de padronização, todos os animais foram pesados no mesmo dia da semana e no mesmo horário.
A função pulmonar foi avaliada por meio de um ventilador para animais de pequeno porte (flexiVentT; SCIREQ, Montreal, QC, Canadá). Após 30 semanas de exposição diária à fumaça principal do cigarro ou ao ar ambiente, os animais foram anestesiados por meio de injeção intraperitoneal de 250 mg/kg de Thiopentax® (Cristália - Produtos Químicos Farmacêuticos Ltda., Itapira, Brasil) e traqueostomizados com um cateter 20 G ligado ao ventilador (volume corrente: 10 mL/kg; FR: 120 ciclos/min; pressão expiratória final positiva: 3 cmH2O). A paralisia muscular foi induzida por meio de injeção intraperitoneal de brometo de pancurônio (1 mg/kg). A função pulmonar foi expressa em resistência das vias aéreas (Rva), resistência do sistema respiratório, complacência do sistema respiratório (Csr), resistência tecidual e elastância tecidual.
Após a avaliação mecânica do sistema respiratório, os animais foram sacrificados e os pulmões foram removidos. A traqueia foi canulada e ligada ao aparelho de perfusão; os pulmões foram incubados em solução de paraformaldeído a 4 % durante 24 h e mantidos inflados com pressão positiva contínua (20 cmH2O). O tecido pulmonar foi cortado em seções de 5 µm e corado com HE para a avaliação histológica.
O enfisema foi avaliado por meio do diâmetro alveolar médio (Lm), em µm, como proposto por Weibel.(13) Após a fixação, cada pulmão foi cortado em quatro seções sagitais. As seções foram incluídas em um único bloco de parafina, e cada bloco foi cortado em três seções de 5 µm; foram preparadas portanto três lâminas para cada bloco. Para cada lâmina, dez campos não sobrepostos foram selecionados aleatoriamente e examinados por meio de microscopia de luz (aumento: 400×).
Os resultados foram analisados por meio do teste t de Student e de ANOVA de um fator. A fim de testar os pressupostos de distribuição normal e homogeneidade de variância, realizamos os testes de Shapiro-Wilk e Levene. Nos casos em que os pressupostos não se confirmaram, usamos o teste de Mann-Whitney e a ANOVA de Kruskal-Wallis. Para todos os testes, valores de p < 0,05 foram considerados significantes. O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa Animal da Faculdade de Ciências e Letras de Assis da Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" (Protocolo nº 001/2011).
ResultadosComo se pode observar na Figura 2, não houve diferenças significativas entre os ratos do grupo fumaça de cigarro e os do grupo controle no tocante ao peso inicial. Da segunda semana de exposição em diante, a média de ganho de peso foi menor no grupo fumaça de cigarro do que no grupo controle. Houve diferença significativa (p < 0,05) entre os dois grupos quanto ao ganho de peso após a terceira semana de exposição. Após 30 semanas de exposição, a média de ganho de peso foi de 212,00 83,40 g no grupo controle e 44,92 43,40 g no grupo fumaça de cigarro; a média de ganho de peso no grupo fumaça de cigarro correspondeu a 21,2% da média no grupo controle.
Como se pode observar na Tabela 1, os valores de Rva, resistência tecidual, resistência do sistema respiratório, Csr e elastância tecidual foram maiores no grupo fumaça de cigarro do que no grupo controle. No entanto, não houve diferença significativa entre os grupos no que tange aos parâmetros respiratórios analisados, provavelmente por causa da grande variação entre os sujeitos no mesmo grupo (evidenciada pelos valores elevados do dp).
A Figura 3A mostra o Lm para os pulmões direito e esquerdo conjuntamente (em cada grupo), e a Figura 3B mostra o Lm para os pulmões direito e esquerdo separadamente (em cada grupo). Como se pode observar na Figura 3, houve diferença estatisticamente significante entre o grupo fumaça de cigarro e o grupo controle no que tange ao Lm. Quando analisamos os pulmões direito e esquerdo conjuntamente, notamos que o Lm foi 25,0% maior no grupo fumaça de cigarro do que no grupo controle (Figura 3A). Quando os pulmões direito e esquerdo foram analisados separadamente, notou-se que o Lm para o pulmão esquerdo foi 15,8% maior no grupo fumaça de cigarro do que no grupo controle (Figura 3B). Da mesma forma, notou-se que o Lm para o pulmão direito foi 32,3% maior no grupo fumaça de cigarro do que no grupo controle (Figura 3B). Esses resultados sugerem uma diferença entre os pulmões direito e esquerdo no grupo fumaça de cigarro no que tange ao grau de aumento dos espaços aéreos. A destruição dos septos alveolares foi significativamente maior no grupo fumaça de cigarro do que no grupo controle, mostrando aumento dos espaços aéreos em virtude de maior destruição do parênquima pulmonar no grupo fumaça de cigarro, avaliada qualitativamente por meio de coloração de cortes histológicos com HE (Figura 4).
