RESUMO
Objetivo: Determinar a utilidade, na prática rotineira, da análise da clonalidade dos linfócitos T e B nos tecidos pulmonares por reação em
cadeia da polimerase no diagnóstico das doenças linfoproliferativas pulmonares. Métodos: Avaliaram-se, mediante análise imunohistoquímica
e rearranjo molecular dos genes, 8 casos de pneumonia intersticial linfocítica (PIL) e 7 casos de doenças linfoproliferativas pulmonares.
Resultados: Todos os 8 casos de PIL expressaram imunocoloração moderada a forte para CD3, em contraste com apenas 2 casos de linfoma e 1 caso de pseudolinfoma. Rearranjo gênico foi detectado em 4 de 8 casos de PIL, o que mudou o diagnóstico de PIL para linfoma, indicando, assim, a importância da detecção de rearranjo gênico em casos de PIL. Nesta situação, rearranjo gênico usando-se os pares de primers VH/JH e Vγ11/Jγ12 foi detectado em 3 e 1 casos de PIL, respectivamente, e não foram detectadas anormalidades gênicas usando-se as pares Dβ1/Jβ2 e Vγ101/Jγ12. Uma associação positiva foi detectada entre a intensidade de imunoexpressão CD20 e CD68 e rearranjo gênico usando-se o par de primers VH/JH. Antes do rearranjo gênico, 4 pacientes com PIL morreram rapidamente, enquanto que, após o rearranjo gênico, apenas 1 paciente com PIL morreu. Conclusões: A detecção de células B e T monoclonais por imunofenotipagem e reação em cadeia da polimerase mostrou impacto no diagnóstico de linfomas pulmonares em pacientes previamente diagnosticados com PIL. Portanto, imunofenotipagem e reação em cadeia da polimerase devem ser incluídas como métodos de 'padrão ouro' na rotina diagnósticObjetivo: Determinar a utilidade, na prática rotineira, da análise da clonalidade dos linfócitos T e B nos tecidos pulmonares por reação em cadeia da polimerase no diagnóstico das doenças linfoproliferativas pulmonares. Métodos: Avaliaram-se, mediante análise imunohistoquímica e rearranjo molecular dos genes, 8 casos de pneumonia intersticial linfocítica (PIL) e 7 casos de doenças linfoproliferativas pulmonares. Resultados: Todos os 8 casos de PIL expressaram imunocoloração moderada a forte para CD3, em contraste com apenas 2 casos de linfoma e 1 caso de pseudolinfoma. Rearranjo gênico foi detectado em 4 de 8 casos de PIL, o que mudou o diagnóstico de PIL para linfoma, indicando, assim, a importância da detecção de rearranjo gênico em casos de PIL. Nesta situação, rearranjo gênico usando-se os pares de primers VH/JH e Vγ11/Jγ12 foi detectado em 3 e 1 casos de PIL, respectivamente, e não foram detectadas anormalidades gênicas usando-se as pares Dβ1/Jβ2 e Vγ101/Jγ12. Uma associação positiva foi detectada entre a intensidade de imunoexpressão CD20 e CD68 e rearranjo gênico usando-se o par de primers VH/JH. Antes do rearranjo gênico, 4 pacientes com PIL morreram rapidamente, enquanto que, após o rearranjo gênico, apenas 1 paciente com PIL morreu. Conclusões: A detecção de células B e T monoclonais por imunofenotipagem e reação em cadeia da polimerase mostrou impacto no diagnóstico de linfomas pulmonares em pacientes previamente diagnosticados com PIL. Portanto, imunofenotipagem e reação em cadeia da polimerase devem ser incluídas como métodos de 'padrão ouro' na rotina diagnóstica.
Palavras-chave:
Linfoma; Doenças pulmonares intersticiais; Biologia molecular; Reação em cadeia da polimerase.
