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Artigo Original

Análise de três diferentes fórmulas de predição de força muscular do quadríceps femoral em pacientes com DPOC

Analysis of three different equations for predicting quadriceps femoris muscle strength in patients with COPD

Aline Gonçalves Nellessen¹, Leila Donária¹, Nidia Aparecida Hernandes¹, Fabio Pitta¹

ABSTRACT

Objective: To compare equations for predicting peak quadriceps femoris (QF) muscle force; to determine the agreement among the equations in identifying QF muscle weakness in COPD patients; and to assess the differences in characteristics among the groups of patients classified as having or not having QF muscle weakness by each equation. Methods: Fifty-six COPD patients underwent assessment of peak QF muscle force by dynamometry (maximal voluntary isometric contraction of knee extension). Predicted values were calculated with three equations: an age-height-weight-gender equation (Eq-AHWG); an age-weight-gender equation (Eq-AWG); and an age-fat-free mass-gender equation (Eq-AFFMG). Results: Comparison of the percentage of predicted values obtained with the three equations showed that the Eq-AHWG gave higher values than did the Eq-AWG and Eq-AFFMG, with no difference between the last two. The Eq-AHWG showed moderate agreement with the Eq-AWG and Eq-AFFMG, whereas the last two also showed moderate, albeit lower, agreement with each other. In the sample as a whole, QF muscle weakness (< 80% of predicted) was identified by the Eq-AHWG, Eq-AWG, and Eq-AFFMG in 59%, 68%, and 70% of the patients, respectively (p > 0.05). Age, fat-free mass, and body mass index are characteristics that differentiate between patients with and without QF muscle weakness. Conclusions: The three equations were statistically equivalent in classifying COPD patients as having or not having QF muscle weakness. However, the Eq-AHWG gave higher peak force values than did the Eq-AWG and the Eq-AFFMG, as well as showing greater agreement with the other equations.

Keywords: Pulmonary disease, chronic obstructive; Muscle strength; Quadriceps muscle; Reference values.

RESUMO

Objetivo: Comparar diferentes fórmulas de predição do pico de força muscular do quadríceps femoral (QF); investigar a concordância entre elas para identificar fraqueza muscular de QF em pacientes com DPOC; e verificar as diferenças nas características nos grupos de pacientes classificados com presença ou ausência dessa fraqueza de acordo com cada fórmula. Métodos: Cinquenta e seis pacientes com DPOC foram avaliados quanto ao pico de força muscular do QF por dinamometria (contração isométrica voluntária máxima de extensão de joelho). Os valores preditos foram calculados com três fórmulas: uma fórmula composta por idade-altura-peso-gênero (F-IAPG); uma por idade-peso-gênero (F-IPG); e uma por idade-massa magra-gênero (F-IMMG). Resultados: A comparação da porcentagem do predito obtida pelas fórmulas mostrou a F-IAPG com maiores valores do que os valores de F-IPG e F-IMMG, sem diferença entre as duas últimas. A F-IAPG apresentou concordância moderada com F-IPG e F-IMMG, enquanto essas últimas também apresentaram concordância moderada, mas menor, entre si. Do total de pacientes, a fraqueza muscular de QF (< 80% do predito) foi identificada por F-IAPG, F-IPG e F-IMMG em 59%, 68% e 70% dos pacientes, respectivamente (p > 0,05). Idade, massa magra e índice de massa corpórea são características que diferenciam pacientes com e sem fraqueza muscular de QF. Conclusões: As três fórmulas foram estatisticamente equivalentes para classificar pacientes com DPOC como portadores ou não de fraqueza muscular de QF. Entretanto, a F-IAPG apresentou maiores valores de pico de força do que F-IPG e F-IMMG, assim como maior concordância com as outras fórmulas.

Palavras-chave: Doença pulmonar obstrutiva crônica; Força muscular; Músculo quadríceps; Valores de referência.

