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Editorial

Tratamento da linfangioleiomiomatose e Camões

Treatment of lymphangioleiomyomatosis and Camões

Rogério Rufino1

Em 1958, Laipply e Sherrick descreveram um caso de derrame quiloso e hiperplasia angiomiomatosa intratorácica, que seria posteriormente reconhecido como a primeira publicação a respeito da linfangioleiomiomatose (LAM).(1) Nesses 57 anos, muito foi somado ao conhecimento da LAM, que é uma doença crônica, multissistêmica, rara, de acometimento preferencial em mulheres, caracterizada pela formação de cistos (destruição pulmonar), derrame quiloso e lesões extrapulmonares como angiomiolipomas, tumores linfáticos e linfangioleiomiomas.(2) A LAM pode ser classificada como uma doença autossômica dominante, causada pela mutação do TSC1 ou TSC2, e apresentação clínica com déficit cognitivo, autismo, convulsões e lesões de hamartomas no cérebro, coração, pele, rim, olhos, pulmões ou fígado(2); ou pode ser esporádica, em decorrência de mutação somática (sem transmissão para descendentes) no gene TSC2.(2) Na sua patogenia, as células de LAM (células neoplásicas) possuem características de melanócitos e de células encontradas no músculo liso.(2) A LAM é considerada uma neoplasia de baixo grau, destrutiva e com lesões metastáticas.(3) O diagnóstico de LAM consegue ser estabelecido, em muitos casos, pelas seguintes características: cistos pulmonares com paredes finas na TCAR de tórax, história de esclerose tuberosa, LAM familiar ou pneumotórax; dosagem elevada de VEGF no sangue (≥ 800 pg/ml); presença de linfangioleiomiomas e angiomiolipomas na TC ou ressonância magnética de abdômen; derrame quiloso; ou presença de células de LAM e detecção de HMB-45 no material de biópsia pulmonar. (4) O diagnóstico da LAM foi aprimorado nessas últimas décadas, e a proposta terapêutica foi modificada a partir de 2000, com a descrição da mutação do gene TSC2. A presença dessa mutação caracteriza-se com o aumento da síntese proteica e crescimento celular pela via de estimulação de mammalian target of rapamycin (mTOR).(5) Medicamentos como o sirolimo ou everolimo foram avaliados para o uso na LAM, pois eles possuem ação inibitória no mTOR, especificamente no complexo 1.(4) Ou seja, eles poderiam reduzir ou controlar o excesso de estimulação desencadeado pelas mutações. Em 2008, publicou-se um estudo aberto no tratamento de LAM que evidenciava a redução de angiomiolipomas renais com o uso de sirolimo, assim como o retorno do crescimento tumoral após a sua suspensão.(5) Atualmente, os inibidores de mTOR são considerados efetivos para as manifestações torácicas (quilotórax) e extratorácicas (angiomiolipoma) e auxiliares na estabilização da função pulmonar na LAM.(3) Freitas et al.,(6) na edição de maio-junho de 2015 do JBP, apresentam uma série de casos com manifestações extrapulmonares e a opção do uso de sirolimo para o controle da LAM. Os resultados são animadores, como demonstrado pelas imagens de redução do volume de angiomiolipomas renais, das massas abdominais e retroperitoneais e da resolução do quilotórax. Houve também a estabilização da função pulmonar. Essa primeira publicação brasileira demonstrou que o sirolimo é uma real opção terapêutica no controle da LAM. Outros aspectos questionados pelos autores e ainda sem resposta na literatura versam sobre a dosagem laboratorial de sirolimo, o tempo de uso e a segurança no longo prazo do tratamento.(6) Temos então um período promissor de avanços na LAM. De fato, as doenças intersticiais, como a LAM, apresentam novidades terapêuticas. A fibrose pulmonar idiopática obteve um avanço terapêutico relevante recentemente com as primeiras drogas específicas para seu tratamento, aprovadas nos EUA: pirfenidona e nintedanibe. (7,8) Na sarcoidose e na esclerose sistêmica, há novos medicamentos que estão sendo avaliados nos casos de refratariedade terapêutica.(9,10) Além disso, o transplante de pulmão consolida-se como uma opção nas doenças intersticiais, como foi demonstrado no estudo de Rubin et al.,(11) publicado no presente número do JBP, cuja recuperação do volume pulmonar após o transplante pulmonar unilateral em pacientes com fibrose pulmonar idiopática foi, em média, de 620 ml no primeiro ano de seguimento, mas a mortalidade antes de um ano de seguimento foi de 30%.