Introdução Pneumonia intersticial linfocítica (PIL) é um termo clínico-patológico histologicamente relacionado a infiltrado intersticial denso, composto principalmente por células T, células plasmáticas e histiócitos, sendo que centros germinais são freqüentemente identificados.(1-3) Essa doença se inclui no espectro das proliferações linfóides pulmonares, as quais variam desde a bronquite/bronquiolite folicular e a hiperplasia linfóide pulmonar (proliferações basicamente limitadas às vias aéreas) até o linfoma maligno de baixo grau.(4,5) Aparentemente, a PIL às vezes evolui para linfoma. Embora a freqüência dessa evolução provavelmente seja baixa, é difícil determiná-la, pois os linfomas de baixo grau podem simular a PIL.(3,4)
O principal diagnóstico diferencial da PIL é o linfoma de baixo grau,(3) o qual geralmente é um tumor de células B bem diferenciado que parece originar-se de tecido linfóide associado à mucosa e é o subtipo histológico mais comum de linfoma não-Hodgkin (LNH) pulmonar.(6,7) A diferenciação entre a PIL e o linfoma de baixo grau pode ser difícil em cortes corados pela técnica de rotina de hematoxilina e eosina (H&E), podendo requerer análises imunohistoquímicas incluindo os anticorpos CD3, CD20, CD4, CD45RO, CD8, CD15, CD30 e CD68,(8,9) assim como pesquisas de rearranjo gênico molecular usando técnicas como a reação em cadeia da polimerase, conhecida como polymerase chain reaction (PCR) em inglês.(10,11)
O desenvolvimento de técnicas de biologia molecular, como o Southern blotting (12) e a PCR,(13-15) tornou possível a detecção de populações monoclonais de linfócitos B e T por meio da detecção dos genes que codificam as proteínas imunoblobulínicas de células B e as proteínas receptoras de células T, conhecidas como T-cell receptor (TCR) proteins em inglês. Essa detecção tem sido usada para respaldar
o diagnóstico de linfomas nodais,(16,17) assim como o de linfomas extranodais como os linfomas gástricos(18) e os pulmonares.(19-23) O objetivo deste estudo foi determinar a viabilidade da detecção de populações monoclonais de linfócitos B e T na prática rotineira. Realizamos um estudo retrospectivo para avaliar os rearranjos gênicos da cadeia pesada da imunoglobulina (IgH) e da TCR por meio da PCR no diagnóstico de PIL. Para a validação do uso deste procedimento, avaliamos também os rearranjos gênicos da IgH e da TCR em casos-controle de doenças linfoproliferativas pulmonares.
Métodos Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade de São Paulo. Blocos de parafina com quantidades suficientes de tecido foram coletados de nossos arquivos para a realização de cortes seriados para as preparações histoquímicas. Todas as biópsias haviam sido obtidas durante o atendimento clínico de rotina dos pacientes. A população do estudo foi composta por 9 casos (6 pacientes do sexo feminino e 3 do sexo masculino; mediana de idade de 41 anos). As amostras foram avaliadas por patologistas pulmonares experientes que verificaram que 8 dos casos apresentavam um padrão histológico compatível com PIL e que o caso restante apresentava um padrão histológico compatível com pseudolinfoma (Tabela 1). O diagnóstico foi baseado em achados clínicos e histológicos em biópsias (7 biópsias pulmonares cirúrgicas e 2 biópsias transbrônquicas) obtidas entre 1982 e 2002 e reclassificadas, de forma unânime, de acordo com a American Thoracic Society/European Respiratory Society International Multidisciplinary Consensus Classification of Idiopathic Interstitial Pneumonias. (24) Os casos de PIL secundária à síndrome de Sjögren ou à síndrome da imunodeficiência adquirida foram excluídos do estudo.
Como grupo controle, foram incluídos 6 casos de linfoma pulmonar (mediana de idade, 43 anos): 1 caso de LNH de células B de baixo grau, 1 caso de linfoma de células B de baixo grau com diferenciação plasmocítica, 2 casos de LNH de células T de alto grau, 1 caso de granulomatose linfomatóide e 1 caso de doença de Hodgkin. Os espécimes de tecido haviam sido obtidos por meio de autópsia (1 caso) ou de biópsia pulmonar a céu aberto (5 casos).