Introdução

Pacientes com DPOC apresentam alterações funcionais das vias aéreas e também do parênquima pulmonar, como aumento crônico da resposta inflamatória do trato respiratório, aumento de células inflamatórias em todo o tecido pulmonar e alterações estruturais relacionadas ao processo de injúria e reparação.(1,2) Além das alterações pulmonares, a doença se caracteriza também por alterações de caráter sistêmico, como inflamação sistêmica e estresse oxidativo aumentado, alterações nutricionais, como perda de peso e caquexia, e disfunção generalizada dos músculos esqueléticos. A disfunção muscular também afeta os músculos respiratórios, principalmente os inspiratórios, tanto em termos estruturais quanto funcionais.(1-4)

A disfunção muscular periférica pode ser definida como a perda de uma das duas principais propriedades do músculo, que são a capacidade de gerar força e a capacidade de endurance (ou resistência).(5) A disfunção é representada por fraqueza muscular, redução da resistência muscular e presença de fadiga.(3,6) Destaca-se que esses três fatores podem estar presentes simultaneamente. O declínio da força muscular dos membros inferiores, principalmente do músculo quadríceps femoral (QF), mostrou-se de duas a quatro vezes mais rápido em pacientes com DPOC do que em indivíduos saudáveis.(7)

A fraqueza muscular de QF na DPOC grave/muito grave é prevalente em cerca de 50% dos pacientes.(8) Esse comprometimento traz consequências clínicas importantes para essa população,(4,5,9) uma vez que está associado com baixa tolerância ao exercício,(10) redução na qualidade de vida,(11) maior utilização dos recursos de saúde(12) e maior risco de mortalidade.(13)

Por esses motivos, é de suma importância avaliar a força muscular dos membros inferiores e identificar a presença de fraqueza muscular. Uma forma relativamente simples, de baixo custo e de fácil aplicação para quantificar a força muscular do QF é a avaliação do pico de força durante a contração isométrica voluntária máxima, que pode ser realizada por meio de dinamometria, inclusive com dinamômetro portátil.(9,14) Sabe-se que a força muscular de membros inferiores está positivamente relacionada a variáveis como idade e peso corporal, e que homens apresentam uma maior força muscular quando comparados às mulheres.(8,15) Para que se leve em consideração esses fatores de variação (idade, peso, gênero), faz-se necessário ter valores de referência (ou de normalidade) para se interpretar adequadamente a força muscular periférica. Porém, não há valores de referência universais para força muscular periférica, e a diferença entre as fórmulas de predição disponíveis não foi explorada em profundidade na literatura científica.

Levando essas informações em consideração, o objetivo do presente estudo foi comparar três diferentes fórmulas de predição do pico de força muscular do QF, as quais foram propostas por Neder et al.,(16) Decramer et al.(12) e Seymour et al.(8) Objetivou-se também investigar a concordância entre elas para identificar fraqueza muscular de QF em pacientes com DPOC; e verificar as diferenças nas características dos pacientes classificados com presença ou ausência dessa fraqueza de acordo com as três fórmulas.

Métodos

Em um estudo transversal, foram incluídos 56 pacientes com DPOC recrutados durante a avaliação inicial de um programa de treinamento físico no Hospital Universitário da Universidade Estadual de Londrina, Londrina, PR, Brasil. Os critérios de inclusão para o presente estudo foram: diagnóstico clínico de DPOC, estabelecido conforme os critérios da Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease (GOLD)(1); estabilidade clínica, sem infecções e exacerbações nos últimos 3 meses; ausência de doença cardíaca severa e/ou instável; ausência de alterações osteoneuromusculares que limitassem as atividades físicas na vida diária; e não ter realizado treinamento físico no último ano. Os pacientes seriam excluídos caso não conseguissem realizar os testes propostos no estudo.

O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Londrina (nº 061/06). Todos os pacientes foram informados com relação aos procedimentos e assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido antes de sua participação no estudo.