Estamos num processo de novos rumos terapêuticos. Assim, com os novos tratamentos das doenças intersticiais pulmonares, me referencio com o Canto VI de Os Lusíadas:

Outras palavras tais lhe respondia
O Capitão, e logo, as velas dando,
Para as terras da Aurora se partia,
Que tanto tempo há já que vai buscando.
No piloto que leva não havia
Falsidade, mas antes vai mostrando
A navegação certa; e assim caminha
Já mais seguro do que dantes vinha.
- Luís Vaz de Camões (1524 - 1579)


Referências

1. LAIPPLY TC, SHERRICK JC. Intrathoracic angiomyomatous hyperplasia associated with chronic chylothorax. Lab Invest. 1958;7(4):387-400.

2. Taveira-DaSilva AM, Moss J. Clinical features, epidemiology, and therapy of lymphangioleiomyomatosis. Clin Epidemiol. 2015;7:249-57. http://dx.doi.org/10.2147/CLEP.S50780

3. Xu KF, Lo BH. Lymphangioleiomyomatosis: differential diagnosis and optimal management. Ther Clin Risk Manag. 2014;10:691-700. http://dx.doi.org/10.2147/TCRM.S50784

4. Gupta N, Vassallo R, Wikenheiser-Brokamp KA, McCormack FX. Diffuse Cystic Lung Disease. Part I. Am J Respir Crit Care Med. 2015;191(12):1354-66. http://dx.doi.org/10.1164/rccm.201411-2094CI

5. Bissler JJ, McCormack FX, Young LR, Elwing JM, Chuck G, Leonard JM, et al. Sirolimus for angiomyolipoma in tuberous sclerosis complex or lymphangioleiomyomatosis. N Engl J Med. 2008;358(2):140-51. http://dx.doi.org/10.1056/NEJMoa063564

6. Freitas CS, Baldi BG, Araújo MS, Heiden GI, Kairalla RA, Carvalho CR. Use of sirolimus in the treatment of lymphangioleiomyomatosis: favorable responses in patients with different extrapulmonary manifestations. J Bras Pneumol 2015;41(3):275-80. http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132015000004553

7. King TE Jr, Bradford WZ, Castro-Bernardini S, Fagan EA, Glaspole I, Glassberg MK, et al. A phase 3 trial of pirfenidone in patients with idiopathic pulmonary fibrosis. N Engl J Med. 2014;370(22):2083-92. http://dx.doi.org/10.1056/NEJMoa1402582

8. Richeldi L, du Bois RM, Raghu G, Azuma A, Brown KK, Costabel U, et al. Efficacy and safety of nintedanib in idiopathic pulmonary fibrosis. N Engl J Med. 2014;370(22):2071-82. http://dx.doi.org/10.1056/NEJMoa1402584

9. Sweiss NJ, Lower EE, Mirsaeidi M, Dudek S, Garcia JG, Perkins D, et al. Rituximab in the treatment of refractory pulmonary sarcoidosis. Eur Respir J. 2014;43(5):1525-8. http://dx.doi.org/10.1183/09031936.00224513

10. Bosello SL, De Luca G, Rucco M, Berardi G, Falcione M, Danza FM, et al. Long-term efficacy of B cell depletion therapy on lung and skin involvement in diffuse systemic sclerosis. Semin Arthritis Rheum. 2015;44(4):428-36. http://dx.doi.org/10.1016/j.semarthrit.2014.09.002

11. Rubin AS, Nascimento DZ, Sanchez L, Watte G, Holand AR, Fassbind DA, et al. Func-tional improvement in patients with idiopathic pulmonary fibrosis undergoing single lung transplantation. J Bras Pneumol. 2015;41(4):299-304.

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