Os cortes de 3 µm de espessura, os quais haviam sido fixados em formalina e emblocados em parafina, foram desparafinizados com xileno e reidratados usando uma série de álcoois graduados. A peroxidase endógena foi bloqueada com 7 lavagens de 5 min em peróxido de hidrogênio a 10%. Uma melhor amplificação foi conseguida em solução mascarante em alta temperatura (10 mM tampão citrato, pH 6.0). Os cortes foram lavados em salina tamponada com Tris e incubados com soro bloqueador a 2% por 20 min. Eles foram posteriormente incubados por 12-18 h a 4 °C com anticorpos primários nas diluições apropriadas e então incubados com anticorpos secundários (LSAB kit peroxidase; Dako, Carpinteria, CA, EUA) por 45 min a 37 °C. A reação da peroxidase foi realizada usando 3,3' tetrahidrocloreto de diaminobenzidina.(20) Os cortes foram contra-corados com H&E.
Qualquer coloração marrom do citoplasma das células caracterizou imunoexpressão positiva para os seguintes marcadores: CD3 (diluição 1:200; Dako EUA, Santa Barbara, CA, EUA); CD 20 (diluição 1:800; Dako EUA); CD 15 (diluição 1:100; Dako EUA); CD 30 (diluição 1:50; Dako Dinamarca, Glostrup, Dinamarca); CD 45 (diluição 1:25; Novocastra, Newcastle Upon Tyne, Reino Unido); CD68 (diluição 1:100; Dako EUA). O grau de coloração do tumor para CD3, CD20, CD15, CD30, CD45 e CD68 também foi graduado. Primeiramente, com um aumento pequeno, a região de maior imunoexpressão foi selecionada. Em seguida, com um aumento de 400×, o grau de coloração do tumor foi graduado com base na soma da intensidade da coloração com a proporção de células coradas, produzindo um valor potencial de 0 a 4.
O DNA foi extraído de um corte de 25 µm do bloco de parafina que melhor representava cada caso (previamente selecionado das lâminas coradas com H&E). Foram utilizadas lâminas descartáveis para microtomia, e os instrumentos foram limpos com xileno após cada corte de tecido para evitar a contaminação cruzada.
Os cortes com parafina não foram desparafinizados. O DNA foi extraído por proteólise - 40 µL de proteinase K (10 mg/mL) - na presença de 800 µL de tampão de extração composto por 50 mM de KCl, 10 mM de Tris-HCl (pH 8,3), 2,5 mM de MgCl2, 0,1 mg/mL de gelatina, 0,45 % de Nonidet P40 e 0,45% de Tween 20. A incubação a 57 °C por toda a noite foi seguida por 10 min de fervura para a desativação da proteinase K.(25,26)
Um primer universal VH e um primer consenso JH foram usados para detectar rearranjos completos da IgH. As análises do rearranjo gênico do TCR da cadeia beta e do TCR da cadeia alfa foram realizadas usando duas combinações diferentes de primers: Dß1/Jß2 e V.11/V.101/J.12. Esses primers foram obtidos junto a Integrated DNA Technologies (Coralville, IA, EUA).
As combinações de primers foram as seguintes: VH (5'-CTGTCGACACGGCCGTGTATTACTG-3'); JH (5'-AACTGCAGAGGAGACGGTGACC-3'); Dß15'-(CAAAGCTGTAACATTG TGGGGAC-3'); Jß2 (5'-AGCAC(T/G/C)GTGAGCC(T/G)GGTGCC-3'); V.115'-(TCT GG(A/G)GTCTATTACTGTGC-3'); V.101 (5'-CTCACACTC(C/T)CACTTC-3') e J.12 (5'-CAAGTGTTGTTCCACTGCC-3').
A mistura reagente continha 30 .mol de cada primer oligonucleotídeo, 3 µL de extrato de tecido, 200 µm de cada desoxinucleotídeo trifosfatado (dATP, dCTP, dGTP, dTTP), 50 mM de KCl, 10 mM de Tris-HCl (pH 9,0), 3 mM de MgCl2, 100 µg/mL de albumina sérica bovina e 0,25 µL de enzima Taq Polimerase, num volume total de 50 µL com água destilada estéril.