A avaliação da função pulmonar (espirometria) foi realizada utilizando-se o espirômetro Spirobank, versão 3.6 (MIR, Roma, Itália), acoplado a um microcomputador. A técnica foi realizada de acordo com as diretrizes da American Thoracic Society/European Respiratory Society,(17) com aferição de VEF1, CVF, índice VEF1/CVF e ventilação voluntária máxima. Os valores de normalidade utilizados são os referentes à população brasileira.(18)

Os pacientes foram submetidos à avaliação da composição corporal por meio de um aparelho de bioimpedância elétrica (modelo 310, versão 5.2; Biodynamics Corporation, Seattle, WA, EUA). O teste foi realizado de acordo com o protocolo descrito por Lukaski et al.(19) O aparelho fornece como desfechos o percentual de gordura corporal, o peso de gordura total, o peso de massa magra, o total de água corporal, a porcentagem da massa magra e a taxa metabólica basal. Os valores de referência utilizados foram os descritos por Kyle et al.(20) e são específicos para pacientes com insuficiência respiratória crônica.

A força muscular periférica, representada pelo pico de força muscular isométrica de extensores de joelho, foi avaliada por meio do dinamômetro portátil MicroFET 2 (Hoggan Health Industries, West Jordan, UT, EUA), modo High Threshold.(21) O dinamômetro portátil foi fixado a um aparelho multiestação (CRW 1000; Embreex, Brusque, Brasil), com fixação do ângulo de avaliação em 60º de flexão de joelho, pois esse é o ângulo articular em que o músculo QF desenvolve a maior força muscular, ou seja, ângulo no qual o maior torque é desenvolvido pelo músculo.(22,23) O paciente foi posicionado sentado, com apoio para as costas, postura ereta, 90º de flexão de quadril e mãos sobre os respectivos membros inferiores (coxa; Figura 1).(7) A avaliação foi composta por contração isométrica voluntária máxima de QF (extensão de joelho) com duração de seis segundos. Foram realizadas no mínimo quatro e no máximo dez medidas de cada membro inferior avaliado. Essa variação de número de medidas ocorreu para que a última medida não fosse a de maior valor durante o teste e para que os três valores mais altos diferissem em menos de 5%. Para análise foi considerado o maior valor.(7) O teste foi realizado por um avaliador devidamente treinado, com encorajamento verbal padronizado e vigoroso durante a manobra, com o objetivo de estimular o paciente a desempenhar um esforço máximo durante todo o tempo de contração muscular. Os valores de referência aplicados foram os propostos por Neder et al.(16) - valores desenvolvidos com uma população brasileira (I) - Decramer et al.(12) - população belga (II) - e Seymour et al.(8) - população inglesa (III). Os pacientes foram classificados como tendo presença de fraqueza (< 80% do predito) ou ausência de fraqueza (≥ 80% do predito), de acordo com a porcentagem do predito de cada fórmula.(24) As fórmulas de predição são as seguintes:

−1,53 × idade + 133 × h + 0,75 × peso + 34,44 × gênero − 66,44 (I)
sendo idade em anos, altura (h) em m, peso em kg e gênero (homem = 1, mulher = 0).
−2,21 × idade + 1,78 × peso + 55,9 × gênero + 124 (II)
sendo idade em anos, peso em kg e gênero (homem = 1, mulher = 0).
56,2 − 0,30 × idade + 0,68 × massa magra − 0,15 × h − 3,42 (se mulher) (III)
sendo idade em anos, massa magra em kg e altura (h) em cm.

Análise estatística

Para a análise da normalidade na distribuição dos dados foi utilizado o teste de Shapiro-Wilk. As variáveis que apresentaram distribuição normal foram expressas em média e desvio padrão; caso contrário, expressas em mediana e intervalo interquartil (25-75%). As variáveis categóricas foram expressas em frequência absoluta e relativa.

Para comparar a média da porcentagem do predito das três fórmulas foi utilizado o teste de Friedman com pós-teste de Dunn, enquanto o teste de qui-quadrado foi utilizado para comparar as proporções de pacientes classificados como com presença ou ausência de fraqueza muscular de QF de acordo com as três diferentes fórmulas. Os testes t de Student não pareado ou Mann-Whitney e o teste de qui-quadrado (variáveis categóricas) foram utilizados para realizar a comparação das características dos pacientes classificados como tendo ou não fraqueza muscular de QF de acordo com as três fórmulas de predição. Para verificar a correlação entre a idade e a força muscular periférica, tanto em valores absolutos quanto em porcentagem do predito, foram utilizados os coeficientes de correlação de Pearson ou Spearman. Para verificar o grau de concordância entre as fórmulas foi utilizado o coeficiente de kappa (par a par).(25) O nível de significância estatística utilizado para todos os testes foi de p < 0,05. Os softwares utilizados para a análise estatística e disposição gráfica foram o Statistical Package for the Social Sciences, versão 20.0 (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA) e o GraphPad Prism, versão 6 (GraphPad Software Inc., La Jolla, CA, EUA).