DiscussãoO enfisema induzido pela fumaça do cigarro já foi estudado em diversas condições experimentais. (5,6,11,12,14,15) Embora ainda haja algumas questões sobre o tempo de exposição e o número de cigarros usados, modelos animais de enfisema induzido pela fumaça do cigarro são os modelos experimentais que mais bem reproduzem as características clínicas do enfisema pulmonar em seres humanos e constituem uma ferramenta importante para o estudo dos aspectos fisiopatológicos da doença.(6)
Embora modelos animais de enfisema induzido pela fumaça do cigarro tenham sido usados em vários estudos, apenas alguns sistemas de exposição à fumaça do cigarro estão disponíveis comercialmente, incluindo o Cigarette Smoke Generator® (TSE Systems, Inc., Chesterfield, MO, EUA), o TE-2 Smoking Machine® (Teague Enterprises, Woodland, CA, EUA) e o inExposeT (SCIREQ). Todos têm características semelhantes e consistem em um gerador de fumaça de cigarro e uma câmara de exposição, onde os animais são confinados e expostos à fumaça (por intermédio do corpo inteiro ou do nariz apenas).(11,12,15,16) Todos eles custam aproximadamente 75 mil dólares, cerca de vinte vezes o custo final de nosso aparelho (isto é, 3 mil dólares).
Diversas características de nosso aparelho são semelhantes às de sistemas comercialmente disponíveis usados em estudos anteriores. (11,12,15,16) Uma característica interessante é que os animais são expostos à fumaça do cigarro por intermédio do corpo inteiro. Outra característica é que a fumaça que é bombeada para dentro da câmara de exposição é gerada pela sucção de um cigarro, como de fato ocorre durante o ato de fumar. Assim como outros sistemas no mercado, nosso aparelho permite que se regule a força e o tempo de sucção do cigarro, que pode se alternar com períodos de sucção de ar por meio de um dispositivo de tempo (timer). Dentre as principais vantagens de nosso aparelho sobre os dispositivos disponíveis comercialmente estão o custo baixo, o design simples, a facilidade de instalação e o fato de que pode ser montado a partir de peças disponíveis comercialmente, tais como uma bomba de sucção e um timer (para regular o tempo de sucção do cigarro e do ar, conforme descrito na seção Métodos). Além disso, nosso aparelho custa 20 vezes menos que os dispositivos disponíveis comercialmente.
O período de 30 semanas de exposição empregado em nosso estudo foi escolhido na tentativa de estabelecer um padrão para o tempo de exposição em modelos animais. Estudos anteriores sobre o enfisema induzido pela fumaça do cigarro (empregando diferentes aparelhos) relataram períodos de exposição de 8-36 semanas. Embora períodos de 6 meses de exposição sejam comuns em modelos animais,(12,15-18) períodos de até 9 meses de exposição também têm sido usados.(12,19)
Em alguns protocolos, os animais são expostos à fumaça do cigarro 3-5 dias por semana, o que não é suficiente para simular o tabagismo diário.(10,15,18-20) O tempo de exposição diária varia muito de um estudo para outro.(12,21,22) Li et al. adotaram um protocolo de exposição dividido em duas etapas: primeiramente, os animais foram expostos à fumaça de 8 cigarros duas vezes por dia durante 2 semanas (semanas 1 e 2) e, em seguida, foram expostos à fumaça de 15 cigarros três vezes por dia durante 10 semanas (semanas 3-12).(23) O modelo animal usado no presente estudo simula as condições fisiopatológicas do tabagismo ativo; os animais foram expostos à fumaça principal do cigarro diariamente (7 dias por semana) durante 30 semanas.