Foram realizados 40 ciclos de PCR, sendo que cada ciclo era composto por uma etapa de desnaturação a 93 °C por 1 min, uma etapa de anelamento por 1 min e uma etapa de elongação a 73 °C por 1 min. Na etapa de anelamento, temperaturas diferentes foram usadas para cada par de primer: 52 °C (para VH/JH, V.11/J.12 e V.101/J.12) e 55 °C (para Dß1/Jß2). Após os 40 ciclos, houve um período de 5 min a 73 °C para garantir a extensão e o anelamento completos dos produtos da PCR.
Alíquotas de 30 µL foram então analisadas por eletroforese em gel de poliacrilamida a 10%, coradas com brometo de etídeo e fotografadas sob luz ultravioleta. As bandas de tamanho relevante foram identificadas mediante comparação com um marcador de peso molecular (1 kb DNA ladder; Invitrogen Carlsbad, CA, EUA).(10)
Todos os devidos cuidados foram tomados para evitar contaminação. O teste de qui-quadrado, o teste exato de Fisher e o teste t de Student foram usados para identificar quaisquer correlações entre os achados imunohistoquímicos, os resultados da PCR e os dados clínicos. As curvas de sobrevida foram criadas pelo método de Kaplan-Meier, e a significância estatística das diferenças foi calculada usando o teste log-rank, com p < 0,05 indicando uma diferença significativa, e o Statistical Package for Social Science (versão 10 para Windows; SPSS Inc., Chicago, IL, EUA).
Resultados A Figura 1 mostra os infiltrados linfocíticos em diferentes padrões histológicos de transtornos pulmonares linfoproliferativos vistos após a coloração com H&E e a coloração imunohistoquímica. Nos casos de PIL (Figuras 1a a 1d) houve acentuada infiltração linfocítica com extenso envolvimento dos septos alveolares (Figuras 1a e 1b). Os infiltrados linfocíticos eram formados principalmente por linfócitos (células B e T) com números variados de células plasmáticas. Os linfócitos T (células CD3) foram vistos predominantemente no interstício do septo alveolar (Figura 1c), enquanto os linfócitos B (células CD20) foram encontrados principalmente nos agregados dentro dos folículos linfóides e focalmente nas paredes alveolares espessadas (Figura 1d). Já os casos de linfoma de baixo grau (Figuras 1e a 1h) apresentaram infiltração difusa, densa e monomorfa das células linfóides pequenas com contornos nucleares irregulares (Figuras 1e e 1f) remodelando a arquitetura pulmonar. As células neoplásicas eram células B monoclonais positivas para CD20 (Figura 1g), com uma população reativa variável de células T positivas para CD30 ao fundo (Figura 1h).
Os resultados da biologia molecular estão listados na Tabela 2, a qual inclui o número total de casos e controles, assim como a presença de monoclonalidade para os genes estudados.
A análise por PCR do rearranjo gênico da IgH usando o par de primers VH/JH revelou uma banda de 130 bp (variação de tamanho prevista, 100-150 bp) indicando a presença de uma predominante população clonal de linfócitos em linfoma T de alto grau (Caso 13), PIL (Casos 2, 8 e 9), pseudolinfoma (Caso 3), granulomatose linfomatóide (Caso 6) e doença de Hodgkin (Caso 12). Os casos que exibiam mais do que uma banda evidente foram considerados policlonais, enquanto as faixas menores que 75 bp foram tidas como inespecíficas (Figura 2a).
A análise do rearranjo gênico do TCR da cadeia beta usando o par de primers Dß1/Jß2 revelou uma banda de 60 bp (variação de tamanho prevista, 55-100 bp) em pseudolinfoma (Caso 3) (Figura 2b), provavelmente indicando uma amplificação monoclonal.