Resultados

A Tabela 1 descreve as características gerais dos pacientes incluídos na amostra (n = 56). Não ocorreram exclusões. Em geral, a amostra foi caracterizada por obstrução moderada a muito grave das vias aéreas, idade de 66 ± 9 anos e baixa porcentagem dos valores preditos de massa magra.



Como esperado, os pacientes classificados como não tendo fraqueza muscular de QF de acordo com as três fórmulas tinham pico de força mais alto do que pacientes classificados com presença de fraqueza, tanto em Newton-metro (N m) quanto em kg (Tabela 2). Os pacientes que apresentavam fraqueza muscular de QF pelas fórmulas de Neder et al.(16) e Decramer et al.(12) tinham menor idade quando comparados aos pacientes sem fraqueza. A idade não apresentou correlação com a força muscular de QF em valores absolutos (r = −0,06, p = 0,7 para N m; e r = −0,07, p = 0,6 para kg) e apresentou correlação fraca com a porcentagem do predito das fórmulas de Neder et al.(16) e Decramer et al.(12) (r = 0,32, p = 0,02; e r = 0,38, p = 0,004, respectivamente). Os pacientes classificados com presença de fraqueza muscular de QF pela fórmula de Decramer et al.(12) apresentaram índice de massa corporal (IMC) caracterizado como sobrepeso e menor massa magra em porcentagem dos valores preditos.



A função pulmonar (VEF1 em L) não apresentou correlação com a porcentagem do predito das fórmulas de Neder et al.,(16) Decramer et al.(12) e Seymour et al.(8) (r = 0,05, p = 0,7; r = −0,12, p = 0,3; e r = 0,29, p = 0,03, respectivamente); porém, houve correlação moderada do VEF1 em L com a força muscular de QF em valores absolutos (r = 0,50, p < 0,001 para N m; e r = 0,50, p < 0,001 para kg).

A proporção de pacientes que atingiu um valor inferior a 80% do predito na força muscular de QF pelas fórmulas de Neder et al.,(16) Decramer et al.(12) e Seymour et al.(8) foi respectivamente de 59%, 68% e 70%, sem diferença estatisticamente significante (Figura 2). Entretanto, a comparação do pico de força em porcentagem do predito mostrou que a fórmula de Neder et al.(16) apresentou maiores valores quando comparada às fórmulas de Decramer et al.(12) e Seymour et al.(8) (75 [63-90] % do predito vs. 69 [56-86] % do predito e 67 [57-86] % do predito, respectivamente; p = 0,002). O pico de força em porcentagem do predito pelas fórmulas de Decramer et al.(12) e Seymour et al.(8) não apresentou diferença estatisticamente significante (Figura 3).







A respeito da concordância entre as fórmulas, a fórmula de Neder et al.(16) apresentou concordância moderada com as fórmulas de Decramer et al.(12) e Seymour et al.(8) (kappa = 0,66, IC95%: 0,42-0,82; e kappa = 0,62, IC95%: 0,41-0,83, respectivamente). A concordância entre as fórmulas de Decramer et al.(12) e Seymour et al.(8) também foi moderada, porém menor (kappa = 0,52, IC95%: 0,28-0,76).

Discussão

O presente estudo mostrou que as três fórmulas estudadas - de Neder et al.,(16) Decramer et al.(12) e Seymour et al.(8) - apresentaram semelhança para a caracterização dos pacientes com DPOC como tendo ou não fraqueza muscular de QF (< 80% do predito e ≥ 80% do predito, respectivamente). Porém, a fórmula de predição de Neder et al.(16) evidenciou maior valor do pico de força em porcentagem do predito em comparação às outras duas fórmulas, além de apresentar maior concordância com elas.