Não há estudos que envolvam uma análise morfométrica comparativa do dano alveolar nos pulmões direito e esquerdo. A análise morfométrica comparativa é relevante porque permite que se demonstre a heterogeneidade da destruição do parênquima no enfisema induzido experimentalmente. Diferenças anatômicas entre os pulmões direito e esquerdo de ratos oferecem uma possível explicação para os resultados obtidos. Segundo Cataneo e Reibscheid,(24) a traqueia dos ratos apresenta um desvio para a direita, e os brônquios dos ratos são semelhantes aos brônquios humanos (isto é, curtos e largos). O brônquio direito parece ser uma continuação da traqueia, ao passo que o brônquio esquerdo se parece com um ramo.(24) Portanto, é possível que o pulmão direito tenha sido mais constantemente exposto à fumaça do cigarro, o que resultou em ativação intensa de neutrófilos e macrófagos e aumento da secreção de proteases responsáveis pela destruição do parênquima pulmonar. Essas diferenças anatômicas podem explicar por que o Lm foi maior no pulmão direito do que no pulmão esquerdo no grupo de ratos expostos à fumaça do cigarro.
Embora seja uma ferramenta valiosa para avaliar o enfisema em modelos experimentais, o teste funcional é menos sensível que a análise morfométrica, que é mais precisa na avaliação do dano ao parênquima. Animais com enfisema moderado geralmente apresentam valores funcionais normais quando comparados com animais saudáveis, ao passo que animais com doença grave apresentam alterações significativas nos parâmetros respiratórios.(6) Isso já foi relatado por outros grupos de pesquisa. Foronjy et al.(25) expuseram duas linhagens de camundongos C57 à fumaça do cigarro durante 6 ou 12 meses e observaram um aumento significativo do Lm em comparação com os respectivos grupos de controle. Não obstante, não houve diferenças significativas entre os animais expostos e os respectivos grupos de controle no tocante aos parâmetros respiratórios. Segundo Wright et al.,(6) animais com enfisema moderado geralmente apresentam valores funcionais limítrofes ou normais quando comparados com animais saudáveis; animais com doença avançada são os únicos que apresentam alterações significativas nos parâmetros respiratórios.
Os resultados do presente estudo não mostraram diferenças significativas entre os animais do grupo fumaça de cigarro e os do grupo controle no que tange à Rva e à Csr. No entanto, a Rva tendeu a ser maior no grupo fumaça de cigarro. A espécie em estudo desempenha um papel relevante nos resultados da ventilação mecânica. Embora ratos Wistar possibilitem uma série de análises funcionais, são mais resistentes ao enfisema do que outras espécies de roedores.(6) Do ponto de vista fisiopatológico, a doença pode ser mais branda em ratos, o que pode dificultar a comparação de animais expostos e não expostos à fumaça do cigarro no que tange a parâmetros funcionais.(6) Esse achado empírico pode explicar os resultados do presente estudo, que mostraram não haver diferenças estatisticamente significativas entre os dois grupos de ratos no que tange aos parâmetros funcionais avaliados (Tabela 1), não obstante as evidências morfométricas de enfisema (isto é, o Lm), como se pode observar na Figura 3.
A DPOC pode ser considerada uma doença sistêmica, caracterizada por alterações esqueléticas, fraqueza, disfunção muscular e perda de peso, a qual ocorre em virtude de estresse oxidativo e ingestão calórica reduzida.(21,26,27) Em fumantes com DPOC, a nicotina aumenta a saciedade e reduz a ingestão de alimentos.(28) O tabagismo portanto contribui para a perda de peso, agrava o enfisema e gera um circuito de retroalimentação. Estudos anteriores mostraram que a fumaça do cigarro pode alterar a regulação hipotalâmica do apetite no sistema nervoso central.(12,28,29) Mineur et al.(28) demonstraram que a nicotina reduz a ingestão de alimentos e o peso corporal.
O processo inflamatório é um componente fundamental da fisiopatologia da DPOC. A inflamação e outros efeitos sistêmicos do enfisema não foram avaliados no presente estudo, já que nosso objetivo principal era avaliar a viabilidade de um novo modelo murino de enfisema pulmonar induzido pela fumaça do cigarro. Outros estudos estão em andamento em nosso laboratório e envolvem a análise do pulmão em busca das metaloproteinases 9 e 12, que desempenham um papel importante no processo inflamatório,(3) e a avaliação de células inflamatórias no lavado broncoalveolar de animais expostos e não expostos à fumaça do cigarro.