Uma banda de 80 bp (variação de tamanho prevista, 70-110 bp) foi considerada evidência de amplificação de uma população monoclonal para o par de primers V.11/J.12 em linfoma T de alto grau (Casos 14 e 15), PIL (Casos 2, 8 e 10), granulomatose linfomatóide (Caso 6) e doença de Hodgkin (Caso 12) (Figura 2C). Já a ausência de bandas, e, portanto, de amplificação monoclonal, foi visualizada usando o par de primers V.101/J.12 (Figura 2d).
A Tabela 1 apresenta os dados clínicos. A mediana de idade dos pacientes foi de 40 anos (variação, 2-81 anos). Havia 10 pacientes do sexo feminino e 5 do sexo masculino. Os pacientes abaixo de 40 anos apresentaram maior imunoexpressão CD15 em linfomas (p = 0,04). Todos os pacientes do sexo masculino apresentaram imuno-expressão VY11, enquanto 8 dos 10 pacientes do de pseudolinfoma expressaram imunocoloração sexo feminino não expressaram VY11 (p = 0,007). semelhante, sendo esta diferença estatisticamente Não foram encontradas diferenças quanto a imuno-significativa (p = 0,02). Todos os 8 casos de PIL, fenotipagem, rearranjo gênico, sexo ou idade.
A Tabela 2 apresenta os resultados referentes à intensidade da coloração do tumor para CD3, CD20, CD15, CD30, CD45 e CD68 e à imunofenotipagem estratificados de acordo com o diagnóstico (PIL ou linfoma). Todos o 8 casos de PIL expressaram imunocoloração moderada a forte para CD3, enquanto somente 2 casos de linfoma e 1 caso de pseudolinfoma expressaram imunocoloração semelhante, sendo esta diferença estatisticamente significativa (p = 0,02). Todos os 8 casos de PIL, assim como 6 casos de linfoma e 1 caso de pseudolinfoma, também apresentaram imunoexpressão CD20, sem diferenças em relação à intensidade da coloração. Da mesma forma, não foram observadas diferenças para CD15, CD30, CD45 ou CD68.
A Tabela 2 apresenta os resultados referentes à detecção de rearranjo gênico usando os pares de primers VH/JH, D1/J2, V11/J12 e V101/J12 estratificados de acordo com o diagnóstico (PIL ou linfoma). Detectou-se rearranjo gênico em 4 dos 8 casos de PIL, o que mudou o diagnóstico de PIL para linfoma, mostrando, assim, a importância da detecção de rearranjo gênico em casos de PIL. Nesta situação, detectou-se rearranjo gênico usando os pares de primers VH/JH e V11/J12 em 3 e 1 casos de PIL, respectivamente, e não foram encontradas anormalidades usando os pares de primers D1/J2 e V101/J12 em nenhum dos casos.
A Tabela 3 apresenta as associações entre imunofenotipagem e rearranjo gênico. Encontrou-se uma significativa associação positiva entre a intensidade da imunoexpressão CD20 e CD68 e rearranjo gênico usando-se o par de primers VH/JH (p = 0,01 e p = 0,002, respectivamente).
As relações entre dados clínicos, doenças linfocíticas/linfoproliferativas e sobrevida geral foram examinadas usando o método Kaplan-Meier e o teste log-rank antes e após o rearranjo gênico. Não foram encontradas diferenças relacionadas à idade ou ao sexo. Antes do rearranjo gênico, a sobrevida média foi de 48 meses para os 8 pacientes com PIL e de 46 meses para os 7 pacientes com linfoma ou pseudolinfoma. Após o rearranjo gênico, apesar da ausência de significância estatística, a sobrevida média para os pacientes com PIL foi de 58 meses, em comparação a 30 meses para os pacientes com linfoma (log-rank = 2,64; p = 0,10). Antes do rearranjo gênico, 4 pacientes com PIL morreram rapidamente, enquanto que, após o rearranjo gênico, apenas 1 paciente com PIL morreu. Esta diferença não atingiu significância estatística (log-rank = 0,20; p = 0,65).