A fórmula proposta por Neder et al.(16) fundamentou-se em uma pesquisa realizada com 96 indivíduos brasileiros saudáveis com uma ampla faixa de variação de idade (20 a 80 anos), com aleatorização de 15 indivíduos para cada faixa etária. A avaliação da força muscular foi realizada com dinamômetro isocinético, com unidade de medida em N m. A fórmula apresenta um alto coeficiente de determinação da sua análise de regressão, que explica 81% da variância total, e utiliza variáveis simples como o gênero, a idade, a altura e o peso, que são consideradas medidas simples e de baixo custo que podem ser realizadas em ambientes clínicos.

A fórmula proposta por Seymour et al.(8) leva em consideração o gênero, a idade, a altura e a massa magra, dificultando o seu uso na prática clínica por tornar necessária a avaliação da massa magra corporal (por bioimpedância corporal ou dual-energy X-ray absorptiometry). Para seu desenvolvimento, foi avaliada a força muscular periférica em 212 indivíduos saudáveis com idade entre 40 a 90 anos por meio de uma célula de carga, com unidade de medida em kg. A faixa etária envolvida é mais restrita; porém, a aplicabilidade dessa fórmula para pacientes com DPOC é adequada, pois a maior parte dos pacientes com DPOC encontra-se nessa faixa etária.(26) A fórmula apresenta um coeficiente modesto de determinação da sua análise de regressão, que explica 50% da variância total.

A fórmula proposta por Decramer et al.(12) leva em consideração o gênero, a idade e o peso, e a sua unidade de medida é N m. As informações sobre a fórmula são restritas, pois não é informado qual é o número de indivíduos avaliados na pesquisa, a faixa etária da amostra e o valor do coeficiente de determinação, o que limita o entendimento sobre sua aplicabilidade. Os autores do estudo foram contatados para que fornecessem essas informações, porém não houve resposta.

No presente estudo observamos que a porcentagem de pacientes classificados com presença de fraqueza muscular de QF variou de 59% a 70%; no entanto, a literatura mostra que a proporção de pacientes com DPOC mais grave, população semelhante à da amostra incluída no presente estudo, que apresentam fraqueza muscular é de aproximadamente 50%.(7,8,15) Porém, não há uma definição concreta sobre um ponto de corte para determinar fraqueza muscular de QF, e nem mesmo as diretrizes mais atualizadas sobre disfunção muscular periférica em pacientes com DPOC(9) indicam um ponto de corte para determinação de presença ou ausência de fraqueza muscular. Essa ausência de uma definição sobre o que caracteriza a presença de fraqueza muscular possivelmente explica essa diferença. Seymour et al.(8) utilizaram em seu estudo outro ponto de corte para determinar a presença ou ausência de fraqueza muscular, porém a unidade de medida utilizada foi o kg, impossibilitando a sua utilização no presente estudo, pois as demais fórmulas estudadas utilizam a unidade de medida N m. Os pacientes classificados com presença de fraqueza muscular de QF no presente estudo são semelhantes aos sem fraqueza no que diz respeito à obstrução das vias aéreas, classificação da GOLD(1) e gênero. Seymour et al.(8) afirmam não haver diferença em relação à proporção de pacientes classificados com presença de fraqueza muscular quando levados em consideração o gênero e a gravidade da doença de acordo com a GOLD.

No presente estudo, a fórmula de Neder et al.(16) gerou maior valor de pico de força em porcentagem do predito do que as outras duas fórmulas. Há claros indícios de que pacientes brasileiros com DPOC apresentam melhor desempenho no teste de caminhada de seis minutos e maior nível de atividade física na vida diária do que pacientes da Europa(27,28) e mesmo da América Latina.(29) Sabe-se também que a força muscular do QF é um fator determinante para o desempenho no teste de caminhada de seis minutos,(10) além de apresentar correlação moderada com o nível de atividade física diária.(12) Então, pode-se levantar a hipótese de que pacientes brasileiros também teriam força muscular de QF superior à de outras populações. Esses fatores podem explicar por que a fórmula de Neder et al.,(16) desenvolvida com indivíduos brasileiros, gera maiores valores na presente amostra e por isso parece ser mais aplicável à população brasileira do que as fórmulas desenvolvidas com populações de outros países. Tal hipótese merece investigações futuras; porém, já se sabe que, idealmente, os valores de referência a serem utilizados devem ser baseados em uma população o mais próxima possível da população que está sendo estudada.(30) O presente estudo parece corroborar esse conceito, indicando a fórmula de Neder et al.(16) como a mais aplicável para a população brasileira. Novos estudos com outras populações, como as de origem das outras duas fórmulas estudadas, inglesa e belga, podem confirmar isso.