A acentuada perda de peso observada no presente estudo não ocorreu em virtude do tempo de exposição, haja vista a diferença estatisticamente significativa entre o grupo fumaça de cigarro e o grupo controle a partir da terceira semana de exposição (Figura 2). Os animais do grupo controle apresentaram média de ganho de peso de 212,0 83,40 g, ao passo que os do grupo fumaça de cigarro apresentaram média de ganho de peso de 44,92 43,40 g, que correspondeu a 21,2% da média no grupo controle. Nossos resultados também mostraram um grande dp no que tange à média de ganho de peso dos animais expostos após 30 semanas (44,92 43,40 g). É possível que esses resultados se devam à intensidade da exposição à fumaça do cigarro no presente estudo, a qual resultou em alterações pulmonares e em alterações fisiopatológicas generalizadas. Como mencionado acima, a DPOC deveria ser considerada uma doença sistêmica, como em um circuito de retroalimentação no qual os efeitos da exposição à fumaça do cigarro determinam alterações morfológicas e funcionais no pulmão. Essas alterações refletem os efeitos sistêmicos da nicotina e do grande número de substâncias tóxicas na fumaça do cigarro e em outros poluentes atmosféricos e são agravadas por esses efeitos.
Os resultados do presente estudo indicam que, em animais expostos, a fumaça principal do cigarro resulta em diminuição do ganho de peso e em enfisema, avaliado por meio de análise morfométrica (Lm). A metodologia empregada no presente estudo é viável, e o novo aparelho é eficaz em modelos animais de enfisema induzido pela fumaça do cigarro. Esse novo modelo murino de enfisema induzido pela fumaça do cigarro é uma opção promissora e economicamente viável para estudos sobre a fisiopatologia e o tratamento da DPOC.
AgradecimentosOs autores agradecem a José Ricardo Sousa das Faculdades Integradas Padre Albino (FIPA) a assistência técnica.
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*Trabalho realizado na Faculdade de Ciências e Letras de Assis, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Assis (SP) Brasil.
Endereço para correspondência: João Tadeu Ribeiro Paes, Laboratório de Genética e Terapia Celular - GentTe Cel - Departamento de Ciências Biológicas, UNESP, Av. Dom Antonio, 2100, CEP 19806-900, Assis, SP, Brasil.
Tel. 55 18 3302-5856. E-mail: labcel.tronco@gmail.com
Apoio financeiro: Este estudo recebeu apoio financeiro da Fundação para o Desenvolvimento da Unesp (Fundunesp), da Prefeitura Municipal de Assis e do Consórcio Intermunicipal do Vale do Paranapanema/Saúde (CIVAP/Saúde). Rodrigo de las Heras Kozma e Valter A. Barbosa são bolsistas da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Edson Marcelino Alves e Carolina Arruda de Faria são bolsistas do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Renan Cenize Guardia e Henrique Vivi Buzo são bolsistas das Faculdades Integradas Padre Albino (FIPA).
Recebido para publicação em 30/7/2013. Aprovado, após revisão, em 9/12/2013.
Sobre os autoresRodrigo de las Heras Kozma
Aluno de Pós-graduação. Universidade de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.
Edson Marcelino Alves
Aluno de Graduação. Faculdade de Ciências e Letras de Assis, Universidade
Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Assis (SP) Brasil.
Valter Abraão Barbosa-de-Oliveira
Aluno de Pós-graduação. Universidade de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.
Fernanda Degobbi Tenorio Quirino dos Santos Lopes
Pesquisadora. Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Botucatu (SP) Brasil.
Renan Cenize Guardia
Aluno de Graduação. Faculdades Integradas Padre Albino, Catanduva (SP) Brasil.
Henrique Vivi Buzo
Aluno de Graduação. Faculdades Integradas Padre Albino, Catanduva (SP) Brasil.
Carolina Arruda de Faria
Aluna de Pós-graduação. Universidade de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.
Camila Yamashita
Aluna de Graduação. Faculdade de Ciências e Letras de Assis, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Assis (SP) Brasil.
Manzelio Cavazzana Júnior
Professor Associado. Faculdades Integradas Padre Albino, Catanduva (SP) Brasil.
Fernando Frei
Professor Associado. Faculdade de Ciências e Letras de Assis, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Assis (SP) Brasil.
Maria José de Oliveira Ribeiro-Paes
Professora Associada. Faculdades Integradas Padre Albino, Catanduva (SP) Brasil.
João Tadeu Ribeiro-Paes
Professor Assistente. Faculdade de Ciências e Letras de Assis, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho", Assis (SP) Brasil.