Discussão A posição da PIL nos sistemas de classificação tem mudado com os avanços na compreensão da natureza dos infiltrados linfocíticos, e muitos grupos preferem classificar a PIL sob o título de doenças linfoproliferativas pulmonares.(27) O diagnóstico de doenças linfoproliferativas pulmonares pode ser evocado em muitas condições clínicas, tais como a PIL, o pseudolinfoma, o linfoma primário e a localização pulmonar de um LNH estendido.
Em nosso estudo, verificou-se que a PIL se caracterizava por acentuada infiltração linfocítica com extenso envolvimento dos septos alveolares, semelhante à descrita por outros autores em 1969,(28) contrastando com a infiltração difusa, densa e monomorfa de células linfóides pequenas nos linfomas. Todos os 8 casos de PIL expressaram significativa imunocoloração moderada a forte para CD3, enquanto apenas 2 casos de linfoma e 1 caso de pseudolinfoma tiveram imunocoloração semelhante. Já a imunocoloração para CD 20, CD15, CD30, CD45 e CD68 foi vista em quase todos os casos. Embora os anticorpos CD20, CD45 e CD68 sejam usados rotineiramente para determinar clonalidade em diferentes tipos de doenças linfoproliferativas, nossos achados demonstraram que somente o CD3 estava especificamente relacionado aos casos de PIL. Este achado sugere que o diagnóstico diferencial entre PIL e linfomas é difícil devido à presença (nem sempre detectável na prática rotineira) de populações clonais de células B e T nos linfócitos. Há poucos relatos na literatura sobre populações clonais de linfócitos B ou T no tecido pulmonar de pacientes com linfoma pulmonar de células B ou T.(11,22,24,29) Nesse contexto, a técnica da PCR é promissora.
De fato, mediante o uso da técnica da PCR para detectar rearranjos completos da IgH e mediante a análise do TCR da cadeia beta e do TCR da cadeia alfa usando duas combinações diferentes de primers, como Dß1/Jß2 e V.11/V.101/J.12, verificamos que o par de primers VH/JH indicou a presença de uma predominante população clonal de linfócitos em linfoma T de alto grau (Caso 13), PIL (Casos 2, 8 e 9), pseudolinfoma (Caso 3), granulomatose linfomatóide (Caso 6) e doença de Hodgkin (Caso 12). A análise do rearranjo gênico do TCR da cadeia beta usando o par de primers Dß1/Jß2 identificou amplificação monoclonal em pseudolinfoma (Caso 3). Com o uso do par de primers V.11/J.12, encontrou-se amplificação de população monoclonal em linfomas T de alto grau (Casos 14 e 15), PIL (Casos 2, 8 e 10), granulomatose linfomatóide (Caso 6) e doença de Hodgkin (Caso 12). Estes resultados sugerem que VH/JH e V.11/J.12 são as melhores combinações para detectar rearranjo gênico em casos de linfoma que apresentam padrão histológico compatível com PIL.
Nossos achados reforçam a sugestão de que, uma vez que muitos casos de PIL evoluem para linfoma, a PIL deve ser considerada pré-neoplásica ou vista como um verdadeiro linfoma se qualquer rearranjo gênico for detectado. De fato, o nosso estudo mostrou que 4 dos 8 casos de PIL eram casos de linfoma de células B ou T de baixo grau ou casos de doença de Hodgkin desde o início.
Também verificamos que é difícil estabelecer as distinções entre PIL idiopática, linfoma e doença de Hodgkin somente com base na análise rotineira de cortes histológicos,(30) a qual não deve ser subestimada, mas sim complementada pela imunofenotipagem e a análise por PCR, contribuindo, assim, para uma melhor identificação/classificação dos casos de linfoma. De fato, encontramos uma significativa associação positiva entre a análise imunohistoquímica e a técnica da PCR (Tabela 3). Além disso, nosso estudo mostrou que a análise imunohistoquímica e molecular pode separar infiltrados reativos e neoplásicos, e que 50% dos casos de PIL eram na realidade transformações malignas, incluindo a doença de Hodgkin (uma variante com predominância linfocítica). Também confirmamos que o pseudolinfoma na realidade representa um linfoma de baixo grau. Estes achados suscitam a necessidade de modificações no protocolo terapêutico usado para esse subgrupo de pacientes. Contudo, isso pode não ocorrer em todos os casos de PIL, sugerindo que alguns casos de PIL preenchem os critérios para estado benigno e devem ser tratados somente com esteróides, enquanto os casos de PIL com detecção de rearranjo gênico devem ser vistos como casos de linfoma e tratados com quimioterapia.