Uma possível explicação para o fato de os pacientes classificados como sem fraqueza muscular de QF de acordo com as fórmulas de Neder et al.(16) e Decramer et al.(12) serem mais velhos é que, nas três fórmulas analisadas, o coeficiente multiplicativo da idade é negativo, sendo menor nas fórmulas de Neder et al.(16) e Decramer et al.(12) Em outras palavras, essas fórmulas preveem que quanto maior a idade do paciente, menor será a força muscular esperada. Outro fator que pode explicar esse achado é que a idade não se correlacionou com a força muscular do QF em valores absolutos nos pacientes do presente estudo, porém apresentou correlação moderada e positiva com a porcentagem do predito das fórmulas de Neder et al.(16) e Decramer et al.(12) Quanto ao fato de os pacientes com fraqueza muscular de QF terem apresentado maior IMC, salienta-se que eles também apresentaram menor massa magra quando comparados aos pacientes sem fraqueza. Isso está em acordo com resultados prévios da literatura que mostram que a massa magra tem relação com a força muscular de membros inferiores.(31)

Uma limitação do presente estudo é que a amostra contempla apenas um único paciente com DPOC leve, o que pode afetar a capacidade de generalização dos nossos resultados para esse subgrupo; no entanto, pacientes com doença leve não eram o alvo da presente investigação, pois a possibilidade de disfunção muscular de QF nesse subgrupo é menor, embora exista. Outra limitação foi a avaliação do pico de força por meio de um dinamômetro portátil, e não por métodos de contração involuntária estimulada ou de dinamometria computadorizada. Entretanto, o método empregado no presente estudo envolveu o uso de um dinamômetro portátil "fixado" em uma cadeira de avaliação, de forma a simular a posição e metodologia da contração voluntária máxima realizada em dinamometria computadorizada. Já foi mostrado previamente que esse método se correlaciona fortemente com o padrão ouro e é altamente reprodutível,(32) além de não trazer prejuízos significativos à acurácia da medida.(33) Por fim, não foi viável realizar o cálculo de sensibilidade e especificidade de cada fórmula, pois não havia no presente estudo um método considerado padrão ouro (ou de referência) para determinação da real presença de fraqueza muscular em cada paciente.

Os resultados deste estudo têm como principal implicação clínica o fato de apontar ao fisioterapeuta a fórmula que melhor identifica a presença ou ausência de fraqueza muscular de QF em pacientes brasileiros com DPOC, facilitando a prática clínica desses profissionais. A identificação de fraqueza muscular nesses pacientes auxilia o fisioterapeuta a estabelecer o melhor plano de tratamento de forma individualizada.

Conclui-se que, em pacientes com DPOC, as três fórmulas foram estatisticamente equivalentes para caracterizar os pacientes como apresentando ou não fraqueza muscular de QF. Os pacientes caracterizados pela presença de fraqueza muscular de QF pelas fórmulas de Neder et al.(16) e Decramer et al.(12) são mais novos, enquanto os pacientes classificados com presença dessa fraqueza de acordo com a fórmula de Decramer et al.(12) apresentaram menor proporção de massa magra e maior IMC. A fórmula de predição de Neder et al.(16) evidenciou maior valor do pico de força em porcentagem do predito em comparação às demais, além de apresentar maior concordância com as demais fórmulas. Esses resultados reforçam que, sempre que disponível (como é o caso do Brasil), recomenda-se utilizar uma fórmula de predição que seja baseada em uma população o mais próxima possível da população alvo.

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