Neste estudo, enfatizamos o diagnóstico da PIL mediante a análise imunohistoquímica e por PCR do rearranjo gênico da IgH. Esta pesquisa é muito importante para oncologistas, pneumologistas e patologistas pulmonares porque permite o estabelecimento do diagnóstico correto de linfoma e a introdução do tratamento adequado para a doença, assim como, talvez, uma maior chance de sobrevida para esses pacientes.
Uma vez que a PIL e os linfomas primários do pulmão são raros, representado menos de 1% de todas as patologias pulmonares na maioria dos estudos, era de se esperar que a nossa casuística tivesse um tamanho pequeno. Contudo, o impacto clínico de nossos achados foi investigado. Não foram encontradas diferenças quanto a imunofenotipagem, rearranjo gênico, sexo ou idade. Também examinamos as curvas de sobrevida antes e após o rearranjo gênico. As diferenças não atingiram significância estatística, provavelmente devido ao número limitado de pacientes e ao fato de que os clínicos não estavam cientes de que alguns dos casos de PIL eram linfomas. O diagnóstico de linfoma em alguns dos casos de PIL foi feito somente após o rearranjo gênico. A análise das curvas de sobrevida antes e após o rearranjo gênico revelou que 4 pacientes com PIL morreram rapidamente antes dele, enquanto somente 1 paciente com PIL morreu depois dele, confirmando que o estágio mais agressivo da doença ocorre antes do rearranjo gênico.
Independentemente do mecanismo patogenético linfocítico/linfoproliferativo, a detecção de células B e T monoclonais por imunofenotipagem e PCR teve impacto no diagnóstico de linfomas pulmonares em pacientes previamente diagnosticados com PIL. Portanto, a imunofenotipagem e a PCR devem ser usadas como métodos de 'padrão ouro' na rotina diária. Foram obtidos resultados de PCR interpretáveis na maioria dos casos analisados, demonstrando que a nossa análise por PCR pode se tornar um procedimento de rotina. A detecção de rearranjo gênico em biópsias pulmonares, especialmente em casos diagnosticados como PIL, é muito importante para o estabelecimento de um diagnóstico acurado de linfoma. Para verificar se esses casos representam ou não transformação maligna de PIL, são necessários ensaios prospectivos envolvendo amostras maiores de pacientes. Além disso, acreditamos que mais estudos sobre doenças linfocíticas e linfoproliferativas são necessários para validar os resultados da nossa análise por imunofenotipagem e rearranjo gênico.
Agradecimentos Agradecemos a Sandra de Morais Fernezlian e Keila Maria da Silva, do Laboratório de Imunohistoquímica e Histotecnologia, a assistência técnica.
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*Trabalho realizado no Departamento de Patologia e na Divisão de Pneumologia. Instituto do Coração - InCor - Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP - São Paulo, Brasil.
1. Médica. Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP - São Paulo (SP) Brasil.
2. Doutor em Ciências. Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP - São Paulo (SP) Brasil.
3. Professora Livre-Docente. Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP - São Paulo (SP) Brasil.
4. Professora Associada do Departamento de Patologia. Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP - São Paulo (SP) Brasil.
Endereço para correspondência: Vera Luiza Capelozzi ou Edwin Roger Parra. Departamento de Patologia, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Av. Dr. Arnaldo, 455, CEP 01246-903, São Paulo, SP, Brasil.
Tel 55 11 3066-7427. Fax 55 11 3064-2744.
E-mail: vcapelozzi@lim05.fm.usp.br/erparra20003@yahoo.com.br
Recebido para publicação em 8/11/2006. Aprovado, após revisão, em 11/4/2007.